terça-feira, setembro 30, 2008
CONTROLE ABSOLUTO (Eagle Eye)
Segunda parceria de Shia LaBeouf com o diretor D.J. Caruso, depois do bem-sucedido PARANÓIA (2007), versão teen eficiente de JANELA INDISCRETA, de Alfred Hitchcock – inclusive, saiu uma notícia por aí que Spielberg, como produtor do filme, havia sido processado por plágio pelo escritor do conto que deu origem ao clássico -, CONTROLE ABSOLUTO (2008) também guarda semelhanças com diversos filmes do mestre do suspense, em especial os thrillers de espionagem, como INTRIGA INTERNACIONAL e SABOTADOR, onde sempre há a figura de um homem inocente acusado de um crime que não cometeu. Nisso, entra também a figura do mcguffin, que pra mim se converteu numa forma de desencanar de tramas complicadas e não merecedoras da queima de nossos neurônios. O objetivo desse recurso é servir como ponto de partida para o mais importante: as cenas de ação e suspense.
Em CONTROLE ABSOLUTO, os personagens de Shia LaBeouf e Michelle Monaghan vivem suas vidas na normalidade até o dia em que se vêem enredados numa conspiração terrorista, obrigados a executar ações criminosas e monitorados por um super-computador que controla tudo: desde sinais de trânsito e câmeras de rua a todo tipo de computador, telefone celular ou qualquer tipo de aparelho eletrônico. No começo, até que o filme se mostra interessante, embora a sensação de dèja vu seja constante. A presença de Michelle Monaghan e sua beleza também contribuem para que se veja o filme com certo prazer. Mas depois de uma hora de duração, CONTROLE ABSOLUTO vai se convertendo numa dessas produções genéricas e sem a menor graça, dessas que só pioram à medida que vão se aproximando do final. Quanto mais o filme tentava aumentar a barulheira, mas eu ficava entediado.
Há quem ainda identifique os furos do roteiro, mas eu não estou muito preocupado com isso. Quando se perde o interesse por um filme, não há porque ficar prestando atenção em detalhes bobos, já que o filme em si é bobo. No meio dessa presepada, estão também Billy Bob Thornton como o agente do FBI encarregado de caçar a dupla de "terroristas" e Rosario Dawson como uma espécie de chefe das forças armadas. Por mais que o filme tenha alguma relevância na questão do poder das máquinas sobre os homens, com direito até a um computador "inspirado" no HAL-9000 de 2001 – UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO com a voz da Julianne Moore. Quanto às cenas de ação que eram pra ser o forte do filme, são tão sem graça quanto comer chuchu como almoço todo dia.
P.S.: Uma dica muito boa e que talvez nem todos estejam sabendo: não deixem de conferir, na internet mesmo, o excelente trabalhado que a equipe V2 Cinema, de Porto Alegre, anda fazendo. Trata-se de curtas que contam com debates interessantes sobre a natureza do cinema e que trazem convidados especialíssimos. No primeiro curta, DOIS ANDARES, há a participação de Beto Brant e José Padilha, no segundo, TEATRO DE TITÃS, temos Fernando Arrabal, e no terceiro e mais recente, DE VOLTA AO QUARTO 666, temos Wim Wenders discutindo o futuro do cinema, além de imagens de diversos cineastas conhecidos passando pela tela, com direito a palavras proféticas de Michelangelo Antonioni. Trata-se de um trabalho imperdível e feito com muito profissionalismo. Davi Pinheiro promete David Lynch para novembro!! E antes disso vem mais um aí com o Philip Glass!
segunda-feira, setembro 29, 2008
MULHERES....O SEXO FORTE (The Women)
Remake de AS MULHERES (1939), de George Cukor, MULHERES... O SEXO FORTE (2008) não se destaca apenas por ter um super-elenco feminino (Meg Ryan, Annette Bening, Eva Mendes, Debra Messing, Jada Pinkett Smith, Bette Midler, Candice Bergen, Carrie Fisher, Debi Mazar), mas também por fazer uma reflexão sobre o papel da mulher na sociedade atual, que vem passando por novas mudanças. O número de famílias em que a mulher desempenha o papel de mãe e pai tem crescido consideravelmente, bem como a quantidade de mulheres bem sucedidas profissional e financeiramente que não têm a menor intenção de casar, sem falar nas mulheres lésbicas, no número de gays no planeta, que parece ter crescido exponencialmente nos últimos anos. Já é lugar comum ouvirmos as mulheres se queixando, ao dizer que não há mais homens no mundo. O que não é verdade, claro, mas a declaração deve ser estudada e pensada com calma para se chegar a uma conclusão sobre o que está de fato ocorrendo.
MULHERES... O SEXO FORTE teve que fazer algumas mudanças em relação ao filme de Cukor, mostrando, por exemplo, uma mulher mais trabalhadora e mais presente nas ruas, ao contrário dos anos 30, onde as mulheres ricas costumavam ficar mais em casa enquanto os maridos trabalhavam. Mary Haynes, a personagem de Meg Ryan é um pouco assim. Casada e com uma filha que apesar de bem magrinha já se acha gorda, sintoma dos dias atuais, que tem formado pessoas psicologicamente perturbadas e obcecadas com o peso. A pressão que a sociedade dos dias atuais impõe pode até gerar pessoas mais bonitas por fora, forçando homens e mulheres a manterem a forma, mas quem garante se isso não tem contribuído para os inúmeros problemas de natureza emocional que têm surgido? Mas voltando ao filme e à personagem de Meg Ryan, ela é a mais fiel ao texto e ao filme original, a base de toda a estória. Sua melhor amiga é a personagem de Annette Bening, uma solteirona executiva com cargo de confiança na redação de uma famosa revista feminina. Certo dia, ao fazer as unhas num local chique de Nova York, ela descobre sem querer, através de uma afetada e fofoqueira manicure (Debi Mazar, de ENTOURAGE), que Stephen, marido de Mary, estaria a traindo com uma vendedora de uma loja de perfumes (Eva Mendes). Uma Eva Mendes que se mostra muito mais gostosa e tentadora que a Joan Crawford do filme original, mas cuja vulgaridade é bem carregada nas tintas, tornando-a mais antipática à platéia. Sem falar na redução de tempo de cena da personagem em relação ao filme original.
Uma característica marcante de MULHERES... O SEXO FORTE, mas que a essa altura todo mundo deve estar sabendo, é que o filme, assim como o original, é totalmente composto por mulheres. Os homens não são mostrados em cena. Nem mesmo suas vozes no telefone são ouvidas. Dessa vez, até uma mulher dirigiu o filme. Em nenhum momento do filme é mostrado um homem, nem mesmo unzinho sequer passeando na rua. No original, até os animais são fêmeas. Não sei se o mesmo ocorreu no remake. Não deixa de ser curioso, só por esse aspecto, por se utilizar de elipses para as cenas em que os homens seriam necessários. E assim como o filme anterior, o novo destaca a amizade entre as mulheres, de maneira talvez até mais forte que em SEX AND THE CITY – O FILME.
Há uma controvérsia em relação à amizade entre mulheres. Tempos atrás, inclusive, havia a teoria de que as mulheres não tinham amigas. As verdadeiras amizades seriam entre os homens. As mulheres seriam mais susceptíveis a trair uma a outra. E como, segundo o personagem de Billy Crystal em HARRY E SALLY – FEITOS UM PARA O OUTRO, não existe amizade entre homem e mulher, a mulher seria, portanto, bem mais solitária que o homem. Mas acredito que hoje em dia não sou muito adepto dessa teoria, até por ter amizade com várias mulheres e por perceber um companheirismo maior entre elas.
No mais, a título de curiosidade, Meg Ryan e Candice Bergen são provavelmente as únicas atrizes do elenco que trabalharam com George Cukor. Ambas estiveram presentes no último filme dirigido por Cukor, RICAS E BONITAS (1981). A personagem gay de Jada Pinket Smith é um avanço natural em relação ao original. A diretora Diane English, em sua estréia no cinema, tomou cuidado para que seu filme não parecesse antiquado. Apesar disso, algumas pessoas saíram no meio da sessão, não tendo paciência em ver um filme baseado numa peça de teatro. Ainda assim, acredito que a diretora soube manter um ritmo dinâmico, para que seu filme não se tornasse cansativo para as novas audiências. Infelizmente, não agradou a todos.
domingo, setembro 28, 2008
O TUBARÃO (Tiger Shark)
Howard Hawks não é muito conhecido por ser um diretor de filmes de gângster, até por não ter feito muitos trabalhos nesse sentido, mas além de ter realizado o bem sucedido SCARFACE - A VERGONHA DE UMA NAÇÃO (1932), filme importante para o gênero, Hawks ainda teve a sorte de trabalhar, na mesma época, com dois ícones dos filmes de gângster, os gigantes James Cagney, em DELIRANTE (1932), e Edward G. Robinson, neste belo trabalho sobre homens trabalhando com pesca e ameaçados por tubarões, entitulado no Brasil O TUBARÃO (1932). Ao contrário do que muitos podem pensar, o filme não tem nada a ver com o TUBARÃO campeão de bilheteria de Steven Spielberg ou o TUBARÃO picotado de Samuel Fuller. Se bem que eu não vi ainda o filme do Fuller, mas imagino que a trama deva se distanciar bastante dessa obra puramente hawksiana. Vemos aqui, como em vários de seus dramas, homens trabalhando num negócio perigoso. Nos filmes de Hawks, a ameaça pode vir através de desastres automobilísticos, de um ataque de índios, de uma má visibilidade num vôo ou pela grande possibilidade de morrer numa guerra. E falando em morrer na guerra, lembremos que TUBARÃO também antecipa o tema do triângulo amoroso presente em O CAMINHO DA GLÓRIA (1936). Em O TUBARÃO, o triângulo amoroso ameaça a velha amizade de dois homens.
O filme começa com três homens num barco cercado por tubarões. Eles estão prestes a morrer de sede e inanição ou a virar comida de tubarão. O personagem de Edward G. Robinson já mostra nos primeiros minutos suas duas facetas: a do sujeito leal a um amigo que está morrendo de sede e a de um sujeito extremamente cruel ao jogar o terceiro homem que o ameaça para os tubarões sem o menor sentimento de culpa. Ao avistarem um navio que os salvará, ele relaxa e deixa uma de suas mãos na água, pronta para ser devorada por um tubarão. Passados alguns meses, com um gancho no lugar da mão, ele continua chefiando uma trupe de pescadores. As cenas dos peixes sendo pescados aos montes e a do tubarão sendo recebido a golpes de paus pelos homens são reais. Hawks, antes de começar a filmar, preparou-se para deixar o filme - pelo menos no aspecto da profissão dos pescadores - o mais realista possível. Por isso, essas seqüências são quase documentais e foram filmadas por seu assistente, Dick Rosson. Hoje em dia, com a Sociedade Protetora dos Animais de olho, tais cenas provavelmente seriam proibidas.
