terça-feira, dezembro 29, 2015

ZÉ DO CAIXÃO



Certamente quem leu a biografia Maldito, de André Barcinski e Ivan Finotti, ou mesmo quem tem um pouco mais de intimidade com os filmes do Mojica ficará um tanto frustrado com esta minissérie que leva o nome ZÉ DO CAIXÃO (2015), exibida recentemente no canal Space. O fato de querer condensar boa parte da vida e da obra de José Mojica Marins em apenas seis episódios de menos de uma hora não podia mesmo render bem, embora o trabalho de personificação de Matheus Nachtergaele seja ótimo.

Cada episódio centra em algum filme e em um momento específico da vida e da obra desse gênio do cinema brasileiro, embora a imagem que fique muitas vezes é de uma espécie de Ed Wood, alguém sem noção do que está fazendo. Não é nem o caso de comparar a minissérie com o filme de Tim Burton, pois aí é covardia. O que é vendido erroneamente ao longo dos seis episódios é sim de um homem que sabe pouco de cinema, embora muito criativo (a ideia de pintar os cavalos na falta de outros nas filmagens de A SINA DO AVENTUREIRO é genial) e que teve um momento de grande popularidade.

Uma boa maneira de curtir a série, na medida do possível, é esquecendo um pouco a vida real e os filmes dele e se deixando levar pela imagem quase trágica de um homem que cometeu uma série de erros por falta de orientação ou mesmo por falta de dinheiro, como quando ele vendeu os direitos de À MEIA-NOITE LEVAREI SUA ALMA por uma ninharia e o filme rendeu horrores nas bilheterias. O nome “Zé do Caixão” ficou quente e marcante na cultura popular.

Uma pena que algumas escolhas tenham sido muito infelizes, como colocar na boca de um personagem chamado Chicão, uma homenagem ao Carlão Reichenbach, a idiotice de dizer que Mario Bava é giallo, e que giallo é lixo. Carlão teria ficado furioso se estivesse vivo. Se serve de consolo (não serve, eu sei), isso é dito quando Chicão questiona o fato de Mojica estar dirigindo algo ruim como AS MULHERES DO SEXO VIOLENTO quando fez uma obra-prima proibida pela censura como RITUAL DOS SÁDICOS. É mais para comparar o seu ponto máximo com as tranqueiras que ele dirigiu posteriormente e que acabou prejudicando sua imagem.

Curioso que, dentro dos filmes realizados na década de 1970, que foi um período até que bastante produtivo, ainda que de qualidade bem inferior aos anos 1960, a minissérie escolheu ESTUPRO como destaque. Talvez por causa da cena do mamilo ou por ter uma trama envolvendo uma mulher suspeita de assassinato financiando o filme, o que rende algumas cenas engraçadas com o Mário Lima, grande amigo de Mojica e parceiro para todas as horas.

Nessa corrida contra o tempo, o sexto episódio apresenta a decadência de Mojica nos anos 1980, quando ele adere aos filmes de sexo explícito, que passaram a ser febre na Boca do Lixo. Apesar de alguns momentos tristes, até que é um episódio engraçado, tanto pela cena do cachorro fazendo sexo com uma mulher, como pelo fato de ele ficar arrasado quando Nilse, sua mulher, lhe diz que se converteu a uma igreja evangélica. Disso eu não lembro no livro, mas minha memória não é mesmo muito boa.

Falando em livro, uma boa oportunidade de ler e de reler esse delicioso trabalho é o lançamento luxuoso em capa dura e com muitas páginas (666) pela Darkside. Ler o livro e ver os filmes oferece uma dimensão da vida e da obra de Mojica que a minissérie passa bem longe de apresentar. Porém, se a minissérie conseguir atrair espectadores para o cinema de Mojica, ela já prestou um baita serviço.

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