quinta-feira, dezembro 27, 2007

NASCE UMA ESTRELA (A Star Is Born)



Sei que eu meio que prometi escrever primeiro sobre A DAMA DAS CAMÉLIAS (1936), mas tive de dar um salto temporal na filmografia de George Cukor pois, ao tentar copiar o dvd de NASCE UMA ESTRELA (1954), vi que o filme perderia metade da qualidade da imagem e do som, se compactado para um dvd de 4,7 Gb. O dvd da Warner é de dupla camada, em widescreen (o primeiro ano do cinemascope) e excelente qualidade de som e imagem. Logo, a gravação ia sair uma porcaria. Desse modo, tive que ver NASCE UMA ESTRELA antes dos outros, mesmo estando com uma certa má vontade, já que não sou exatamente um entusiasta desses musicais clássicos americanos, cheios de sapateado. Além do mais, a versão lançada em dvd é a estendida, com três horas de duração. Porém, heroicamente, respirei fundo e topei encarar o desafio.

NASCE UMA ESTRELA é um remake luxuoso da primeira versão de 1937, dirigida por William A. Wellman. Houve ainda uma terceira versão em 1976, da era hippie, estrelada por Barbra Streisand. A versão de George Cukor representou também uma tentativa de trazer de volta ao estrelato Judy Garland, a mulher de olhos estranhos mais conhecida pelo papel de Dorothy em O MÁGICO DE OZ (1939). Ela tinha 17 anos quando estrelou O MÁGICO DE OZ e o filme foi ao mesmo tempo uma bênção e uma maldição, já que ela assinou um contrato com os executivos da MGM para não engordar e não perder a voz. Assim, ela começou a tomar remédios para emagrecer e, com o tempo, foi se tornando viciada em drogas e álcool. Sem falar nas tentativas de suicídio. Com tantos problemas, ela acabou sendo demitida da MGM e passou uns tempos na Inglaterra, dedicando-se mais à música que aos filmes. Na época de NASCE UMA ESTRELA, ela era casada com Vincent Minnelli, que fez alguns dos melhores musicais da Era de Ouro de Hollywood. Foi da união dos dois que nasceu Liza Minelli.

O filme é quase autobiográfico, tendo muito do que ela passou, através de sua personagem e do personagem de James Mason, que no filme faz o papel de um ator alcóolatra e demitido da companhia pelo abuso com a bebida e pelo fracasso de seus filmes. Ele se casa com a jovem que ele "descobriu" - interpretada por Garland - e enquanto ela vai cada vez mais se tornando uma estrela adorada pelas multidões, ele vai descendo ao fundo do poço. O filme teria tudo para me agradar, mas o problema é essa minha implicância (ou falta de interesse mesmo) com esse tipo de musical, que acabou atrapalhando a minha apreciação. Achei muito chatas as seqüências cantadas. (Talvez se Garland fosse bonita como a Grace Kelly ou tivesse pernas maravilhosas como a Cyd Charisse eu me interessaria mais.) George Cukor afirma que Garland só não ganhou o Oscar no ano seguinte - perdeu para a princesa Grace Kelly - porque os produtores cortaram quarenta minutos de seu filme. Nem tudo pôde ser recuperado nessa restauração, mas achei interessante as passagens que mostram apenas fotos estáticas ou com zoom, substituindo os trechos perdidos, com diálogos recuperados.

Trata-se de um dos mais importantes musicais da época e a sua fotografia em technicolor em sua abundância de cores vivas ajudou a tornar o filme um ícone gay. Talvez porque a própria Judy Garland já fosse um ícone gay desde O MÁGICO DE OZ. Curiosamente, no dia de seu funeral, cinco dias depois da morte da atriz e cantora, em 22 de junho de 1969, foi o dia de um dos acontecimentos mais importantes da comunidade GLS, o famoso incidente de Stonewall. Esse era o nome de um bar nova-iorquino freqüentado por gays e travestis que, nesse dia, enfrentaram a polícia, que costumava prender principalmente os travestis. E naquela noite, com os ânimos acirrados e a dor pela morte de Garland, os gays resolveram resistir e não arredar o pé do lugar. Esse incidente foi homenageado no primeiro álbum solo do Renato Russo.

quarta-feira, dezembro 26, 2007

O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA (Love in the Time of Cholera)



Li no ano passado o romance homônimo de Gabriel Garcia Marquez, mas o livro não me agradou tanto quanto a obra-prima "Cem Anos de Solidão". Achei a estória de amor de Florentino Ariza e Fermina Daza muito arrastada, mas com um potencial muito bom para uma adaptação cinematográfica. Pena que escolheram um diretor tão frio e impessoal quanto o inglês Mike Newell para essa empreitada tão ambiciosa, com um elenco internacional, um dos melhores exemplos da globalização no cinema. Pode-se dizer que o único filme realmente bom - digo, que eu gostei - de Newell foi QUATRO CASAMENTOS E UM FUNERAL (1994) e eu nem sei se ele resistiu ao tempo.

O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA (2007) tem um elenco de beldades difícil de encontrar em outro filme. A começar pela deusa italiana Giovanna Mezzogiorno como Fermina, o amor da vida de Florentino, interpretado na fase adulta pelo espanhol Javier Bardem. Eu sou apaixonado pela Giovanna, essa escorpiana de olhos enigmáticos, desde O ÚLTIMO BEIJO, de Gabriele Muccino, mas pelo visto só agora ela está ganhando projeção internacional. Espero que faça muito sucesso. As outras beldades do filme são também adoráveis: a colombiana Catalina Sandino Moreno, como a prima assanhada de Fermina; a americana Laura Harring, que dispensa apresentações e que infelizmente aparece num papel minúsculo; e a voluptuosa colombiana Angie Cepeda, no papel da viúva fogosa e que garante o momento mais engraçado do filme. Isso só pra ficar nas mais conhecidas. Para os brasileiros, a presença de Fernanda Montenegro como a mãe de Florentino, Trânsito Arisa, não deixa de ser um atrativo curioso.

Com todo esse luxo e um elenco que ainda inclui Benjamin Bratt, Liev Schreiber e John Leguizamo, é uma pena o filme parecer não ter alma. Mal dá pra sentir e levar a sério o amor transbordante de Florentino Ariza por Fermina. Ele, que espera 51 anos pela amada. Espera o marido de Fermina morrer, para novamente tentar conquistá-la. Mas como ele não é besta, vai se divertindo com toda sorte de mulher que aparece pelo caminho. Faz até um caderninho com o número, o nome e uma breve descrição das centenas de mulheres com quem vai transando. Enquanto isso, o casamento de Fermina com o Dr. Juvenal Urbino (Benjamin Bratt), se não tem o amor como eixo de sustentação, ao menos é um casamento estável. Quando se tem dinheiro, isso é mais fácil de se obter. Um dos melhores momentos do filme é a cena da lua-de-mel dos dois. E como esquecer também a cena em que o médico se aproveita de um exame para ver se a moça estava com o cólera, abrindo por completo a blusa de Fermina e exibindo seus belos seios? Os espectadores, obviamente, agradecem.