Edward G. Robinson, conforme o gosto de Hawks, deixa de ser um sujeito lento e passa a se mostrar rápido na fala e vigoroso nos atos. Ele é um português de nome Mike Mascarenhas que tem alguns portugueses na sua tripulação também, como o senhor Manuel Silva. (Inclusive, é possível ouvir e entender algumas falas em português, que não são traduzidas e nem colocadas nas legendas que vêm com o arquivo.) Com a morte de Manuel, que teve suas pernas comidas pelos tubarões, Mascarenhas aparece para contar a triste notícia para a filha única do seu Manuel, Quita (Zita Johann, a jovem de olhos de ressaca que apareceria em A MÚMIA, de Karl Freund). Como ela estava sozinha e sem ninguém, aceita o convite de casamento do "capitão gancho", que já vinha sempre a visitando e cuidando dela, trazendo dinheiro ou comida. O problema acontece quando ela conhece e se apaixona pelo amigo de Mascarenhas, Pipes (Richard Arlen), um sujeito bem mais jovem e boa pinta que o pobre Mike, que muitas vezes tinha que mentir para esconder o fato de que era solitário, para não parecer um pobre coitado aos olhos de sua tripulação. E Edward G. Robinson passa muito bem para as telas tanto o lado terno e sensível do personagem, apaixonado por uma mulher que em outras circunstâncias jamais se casaria, e o seu lado sombrio, que é um pouco mais suavizado no filme e só mostrado novamente lá pelo final. O TUBARÃO, apesar do final, arranjado para agradar a todos, não deixa de ser um filme ousado em muitos aspectos, principalmente ao mostrar a mulher adúltera com bons olhos, graças, principalmente, à compreensão e à cumplicidade da platéia.
quinta-feira, setembro 25, 2008
UM SINAL DE ESPERANÇA (Jakob the Liar)
É tempo de organizar as coisas, como as finanças, que até me impediram de ir ao cinema ultimamente. Tempo também de organizar as fotos mais antigas do blog, que estão todas zoadas. Certo site de onde eu costumava "linkar" algumas fotos resolveu proibir esse acesso e o resultado foi desastroso para o arquivo do blog. Mas já consertei todas as fotos de 2008 e aos poucos vou consertando as demais, embora isso leve um tempinho. É tempo também de ver os DVDs que as pessoas, com muita boa vontade, me emprestaram para eu ver e que eu levo anos para ver e devolver. Estou tentando aos poucos me livrar dessa "obrigação", por mais que as pessoas que me emprestaram não estejam necessariamente apressadas para receber o seu material de volta. UM SINAL DE ESPERANÇA (1999) é um desses "acertos de conta", um filme que normalmente eu não locaria, mas que passou pelas minhas mãos e eu resolvi dar uma chance.
UM SINAL DE ESPERANÇA, curiosamente, foi feito um ano após A VIDA É BELA, de Roberto Benignini. Não teve a mesma repercussão internacional que o oscarizado filme italiano, e talvez também não tenha a mesma força, mas tem suas qualidades, algumas delas até superam o exemplar italiano. O bom elenco ajuda: Robin Williams - fazendo o típico papel de sujeito iluminador -, Liev Schreiber, Armin Mueller-Stahl, Alan Arkin e Mathieu Kassovitz, que, aliás, é filho do diretor, Peter Kassovitz, que quando criança, viu seus pais serem levados para um campo de concentração. Ele tinha cinco anos de idade, mas a imagem traumática deve ter ficado gravada em sua mente. Logo, ele, mais do que Beninigni, tem motivos muito mais fortes para realizar um filme sobre o horror do holocausto. Felizmente, seus pais sobreviveram ao campo de concentração e ele teve a alegria de encontrá-los depois dessa que foi a mais cruel de todas as guerras. Apesar de ser bem menos conhecido que o filho, Peter Kassovitz tem uma filmografia até extensa, tendo trabalhado na França desde os anos 60.
UM SINAL DE ESPERANÇA é uma refilmagem de JAKOB, DER LÜGNER (1975) e mostra a rotina de um grupo de judeus poloneses presos no gueto de Varsóvia. Robin Williams é o Jakob mentiroso do título original, que depois de ser pego depois do toque de recolher por um soldado alemão precisa prestar contas com um comandante nazista. Enquanto isso, ele ouve no rádio do comandante uma notícia sobre o avanço das tropas soviéticas, que estariam próximas. Ele conta isso depois para o personagem de Liev Schreiber, que não resiste e espalha para todos. A fofoca se espalha de modo que todos pensam que Jakob tem escondido um rádio, onde pode ter notícias sobre a guerra. Depois de perceber que mentir ajudava mais do que dizer a verdade, ele procura inventar fatos para elevar os ânimos dos judeus e diminuir os índices de suicídio. Enquanto isso, Jakob esconde uma garotinha que foge de um trem cheio de judeus sendo levados para um campo de concentração. Apesar do tema pesado, o filme tem uma leveza que torna possível até mesmo algumas risadas ocasionais.
Agradecimentos especiais a Anny, que me emprestou o DVD.
quarta-feira, setembro 24, 2008
O VOYEUR / O HOMEM QUE OLHA (L'Uomo che Guarda)
Não estava na minha lista de prioridades rever O VOYEUR (1994), de Tinto Brass, por esses dias, mas tem dias que a gente sente necessidade de procurar alguns estímulos, mesmo que sejam de natureza menos elevada. Ou mais elevada, se você pensar no aspecto físico da coisa. Tenho O VOYEUR como uma das melhores obras de Brass. E por isso não resisti ao ver a bela e chamativa capa do DVD promocional exposto nas Lojas Americanas, trazendo a voluptuosa Katarina Vasilissa à janela, com o traseiro arrebitado e um sorriso provocante. Katarina deixou o seu país natal, a Polônia, com o objetivo de trabalhar na indústria pornográfica italiana. Se ela conseguiu isso, não sei, não consta no IMDB. O que sabemos é que a moça caiu nas graças de Tinto Brass que a transformou em uma espécie de anjo do pecado num de seus filmes mais explícitos. Aliás, quanto a isso, uma pena que a versão nacional do DVD seja uma versão com cortes, o mesmo acontecendo com a versão de INSTINTO SELVAGEM, de Paul Verhoeven, que não contém as cenas mais picantes adicionadas no VHS, que trazia cenas extras em relação à versão exibida nos cinemas.
Na época da realização de O VOYEUR, a indústria pornográfica estava passando por uma boa fase, ainda que muitos considerem-na uma fase de decadência, já que os filmes pornôs mudaram da tela de cinema para a telinha dos lares, dando uma maior privacidade para o espectador. E nesse momento de transição, Brass precisava ser também mais apelativo, mostrar que podia, sem necessariamente se utilizar do sexo explícito, aumentar a voltagem erótica de seus filmes, tornar as estórias menos importantes, mais simples, já que quando a cabeça de baixo "pensa" mais que a de cima o raciocínio fica um pouco confuso. Lembro que na época, cheguei a ver um filme pornô do John Leslie que tinha uma trama um pouco complexa (ou vai ver não fazia sentido mesmo) e eu não consegui entender quase nada. O filme se chamava DOG WALKER e era um dos bons exemplos da ótima safra daquela época. Se por um lado, a sinalização do fim do cinema pornô como arte estava próxima, aqueles últimos momentos, em que alguns diretores filmavam direto em vídeo e alguns em 16 mm, foram uma época muito boa para o mais marginal dos gêneros. Mas nem devia estar falando tanto do pornô. Voltemos o foco ao erotismo sofcore de Tinto Brass.
Em O VOYEUR - que nos cinemas passou com o título de O HOMEM QUE OLHA, mais fiel ao título italiano -, vemos Dodo, um jovem professor sofrendo de depressão por causa da partida de sua esposa gostosa – a já citada loira Katarina Vassilissa. Ele sonha com ela o tempo todo. Os sonhos se misturam com as memórias, em seqüências que emulam muito bem o estado onírico. Entre os sonhos, há os encontros fortuitos em lugares públicos que a sua ex-esposa sugere, como o restaurante ou o cinema, e há também uma cena em que uma de suas alunas o convida para ir até sua casa. Paralelamente, Dodo se sente atraído pela enfermeira safada que cuida de seu pai. Ela, além de tratar da saúde do velho, ainda lhe presta alguns "servicinhos extras" para o homem convalescente, que apesar da idade, se sente muito mais tarado do que quando jovem. A enfermeira passa o filme todo usando um micro-short e os seios à mostra, com o objetivo de provocar o filho do seu paciente. No mais, temas recorrentes da filmografia de Brass, como o uso dos espelhos em cenas eróticas, das roupas transparentes e do sexo ou atos obscenos em ambientes públicos, estão todos lá. Na cena em que Dodo e sua amada estão no cinema, vemos uma cena crucial de A CHAVE (1983), um dos filmes mais importantes da filmografia do diretor.
terça-feira, setembro 23, 2008
FEAR ITSELF - NEW YEAR'S DAY
Os zumbis estão na moda. Eles estão em todo lugar. Nos games, nas ruas ("zombie walk"), nos quadrinhos e, claro, cada vez mais presentes nos filmes, vide o sucesso de [REC] e outros exemplares. Até o pai dos mortos-vivos, o simpático George Romero (acho o Romero tão simpático quanto o Stan Lee), quis fazer um filme fora de sua franquia, o controverso DIÁRIO DOS MORTOS. Nos quadrinhos, nem a Marvel resistiu e inventou as divertidas estórias com os Zumbis Marvel. E NEW YEAR'S DAY (2008) é mais um título a engrossar a já longa lista de filmes de mortos-vivos. E, por sorte, talvez graças à boa estória do especialista em quadrinhos de terror Steve Niles, da graphic novel "30 Dias de Noite", NEW YEAR'S DAY foi uma boa surpresa.
Surpresa principalmente pelo fato de ter sido dirigido por Darren Lynn Bousman, cineasta mais conhecido pelas continuações "meia-boca" da franquia JOGOS MORTAIS. O seu trabalho para a antologia FEAR ITSELF tem um pouco daqueles tiques e efeitos de câmera irritantes e muito utilizados nos filmes de tortura do Jigsaw, meio como videoclipes dos anos 90, mas nada que atrapalhe o belo enredo desse exemplar zumbiesco, que se utiliza de uma trama cheia de idas e vindas e um final-surpresa que me agradou bastante.
O prólogo mostra a bela desconhecida Briana Evigan acordando do que aparentemente parece ter sido uma noite de bebedeira. É dia de ano novo e ouvimos um ruído nas ruas. Ela acorda desnorteada sem saber o que aconteceu e olha para a janela de seu apartamento, quando vê que o mundo está mergulhado no caos. Em seu edifício, barulhos estranhos são ouvidos e logo ela se vê cercada de zumbis por todos os lados, inclusive um de seus amigos, transformado em zumbi. Enquanto isso, com idas e vindas no tempo, a estória vai mostrando o que aconteceu na noite anterior, que parecia ser uma noite como outra qualquer, na qual essa jovem se encontrava deprimida em casa e é encorajada pelo amigo a sair para a festa, até porque o sujeito de quem ela gosta estaria lá também. As cenas da festa, com a expectativa de que algo está prestes a acontecer lembram um pouco CLOVERFIELD e são tão boas de ver quanto as cenas do presente. Depois de ter visto o ótimo trabalho de Stuart Gordon (EATER) e agora essa boa surpresa, estou recuperando as espeanças pelo sucesso de FEAR ITSELF.
segunda-feira, setembro 22, 2008
LINHA DE PASSE
Interessante observar como o tema da paternidade/maternidade é tão importante na filmografia de Walter Salles, que - se eu não me engano - cresceu em berço esplêndido e sem problemas de ordem familiar. Se bem que eu não conheço a sua história de vida; faço apenas suposições. De todo modo, não deixa de ser bonito quando se percebe que Salles não é apenas um rapaz rico e mimado que se meteu a fazer filmes, mas um sujeito que realmente conhece e ama o cinema. Não custa lembrar que Salles foi um dos poucos que lançou filme brasileiro durante a crise braba que foi a Era Collor – A GRANDE ARTE (1991) -, e depois ainda fez questão de registrar esse momento negro de nossa História recente no ótimo TERRA ESTRANGEIRA (1996). A solidão e a dificuldade de encontrar o próprio caminho também são temas recorrentes na obra de Salles e podem ser vistos até num remake de um terror japonês, ÁGUA NEGRA (2005), filme praticamente renegado por seu autor, mas que tem o seu valor dentro de sua filmografia. Não se trata apenas de um filme de encomenda.
