quinta-feira, setembro 04, 2008
O GAROTO (The Kid)
Tive a oportunidade de ver O GAROTO (1921), de Charles Chaplin, durante o último final de semana, mas minha intenção em rever o filme era passá-lo para os alunos da escola onde ensino. Durante uma das aulas de compreensão do texto, Chaplin e seu famoso personagem, o vagabundo Carlitos, foi tema e eu fiquei um pouco incomodado com o fato de nenhum dos alunos ter visto sequer um filme de Chaplin ou mesmo ter tido qualquer experiência com o cinema mudo. Assim, como LUZES DA CIDADE (1931) era um filme um pouco longo para o tempo de aula, escolhi O GAROTO pela duração (apenas 50 minutos), que seria perfeita para a exibição para os meninos. O que eu não esperava é que a experiência de ver o filme junto com a turma fosse tão bem sucedida e divertida para eles. Senti-me muito bem com isso e essa terceira vez que vi o filme foi a melhor de todas, tendo até me emocionado mais e rido mais do que vendo sozinho. Quando assisti sozinho em casa, achei o filme muito melancólico, mas a turma, bem alto-astral, fez com que eu visse O GAROTO com outros olhos, valorizando-o ainda mais. Inclusive a seqüência do sonho, que havia achado um pouco dissonante com o tom geral do filme, eu gostei mais nessa revisão, já que entra em sintonia com o surrealismo em vigor na Europa. Foi uma alegria rever o filme com os alunos, que riram e se divertiram, vendo pela primeira vez um filme mudo. E é bom que tenha sido do Chaplin, um cineasta tão popular e acessível para as grandes audiências, ao mesmo tempo em que, hoje, sua genialidade seja praticamente uma unanimidade entre a crítica.
A trama de O GAROTO é extremamente simples: uma jovem mãe, sem condições de cuidar do filho, deixa a criança no banco traseiro de um carro de luxo, acreditando que a família dona do carro, cuidará melhor do bebê. No entanto, dois ladrões roubam o carro e, ao verem o choro da criança, tratam de escondê-lo no chão, num beco. Carlitos, passando pelo beco, ouve o choro e acaba adotando, ainda que com muita resistência, o garoto. Naturalmente, como acontece com o relacionamento entre pais e filhos, a tendência é aumentar o vínculo afetivo, e apesar de não ter muitas condições de cuidar da criança, ele faz o que pode e o filme salta cinco anos, quando os dois já formam uma dupla de trapaceiros: o garoto quebra janelas e ele dá uma de consertador de janelas de vidro que passa "por acaso" na rua. Assim, eles vão conseguindo o suficiente para mantê-los alimentados e dentro de uma casinha pobre. Enquanto isso, a mãe do garoto, agora uma cantora rica e bem sucedida, encontra-se em busca da criança.
Um dos momentos mais belos do filme é quando ela encontra-o por acaso, sem reconhecê-lo, na porta da casa onde o garoto mora. O sorriso no rosto do garoto é encantador e totalmente natural, diferente da interpretação dos adultos, que na época do cinema mudo era naturalmente exagerada. Dizem que durante as gravações, que durou muito tempo para a época - cerca de um ano, com muita pressão dos produtores - Chaplin tratou o garoto (Jackie Coogan) como seu próprio filho, talvez porque um filho seu houvesse morrido pouco antes das filmagens. Foi durante as filmagens de O GAROTO que Chaplin conheceria a sua segunda esposa, a adolescente que aparece no filme na cena do sonho, vestida de anjo.
O fato de ter demorado um ano, coisa que não era nada comum na época, foi usado como marketing para o lançamento do filme, que se tornou um de seus maiores sucessos e o filme que mudou o rumo da carreira de Chaplin, que passou a fazer projetos cada vez mais ambiciosos e ousados. O GAROTO foi o primeiro filme a combinar com sucesso o drama e a comédia e a metragem atual é um pouco menor do que a original. Ela foi modificada pelo próprio Chaplin em 1971, quando também compôs a bela trilha sonora, que se tornaria definitiva.
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