Sim, o filme tem os seus momentos, os seus méritos. Mostrar a Colômbia da virada do século XIX para o XX de maneira aparentemente realista é um deles. Claro que na Colômbia não se fala inglês, mas esse detalhe, para muita gente inconveniente - e acredito que não seria difícil fazer uma obra falada em espanhol, tendo tanta gente hispânica no elenco -, mas é preciso lembrar que O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA foi feito para agradar principalmente aos americanos, que são os produtores do filme. Inclusive, o produtor Scott Steindorff, o mesmo de TURISTAS (2006), passou três anos implorando a Garcia Marquez pelos direitos de filmagem da obra, dizendo-se ser ele mesmo o próprio Florentino, isto é, um homem que nunca desiste. Outra coisa que muita gente anda "chiando" diz respeito às canções interpretadas por Shakira para o filme. Pra mim, ficaram boas. Pelo menos, não me incomodaram. No mais, trata-se de uma obra que é fiel ao romance de Garcia Marquez na estrutura e no desenvolvimento narrativo, mas desprovida de real sentimento.

segunda-feira, dezembro 24, 2007

ROMEU E JULIETA (Romeo and Juliet)



Dando continuidade à série de peregrinações que faço, a partir da leitura de certos livros, chego hoje, véspera de Natal, a George Cukor, cineasta mais conhecido pela sua sensibilidade com o trato com os atores e por sua incrível capacidade de descobrir grandes atrizes. Foi ele quem trouxe a grande Katharine Hepburn para Hollywood. Antes deste ROMEU E JULIETA (1936), Hepburn já havia trabalhado com ele em três títulos: VÍTIMAS DO DIVÓRCIO (1932), QUATRO IRMÃS (1933) e VIVENDO EM DÚVIDA (1935). Infelizmente, todos inéditos em dvd no Brasil. É possível que eu os consiga por "meios alternativos", mas por enquanto, vou escrevendo sobre o que conseguir, tentando seguir, como sempre, uma ordem cronológica. Pena que a entrevista que ele deu a Peter Bogdanovich, presente no livro "Afinal, Quem Faz os Filmes" não é seguindo a ordem de realização dos filmes. A entrevista é mais um bate-papo descontraído, focando mais nos astros e estrelas que trabalharam com o diretor.

Seu ROMEU E JULIETA é bem tradicional e fiel ao texto original de William Shakespeare. E como a estória é uma das mais conhecidas do mundo não há muitas surpresas. Acredito que a principal surpresa do filme se deve à interpretação de John Barrymore, como Mercutio, o amigo de Romeu. Se Leslie Howard já me pareceu um pouco velho para o papel de Romeu, o que dizer de Barrymore? Se não me engano, nas outras adaptações da peça que vi para o cinema - a de Franco Zefirelli (1968) e a de Baz Lurmann (1996) - Mercutio não tinha traços efeminados e não era tão palhaço, mas é possível que minha memória esteja me enganando. E é possível também que Cukor tenha sido mais fiel à obra original que os outros dois cineastas. No papel de Julieta, a bela Norma Shearer. E ela é a alma do filme. Os melhores e mais emocionantes momentos dessa versão se devem à interpretação de Norma. Destaque para o momento em que ela chora pela morte de seu primo Teobaldo (Basil Rathbone), morto pela espada de Romeu, que vingava a morte de Mercutio. Ela chora de tristeza pelo primo, mas ao mesmo tempo, sente-se feliz por não ter sido Romeu o morto.

A estória é velha conhecida, mas refrescando a memória: ela se passa na ensolarada Verona. Lá vivem duas famílias rivais, os Capuleto e os Montague. Romeu, dos Montague, vai até uma festa organizada pelos Capuleto e lá conhece Julieta, filha do patriarca. É amor à primeira vista de ambas as partes. E ele é ousado o suficiente para ficar até o final e assediar a moça na janela de seu quarto. A empolgante meia-hora final compensa a verborragia do início (muito devido a Mercutio) e atesta a força atemporal da obra de Shakespeare. Mesmo sabendo da estória, impossível não torcer por um final feliz para os dois amantes. Não sei se um dia algum diretor ousou mudar o final dessa que é a mais conhecida das tragédias de Shakespeare. Provavelmente por sua maior simplicidade - não há como comparar com a complexidade de "Hamlet", por exemplo - e por seu romantismo exacerbado. Aliás, impressionante como Shakespeare era um autor completo, sendo ao mesmo tempo clássico e romântico.

Próximo provável Cukor: A DAMA DAS CAMÉLIAS (1936).

domingo, dezembro 23, 2007

NO VALE DAS SOMBRAS (In the Valley of Elah)



Não sou do grupo dos odiadores de Paul Haggis. Nem dos que odiaram o oscarizado CRASH - NO LIMITE (2004), embora tenha sido mesmo surreal a premiação para o dito cujo. Os roteiros de Haggis para os últimos trabalhos de Clint Eastwood são um pouco esquemáticos e não agradam a todos, mas suspeito que se ele não tivesse ganhado fama com CRASH seu nome passaria desapercebido. NO VALE DAS SOMBRAS (2007) é um trabalho melhor de Haggis, sente-se mais de perto as influências do velho Clint, com quem ele trabalhou nos últimos anos, e eu até diria que se colocassem um "Directed by Clint Eastwood" no final, aposto que enganaria muita gente. NO VALE DAS SOMBRAS tem muito em comum, por exemplo, com A CONQUISTA DA HONRA. São guerras diferentes, mas ambos fazem uma reflexão sobre a morte dos jovens enviados para lutar pelo seu país num ambiente estranho e as conseqüências na vida daqueles que voltam.

NO VALE DAS SOMBRAS é um filme que tem cara de Oscar. Deve ter sido realizado pensando no Oscar. E deve ganhar algumas indicações, principalmente para ator (Tommy Lee Jones). Apesar da sensação de vazio que fica no final e do incômodo patriotismo do protagonista, o filme tem as suas qualidades. Tommy Lee Jones é um militar aposentado que recebe a notícia de que seu filho, na primeira semana após ter voltado da Guerra do Iraque, é dado como foragido, desaparecido. Seu pai parte em sua busca. Quando o corpo do rapaz é encontrado, sua missão passa a ser a de descobrir os assassinos. Charlize Theron é a detetive encarregada das investigações que acaba tendo que lidar com os militares que estranhamente tentam acobertar o caso.