Filmes sobre meninos em busca do pai, como CIDADE DOS HOMENS e este LINHA DE PASSE (2008) são reflexo de uma sociedade em que cresce cada vez mais o número de famílias onde a mãe exerce as duas funções: de pai e de mãe. Em entrevista a uma revista, li Salles discorrendo sobre o fato de o Brasil ser também um país sem pai. Diferente dos Estados Unidos, que foi verdadeiramente colonizado pela Inglaterra, o Brasil foi explorado, sugado e muitas vezes abandonado por seu "pai", Portugal. Mas prefiro não estabelecer metáforas entre o drama dos personagens mostrados no filme e o Brasil.
O maior risco de Salles em LINHA DE PASSE era mostrar seus personagens, principalmente o evangélico e o jogador de futebol, de maneira estereotipada. No caso do aspirante a jogador de futebol, acredito que ele foi bastante feliz, já que houve quatro anos de preparação para que Vinícius de Oliveira (o nome mais conhecido do elenco) treinasse o esporte. No caso do rapaz evangélico, porém, achei que ele não obteve um resultado que fugisse dos estereótipos, embora eu tenha achado bem respeitadora e bonita a seqüência em que o rapaz recita um dos salmos de Davi, enquanto a montagem mostra as dificuldades que cada um dos cinco personagens está enfrentando no momento.
O prêmio de melhor atriz em Cannes para Sandra Corveloni foi uma bela surpresa e pode abrir as portas da fama para essa ótima atriz, que se despe de glamour para interpretar uma mãe pobre que cuida de quatro filhos de pais diferentes e ainda está grávida do quinto. Salles talvez tenha atingido o seu ápice criativo em LINHA DE PASSE e isso se deve não apenas à sua habilidade na direção e ao ótimo roteiro de Daniela Thomas, George Moura e Bráulio Mantovani, mas também à excelente edição, que torna o filme fluido, mesmo lidando com cinco realidades distintas, representadas pela mãe e seus quatro filhos. Salles acertou em ter escolhido um grupo de atores desconhecidos para o seu filme, dando mais credibilidade à trama. Até o próprio Vinícius de Oliveira, o único conhecido, não tem perfil de ator global e se mostra bem diferente, agora adulto, dez anos depois de CENTRAL DO BRASIL (1998). E que sorte a dele, de ter trabalhado justamente nos dois melhores filmes da carreira de Salles.
Num filme onde desgraça pouca é bobagem e que guarda semelhanças óbvias com ROCCO E SEUS IRMÃOS, de Luchino Visconti, Salles, como uma mãe, tem a sensibilidade de tratar todos os personagens com a mesma importância, embora o título dê a entender que o personagem de Vinicius de Oliveira se destaque dos demais. Pode até ser que se destaque um pouco mesmo, mas acredito que a todos foi dado praticamente o mesmo tempo de cena. Nesse caso, a mãe vivida por Corveloni seria algo mais próximo de uma protagonista no filme, pois está mais presente. A montagem final é o ápice. Brilhante e orquestrada com habilidade, junto com a trilha sonora de Gustavo Santaolalla, deixa para o espectador o privilégio de levar um pouco do filme para casa, imaginando o possível rumo dos personagens.
Meu top 5 Walter Salles:
1. LINHA DE PASSE
2. CENTRAL DO BRASIL
3. TERRA ESTRANGEIRA
4. ÁGUA NEGRA
5. DIÁRIOS DE MOTOCICLETA
sábado, setembro 20, 2008
DELIRANTE (The Crowd Roars)
E é com prazer que chego a uma segunda peregrinação pela obra de Howard Hawks. Na verdade, são apenas uma meia dúzia de filmes que consegui, das décadas de 30 e 40, mas que me darão mais gosto de ver do que a grande maioria desses filmes novos de Hollywood. Vendo DELIRANTE (1932), que nem é da melhor safra do cineasta, ainda assim senti um gostinho todo especial de estar curtindo um autêntico Hawks, que, sendo o "cineasta da velocidade", encontra num filme de corridas um equivalente muito justo ao seu ritmo. Ele voltaria ao tema em FAIXA VERMELHA 7000 (1965). Hawks já antecipava essa loucura que é o mundo da velocidade de hoje, onde não se tem tempo para nada e onde tudo passa rápido demais. E essa angústia ou essa vontade de viver cada minuto como se fosse o último transparece tanto na fala rápida e ansiosa dos personagens, como em seus atos. E no caso de DELIRANTE, também na velocidade dos carros. Reabrir a peregrinação pelo cinema de Hawks também significa reler os trechos da entrevista relativas aos filmes em questão do livro "Afinal, Quem Faz os Filmes", que pelo visto, vai render ainda muitos anos nas minhas mãos, já que em vez de seguir em frente na leitura, dedicando-me a outros cineastas, eu estou voltando. Mas faço isso com prazer, para descobrir detalhes sobre a produção dos filmes, a reação do diretor ao seu próprio trabalho, entre outras coisas.
1932 foi um ano bem ocupado para Hawks, que teve três trabalhos seus lançados nos cinemas americanos, sendo os outros dois SCARFACE - A VERGONHA DE UMA NAÇÃO e O TUBARÃO. Falando especificamente de DELIRANTE, é impressionante como naquela época as pistas não eram asfaltadas, então era poeira pra todo lado, facilitando os riscos de acidentes fatais. Até porque, ainda que os carros não tivessem a mesma velocidade que os carros de Fórmula 1 ou Fórmula Indy têm hoje em dia, havia bem menos dispositivos de segurança. Mas esse é o mundo dos heróis de Hawks, mundo do perigo e da coragem. DELIRANTE talvez possa ser considerado o avô dos filmes de corrida. Na entrevista a Peter Bogdanovich, Hawks conta que também gostava muito de correr em carros de corrida e que já experimentou correr com a poeira na vista, sem saber direito para onde estava indo, perdendo o controle e saindo fora da pista. O filme, inclusive, já começa com uma seqüência documental, mostrando um acidente feio durante uma corrida em Indianápolis. Esses acidentes eram bem freqüentes na época e as pessoas compareciam mais para ver a carnificina do que por gostarem do esporte. Aposto que se as corridas de Fórmula 1 ou Indy ainda fossem assim, o número de espectadores cresceria exponencialmente. Acho que até eu seria um desses espectadores. Vejam como o ser humano é cruel e carente de cenas de mortes como espetáculo. Sorte que hoje temos o cinema e dá pra brincar de faz de conta. Melhor do que ir para uma praça pública para assistir a um enforcamento, um apedrejamento, uma morte na cruz ou na guilhotina, ou assistir a uma batalha até a morte de dois gladiadores num coliseu.
Em DELIRANTE, a família ainda aparece como centro da trama, como havia sido mostrada no anterior SCARFACE - A VERGONHA DE UMA NAÇÃO. Apesar disso, em ambos os filmes, a família é vista de maneira problemática. Nos trabalhos posteriores de Hawks, a família tradicional, sangüínea, seria substituída pela ausência da família ou pela preferência por um grupo de amigos com interesses em comum como família. Em DELIRANTE, James Cagney é um famoso piloto de corridas que depois de um longo tempo longe da famíla parte para uma visita, deixando em Indianápolis sua noiva (Joan Blondell), cada vez mais disposta a se casar com ele, enquanto ele foge do casamento como o diabo foge da cruz, e fica empurrando com a barriga o relacionamento, chegando até a evitar uma apresentação formal da moça para a família, provavelmente para que não se firme um compromisso. Ao chegar em sua cidade natal, ele se surpreende ao encontrar seu irmão mais novo todo entusiasmado e já pronto para se tornar também um famoso piloto de corridas como ele. Interessante como a trama lembra SPEED RACER. Aliás, eu não duvido nada que o desenho japonês tenha se inspirado um pouco nesse filme para construir seus personagens. E a maneira rude como os homens hawksianos tratam as mulheres - também hawksianas, no sentido de irem em busca do que querem até o fim - encontra um intérprete perfeito na figura de James Cagney, com toda aquela pinta de malvado e durão.
sexta-feira, setembro 19, 2008
MAMMA MIA!
Entre uma cochilada e outra, fui conferir MAMMA MIA! (2008), de Phyllida Lloyd, musical que tem como grande diferencial ter todo o repertório composto de canções da banda sueca Abba. Nunca fui muito fã do Abba, banda considerada meio brega até pouco tempo, e acho até triste as suas canções, apesar de parecerem superficialmente alegres. "Dancing Queen" é o maior exemplo disso. Não sei se essa impressão que eu tenho é fruto da apreciação de O CASAMENTO DE MURIEL, mas toda canção da banda que eu ouço eu acho triste. Assim como também acho triste as canções ditas mais alegres da primeira fase dos Beatles. Mas eu sou meio freak mesmo, desses de ficar triste em festa e feliz em dias chuvosos. Mas falando em Beatles, não tem como não comparar MAMMA MIA! com ACROSS THE UNIVERSE, de Julie Taymor, que foi um filme que me agradou bem mais, até pelo fato de eu conhecer todo o repertório, enquanto do Abba só conheço mesmo as mais clássicas.
Há quem diga que ACROSS THE UNIVERSE é brega, mas apesar de MAMMA MIA! se utilizar bem menos de efeitos visuais e outros recursos estilosos para encantar a platéia, MAMMA MIA! me pareceu bem menos consistente. Quando saí do cinema, eu estava culpando o sono, mas agora acho que vou me juntar ao grupo dos que não gostaram do filme, ainda que tenha gostado de uma cena ou outra, principalmente as cantadas por Amanda Seyfried (a filha mais velha da família da série BIG LOVE), que se mostra encantadora e bem mais solta no filme. Na série, eu estava acostumado a vê-la mais presa às regras da religião dos pais e dificilmente dando um sorriso.
Dessa vez, ela já começa sorrindo, animada pelo fato de ter convidado para o seu casamento os seus três possíveis pais, que ela acabara de descobrir da existência graças ao fato de ter encontrado um diário antigo de sua mãe (Meryl Streep, que também é boa cantora), em que ela narrava as aventuras de sua juventude nos anos 70. A mãe até hoje vive num ambiente o mais natural possível, separada da civilização, numa pequena ilha na Grécia. Os prováveis pais da garota são protagonizados por Pierce Brosnan, Stellan Skarsgård e Colin Firth. O filme pode ser visto como uma celebração da vida, com as canções da banda sueca e o clima festeiro, mas confesso que foram pouquíssimos os momentos que me deixaram um pouco alegre.
