quarta-feira, maio 11, 2016

A VIDA DE O'HARU / OHARU: VIDA DE UMA CORTESÃ (Saikaku Ichidai Onna)



No mesmo ano que Chaplin lançava seu filme mais triste (LUZES DA RIBALTA), um dos maiores gênios do cinema mundial, Kenji Mizoguchi, conta também uma das história mais tristes já contadas sobre a vida de uma mulher, A VIDA DE O'HARU (1952), que pode ser encontrado no box lançado pela Versátil que traz também a obra-prima CONTOS DA LUA VAGA (1953). Ainda que sua história sobrenatural seja mais famosa e apareça até hoje em tantas listas de melhores filmes de todos os tempos, o filme sobre a vida atormentada de Oharu é tido como o favorito do próprio diretor.

O filme segue uma estrutura bem clássica, começando em um momento de decadência da personagem, quando ela, já na faixa dos 50 anos, tenta disfarçar a idade para sobreviver, junto com outras prostitutas veteranas. O que ela ganha, quase sempre, é escárnio por parte dos homens. Em seguida, somos apresentados a sua vida pregressa, quando mais jovem, e apaixonada por um homem que não fazia parte da nobreza. Seu relacionamento com esse homem (vivido por Toshiro Mifune) acaba por fazer com que sua família fosse expulsa do vilarejo e o destino do seu amado é bem trágico.

A série de desventuras da protagonista é tão grande que chega a parecer um grande exagero, mas em nenhum momento Mizoguchi trata seu filme como um dramalhão. É tudo narrado de maneira muito seca. E se o cinema de Yasujiro Ozu costuma mostrar sempre o teto das casas e a câmera baixa, A VIDA DE O'HARU opta por mostrar a personagem do ponto de vista de cima, quase como um objeto desprezível, que é assim como ela é tratada pela vida e pela sociedade machista do Japão.

Mizoguchi tem um especial interesse pela vida das prostitutas. Além de frequentar bordeis para socializar e entrar em contato com aquelas mulheres, ele ainda teve um caso em sua família de uma irmã que foi vendida pelo seu pai para ser gueixa. Certamente ele se sentia solidário dessas mulheres que acabavam sendo jogadas com força por uma sociedade desumana para o lugar que lhe fosse mais conveniente.

Banida de vários lugares por onde passa (seja como concubina, cortesã, empregada em uma casa, ou mesmo abandonando tudo, inclusive a casa de seus pais, para ser freira), Oharu enfrenta a miséria e a fome, e a cada agressão que recebe, mais ela parece resistir, ainda que com o espírito cada vez mais quebrado. E não é para menos. O drama de não poder ver o próprio filho é um dos mais dolorosos do filme e meio que sintetiza, se é que isso é possível, a dor da personagem. A VIDA DE O'HARU é hoje visto como uma obra feminista e à frente de seu tempo, ainda mais saindo de um país com fama de ser tão opressivo com as mulheres.

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