Ao lado de REDACTED, de Brian De Palma, e do já citado A CONQUISTA DA HONRA, NO VALE DAS SOMBRAS é mais um filme a mostrar o quanto a guerra mexe com a sanidade de uma pessoa enviada para lutar. Não se trata apenas de chorar pelos mortos de uma família. Seria, se olhássemos apenas o ponto de vista da mãe (Susan Sarandon), que perdeu os dois únicos filhos, vítimas da guerra. Já o personagem do pai, de Tommy Lee Jones, é mais complexo. Apesar de tudo, ele ainda acredita na força militar dos Estados Unidos, independente de quem esteja no poder, seja um presidente republicano ou um democrata, como se pode notar nas duas cenas da bandeira. Quanto à Charlize Theron, ela continua no seu processo de desglamourização, de quase rejeição de sua beleza, na intenção de se tornar uma grande atriz. E talvez ela esteja no caminho. Ela tem momentos brilhantes tanto dentro da delegacia, quanto em casa, com o filho pequeno. Também gosto da cena em que Tommy Lee Jones conta a estória de Davi e Golias para o garoto. Esse é o momento que justifica o título original. E um dos que justificam o filme também.

sábado, dezembro 22, 2007

SIDNEY LUMET EM TRÊS FILMES



Depois da repercussão bastante positiva na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, ANTES QUE O DIABO SAIBA QUE VOCÊ ESTÁ MORTO (2007), do veterano mestre de 83 anos Sidney Lumet, apareceu na lista dos dez melhores filmes do ano do AFI - American Film Institute. Quando se achava que o velho Lumet já tinha dado o melhor de si, eis que o homem mostra fôlego de um jovem. Assisti recentemente três títulos de diferentes fases da carreira do cineasta e coincidentemente os três são filmes de tribunal. A julgar por esses três trabalhos, Lumet deve gostar bastante do meio forense. E esses não são os únicos filmes de tribunal do homem não.

12 HOMENS E UMA SENTENÇA (12 Angry Men)

Presença constante em várias listas de melhores de todos os tempos, 12 HOMENS E UMA SENTENÇA (1957) é um daqueles títulos que eu tinha a obrigação de ter visto há muito tempo, mas que acabei vendo só agora. Realmente trata-se de uma obra excepcional, filmado o tempo todo numa única sala e sem perder o pique em instante algum, o filme mostra um júri composto por doze homens que devem decidir pelo destino de um rapaz, acusado de ter matado o próprio pai. No início, não sabemos nada sobre o assunto, afinal, não assistimos ao julgamento. O que vai sendo revelado é o que é debatido pelos membros do júri. A princípio, todos acreditam que o rapaz é culpado, apenas o personagem de Henry Fonda acredita em sua inocência e tenta fazer com que aquele júri leve a sério o seu papel. Apesar de se passar inteiramente num único lugar, uma sala de júri, o filme tem um trabalho de câmera que faz com que ele passe longe de ser teatro filmado. Quarenta anos depois, o filme ganhou um remake dirigido por William Friedkin, numa produção para tv, que eu não cheguei a ver, mas que dizem ser bem legal também.

O VEREDICTO (The Verdict)

E qual não foi minha surpresa ao ver que O VEREDICTO (1982) é ainda melhor que 12 HOMENS E UMA SENTENÇA. Até o momento, é o meu favorito de Lumet, talvez melhor até que UM DIA DE CÃO (1975), mas esse eu precisaria rever pra confirmar. Aliás, Lumet é tão prolixo que é preciso ver muita coisa dele ainda pra se ter uma idéia da qualidade de sua obra. Em O VEREDICTO, Paul Newman tem uma das melhores performances de sua carreira, interpretando um advogado decadente e alcóolatra que tenta recuperar a sua carreira e a sua honra, pegando o caso de uma mulher em estado de coma devido a erro médico. Como o hospital é muito conceituado e diretamente ligado à Igreja Católica, ele recebe uma boa quantia em dinheiro para não levar o caso ao tribunal. Em vez disso, ele rejeita o cheque e prefere ir à luta. Mas as coisas vão se tornando cada vez mais difíceis para o advogado, especialmente quando uma de suas testemunhas-chave desaparece. O VEREDICTO, apesar de ser um drama de tribunal, seus melhores momentos acontecem fora do tribunal. E se você quer se tornar um fã de Paul Newman, dê uma olhada em O VEREDICTO. Impossível não admirá-lo. Recentemente, George Clooney disse ter se inspirado nesse papel para a construção de outro advogado decadente no recente CONDUTA DE RISCO. Gravado da Globo.

SOB SUSPEITA (Find me Guilty)

Não é tão bom quanto os anteriores, mas SOB SUSPEITA (2006) cresce bastante no final. Quando ele deixa um pouco de lado o aspecto cômico, o filme vai ganhando força. É um pouco esquizofrênico. Começa em tom de comédia e depois vai ganhando uma carga melodramática. Pela falta de tempo e pelo cansaço dos últimos dias, acabei vendo o filme "em fascículos" e achei-o um pouco longo em sua duração, mas depois que ele terminou, achei que o fato de o filme se arrastar por pouco mais de duas horas acaba sendo coerente com o enredo e com o tempo do julgamento que se estendeu por quase dois anos. Em SOB SUSPEITA, Vin Diesel é Jackie DiNorscio, um membro da máfia italiana que é condenado a 30 anos de cadeia e se recusa a cooperar com o FBI e entregar a famiglia e o chefão. Em vez disso, ele demite o seu advogado e mesmo sem ter nenhuma noção de Direito, prefere ser o seu próprio advogado. O resultado é que ele transforma o tribunal num show de humor, num circo, o que o torna simpático ao júri. Vin Diesel está bem diferente nesse papel, deixando de lado a sua persona grosseira comum nos filmes que lhe fizeram a fama. E ele só tem a ganhar com isso, principalmente com essa oportunidade de trabalhar com um cineasta como Lumet. Mas engana-se quem pensa que Lumet mudou de lado ao apoiar a máfia. Acontece que os supostos homens da lei também agem como mafiosos, portanto, não há como não apoiar a famiglia e seu senso de ética e companheirismo. Enfim, é um filme assumidamente subversivo. Destaque para o personagem de Peter Dinklage, o protagonista de O AGENTE DA ESTAÇÃO, fazendo papel de um dos advogados da máfia.

P.S.: Chegou a nova Paisà! A capa está lindona e o destaque desse mês é Gus Van Sant, com o seu PARANOID PARK e a cobertura dos festivais.

quarta-feira, dezembro 19, 2007

INVASORES (The Invasion)



Mais um filme cuja recepção fria da crítica e do público eu não entendi muito bem. Concordo que o final deixa a desejar e parece um enxerto mal feito, mas o tal final representa poucos minutos de um filme que se sustenta muito bem no suspense e nas seqüências de ação, durante os seus enxutos noventa minutos de duração. E tem a Nicole Kidman, que continua linda, exuberante e com um carisma que poucas estrelas de Hollywood da atualidade possuem. Só a sua presença já justifica uma ida ao cinema.

Em INVASORES (2007), ela é Carol Bennell, uma mulher divorciada, mãe de um garotinho chamado Oliver e que trabalha como psiquiatra. Ela começa a desconfiar que as coisas estão ficando estranhas quando uma de suas pacientes diz que o seu marido não é o seu marido. Aos poucos, os alienígenas que chegaram à sua cidade vão tomando os corpos de seus habitantes. Um deles é o seu ex-marido (Jeremy Northam), que estranhamente pede para passar uns dias com o seu filho. Aliás, bonita a cena de Nicole chorando, ao deixar o filho nas mãos do marido, sem saber que ele agora é um E.T. de pensamento coletivo. Daniel Craig tem papel de destaque no filme, como melhor amigo/interesse amoroso da protagonista, mas o brilho de Nicole é tanto que Craig fica totalmente apagado em seu papel.