O que mais me fez pensar entre uma cochilada e outra foi no quanto os musicais de hoje bebem da fonte das canções do passado e que isso pode ser reflexo da própria sociedade atual, que tem preferido buscar coisas do passado a criar canções originais para os novos musicais ou pegar coisas de bandas novas. Além dos dois musicais citados, basta lembrar também de NÃO ESTOU LÁ, de DE-LOVELY – VIDA E AMORES DE COLE PORTER, de C.R.A.Z.Y. – LOUCOS DE AMOR e de MOULIN ROUGE. Até mesmo Woody Allen se utilizou desse recurso no delicioso TODOS DIZEM EU TE AMO. Isso, em se tratando de cinema em língua inglesa, pois parece estar havendo uma tímida revitalização do musical na França, vide o recente CANÇÕES DE AMOR, de Christophe Honoré. Ainda assim, mantenho a teoria de que as pessoas, pelo menos as da minha geração e várias das de mais de 20 anos, têm procurado muito mais as velhas e boas canções dos anos 60, 70 e 80 do que o material requentado que vem sendo produzido atualmente no show business.
quinta-feira, setembro 18, 2008
SOLDADO DE LARANJA (Soldaat van Orange)
Praticamente trinta anos antes de parir a obra-prima A ESPIÃ (2006), o holandês maluco Paul Verhoeven exercitou o tema no épico de guerra SOLDADO DE LARANJA (1977), filme que também trata da ocupação alemã na Holanda durante a Segunda Guerra Mundial. A julgar pela relativamente longa duração do filme e até pela utilização de um intervalo musicado entre a primeira e a segunda partes, nota-se que o filme foi uma produção bem ambiciosa, talvez mais até do que A ESPIÃ. Decepcionei-me um pouco, embora tenha gostado do filme. Talvez pelo fato de ser o trabalho mais comportado de Verhoeven que eu já vi. Muito pouco sexo, transgressão e violência, coisa bastante comum de se encontrar nos trabalhos do cineasta. Talvez o filme tenha sido feito com concessões, para agradar a uma audiência maior. No ano anterior, Verhoeven havia produzido uma produção para a televisão holandesa com o mesmo título, mas não sei dizer o quanto a mini-série tem a ver com o filme.
Na trama, vemos um grupo de amigos que têm as suas vidas totalmente modificadas com a tomada dos alemães a seu país. Alguns, para escapar à morte, preferem se aliar aos nazistas; outros, entram em grupos de resistência, mesmo aqueles incapacitados para o exército, como o personagem de Rutger Hauer, que foi dispensado por ser míope. Outro rosto familiar dos filmes de Verhoeven e segundo personagem importante da estória é Jeroen Krabbé, que apareceria nos filmes seguintes do cineasta – SEM CONTROLE (1980) e O 4º HOMEM (1983). Rutger Hauer também apareceria em SEM CONTROLE, numa pequena ponta e, já com uma carreira bem estabelecida nos Estados Unidos, protagonizou a retumbante estréia hollywoodiana de Verhoeven: CONQUISTA SANGRENTA (1985), que honra o adjetivo do título e é um dos melhores e mais fortes trabalhos do diretor.
Assim como A ESPIÃ, SOLDADO DE LARANJA é um filme sobre espiões, sobre pessoas que tentam sobreviver num mundo onde não se pode confiar no outro. Não custa lembrar que o softcore SHOWGIRLS (1995) também lidava com a desconfiança, com conspirações, apesar de ser um trabalho totalmente distinto no tema. SOLDADO DE LARANJA é claramente dividido em duas partes. Assim como E O VENTO LEVOU, para citar um exemplo de um filme grandioso com um intervalo, há uma diferença de tom e do rumo dos acontecimentos do filme entre a primeira e a segunda parte. E talvez a comparação com a superprodução americana não seja gratuita. Talvez SOLDADO DE LARANJA seja mesmo o E O VENTO LEVOU dos holandeses, já que não houve guerra que tenha afetado tanto a sociedade holandesa quanto a Grande Guerra. Apesar de eles terem tido depois apoio dos ingleses, americanos e dos russos, a ocupação alemã foi muito traumática para o país. Dizem que até hoje os holandeses mantêm uma relação de inimizade com o povo alemão, embora eu não tenha como comprovar isso. Mas a necessidade de um filme como A ESPIÃ ser feito em pleno século XXI pode ser uma indicação de que ainda existe rancor entre os dois povos.
Dando uma olhada no IMDB, fiquei feliz ao ver que o nome de Verhoeven não consta mais como diretor da continuação de THOMAS CROWN – A ARTE DO CRIME, embora isso não queira dizer que o filme não seja realizado e que Verhoeven não venha a fazê-lo e que até supere com facilidade o original. O que consta no IMDB como trabalho seguinte do homem é o thriller AZAZEL, previsto para o próximo ano e com a bela Milla Jovovich encabeçando o elenco.
quarta-feira, setembro 17, 2008
LIFE ON MARS - PRIMEIRA TEMPORADA (Life on Mars - Series 1)
Eu adoro filmes sobre viagens no tempo. Eles geralmente me fascinam. Logo, tinha tudo para gostar de LIFE ON MARS, a série inglesa que mostra um policial que sofre um acidente, fica em estado de coma, e vai parar no ano de 1973. A premissa me agradou e o charme da década em si, bem como as canções clássicas que eventualmente surgem nos episódios seriam supostamente atrativos suficientes pra mim. No entanto, não sei o que aconteceu, mas eu nunca passei tanto tempo para terminar uma temporada de uma série como passei pra terminar essa primeira (2006) de LIFE ON MARS.
Minha intenção nas férias de julho era ver essa série e, se desse tempo, ver também mais uma temporada de FAMÍLIA SOPRANO ou HOUSE, mas só agora, em pleno setembro, terminei uma temporada de apenas 8 episódios! O que justifica isso? Simples: por incrível que pareça, porque a série é bem chatinha, não tem ganchos que nos motivem a ver o episódio seguinte e ainda tem aquele drama sem graça e xaroposo do cara que quer arranjar um jeito de voltar para o seu mundo, o mundo contemporâneo. No começo é até interessante, mas impressionante como a repetição disso em praticamente todos os episódios - ainda que sejam poucos - resulta num pé no saco.
Mas LIFE ON MARS, que devido ao sucesso que teve na Inglaterra, ganhou até uma refilmagem ou reinvenção americana (que ainda não estreou nos Estados Unidos), tem as suas qualidades. A ambientação inglesa, as canções setentistas, as referências às bandas de rock da época e as comparações de como a polícia trabalhava naquele tempo e o modo como trabalha agora, com muitos mais recursos tecnológicos, são alguns dos pontos positivos. Naquela época, por exemplo, nem mesmo uma investigação com o uso das digitais do suspeito de uma cena do crime era possível.
O entretenimento fica mais no aspecto policial da série, no jeitão "Dirty Harry" burro do parceiro do protagonista, comparado com sua maneira toda correta de agir. Se bem que eu ainda acho meio ridículo ver policiais desarmados correndo atrás de bandidos. Não que eu seja a favor do uso de armas, só achei isso muito estranho. LIFE ON MARS também me dá um pouco de interesse quando mostra a família do protagonista, o momento em que ele encontra sua mãe, e especialmente, o momento em que ele encontra seu pai. Dizem que a segunda (e última) temporada é bem melhor, mas sinceramente eu vou dar um tempo de alguns meses ou um ano para voltar a ver a série. Estou com saudade do Dr. House e sua turma, de Tony Soprano, da família poligâmica de Bill e da turma de Seinfeld para perder tempo com séries que não gosto.
terça-feira, setembro 16, 2008
PERIGO EM BANGKOK (Bangkok Dangerous)
Cineastas estrangeiros em Hollywood nem sempre têm a mesma sorte. Normalmente, eles acabam perdendo sua liberdade criativa e às vezes se submetem a trabalhos de encomenda que nada têm a ver com seu estilo. Eu, particularmente, gosto bastante da dobradinha THE EYE – A HERANÇA (2002) e mais ainda de VISÕES (2004), que tive oportunidade de ver no cinema. ASSOMBRAÇÃO (2006), que também ganhou distribuição nos cinemas brasileiros, foi uma experiência delirante e extravagante que merece o nosso respeito, apesar de eu achá-lo um pouquinho cansativo e de ter sido um dos filmes responsáveis pela diminuição de produções asiáticas estreando nos cinemas do país. Mas foi com esse background que Oxide Pang Chun e Danny Pang chegaram a Hollywood para filmar o horror genérico OS MENSAGEIROS (2007), que pode ser considerado um fracasso, tanto comercial quanto artístico, apesar de ter os seus momentos e algumas belas imagens. Aliás, a utilização de uma direção de arte e fotografia caprichadas sempre foi uma característica do cinema dos Pangs. E alternando produções em Hong Kong, eles voltam em mais uma produção americana, dessa vez com uma refilmagem de seu próprio trabalho, realizado em 1999.
PERIGO EM BANGKOK (2008) obviamente se parece mais com o cinema produzido no Oriente que OS MENSAGEIROS. Não apenas por se passar em Bangkok, na Tailândia, e por ter um elenco de apoio totalmente oriental, mas por optar por uma dramaturgia mais próxima da utilizada nos filmes chineses e que muitas vezes é considerada piegas ou brega nas seqüências mais dramáticas ou românticas. E se os irmãos Pang fizeram um trabalho próximo de um melodrama misturado com um filme de ação, algo bem presente no cinema de John Woo, é porque eles foram mais fiéis às suas origens. Nicolas Cage serve como um atrativo para a platéia. Apesar de não ter feito boas escolhas nos últimos anos, Cage, curiosamente, leva muitos espectadores ao cinema, mesmo em bombas como O MOTOQUEIRO FANTASMA.
Em PERIGO EM BANGKOK, Cage é um assassino profissional contratado para efetuar quatro trabalhos na capital da Tailândia, mostrada de maneira suja e barulhenta pelas lentes dos diretores. Chegando lá, elege um batedor de carteiras como seu auxiliar, responsável pela entrega de maletas secretas que servem para fornecer os dados para que o assassino saiba qual será a próxima vítima. Diferente do que costumava fazer em seus trabalhos anteriores, em Bangkok, ele começa a criar um vínculo afetivo com seu ajudante, que pede para ser um aprendiz, bem como com uma farmacêutica surda-muda, por quem se apaixona.
