domingo, setembro 28, 2008

O TUBARÃO (Tiger Shark)



Howard Hawks não é muito conhecido por ser um diretor de filmes de gângster, até por não ter feito muitos trabalhos nesse sentido, mas além de ter realizado o bem sucedido SCARFACE - A VERGONHA DE UMA NAÇÃO (1932), filme importante para o gênero, Hawks ainda teve a sorte de trabalhar, na mesma época, com dois ícones dos filmes de gângster, os gigantes James Cagney, em DELIRANTE (1932), e Edward G. Robinson, neste belo trabalho sobre homens trabalhando com pesca e ameaçados por tubarões, entitulado no Brasil O TUBARÃO (1932). Ao contrário do que muitos podem pensar, o filme não tem nada a ver com o TUBARÃO campeão de bilheteria de Steven Spielberg ou o TUBARÃO picotado de Samuel Fuller. Se bem que eu não vi ainda o filme do Fuller, mas imagino que a trama deva se distanciar bastante dessa obra puramente hawksiana. Vemos aqui, como em vários de seus dramas, homens trabalhando num negócio perigoso. Nos filmes de Hawks, a ameaça pode vir através de desastres automobilísticos, de um ataque de índios, de uma má visibilidade num vôo ou pela grande possibilidade de morrer numa guerra. E falando em morrer na guerra, lembremos que TUBARÃO também antecipa o tema do triângulo amoroso presente em O CAMINHO DA GLÓRIA (1936). Em O TUBARÃO, o triângulo amoroso ameaça a velha amizade de dois homens.

O filme começa com três homens num barco cercado por tubarões. Eles estão prestes a morrer de sede e inanição ou a virar comida de tubarão. O personagem de Edward G. Robinson já mostra nos primeiros minutos suas duas facetas: a do sujeito leal a um amigo que está morrendo de sede e a de um sujeito extremamente cruel ao jogar o terceiro homem que o ameaça para os tubarões sem o menor sentimento de culpa. Ao avistarem um navio que os salvará, ele relaxa e deixa uma de suas mãos na água, pronta para ser devorada por um tubarão. Passados alguns meses, com um gancho no lugar da mão, ele continua chefiando uma trupe de pescadores. As cenas dos peixes sendo pescados aos montes e a do tubarão sendo recebido a golpes de paus pelos homens são reais. Hawks, antes de começar a filmar, preparou-se para deixar o filme - pelo menos no aspecto da profissão dos pescadores - o mais realista possível. Por isso, essas seqüências são quase documentais e foram filmadas por seu assistente, Dick Rosson. Hoje em dia, com a Sociedade Protetora dos Animais de olho, tais cenas provavelmente seriam proibidas.

Edward G. Robinson, conforme o gosto de Hawks, deixa de ser um sujeito lento e passa a se mostrar rápido na fala e vigoroso nos atos. Ele é um português de nome Mike Mascarenhas que tem alguns portugueses na sua tripulação também, como o senhor Manuel Silva. (Inclusive, é possível ouvir e entender algumas falas em português, que não são traduzidas e nem colocadas nas legendas que vêm com o arquivo.) Com a morte de Manuel, que teve suas pernas comidas pelos tubarões, Mascarenhas aparece para contar a triste notícia para a filha única do seu Manuel, Quita (Zita Johann, a jovem de olhos de ressaca que apareceria em A MÚMIA, de Karl Freund). Como ela estava sozinha e sem ninguém, aceita o convite de casamento do "capitão gancho", que já vinha sempre a visitando e cuidando dela, trazendo dinheiro ou comida. O problema acontece quando ela conhece e se apaixona pelo amigo de Mascarenhas, Pipes (Richard Arlen), um sujeito bem mais jovem e boa pinta que o pobre Mike, que muitas vezes tinha que mentir para esconder o fato de que era solitário, para não parecer um pobre coitado aos olhos de sua tripulação. E Edward G. Robinson passa muito bem para as telas tanto o lado terno e sensível do personagem, apaixonado por uma mulher que em outras circunstâncias jamais se casaria, e o seu lado sombrio, que é um pouco mais suavizado no filme e só mostrado novamente lá pelo final. O TUBARÃO, apesar do final, arranjado para agradar a todos, não deixa de ser um filme ousado em muitos aspectos, principalmente ao mostrar a mulher adúltera com bons olhos, graças, principalmente, à compreensão e à cumplicidade da platéia.

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