Cheguei a ver as três adaptações anteriores do livro de Jack Finney para o cinema, mas tenho pouca lembrança das três. Talvez por isso tenha gostado da nova versão. Lembro de não ter gostado da versão de Abel Ferrara, INVASORES DE CORPOS - A INVASÃO CONTINUA (1993), que assisti há cerca de sete anos na TNT. A primeira versão, a obra-prima de Don Siegel VAMPIROS DE ALMAS (1956), lembro de ter visto em vhs, há séculos, numa cópia da Herbert Richards colorizada por computador. Para preservar a autenticidade da obra, eu tive de retirar a cor da televisão. Agora, o que eu gostaria de ver mesmo é a segunda versão, INVASORES DE CORPOS (1978), de Philip Kaufman, que vi na televisão quando era adolescente. É um filme que necessita com urgência de uma versão caprichada em dvd, que parece que já saiu lá fora.

Mas voltando à obra creditada ao alemão Oliver Hirschbiegel, diretor de A EXPERIÊNCIA (2001) e A QUEDA! AS ÚLTIMAS HORAS DE HITLER (2004), ao que parece houve um pequeno desentendimento entre ele e os produtores do filme, que não gostaram do resultado do seu trabalho e fizeram alguns "ajustes", incluindo o final, que eu admito que ficou muito ruim, ou pelo menos, muito estranho, dando a impressão de que foi enxertado no filme às pressas. Quem ficou responsável por "ajustar" o filme à vontade dos produtores - ou torná-lo mais palatável ao gosto americano - foram os irmãos Wachowski, que reescreveram o roteiro, e James McTeigue, que dirigiu cenas adicionais. No entanto, nenhum dos três foi creditado no filme. Será que Hirschbiegel tem coragem de voltar à Hollywood, depois dessa falta de consideração dos americanos? Se bem que eu não duvido nada que o "ajuste" tenha sido para melhor. Tudo é possível.

terça-feira, dezembro 18, 2007

CAMINHO SEM VOLTA (The Yards)



Quase não dá pra acreditar que sete anos separaram CAMINHO SEM VOLTA (2000) do mais recente filme de James Gray, o brilhante OS DONOS DA NOITE (2007), que continua em cartaz em boa parte dos cinemas brasileiros e que muita gente não está dando o devido valor. É que os filmes se parecem muito um com o outro, não apenas pelo elenco (Mark Wahlberg e Joaquin Phoenix), mas também pela forte influência de O PODEROSO CHEFÃO, inclusive com a presença de um dos atores do clássico de Coppola, no caso, James Caan. Ambos os filmes também são dramas policiais e familiares com toques de tragédia shakesperiana.

Na trama, Wahlberg é Leo Handler, rapaz recém-saído da prisão, depois de quatro anos cumprindo pena, mesmo sendo inocente. Ele é recebido com uma festa de boas vindas da família e dos amigos, representados principalmente por sua mãe (Ellen Burstyn), sua tia (Faye Dunaway), sua bela prima (Charlize Theron) e seu velho amigo Willie (Joaquin Phoenix), que namora a prima, por quem ele é apaixonado desde a infância. Percebe-se a tristeza de Leo, contrastando com a alegria e o esforço dos amigos para tentar levantar seu astral. Mas não dá pra ser feliz quando você vê numa festa a mulher que você ama dançando e namorando outro cara. Mesmo que esse cara seja seu amigo. Willie até se esforça para alegrar Leo e ajudá-lo a conseguir um emprego, durante esse difícil período de readaptação à sociedade e ainda em fase de liberdade condicional.

Ao procurar ajuda com o seu tio Frank (James Caan), dono de uma empresa de suprimentos de material para o metrô de Nova York, o mesmo recomenda ao rapaz que ele faça primeiro uns cursos antes de começar a trabalhar. Mas Leo não gosta da idéia, quer logo trabalhar e ganhar o seu dinheiro, como o amigo Willie, que também trabalha na mesma empresa, no ramo de negócios. Wiliie acaba trazendo Leo para trabalhar com ele. Acontece que os negócios que ele faz não são nada honestos e ao tentar sabotar uma das empresas rivais, algo dá muito errado. E é a partir daí que o filme deixa de ser um drama familiar para se tornar um dos thrillers policiais mais angustiantes e eletrizantes dos últimos anos.

Em CAMINHO SEM VOLTA, Wahlberg tem mais chance de mostrar o seu talento como ator, já que ele é o protagonista - em OS DONOS DA NOITE ele está mais para coadjuvante. No entanto, CAMINHO SEM VOLTA sai perdendo para o seu "filme-irmão" em alguns pontos, já que Joaquin Phoenix é um ator muito mais talentoso que Wahlberg e é um privilégio para um filme tê-lo como protagonista, ainda mais sob a batuta de Gray, cineasta que deve-se ficar de olho, apesar de sua curta filmografia, com filmes produzidos com um intervalo de tempo muito grande. De FUGA PARA ODESSA (1994) para CAMINHO SEM VOLTA foram seis anos. E desse para o mais recente foram sete. A boa notícia é que não precisaremos esperar todo esse tempo novamente, já que ele está com outra parceria com Joaquin Phoenix, prevista para o próximo ano. O novo filme se chama TWO LOVERS. A única coisa a lamentar é o dvd nacional de CAMINHO SEM VOLTA, que está em fullscreen. Mesmo assim, isso não diminui o impacto e a força desse belo trabalho.

domingo, dezembro 16, 2007

IMPÉRIO DOS SONHOS (Inland Empire)



Quem acompanhou o trabalho que David Lynch fez com câmera digital para o seu website www.davidlynch.com já tinha uma prévia do que viria em seu longa-metragem seguinte, o tão aguardado IMPÉRIO DOS SONHOS (2006). Tanto a série de curtas RABBITS (2002) quanto o curta DARKENED ROOM (2002) lidam com o medo. Medo do desconhecido. Um medo irracional, bastante coerente com esses tempos de síndrome do pânico e de paranóia. Afinal, qual seria a razão desse medo? Pode ser que haja algum monstro, ou demônio ou um assassino à espreita, mas talvez não exista nada disso, talvez seja apenas o medo do desconhecido. Ou talvez as pessoas mais sensíveis tenham detectado que há algo assustador naquele beco escuro, ou na escuridão de uma porta aberta, mas cuja escuridão invade o ambiente, elemento tão comum na obra de Lynch. Tanto RABBITS quanto DARKENED ROOM são ensaios para IMPÉRIO DOS SONHOS. O primeiro aparece mais explicitamente, já que tem parte de suas cenas aproveitadas no longa-metragem. Em RABBITS, Lynch desconstrói o tempo. A ordem dos diálogos é embaralhada de modo a aumentar o estranhamento e fazer com que o medo seja provocado tanto pela bizarrice quanto pelo suspense, seja ele causado por um telefone que toca ou por alguém que parece se aproximar da porta.