Os dois primeiros atos são bem interessantes e o fato de o filme se passar num lugar exótico e de possuir os maneirismos dos irmãos Pang ajuda a torná-lo uma experiência nova. O problema é o terceiro ato que costuma ser chato e barulhento como é de costume acontecer na grande maioria dos filmes de ação, com seus velhos clichês e finais forçados. No caso de PERIGO EM BANGKOK, os cineastas começam a perder a mão quando as coisas apontam para uma provável tragédia e um ato de heroísmo por parte do protagonista, que funciona como uma redenção, mas que não oferece ao espectador o impacto necessário. No entanto, levando-se em consideração os dois terços iniciais, ainda considero PERIGO EM BANGKOK um bom ou ao menos razoável filme de ação.
segunda-feira, setembro 15, 2008
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA (Blindness)
"Ensaio sobre a Cegueira", o romance de José Saramago, é um dos mais impactantes - e talvez o mais acessível e ao mesmo tempo instigante - trabalhos do autor. Diferente, por exemplo, de "Todos os Nomes", que é uma obra mais difícil, mas que vai conquistando aos poucos o leitor a ponto de ter um clímax poético e emocionante, "Ensaio..." é um livro que agrada e "pega" o leitor logo de cara. Por isso, só imaginar uma adaptação cinematográfica para essa obra-prima de Saramago é uma tarefa difícil. O próprio escritor, quando sondado por Fernando Meirelles para ceder os direitos de sua obra para o cinema, alguns anos antes, recusou, afirmando se tratar de uma obra infilmável, afinal, muito da força do livro vem da imaginação do leitor, que, assim como a maioria dos personagens, também não pode realmente ver o que está acontecendo na ação. Transformar a prosa do escritor português em filme poderia resultar na diminuição do impacto de várias cenas, principalmente levando-se em consideração que Meirelles não é exatamente um fã de cinema de horror (o sujeito nunca viu O DESPERTAR DOS MORTOS, do Romero!), e o resultado final de ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA (2008), o filme, seria mais ou menos parecido com o de um filme de horror de zumbis. Pelo menos é essa a imagem que fica na cabeça do leitor nas cenas em que Saramago descreve os cegos com as bocas levantadas para cima no meio da rua, para beber a água da chuva, ou andando como zumbis famintos, dentro de um supermercado, em busca de comida, numa das melhores seqüências, tanto do filme quanto do livro.
A adaptação não tem o mesmo impacto que sua fonte (nem acho que Meirelles tivesse essa pretensão) e o cineasta, por querer fazer um trabalho mais limpo, em nome do "bom gosto", para evitar chocar a platéia, me passou uma impressão de covardia. Não que eu faça questão de ver as fezes dos cegos nas alas onde eles ficam presos em quarentena, o que serviria para passar a imagem de sujeira extrema descrita com detalhes no livro, mas acredito que isso ajudaria a tornar o filme menos asséptico do que ficou em seu resultado final. Mas tudo bem. Meirelles optou por esse caminho e as tonalidades brancas da fotografia de César Charlone, quase constantes no filme, tornam essa assepsia coerente com a chamada "cegueira branca".
Independente dos problemas, Meirelles é um ótimo narrador e para quem leu o livro, o filme não deixa de ser um prazer de se ver, sempre que tentamos imaginar o que virá a seguir, imaginar como Meirelles materializará determinada cena. Uma das que eu mais tinha curiosidade de ver o resultado era a cena em que o "velho da venda preta" (Danny Glover, também narrador do filme) conta como está o mundo lá fora. Enquanto lia o livro ficava imaginando se Meirelles iria utilizar o recurso do flashback ou se mostraria o personagem simplesmente contando o ocorrido. Considero a escolha pelo uso das cenas do caos no mundo causado pela cegueira generalizada um dos acertos do filme. Bem como a utilização de um elenco global.
Sendo uma co-produção de países tão distintos quanto o Brasil, o Japão e o Canadá, o filme utilizou atores hollywoodianos para interpretar os personagens principais – o médico (Mark Ruffalo) e a mulher do médico (Julianne Moore) -, a nossa atriz brasileira mais conhecida lá fora (Alice Braga), o mexicano Gael Garcia Bernal como o grande vilão do filme, e dois astros japoneses (Yusuke Iseya e Yoshino Kimura) convidados para interpretar o primeiro cego e sua esposa. Sem falar no já citado Danny Glover. Como o livro não especifica onde acontece a ação e nem mesmo dá nome e e características físicas aos personagens, ele funciona como uma fábula, como algo universal. E sendo universal, a opção pela língua inglesa foi por necessidade comercial, sem a intenção de dar a entender que a ação se passa nos Estados Unidos, no Canadá ou na Inglaterra ou em qualquer outro país de língua inglesa. No entanto, pelo menos para os brasileiros, a cidade mais reconhecível do filme, entre as várias utilizadas como locação, é a São Paulo esvaziada durante a epidemia.
sábado, setembro 13, 2008
FEAR ITSELF - EATER
Impressionante como Stuart Gordon consegue se ajustar perfeitamente às condições que lhe são oferecidas e ainda assim oferecer um ótimo trabalho. Ele é provalvemente o cineasta que melhor soube aproveitar a pouca duração das séries de tevê que trabalhou, sabendo condensar ou ajustar da melhor maneira possível a trama ao tempo e ainda assim imprimir um grau de terror elevado, além de ter a coragem de colocar cenas fortes numa série de tv aberta. Em MASTERS OF HORROR, ele prestou tributo a dois mestres dos contos de terror: H.P.Lovecraft com DREAMS IN THE WITCH-HOUSE (2005) e Edgar Allan Poe com THE BLACK CAT (2007). E vendo recentemente outros trabalhos do cineasta, começo a acreditar que ele é um dos diretores mais subestimados, até mesmo pelos fãs dos filmes de horror, que sempre o colocam abaixo da importância de um George Romero ou um John Carpenter. E talvez Gordon seja tão bom quanto eles, além de ter o título inquestionável de melhor especialista em adaptações de Lovecraft para o cinema. Sem falar que ele se utilizou de um roteiro de David Mamet e fez aquela maravilha que é SUBMUNDO (2005). E injustamente nunca vi nenhum filme de Gordon sendo lançado comercialmente nos cinemas. É tudo direto para vídeo e olhe lá!
EATER (2008), dirigido por ele, é, até agora, o melhor dos episódios de FEAR ITSELF que eu pude ver e acho difícil encontrar outro que rivalize com esse excelente conto de um serial killer canibal que é capturado pela polícia e aterroriza os policiais responsáveis em ficar com ele durante a noite na prisão. Além de canibal e de lembrar um pouco Joey Ramone, o tal maníaco, é também detentor de conhecimentos de magia negra, através de rituais indígenas. Dizer mais da trama pode estragar as surpresas do pequeno filme. O legal é que, diferente de outros episódios anteriores, como IN SICKNESS AND IN HEALTH, de John Landis, e SPOOKED, de Brad Anderson, o prólogo do filme de Gordon não chega a empolgar. É a partir de seu desenvolvimento e depois dos créditos iniciais que o filme diz de verdade a que veio e vai criando uma atmosfera cada vez mais opressiva e aterrorizante. Eu já me tornei fã de Gordon e vou tentar ver outros filmes dele para confirmar a excelência do trabalho do cineasta, a começar pela versão do diretor de DO ALÉM (1986), que há tempos eu devo a mim mesmo uma conferida.
E aproveitando que eu não tenho muito mais a comentar sobre EATER, falemos um pouco, nesse último parágrafo, da volta de boa parte das séries de tv que eu acompanho, nesse mês de setembro. PRISON BREAK, uma série que parecia durar no máximo duas temporadas, conseguiu chegar a uma quarta, embora eu acredite que dessa não passe. Se na primeira e na terceira temporadas, Michael Scofield estava encarcerado e lutando para sair da cadeia e na segunda havia um jogo de gato e rato fora da prisão, essa quarta temporada parece mais uma série de homens numa missão. A série começou com uma série de falhas, mas continua descaregando mais adrenalina que 24 HORAS faz tempo. E que bom poder olhar de novo para a beleza de Sarah Wayne Callies. Já ENTOURAGE é garantia de diversão fácil. Difícil não gostar das aventuras de Vince e cia em Hollywood. Dessa vez, ele tem que lidar com o fracasso retumbante do filme "Medellin" e dar a volta por cima. Não que ele tenha ficado triste com isso e deixado de pegar as mulheres mais bonitas do planeta. Na próxima encarnação, eu quero ser que nem o Vince. Quanto a DEXTER, o primeiro episódio vazou na internet antes da estréia na tv americana e deu pra ter um gostinho e uma idéia do que pode acontecer nessa terceira temporada, que já dá sinais de cansaço, mas que ainda assim agrada. Esse é o meu problema com as séries. Só se elas se tornarem muito ruins mesmo (caso de NIP/TUCK e HEROES) para que eu desista delas, pois eu me apego facilmente a bons personagens. Falta estrear ainda THE OFFICE. E acho que vou continuar vendo FRINGE também.
quinta-feira, setembro 11, 2008
MY BOY
A intenção era assistir todos os extras do disco 2 do dvd de O GAROTO (1921) e falar de maneira rasteira dos curtas e dos demais extras presentes no dvd duplo no próprio post do filme. Acontece que enquanto eu assistia MY BOY (1921), acreditando se tratar de um curta-metragem, o filme foi se mostrando com uma duração maior que a do filme principal! Aí eu desisti de ver os demais e resolvi fazer logo o meu post sobre o filme de Charles Chaplin, deixando o disco 2 para depois. Comecemos, então, com MY BOY, o principal extra do dvd, e praticamente um remake de O GAROTO. Tem algumas diferenças na estória, mas na essência é muito parecido. Na trama, o menino é um órfão que vai parar nos Estados Unidos e foge da imigração ao descobrir que irá ser mandado de volta. Ele, como um cachorrinho, acompanha um velho capitão decadente e pobre e acaba pedindo para dormir na casa dele por uma noite. E essa noite vai se tornando outras noites e o velho vai cada vez mais se afeiçoando ao pobre menino, que é bastante trabalhador, apesar da idade. A comparação com O GAROTO também se deve ao fato de haver na trama uma avó procurando pela criança, assim como há a mãe em O GAROTO.
O garoto Jackie Coogan fez um sucesso tremendo com O GAROTO e esse filme, dirigido por Albert Austin e Victor Heerman, é um dos frutos desse sucesso. Como os dois diretores não tinham o mesmo talento de Chaplin, fizeram um filme apenas correto, levando mais para o melodrama do que para a comédia, que aparece também mas um pouco capenga. E pensar que de primeiro grande astro mirim de Hollywood, Jackie Coogan, quando adulto, se tornaria famoso como o sinistro e feio Tio Fester Frump da série de tevê A FAMÍLIA ADAMS (1964-1966). Entre os extras do dvd, há um prefácio, que fala das condições e das razões de realização de O GAROTO, que até já comentei por aqui no post específico sobre o filme. Vale destacar também um outro mini-documentário com participação de Abbas Kiarostami, cujo estilo e maneira de trabalhar com as crianças é às vezes comparado a Chaplin.
Chaplin aparece e dirige o curta HOW TO MAKE MOVIES (1918), documentário interessante sobre o modo como se fazia filmes em Hollywood naquela época. Mostra também um pouco da rotina do artista, como receber cartas pela manhã ou jogar golfe. Depois, quando ele coloca o bigodinho e as roupas de Carlitos, o filme passa a se tornar uma mistura de documentário com comédia, especialmente na cena do jogo de golfe. Outro curta de Chaplin presente no dvd é NICE AND FRIENDLY (1922). Talvez o filme mais fraco que eu vi de Chaplin. O garoto Coogan aparece muito rapidamente e Carlitos aparece como uma espécie de herói que salva uma família de uma turma de bandidos. Parece mais uma brincadeira despretenciosa. E vale destacar que todos esses curtas do segundo disco vieram totalmente mudos, isto é, sem nenhuma música de fundo. É um pouco estranho ver filme assim, mas depois a gente se acostuma.