Talvez nunca a escuridão tenha sido tão utilizada num filme. Antes, o filme que Lynch mais aproveitou a falta de luz foi ESTRADA PERDIDA (1997), mas dessa vez ele leva a escuridão às telas de forma inédita e exponencial. Aliás, o que Lynch fez foi quase um suicídio comercial. O diretor fez um filme para fãs radicais do seu trabalho e mesmo alguns deles podem não gostar do resultado. Eu mesmo, como fã, lamento um pouco o uso do suporte digital para um longa-metragem feito para ser exibido nos cinemas. Sinto falta da qualidade da imagem da película e confesso que fiquei triste quando ele disse que nunca mais utilizará 35 mm, que a partir de agora vai sempre usar câmeras digitais, pela leveza e facilidade de produção e edição. Parece que é um caminho sem volta. E diferente de Michael Mann, que utiliza o suporte digital de uma maneira que se aproxima e muito da película em qualidade da imagem, Lynch quis, de propósito, que seu IMPÉRIO DOS SONHOS parecesse mesmo um filme de imagem de baixa qualidade, quase um vídeo caseiro.

E, pra mim, curiosamente, a familiaridade que eu tenho com a obra de Lynch acabou diminuindo o impacto de IMPÉRIO DOS SONHOS em mim. Em A ESTRADA PERDIDA, temos um homem de aspecto assustador, um ator desconhecido que fez gelar a minha espinha sempre que aparecia. Já em IMPÉRIO DOS SONHOS, a figura mais assustadora que aparece, em close e em imagem distorcida, é Grace Zabriskie, que já me assustou muito mais na série TWIN PEAKS (1990) e que se tornou uma atriz bem conhecida - atualmente faz parte do elenco de BIG LOVE, série da HBO. Como protagonista, temos Laura Dern, em sua terceira parceria com o diretor. Sem falar em Justin Theroux, Harry Dean Stanton e a aparição especial da lindíssima Laura Harring, dando tchauzinho no final. Quer dizer, tudo muito familiar. Nada contra a familiaridade, afinal, sou fã de Howard Hawks e John Ford. O que eu estou querendo dizer é que eu senti falta de um elemento comum nos trabalhos de Lynch: o medo, que ele consegue obter de maneira muito mais forte na série de curtas RABBITS.

Há, no entanto, muitos momentos de suspense, de expectativa, de "quase medo", como aquele em que Laura Dern e Justin Theroux conversam numa mesa, ensaiando os diálogos do filme com Harry Dean Stanton e Jeremy Irons, quando Stanton interrompe a conversa e diz que tem alguém na escuridão daquele lugar. Sim, porque praticamente todos os lugares em que os personagens se encontram são escuros. A não ser que a cena aconteça de dia e fora das quatro paredes. Quando isso acontece, há uma claridade imensa. Mais tarde, saberemos quem é a pessoa que aparece na escuridão do set de filmagens e que foge de lá correndo, o que acaba sendo um dos momentos mais fascinantes do filme. Assim como acontece em dois de seus últimos trabalhos, ESTRADA PERDIDA e CIDADE DOS SONHOS (2001), o tempo é um elemento fundamental na construção da trama. E a confusão e o sentimento de pesadelo que nos encontramos cada vez mais, principalmente a partir da metade de suas longas três horas de duração, fazem com que IMPÉRIO DOS SONHOS seja - ao lado de POSSUÍDOS, de William Friedkin - o filme que mais espanta casais desavisados das salas de cinema. E talvez os dois filmes tenham mais coisas em comum do que apenas isso. Agora, a pergunta que não quer calar é: depois de uma obra tão radical, como será o próximo trabalho de Lynch? Será que algum dia ainda teremos a chance de ver outra obra inédita de David Lynch no cinema depois dessa extravagância? Olha o medo do desconhecido se formando aí.

sábado, dezembro 15, 2007

UM AMOR JOVEM (The Hottest State)



A experiência como ator nos filmes de Richard Linklater, aliada à sua experiência como escritor de romances, levou Ethan Hawke pela segunda vez ao posto de diretor de longa-metragem, na adaptação de um de seus livros, "The Hottest State" (inédito no Brasil). De seus romances, comprei o bom "Quarta-feira de Cinzas", livro que alterna os pontos de vista de um casal em crise. Cada capítulo do livro é narrado pelo ponto de vista de um deles.

Sendo uma adaptação de um de seus primeiros livros, imagina-se que UM AMOR JOVEM (2006) seja o trabalho mais pessoal de Ethan Hawke. A influência de Richard Linklater é clara: o filme de Hawke não se liga muito numa narrativa, é mais um estudo de personagem, um trabalho intimista, no que a palavra tem de mais amplo. Conta a estória de William (Mark Webber), um rapaz que se apaixona por uma linda e jovem cantora de nome Sarah (Catalina Sandino Moreno). Embora em nenhum momento UM AMOR JOVEM consiga atingir a graça e o encanto de um ANTES DO AMANHECER ou um ANTES DO PÔR-DO-SOL - o que seria uma surpresa e tanto - o trabalho do jovem diretor tem os seus méritos.

Na trama, William conhece Sarah num barzinho e começa a puxar conversa com ela. Ela simpatiza com o rapaz e os dois começam a conversar no caminho de volta para casa, a pé. É quando ele descobre que ela mora em frente à sua casa. Ele fica tão amarradão na menina que quer logo morar junto com ela. As coisas vão bem, mas a presença constante do rapaz faz com que Sarah comece a perder o encanto por ele, embora ela mesma admita que a viagem que os dois fizeram juntos tenha sido marcante e um dos momentos mais felizes da vida dela. E quando ela pede "um tempo", ele fica logo desesperado. Não quer perder a garota que ele tanto ama e que acredita ser a mulher de sua vida. E é nessa hora que o filme atinge os seus melhores momentos, quando nos sentimos um pouco na pele do rapaz. Uma das seqüências mais memoráveis é aquela em que ele liga várias vezes para o telefone de Sarah, deixando uma mensagem atrás da outra na sua secretária eletrônica, sem nunca conseguir esgotar o que falar ou diminuir a dor no peito. Quem já se apaixonou, vai entender.

E quem, como eu, se encantou com a beleza de Catalina Sandino Moreno desde sua estréia em MARIA CHEIA DE GRAÇA, vai ficar muito feliz em poder ver um pouco mais de seu belo corpo no filme. Alguns coadjuvantes de luxo participam. Além do próprio Hawke, que interpreta o pai ausente de William, temos a sempre ótima Laura Linney, como a mãe dele, e Sônia Braga, como a mãe de Sarah. Outra figurinha conhecida é Michelle Williams.

UM AMOR JOVEM ainda está inédito no Brasil, mas vai ser lançado em breve, só não sei se no cinema ou direto em dvd.

P.S.: Embora eu ande sem tempo pra acompanhar o blog dos amigos e a empresa onde eu trabalho esteja limitando cada vez mais o acesso à internet, a ponto de proibir até os blogs, venho avisar que a décima-quinta edição da Revista Zingu! está no ar. Dessa vez, o destaque é o Cine Marabá, um daqueles antigos cinemas-palácio de rua, que estão em fase de extinção no Brasil. O lugar foi fechado e vai se transformar num multiplex com cinco salas. No mais, a revista traz: a continuação da série de textos do especialista Rodrigo Pereira sobre os "western feijoada"; contribuições de Marcelo Carrard nas sessões "Subgêneros obscuros" e "Cinema Extremo"; e muito mais, como um texto bastante pessoal do amigo Eduardo Aguilar, que está estreando como diretor de teatro na peça OS HOMENS SÃO SINGELOS, AS MULHERES NÃO. Ele faz um interessante e afetuoso estudo comparativo entre o cinema e o teatro e sobre a necessidade ou não de controlar as coisas. Inclusive na vida. Vale a conferida!

quinta-feira, dezembro 13, 2007

CONDUTA DE RISCO (Michael Clayton)



Não gosto de shopping centers nessa época do ano. Eles me deixam triste com aquelas decorações natalinas e com aquela monte de gente transitando. Quando fui ver 30 DIAS DE NOITE no sábado tive de encarar aquele formigueiro que se transforma o Iguatemi quando o Natal se aproxima. E olha que ainda estamos no começo de dezembro. Felizmente as filas para o cinema até que andam curtas. O povo está indo mesmo é fazer compras. Na terça-feira à noite, quando retornei lá para a sessão de CONDUTA DE RISCO (2007), foi um alívio, com o shopping mais tranqüilo. Bom mesmo é ir ao cinema durante a semana. E geralmente os filmes que deixo para ver no meio da semana são aqueles que não priorizo tanto, aqueles que não me parecem tão atraentes. Por isso a surpresa positiva que tive com o excelente thriller CONDUTA DE RISCO, bem sucedida estréia na direção de Tony Gilroy, roteirista da trilogia Bourne.

George Clooney, um dos produtores executivos do filme, mais uma vez flerta com o engajamento político. Em 2005, ele havia demonstrado isso com a dobradinha BOA NOITE E BOA SORTE (esse, dirigido por ele mesmo) e SYRIANA. O primeiro, sobre o mcarthismo e a liberdade velada; o segundo sobre a sujeira na indústria do petróleo. CONDUTA DE RISCO lida com a corrupção corporativa. Clooney é o Michael Clayton do título original, um advogado financeiramente falido (ele é um viciado em jogo), cujo principal trabalho é botar pra debaixo do tapete a sujeira da empresa em que trabalha, no caso, uma companhia agroquímica que está na batalha com um processo na justiça, numa ação de bilhões de dólares. A batalha estaria praticamente ganha pela empresa, caso um de seus principais empregados (Tom Wilkinson), numa atitude de lucidez misturada com loucura, não tirasse toda a sua roupa e saisse correndo pelado pelo estacionamento, ameaçando contar os podres da companhia e ajudar os prejudicados pelas substâncias tóxicas produzidas pela empresa, em especial uma garota por quem ele fica obcecado, chamada Anna.

Mas o filme não entrega a trama de maneira tão clara assim. CONDUTA DE RISCO começa pelo final, que funciona como uma espécie de prólogo, e depois voltamos no tempo e vamos entendendo aos poucos a trama e o que aparentemente parece frio e confuso como um filme de espionagem convencional vai se tornando uma obra empolgante e cheia de tensão e suspense. Os grandes desempenhos de Clooney, Wilkinson e Tilda Swinton fazem parte dos méritos do filme e provavelmente o elenco será lembrado na temporada de premiações do início do próximo ano. Clooney, em entrevista, disse que, para o seu papel, inspirou-se no Paul Newman de O VEREDITO, de Sidney Lumet, de forma a ajudá-lo a desenvolver a ambígüidade moral que o personagem requer. No fim da sessão, confesso que fiquei empolgado e voltei pra casa bem satisfeito. Filmão.

P.S.: Acabou de sair a lista dos indicados ao Globo de Ouro e CONDUTA DE RISCO foi indicado nas categorias de filme (drama), ator (George Clooney), ator coadjuvante (Tom Wilkinson) e atriz coadjuvante (Tilda Swinton).

terça-feira, dezembro 11, 2007

ROOT OF ALL EVIL?



Sou de ascendência evangélica e tenho uma tendência a valorizar certos aspectos da educação religiosa que tive, mesmo tendo sido sempre um peixe fora d'água e sempre fui muito questionador. Ainda assim, tenho um certo fascínio pela Bíblia e um interesse geral por quase todo tipo de religião, embora admita ter um pouco de preconceito com as religiões africanas, afro-brasileiras e afins. Com o tempo, fui me interessando por crenças que nada têm a ver com o que me foi ensinado na escola dominical, nos livros de teologia que eu costumava ler ou no que o pastor pregava. Até hoje, por exemplo, não encontrei respostas para coisas como por exemplo: por que Jesus morreu na cruz por nossos pecados? Se ele não tivesse morrido, o que seria da humanidade? É uma questão básica, mas até hoje não ouvi ou li nenhuma resposta que me deixasse satisfeito. Tudo parece um mistério velado e nunca muito bem explicado por pastores, reverendos e muito menos padres. Com o tempo, e com meus estudos em astrologia, acabei percebendo (ou aprendendo) que o sacrifício de Jesus teria sido o marco inicial da era de Peixes, uma era nebulosa que durou cerca de 2000 anos e que seria fundamentada na religião e no misticismo e teria o seu ápice na Idade Média, tida nos livros de História como a "Idade das Trevas".

Os valores da era anterior, a Era de Áries, como a bravura, a franqueza e a violência, seriam substituídos pelos valores piscianos: a sensibilidade, o sacrifício, a compassividade. Agora, na era de Aquário, podemos perceber que os valores passaram a ser outros: o idealismo, o progresso (seja ele científico ou não), o individualismo. Estamos vivendo novos tempos, como foi celebrado pelo hippies nos anos 70, mas mesmo eles não sobreviveram ao progresso constante e contínuo dessa era em que vivemos. Estamos em constante mutação e daqui a uns cem anos, o planeta Terra e a humanidade já não mais serão os mesmos. Para o bem e para o mal. Talvez Kubrick meio que quisesse dizer isso em 2001: UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO. Mas sinto que estou fugindo um pouco do foco central. Que é a religião ocidental monoteísta atacada pelo narrador e protagonista do documentário.

Não tenho nada contra os céticos, os ateus. Até admiro alguns deles, como o filósofo raivoso Nietzsche e seu ódio contra o Cristianismo, explicitada com veemência em "O Anticristo". Sou fã de sua energia e de sua dialética. Mas esse sujeito, Richard Dawkins, o cara do documentário ROOT OF ALL EVIL? (2006), me pareceu uma versão ainda mais pentelha de Michael Moore. O documentarista gordinho e inimigo dos Bush pelo menos é divertido e seus filmes são prestações de serviços para a humanidade. Quanto a Dawkins, ele se mostra no filme - na verdade um programa de televisão dividido em duas partes - tão extremista e radical em sua defesa pela ciência e contra a fé - que ele chama de "vírus da fé" - quanto aqueles a quem ele combate.