Outros extras contidos: cenas de Jackie Coogan dançando para acalmar os executivos, preocupados com a demora da produção. Assim, Chaplin mostrou o garoto dançando para uma pequena multidão que aplaudiu o garoto. Há também "Charlie on the Ocean", um pequeno e descartável documentário que mostra a diferença entre a maneira pobre como Chaplin chegou na América e quão famoso ele se tornou a ponto de sua limusine mal conseguir atravessar as ruas. Menos importante ainda são os takes de Jackie Coogan em Paris, curtíssima amostra do sucesso de Coogan na França. Um extra interessante é o da gravação em 1971 da música para O GAROTO, que entraria na versão "definitiva" e com cenas a menos do filme. Mas quem quiser conferir as cenas cortadas, tem também nesse mesmo disco. Há um extra que mostra trailers de várias partes do mundo de O GAROTO, galeria de fotos e cartazes e trailers da Coleção Chaplin da Warner, que me deixou com vontade de ver e rever alguns títulos importantes do mestre, presentes nessa excelente coleção da Warner.
quarta-feira, setembro 10, 2008
ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO
Provavelmente o filme mais esperado do ano. Ou dos últimos quarenta anos, por Mojica e pelos fãs de seu trabalho. E quando finalmente estréia, depois de aparições na mídia e capa em revista de cinema pop brasileira, pouca gente vai ver o filme. Na sala onde eu estava, só havia eu e mais dois rapazes. Um deles, coincidentemente, um amigo meu, o Alex. Foi até engraçado, eu entrando na sala quase vazia e o Alex chamando o meu nome. A expectativa - ou a esperança - dos envolvidos com a produção de ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO (2008) era que o filme se tornasse um sucesso comercial, que as novas gerações abraçassem com interesse o retorno de Zé do Caixão. Infelizmente, para ratificar a fama de maldito de Mojica, além da morte no meio das filmagens de Jece Valadão, o filme foi um grande fracasso de bilheteria, apesar de ter produção da Fox, trailers veiculados em filmes de horror e do fato de a geração de hoje curtir filmes de tortura, como JOGOS MORTAIS e O ALBERGUE. Parecia o momento certo para o retorno à telona do homem de unhas enormes e roupa e cartola pretas.
Mas sabe de uma coisa? Que se dane se o filme foi ou não for um sucesso de bilheteria. O importante é que ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO é um prazer para os olhos dos apreciadores do trabalho de José Mojica Marins, especialmente dos dois primeiros filmes de Zé do Caixão – À MEIA-NOITE LEVAREI SUA ALMA (1964) e ESTA NOITE ENCARNAREI NO TEU CADÁVER (1967). Inclusive, só pela inteligência de refazer a seqüência final de ESTA NOITE...o filme já merece aplausos. A seqüência havia sido modificada a mando da censura, que fez com que o cético coveiro, enquanto afundava no pântano com os esqueletos de suas vítimas, tivesse que dizer que acreditava em Deus. Desta vez, com a liberdade de expressão dos dias de hoje, essa seqüência pôde ser refeita, num momento que tanto mostra a cena original de 1967 quanto a refilmada, com o sósia americano de Zé do Caixão interpretando o protagonista em fotografia em preto e branco. Mas o filme não começa exatamente aí. Começa dentro de uma prisão, com os policiais soltando, depois de 30 anos, o assassino Zé do Caixão, que sai às ruas e encara um mundo perdido, com crianças cheirando cola na rua e a violência reinante de uma cidade grande comtemporânea.
Antes disso, difícil não ficar entusiasmado com os créditos iniciais, que se iniciam com o elenco: José Mojica Marins, Jece Valadão, Adriano Stuart, José Celso Martinez Corrêa, Helena Ignez, Milhem Cortaz, Cristina Aché, Débora Muniz. Mário Lima, sempre presente nos filmes de Mojica, também está no filme em papel pequeno, bem como Satã, o famoso guarda-costas de Mojica. E quem não piscar pode ver uma aparição relâmpago de crítico Carlos Primati. A maior parte do elenco principal foi parte importante da história do cinema nacional. Temos desde uma musa do cinema novo (Helena Ignez) a uma musa da boca do lixo e da pornografia (Débora Muniz), as duas fazendo o papel de duas bruxas cegas com a coragem de peitar o Zé do Caixão. Elas cuidam de uma sobrinha que Mojica está de olho. Para ele, a moça tem potencial para ser uma mulher perfeita para gerar o seu filho. Sim, Zé ainda tem como missão de vida gerar o "filho perfeito".
E se antes, Zé tinha um pouco de dificuldade para conseguir arranjar a tal mulher, tendo que raptar um grupo delas para submetê-las ao famoso teste das aranhas e das cobras do segundo filme, desta vez, as mulheres vêm até ele. Uma delas, inclusive, é belíssima (Cleo de Paris), uma cientista que desfruta da mesma linha de pensamento de Zé e que fica muito feliz ao ser raptada por Bruno, o fiel servo de Zé, e ser usada para experimentos pelo maníaco e seu grupo de seguidores. É numa cena com essa bela jovem que o filme apresenta uma das seqüências mais arrepiantes: a do esquartejamento da bunda da moça. Nessa hora, não resta dúvida de que Mojica esteve muito bem assessorado, com profissionais que entendem de verdade de efeitos especiais e de maquiagem, que não ficam nada a dever aos técnicos americanos. Para se ter uma idéia, há uma cena fantástica de uma mulher nua saindo de dentro de um porco de verdade. Não foi à toa que o filme ganhou os principais prêmios técnicos do Festival de Paulínia (fotografia de José Roberto Eliezer, montagem de Paulo Sacramento, direção de arte de Cássio Amarante, trilha sonora de André Abujamra e Marcio Nigro e edição de som de Ricardo Reis). Pra completar, ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO ainda saiu do festival com o prêmio de melhor filme pelo júri oficial e pela crítica.
Tudo bem que o filme não é tão bom quanto os anteriores; não tem o mesmo charme. O próprio Mojica, que dessa vez não mais conta com o excelente dublador dos primeiros filmes, que tornava sua performance muito boa, surge com a sua própria voz e com o mesmo jeitão um tanto engraçado do Zé do Caixão da tevê e do rádio, acostumado a ser visto rogando pragas e começando sempre com o tradicional "você!". Pode-se dizer que o filme acaba um pouco prejudicado pela canastrice de Mojica, que não convence quando está sendo atormentado pelos espíritos dos mortos assassinados por ele no passado. Mas em se tratando de filme de horror, ser canastrão não chega a ser exatamente um problema, é algo que pode ser relevado e até visto como momento de diversão para a platéia. E basta lembrar que alguns dos maiores ícones do cinema de horror do mundo (Bela Lugosi, Lon Chaney, Vincent Price) eram um pouco canastrões mesmo.
Ao final, quando o filme é dedicado à memória de Rogério Sganzerla e Jairo Ferreira, lembramos mais uma vez, depois de quase duas horas de diversão e bom cinema, que ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO representa um tributo ao cinema brasileiro produzido nos anos 60 e 70, as duas décadas mais ricas de nossa cinematografia. E um exemplo da resistência de um homem que revolucionou o cinema e se fundiu à sua própria criação.
terça-feira, setembro 09, 2008
HELLBOY II - O EXÉRCITO DOURADO (Hellboy II: The Golden Army)
Não tem jeito. Quando Guillermo del Toro dirige produções hollywoodianas seu rendimento não é o mesmo do que nas produções latinas. É como se ele fizesse sempre um serviço desleixado, apenas pelo dinheiro, sem amor. Isso pode ser sentido em praticamente todos os seus trabalhos "made in USA". Nota-se que, por mais que esses filmes possuam algumas das marcas presentes desde o seu longa-metragem de estréia – CRONOS (1993) -, eles não proporcionam o mesmo prazer e interesse. Talvez o melhor de seus trabalhos em Hollywood ainda seja MUTAÇÃO (1997), cujas qualidades eu só pude ver melhor através de uma revisão de trechos do filme numa exibição pela tevê. E é uma pena que um diretor que conta com uma obra-prima como O LABIRINTO DO FAUNO (2006) no currículo se sujeite a essas produções chatas e barulhentas que, por mais que tenham, vez ou outra, sua marca autoral, acabam entrando no mesmo saco dos blockbusters medianos. E infelizmente isso se repete em HELLBOY II – O EXÉRCITO DOURADO (2008), segundo filme da franquia baseada nos personagens criados por Mike Mignola.
E o pior é que o cineasta está com a agenda cada vez mais atolada em Hollywood, tendo inclusive, entre esses próximos filmes, o esperado O HOBBIT, sob supervisão de Peter Jackson. E para ser sincero, eu duvido muito que O HOBBIT sequer consiga chegar perto da excelência da trilogia dos anéis de Jackson, por mais que o neozelandês também esteja envolvido no projeto. Del Toro precisa mesmo é se afastar dos castradores executivos americanos e voltar a fazer filmes na Espanha ou no México, onde poderá misturar com toda a liberdade que merece a fantasia com a violência e o horror.
Em HELLBOY II, o protagonista (Ron Pearlman) se mostra cada vez mais um bebezão num corpo de demônio. E para enfatizar isso, o filme ainda mostra um flashback da infância de Hellboy – acredite, ele era ainda mais feio quando criança -, que adorava não apenas ver televisão, mas também ficava encantado com as fábulas narradas pelo seu "pai adotivo" (John Hurt), entre elas, a que aparece como subtítulo do filme: a lenda do Exército Dourado, que também servirá de eixo para a trama principal, que começa com o surgimento do Príncipe Nuada, o grande vilão do filme, que pretende destituir o poder dos mortais no mundo, chegando ao ponto de disputar a coroa com o seu próprio pai, o rei de sua raça.
Dessa forma, HELLBOY II acaba se tornando ainda mais fantasioso que o primeiro filme, que dava mais destaque às aventuras secretas do bizarro agente do FBI de cor vermelha, com rabo e chifres. Apesar de ser um demônio, Hellboy é um cara de bom coração, apaixonado por Liz (Selma Blair) e que mantém uma boa convivência com o seu outro amigo estranho, Abe (Doug Jones). Para aumentar a "festa estranha com gente esquisita" entra em cena Johan Krauss, uma criatura feita de gás (ou ectoplasma, para usar a linguagem do filme) e cujo corpo gasoso é contido através de roupas especiais. Ele é chamado para a equipe como uma espécie de interventor, para fazer com que Hellboy seja um pouquinho mais discreto. Sua última missão, em matéria de discrição, foi um fracasso. Além do mais, Hellboy já havia ficado famoso, tendo suas imagens já disseminadas pela internet, principalmente através do youtube.
As criaturas apresentadas guardam similaridades com as mostradas em O LABIRINTO DO FAUNO e são o que há de mais interessante no filme, bem como as aparições de cenas de clássicos da Universal, como A NOIVA DE FRANKENSTEIN e O LOBISOMEM, o que demonstra o carinho de del Toro pelos monstros. Pena que isso não chegue a ser suficiente para evitar que HELLBOY II se torne, no fim das contas, uma aventura aborrecida e barulhenta, com piadas sem graça e dois casos de romances (tanto da parte de Hellboy quanto de Abe) que não chega a enternecer ou mesmo a parecer engraçado, se era essa a intenção de del Toro.