E quem são aqueles que ele combate? No caso, são os judeus, os evangélicos, os católicos e os mulçumanos. Usando como base a teoria evolucionista de Charles Darwin, por exemplo, ele tenta constranger um rabino que acredita que Deus criou mesmo o mundo em seis dias. A Terra não teria, portanto, bilhões de anos, como afirmam os cientistas, teria a quantidade de anos do calendário judaico. E da mesma maneira, ele cutuca os evangélicos, os católicos e os mulçumanos. Basta um maometano afirmar que o ato de 11 de setembro foi justo para que isso sirva para mostrar ao mundo que eles são vilões. Quanto aos católicos, eles têm teto de vidro e uma História tão podre desde os tempos de Constantino que é até covardia criticá-los, mas ele tenta debater sobre a crença na assunção de Maria, que surgiu seis séculos após a morte de Jesus, não consta na Bíblia e foi aceito como dogma apenas nos anos 1920. Atualmente, os católicos são especialmente criticados pela ridícula proibição de métodos anticoncepcionais, em plena era da Aids. Mas, por mais que as defesas de Dawkins sejam até justas, do jeito simplista que ele briga por seus ideais, o filme fica parecendo um programa para leigos. Fica parecendo que Dawkins não sabe que existem outras crenças, outras "verdades", além das pregadas pelos grupos que ele atacou. E que também têm a fé como algo fundamental.

Agradecimentos ao Renato pelo cópia do doc.

P.S.: Acabei descobrindo hoje onde eu vi a expressão "o tempo é uma raposa". Foi no trailer de MEU NOME NÃO É JOHNNY, filme brasileiro estrelado pelo Selton Mello. Pra quem não viu ainda, tem no youtube.

segunda-feira, dezembro 10, 2007

30 DIAS DE NOITE (30 Days of Night)



Fiquei satisfeito com o resultado de 30 DIAS DE NOITE (2007), a adaptação para o cinema da HQ homônima de Steve Niles e Ben Templesmith. Talvez o fato de eu não ter lido a obra original possa ter ajudado um pouco, já que não fiquei sabendo sempre o que ia acontecer, como quando fui ao cinema ver SIN CITY. E pelo que andei lendo por aí, houve algumas mudanças na estória nessa adaptação. O padrinho do filme é Sam Raimi, que parece estar com medo de voltar a dirigir um filme de terror. Talvez ele ache que não sabe mais dirigir um, depois de tantos anos só fazendo filmes do Homem-Aranha. Desse modo, o posto de direção foi para David Slade, que chamou atenção com o seu thriller de baixo orçamento MENINA MÁ.COM (2005), filme que dividiu opiniões. Com 30 DIAS DE NOITE, Slade trabalha com um orçamento bem mais gordo e faz um bom trabalho, apesar de faltar no filme uma coisa que eu acho quase essencial num filme de terror: causar medo. Mas como sequer me lembro do último filme que me assustou de verdade, vamos deixar passar esse pequeno "detalhe".

O que Slade consegue em 30 DIAS DE NOITE é manter um clima de suspense, o que já é alguma coisa. O filme também nos faz lembrar de O ENIGMA DE OUTRO MUNDO, de John Carpenter, pelo fato de se passar num lugar extremamente gelado, e em O DESPERTAR DOS MORTOS, de George Romero, pela forma com que os sobreviventes tentam conseguir suprimentos para se manter escondidos até a chegada da aurora. Também conta pontos a favor do filme o visual dos vampiros. Com dentes pontiagudos, unhas quase tão grandes quanto as do Zé do Caixão e sempre com o rosto coberto de sangue, eles são as grandes estrelas do filme. Ainda assim, Josh Hartnett tem os seus momentos de brilho como o herói, em especial na seqüência final. Melissa George, de TURISTAS e da série ALIAS, é o par romântico do rapaz.

Assim como o personagem de Al Pacino ficou perturbado com os dias sem noite no Alaska em INSÔNIA, dessa vez temos o contrário: uma cidadezinha no norte do território mais frio dos Estados Unidos, afastada da civilização e atormentada por um inverno muito forte. Tão forte que o sol passa trinta dias sem dar as caras por lá. Por isso, sempre nessa época do ano, a cidade fica quase vazia, com muita gente migrando para lugares um pouco mais ensolorados que o vilarejo de Barrow. E é sabendo disso que um grupo de vampiros prepara um esquema de sabotagem, antes de atacar pra valer, deixando a cidade sem energia elétrica, telefone, internet ou qualquer outro meio de comunicação com o mundo exterior. Daí pra frente é só começar a carnificina. O vermelho do sangue das vítimas tingindo a neve branca em tomadas aéreas é uma das coisas que mais fica em nossa memória. Já estão falando em continuação, isto é, em adaptações dos outros livros de Niles. É quase certo estarmos diante de uma nova franquia.

P.S.: E falando em bons filmes de terror, já viram o cartaz do novo trabalho de M. Night Shyamalan?

domingo, dezembro 09, 2007

TRANSILVÂNIA (Transylvania)



Vai parecer que eu estou reclamando, coisa que eu estou tentando evitar nesse espaço dedicado mais aos filmes e às séries, mas como este blog também funciona como uma "cápsula do tempo", para usar o termo usado em MY SASSY GIRL, gostaria de deixar registrado aqui um pouco das minhas insatisfações atuais. Sei que a gente sempre deve ver a vida pelo lado positivo, como aquele personagem engraçado de A VIDA DE BRIAN, mas nem sempre se consegue manter a esportiva, especialmente quando se está convivendo com perdas e insatisfações. E eu estou insatisfeito com o meu trabalho. E ao ver um grande amigo meu resolvendo sair de lá por conta própria, e não na primeira remessa dos demitidos, simplesmente por não estar mais agüentando mais tanta pressão e estresse - que pode resultar em várias doenças e ausência de vida própria -, a sexta-feira foi um dia bem triste pra mim. E esse ano está sendo o ano das demissões e das mudanças radicais na vida das pessoas, inclusive dentro do plano sentimental. E eu estou aguardando a minha mudança também. Pra melhor, claro. Estou um pouco cansado de ver o bonde passar e eu ficar parado. E falando nisso, encontrei por acaso, na última quinta-feira, uma ex-namorada minha, de 2000, a mais importante que tive, e ela, toda contente, me apresentou aos seus colegas de trabalho e me mostrou as fotos de seu filho e de seu atual companheiro. Foi um negócio bem estranho, mas eu não fiquei triste, apenas pensativo. Ok, vamos ao filme em questão, que o tempo é uma raposa (em qual filme vi essa frase mesmo?).

TRANSILVÂNIA (2006) é outro road movie um tanto quanto indigesto de Tony Gatlif, cineasta que já havia me deixado passando mal no cinema com o anterior EXÍLIOS (2004) e aquele plano-seqüência "demoníaco". Dessa vez, Gatlif entrega um filme similar - irmão, eu diria - mas bem menos perturbador e com uma atriz que eu gosto bastante como protagonista (Asia Argento). Ela é Zingarina, uma jovem mulher grávida que viaja até a "terra do Drácula" em busca do homem que ama. Ela está acompanhada de uma amiga, a francesa Marie (Amira Casar), e de uma guia turística que as ajuda a se virar naquele lugar estranho. O objetivo principal é, claro, encontrar o tal homem que se sabe que está morando ali e que trabalha como músico. O problema é que o cara fugiu dela, não foi deportado, como ela acreditava. Arrasada com a revelação, Zingarina vaga sem rumo pela região da Transilvânia, fugindo de Marie e recusando-se a voltar pra casa. No caminho, ela encontra um negociante solitário (Biron Ünel, o barbudo protagonista de EXÍLIOS). No começo do filme, na primeira vez que ela o encontra, numa festa exótica, ela diz estar ali em busca do amor; ele afirma estar em busca de dinheiro.