P.S.: Antes que eu me esqueça novamente, tem edição nova da Revista Zingu!, com mais uma parte da matéria sobre as musas do Boca do Lixo. Na coluna "Clássicos de Prestígio", Gabriel Carneiro escreve sobre o meu Cukor favorito: A DAMA DAS CAMÉLIAS.
segunda-feira, setembro 08, 2008
II FOR RAINBOW
Não tinha muito interesse em ir para esse II For Rainbow, festival da diversidade sexual, que acontece em Fortaleza entre os dias 05 a 09 de setembro de 2008. Talvez por achar que os curtas não seriam suficientemente bons ou por saber que seriam exibidos na "sauna" do São Luiz, conforme muito bem relatou Sergio Alpendre para o Cineclick. Aproveitando a deixa: meu Deus, quando é que alguém vai criar vergonha na cara e mandar colocar um sistema de ar condicionado que preste naquela sala monumental? Eu me refiro às autoridades competentes do Estado e da Prefeitura, que permanecem de braços cruzados enquanto a cada festival que acontece lá é sempre o mesmo problema, sempre as mesmas reclamações, sempre a mesma repercussão negativa. O Cine São Luiz hoje é mais famoso por ser quente feito o inferno e pelo som ruim do que por ser bonito e majestoso. Se eu fosse rico, se tivesse muito dinheiro, eu mesmo mandaria consertar.
Mas deixando de lado a minha indignação, o que motivou a minha ida para o evento foi poder encontrar o amigo Sergio Alpendre (Revista Paisà, Cineclick), que só conhecia através da internet - do mundo dos blogs e listas de discussão. Conheci também a Lila Foster (Paisà, Cinética) e o Gabriel Martins (Filmes Polvo). Todos gente fina. No final da sessão dos curtas, houve o reencontro-surpresa com o Marcus Mello, editor da revista Teorema, que eu havia conhecido através do Carlão Reichenbach, numa das edições do Cine Ceará. Mas a maior surpresa da noite foi mesmo ter conhecido e trocado algumas palavras com um dos cineastas brasileiros que eu mais admiro: Guilherme de Almeida Prado, que estava muito bem acompanhado, ao lado de uma de suas atrizes, Maira Chasseroux, do seu novo longa - ONDE ANDARÁ DULCE VEIGA? -, que havia sido exibido na noite de sexta-feira, como filme de abertura do festival. E para provar que o mundo é pequeno, conversando com a Maira, ela me conta que é cunhada do Dennison Ramalho (!) e eu, surpreso, imediatamente falei pra ela que tinha visto há poucas horas ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO, filme no qual Ramalho é diretor assistente. Esse mundo do cinema é mesmo muito pequeno. Outra celebridade que estava presente era a musa Lúcia Veríssimo, sentada logo atrás de mim nos dois dias que fui. Ela continua linda e é uma das juradas da mostra competitiva. Eu cheguei a ouvi-la falar entusiasmada: "olha eu aí!", quando ela apareceu num trecho do delicioso AS FERAS, do saudoso e genial Walter Hugo Khouri, exibido num dos documentários do festival.
No domingo, o Sérgio desistiu da sessão e assisti os filmes em companhia da Lila e do Gabriel. Da turma de Fortaleza, quem também estava presente na sessão de sábado era o Alex, o organizador da sessão Filmes Malditos da Meia-Noite. Ele apareceu no domingo junto com a Carol, embora tenham desaparecido misteriosamente, assim que terminou a sessão. Outro nome famoso no meio cinéfilo-jornalístico que eu conheci só no domingo foi o Fernando Secco, da Revista Moviola. Falemos um pouquinho e de maneira bem rasteira de cada um dos curtas vistos nos dois dias que pude ir ao festival. E quem quiser ir direto conferir as fotos que tirei no sábado, é só dar uma clicada no link que coloquei abaixo do post.
Sábado
CINEMA EM 7 CORES
Ótimo curta. Já me conquistou no começo com uma das mais belas canções de Roberto Carlos ("Ninguém vai tirar você de mim"). Foi o mais longo da noite (35 minutos), mas como bem falou Sergio Alpendre, poderia ter-se transformado num longa de tão bom e agradável que é. CINEMA EM 7 CORES (RJ, 2008), de Rafaela Dias, conta com depoimentos de Jean Willis (ex-BBB), Carlos Mossy, Luiz Carlos Lacerda (que estava presente na sessão), Karim Aïnouz, Sandra Werneck, Andrea Ormond (do ótimo blog sobre cinema brasileiro Estranho Encontro), Monique Lafond, entre outros. O barato do filme é que no meio desses pequenos depoimentos há cenas de filmes importantes da cinematografia nacional que abordaram o tema da homossexualidade como GISELLE, de Mossy; A RAINHA DIABA, de Antonio Carlos da Fontoura; MATOU A FAMÍLIA E FOI AO CINEMA, de Julio Bressane; PIXOTE, A LEI DO MAIS FRACO, de Hector Babenco; MADAME SATÃ, de Aïnouz; AMORES POSSÍVEIS e CAZUZA, de Sandra Werneck; NAVALHA NA CARNE, de Braz Chadiak; BEIJO NO ASFALTO, de Bruno Barreto; entre outros. Legal foi o grito de alegria da platéia no momento em que, numa cena de A PARTILHA, de Daniel Filho, a persnagem de Paloma Duarte confessa ser "sapatão", que gosta de "botar aranha pra brigar".
CAFÉ COM LEITE
Belo filme (foto acima) sobre a relação de dois irmãos que sofrem com a morte de um dos pais e passam a se virar sozinhos. O irmão mais velho é homossexual e mantém uma relação harmoniosa com outro rapaz, que de vez em quando dorme lá na casa dele. Já o seu irmão pequeno tenta se ajustar e acha a situação do irmão até normal. O final é muito bonito e chega a emocionar. CAFÉ COM LEITE (SP, 2007) aborda o tema do amor entre dois homens de uma maneira natural, sem causar choque ou soar panfletário. Direção: Daniel Ribeiro.
DESEJOS IGUAIS
Tirando a bela canção em francês, cujo título infelizmente eu não anotei, DESEJOS IGUAIS (CE, 2007) não diz muito. É uma espécie de pequeno videoclipe mostrando duas mulheres em momentos de amor e carinho. Pelo menos o vídeo é curtinho. Parece que tem a duração da canção. Direção: Cecília Góis e Gaby Lima.
ENTRE CORES E NAVALHAS
Filme um pouco bobo sobre um cabeleireiro e uma cobradora de ônibus que se envolvem afetivamente, numa relação diferente. Como ele é mestre em transformar as pessoas em seu salão, resolve no final transformar a si mesmo. ENTRE CORES E NAVALHAS (DF, 2007) é um curta quase esquecível. Tanto que custei a me lembrar dele, inclusive, na hora de escrever. A edição é de José Eduarte Belmonte, de A CONCEPÇÃO. Direção: Catarina Acioly e Iberê Lima.
SEXUALIDADE E CRIMES DE ÓDIO
Trata-se de um trabalho um pouco pesado que funciona mais como um grito de intolerância do que como um trabalho artístico. O filme poderia ser até uma matéria de um programa jornalístico de televisão, por exemplo, que não faria diferença. Ainda assim, SEXUALIDADE E CRIMES DE ÓDIO (RJ, 2008) é um trabalho justo e louvável, pois denuncia o assassinato brutal que vem ocorrendo com uma freqüência cada vez maior no Brasil a gays, lésbicas e transexuais. Os travestis que ficam na rua tentando ganhar o seu sustento, já que não conseguem outra forma de sobrevivência por terem "optado" por esse tipo de vida, são os mais visados pelos assassinos. Falei "optado" entre aspas pois acredito que a homossexualidade não é bem uma questão de opção, mas de natureza mesmo. Direção: Vagner de Almeida.
O ALMOÇO (CONSIDERE UM JANTAR)
Interessante e criativo filme mudo que pede o tempo inteiro a participação do espectador para considerar não apenas os escassos recursos para a realização do trabalho, como também para imaginar uma coisa mostrada na tela como outra descrita nos intertítulos. O ALMOÇO (CONSIDERE UM JANTAR) (SP, 2007) é divertido e arrancou algumas risadas da platéia. Direção: Thiago Ricarte.
HOMENS
Encerra a noitada de curtas de sábado HOMENS (ES, 2008), documentário sobre homossexuais nordestinos, de cidades do interior, que contam, diante das câmeras, um pouco de suas vidas sofridas e das dificuldades que tiveram para assumir a sua orientação sexual diante da sociedade. Um dos depoimentos mais interessantes é de um deles que conta com um senso de humor fora de série, dizendo que ficou "viúva" quando seu amante morreu eletrocutado. O filme parece ter bebido muito da fonte de Eduardo Coutinho. Direção: Lucia Claus e Bertrand Lira.
Domingo
AMANDA E MONICK
Talvez o melhor da noite, embora não o que tenha sido o mais comentado. Mostra a rotina de dois travestis, um de Pernambuco, outro da Paraíba. Um deles faz programa; outro é professor de escola do município. O ponto alto de AMANDA E MONICK (PB, 2008) é o depoimento do pai do travesti-professor, mostrando o grau de amor e falta de preconceito que esse pai tem com o filho. Deve ter emocionado a muitos. Direção: André da Costa Pinto.
BAR A.K.A.
Aqui começa a série de curtas ruins que quase nos fizeram sair da sala, auxiliados pelo calor cada vez mais infernal do Cine São Luiz. Esse BAR A.K.A., (RJ, 2008) por mais que tenha algo de Fellini em sua estranheza, não parece dizer nada ao mostrar um clube onde pessoas das mais diversas preferências sexuais, incluindo aí o sadomasoquismo, desfrutam de seus desejos. Direção: Túlio Bambino
DIZERES ÍNTIMOS
Duas mulheres que mantiveram um relacionamento no passado se reencontram, depois de suas vidas mudadas. Faltou a DIZERES ÍNTIMOS (SP, 2008) uma maior sensibilidade no tratamento da relação das duas amigas para que o final tivesse o mínimo impacto. Um trabalho claramente "verde". Direção: Bruno Peres e Carolina Barres.
QUEM É VOCÊ NA NOITE?
Mais um documentário bem esquemático com as tradicionais entrevistas a homossexuais ou especialistas no tema. A principal questão é "o que é ser gay?", existe uma identidade para o homossexual? Se não fosse o calor intenso e crescente da sala, até que eu não acharia QUEM É VOCÊ NA NOITE? (SP,2008) tão chato e longo. Direção: Marcelo Ramos.
PARA MACEDÔNIO
Mais uma boba produção local, PARA MACEDÔNIO (CE, 2008) fala de suicídio e, no fim, depois de enrolar muito, não diz a que veio. Direção: Claudemyr Barata.
BÁRBARA
Filmes produzidos originalmente em película são os mais prejudicados pelo sistema de som do Cine São Luiz. É o caso de BÁRBARA (MG, 2006), ficção sobre um travesti que visita o seu pai doente no hospital. Ouvi elogios do filme ao final da sessão, mas àquela altura, eu já estava contando as horas para ir embora e fiquei bem disperso. Direção: Carlos Antônio da Silva Gradim.
FILTHY
Eis o filme que balançou a noite. Depois de tantos curtas esquemáticos e normais na estrutura, FILTHY (RS, 2007) veio para balançar as estruturas do Cine São Luiz, com cenas de duas meninas fazendo sexo e brincando com um ursinho. A dúvida enquanto durava o filme – que me lembrou WE FUCK ALONE, de Gaspar Noé, só que sem a perturbadora luz estroboscópica, o que já é um ponto positivo – é saber até que ponto o filme iria em suas ousadias. E eu saí de lá espalhando a notícia de que a menina do filme sortearia o ursinho na manhã do dia seguinte, com a imprensa. :) Direção: "Queer Fiction".
Link para as fotos (clique para vê-las maiores)
quinta-feira, setembro 04, 2008
O GAROTO (The Kid)
Tive a oportunidade de ver O GAROTO (1921), de Charles Chaplin, durante o último final de semana, mas minha intenção em rever o filme era passá-lo para os alunos da escola onde ensino. Durante uma das aulas de compreensão do texto, Chaplin e seu famoso personagem, o vagabundo Carlitos, foi tema e eu fiquei um pouco incomodado com o fato de nenhum dos alunos ter visto sequer um filme de Chaplin ou mesmo ter tido qualquer experiência com o cinema mudo. Assim, como LUZES DA CIDADE (1931) era um filme um pouco longo para o tempo de aula, escolhi O GAROTO pela duração (apenas 50 minutos), que seria perfeita para a exibição para os meninos. O que eu não esperava é que a experiência de ver o filme junto com a turma fosse tão bem sucedida e divertida para eles. Senti-me muito bem com isso e essa terceira vez que vi o filme foi a melhor de todas, tendo até me emocionado mais e rido mais do que vendo sozinho. Quando assisti sozinho em casa, achei o filme muito melancólico, mas a turma, bem alto-astral, fez com que eu visse O GAROTO com outros olhos, valorizando-o ainda mais. Inclusive a seqüência do sonho, que havia achado um pouco dissonante com o tom geral do filme, eu gostei mais nessa revisão, já que entra em sintonia com o surrealismo em vigor na Europa. Foi uma alegria rever o filme com os alunos, que riram e se divertiram, vendo pela primeira vez um filme mudo. E é bom que tenha sido do Chaplin, um cineasta tão popular e acessível para as grandes audiências, ao mesmo tempo em que, hoje, sua genialidade seja praticamente uma unanimidade entre a crítica.
A trama de O GAROTO é extremamente simples: uma jovem mãe, sem condições de cuidar do filho, deixa a criança no banco traseiro de um carro de luxo, acreditando que a família dona do carro, cuidará melhor do bebê. No entanto, dois ladrões roubam o carro e, ao verem o choro da criança, tratam de escondê-lo no chão, num beco. Carlitos, passando pelo beco, ouve o choro e acaba adotando, ainda que com muita resistência, o garoto. Naturalmente, como acontece com o relacionamento entre pais e filhos, a tendência é aumentar o vínculo afetivo, e apesar de não ter muitas condições de cuidar da criança, ele faz o que pode e o filme salta cinco anos, quando os dois já formam uma dupla de trapaceiros: o garoto quebra janelas e ele dá uma de consertador de janelas de vidro que passa "por acaso" na rua. Assim, eles vão conseguindo o suficiente para mantê-los alimentados e dentro de uma casinha pobre. Enquanto isso, a mãe do garoto, agora uma cantora rica e bem sucedida, encontra-se em busca da criança.
Um dos momentos mais belos do filme é quando ela encontra-o por acaso, sem reconhecê-lo, na porta da casa onde o garoto mora. O sorriso no rosto do garoto é encantador e totalmente natural, diferente da interpretação dos adultos, que na época do cinema mudo era naturalmente exagerada. Dizem que durante as gravações, que durou muito tempo para a época - cerca de um ano, com muita pressão dos produtores - Chaplin tratou o garoto (Jackie Coogan) como seu próprio filho, talvez porque um filho seu houvesse morrido pouco antes das filmagens. Foi durante as filmagens de O GAROTO que Chaplin conheceria a sua segunda esposa, a adolescente que aparece no filme na cena do sonho, vestida de anjo.
O fato de ter demorado um ano, coisa que não era nada comum na época, foi usado como marketing para o lançamento do filme, que se tornou um de seus maiores sucessos e o filme que mudou o rumo da carreira de Chaplin, que passou a fazer projetos cada vez mais ambiciosos e ousados. O GAROTO foi o primeiro filme a combinar com sucesso o drama e a comédia e a metragem atual é um pouco menor do que a original. Ela foi modificada pelo próprio Chaplin em 1971, quando também compôs a bela trilha sonora, que se tornaria definitiva.
terça-feira, setembro 02, 2008
TROVÃO TROPICAL (Tropic Thunder)
Ben Stiller é considerado um dos grandes comediantes da atualidade. Nada mais justo. O que pouca gente sabe é que Stiller também tem uma experiência na direção que - apesar de curta e irregular - tem o seu valor. Curiosamente, antes de investir na direção de comédias, Stiller fez o que talvez seja o seu melhor trabalho, o drama CAINDO NA REAL (1994), com os jovens Ethan Hawke e Winona Ryder, um trabalho que refletia sobre a chamada "Geração X", tema tão em voga na década de 90 e que nada tem a ver com o estilo de fazer comédia que marcaria o trabalho do astro. Seus trabalhos seguintes como diretor foram as pouco engraçadas comédias O PENTELHO (1996) e ZOOLANDER (2001). Mas é com TROVÃO TROPICAL (2008) que Stiller tem alcançado o auge da popularidade na função de diretor, já que o filme tem alçado altos números de bilheteria nos Estados Unidos. E olha que o filme recebeu uma classificação "Rated R" pela linguagem chula e desavergonhada.
A estória gira em torno de um grupo de atores que está participando das filmagens de um drama de guerra estilo PLATOON (a cena de Stiller caindo em câmera lenta, depois de uma saraivada de balas é uma clara brincadeira em cima do filme de Oliver Stone). Ao perceber que o diretor do filme não está conseguindo dar conta do time de astros que comanda, o produtor (vivido por um irreconhecível Tom Cruise), dá um ultimato ao pobre cineasta, que é encorajado pelo escritor louco vivido por Nick Nolte a embrenhar os mimados astros (Stiller, o junkie Jack Black, um enegrecido cirurgicamente Robert Downey Jr. e o rapper Brandon T. Jackson) numa selva de verdade, instalando câmeras escondidas em locais estratégicos da selva a fim de capturar momentos em que os astros estejam sentindo medo de verdade. Acontece que eles acabam parando num verdadeiro território habitado por violentos traficantes de heroína e a confusão está feita.
Pena que nem sempre Stiller consiga atingir um timing cômico que garanta as gargalhadas da platéia, até porque o tipo de humor que ele usa é muitas vezes um humor negro e há muitas cenas envolvendo vísceras e sangue aos borbotões, que podem ou não ser engraçadas. A curiosidade de ver uma comédia tão "suja" estrelada por tantos astros conhecidos, além da oportunidade de ver Downey Jr. e Cruise com maquiagens pesada, são atrativos, embora se saiba que por mais que o luxo de se ter astros desse porte não sirva muito se o filme não fizer a platéia rir. Assim, o problema está no fato de que o filme se trata de uma comédia muito estranha. TROVÃO TROPICAL é como um corpo estranho em Hollywood. Não que já não tenhamos visto barbaridades nas comédias dos irmãos Wayans ou dos irmãos Farrellys, mas isso não me preparou para o que iria ver. Há quem diga que TROVÃO TROPICAL é a melhor comédia do ano, mas não há muitos concorrentes no gênero e acho que ainda prefiro a leveza de AGENTE 86.
P.S.: Ontem estreou nos Estados Unidos a quarta temporada de PRISON BREAK. Mal posso esperar para chegar em casa e conferir o primeiro episódio que deixei baixando ao sair de casa. Outras séries do meu interesse que retornarão com novas temporadas nesse mês de setembro: ENTOURAGE (dia 9), THE OFFICE (dia 25) e DEXTER (dia 28).
segunda-feira, setembro 01, 2008
BEZERRA DE MENEZES - O DIÁRIO DE UM ESPÍRITO
O Brasil é o país com a maior concentração de kardecistas do mundo. Logo, BEZERRA DE MENEZES - O DIÁRIO DE UM ESPÍRITO (2008) tem potencial para ser um filme bem sucedido comercialmente, especialmente dentro da comunidade espírita e entre os milhares de simpatizantes da doutrina de Allan Kardec. Tanto é que eu assisti o filme num domingo às duas da tarde, horário geralmente vazio, num shopping curiosamente localizado na Av. Bezerra de Menezes, e a sala estava praticamente cheia.
Bezerra de Menezes é considerado por muitos o Allan Kardec brasileiro, pois foi em fins do século XIX que ele, só depois dos 50 anos de idade, abraçou a causa espírita, após ter lido "O Livro dos Espíritos". Ele que, como médico, já era uma pessoa extremamente caridosa, tornou-se ainda mais depois do esforço de propagar o Espiritismo pelo Brasil. No filme de Glauber Filho e Joe Pimentel, o exemplo maior de convicção e poder de argumentação de Bezerra é mostrado na cena em que ele é convidado a participar de um debate com um grupo de racionalistas.
No papel do "médico dos pobres" está Carlos Vereza, também espírita, e que ficou bastante feliz com o papel. Dizem até que, durante as filmagens, um médium chegou a ver o espírito de Bezerra de Menezes ao seu lado. O filme, no entanto, sofre de uma irregularidade de ritmo (embora às vezes lembre uma obra de Manoel de Oliveira), da falta de mais fatos interessantes na vida de Bezerra - especialmente de sua mocidade -, e de parecer um filme estritamente religioso e engajado, como se fosse feito mais para agradar os espíritas e não tivesse um comprometimento mais artístico. A título de comparação com outro filme religioso, LUTERO, por exemplo, era um filme que também se podia ver dentro desse nicho, porém, sua narrativa era bem mais rica historicamente.
Nos seus poucos 75 minutos de duração, BEZERRA DE MENEZES – O DIÁRIO DE UM ESPÍRITO, parece ter pouco a mostrar. No que se refere aos fenômenos sobrenaturais, há pouca coisa mostrada, com exceção da cena do rapaz pagando adiantado para que o jovem Adolfo Bezerra de Menezes, carente de dinheiro para bancar os seus estudos e sua alimentação, lhe dê aulas de Matemática. Porém, não deixa de ser interessante notar o quanto o filme descarta da vida cotidiana do médico coisas importantes como seus namoros, casamentos ou a dificuldade de se adaptar no Rio de Janeiro, coisa que seria normalmente mostrada numa cinebiografia mais convencional. Assim, o fime prefere dar espaço para que o que os realizadores consideram mais importante: a doutrina espírita e o caráter elevado e caridoso do médico, com direito a uma seqüência puramente documental durante os créditos finais.