O filme lembra um pouco os trabalhos de Emir Kusturica, tanto pela presença dos ciganos, quanto pela música adotada na trilha sonora, daquela região da Europa. Dizem que TRANSILVÂNIA não retrata com realismo a região e seus aspectos culturais, mas isso não importa muito para o que o filme se propõe. É uma obra de ficção, não é um documentário, então não há nenhum problema com isso. E assim como EXÍLIOS, a religiosidade estranha também está presente em TRANSILVÂNIA, com destaque para a cena em que Zingarina é banhada num ritual pagão, usando uma longa veste branca. Outra seqüência memorável é a cena do parto, dentro do carro. Mesmo assim, como o filme não traz uma cena catártica como o trabalho anterior, acaba deixando de ser tão memorável quanto, embora seja um pouco mais simpático. Acho que a cena do filme que eu mais gostei foi a da fuga desesperada de Zingarina, chorando feito louca, no meio de uma floresta. No mais, a Transilvânia, do jeito que é mostrada no filme, é um lugar que eu pretendo manter distância e nunca pisar lá.

sábado, dezembro 08, 2007

DEXTER - A SEGUNDA TEMPORADA COMPLETA (Dexter - The Complete Second Season)



A segunda temporada de DEXTER (2007) se mostrou tão boa ou até melhor que a anterior. Claro que muita gente pode reclamar de algumas mudanças sutis na personalidade do protagonista (Michael C. Hall), mas foi uma evolução natural e acredito que os produtores e roteiristas estão levando a série muito bem. Ouvi dizer que essa segunda temporada não foi inteiramente adaptada do segundo livro de Jeff Lindsay, como havia sido a primeira, mas não sei ao certo. O que sei é que é um prazer ouvir de novo aquela música-tema e ver novamente aquela brilhante seqüência de abertura por mais doze episódios. A estrutura dessa segundona é parecida com a da primeira. Durante a primeira metade da temporada a série continua boa mas vai esquentando mesmo à medida que Dexter Morgan tem a sua vida virada do avesso, depois que descobrem no fundo do mar os pedaços dos corpos dos assassinos que ele matou. A coisa se complica quando o FBI entra na história e passa a afirmar que o assassino, denominado pela imprensa de "Bay Harbor Butcher", é um dos membros da força policial de Miami.

Ao mesmo tempo, Dexter, percebe que, ao contrário do que ele pensava, não é um ser desprovido de sentimentos e consciência, pelo menos quando se trata das pessoas que ele é mais próximo, como sua namorada Rita e sua irmã Deb. Ele acaba meio que acidentalmente entrando num grupo de pessoas viciadas e tenta passar por uma fase de "abstinência", tentando controlar a sua ânsia de matar. E é lá que ele conhece a inglesa Lila, peça fundamental para o desenvolvimento dessa temporada. E como era de se esperar, pelo gancho deixado no final da primeira temporada, o sargento James Doakes passa a vigiar os passos de Dexter, desconfiando cada vez mais que ele está escondendo algo. Quer dizer, o nosso anti-herói não tem descanso. Pra completar, ficamos sabendo mais detalhes sobre o pai de Dexter.

Um dos episódios mais diferentes de toda a série é "The Dark Defender". Esse é o termo inventado pela mídia, quando descobrem que o "Bay Harbor Butcher" mata apenas assassinos seriais, sendo então um herói para a cidade de Miami. O que não quer dizer que seja o melhor episódio. Os melhores são mesmo os três últimos, quando a série atinge o seu clímax e - assim como a primeira - fecha a temporada sem muitas pontas soltas. O final tem cara de final mesmo. Só tenho uma pequena restrição ao final da temporada e deixo aqui como um possível spoiler: achei meio que covardia dos roteiristas nessa segundona a maneira como foi resolvida a situação do Sargento Doakes, ao utilizarem de uma intervenção externa para livrar um pouco a cara do Dexter e não torná-lo desagradável aos olhos dos espectadores, caso ele tivesse realmente seguido o seu plano de manter a sua identidade secreta até o final.

quarta-feira, dezembro 05, 2007

A LENDA DE BEOWULF (Beowulf)



Dizem que ver A LENDA DE BEOWULF (2007) em salas equipadas com projeção em 3-D é uma experiência totalmente diferente. Como na cidade onde eu moro ainda não existe sala com esse tipo de equipamento, não tive esse privilégio. Desse modo, da maneira que vi, a segunda incursão de Robert Zemeckis na técnica de animação conhecida como performance capture - a primeira havia sido O EXPRESSO POLAR (2004) - me pareceu uma aventura apenas mediana. Obviamente, houve progresso em relação ao trabalho anterior do diretor nos aspectos técnicos, mas o que mais me interessou no filme foi o enredo, passado na Dinamarca medieval e que lida com guerreiros bárbaros lutando contra monstros marinhos e dragões. Não que eu seja fã desse tipo de aventura medieval e fantástica, mas por ser "Beowulf" a mais antiga obra de ficção em língua inglesa e como não havia visto nenhuma adaptação para o cinema do tal poema épico, me pareceu uma oportunidade interessante, embora eu não saiba o quanto foi modificado em relação ao texto original. Sem falar que eu acho interessante ver esse período da história em que as sociedades ocidentais começaram a se desfazer de seus deuses e de suas crenças "pagãs" para aderir ao crescente Cristianismo.

Na trama, Beowulf (Ray Winstone) é um forte guerreiro que chega a um reino para eliminar Grendel, um monstro que aterroriza e mata o povo local. A primeira seqüência do filme é memorável. Anthony Hopkins, o rei, é recebido com alegria para uma grande festa, com direito a banquete e orgia. O barulho da festa atormenta o monstro, parecido com o Gollum de O SENHOR DOS ANÉIS, só que bem mais feio (se é que isso é possível) e de estatura gigantesca. Muito boa a tomada que vai do local da festa até a floresta onde habita a tal criatura. Ele arromba a porta do lugar e mata várias pessoas. E só vai embora quando é confrontado pelo rei, com quem tem uma aparente relação de respeito. Mais tarde saberemos o porquê disso. Depois dessa chacina, chega Beowulf, que numa atitude de coragem - e também de vaidade e exibicionismo - tira toda a sua roupa para lutar contra o monstro peladão. Engraçado os recursos que o filme utiliza para esconder os órgãos genitais do bravo guerreiro.

Com roteiro de Neil Gaiman (ele está cada vez mais se enturmando com o pessoal de Hollywood) e Roger Avary, o filme tem seqüências bem sangrentas. Diria que se não tivesse sido realizado como uma animação, provavelmente receberia uma censura 18 anos por aqui e um NC-17 nos Estados Unidos. Há ainda a nudez da personagem de Angelina Jolie, a verdadeira vilã da estória, uma espécie de bruxa, mãe de Grendel, cujo corpo perfeito e voz suave encanta a quem se aproxima, apesar daquele enorme rabo de capeta. Engraçado ver Jolie com um corpo tão perfeito logo num momento em que ela aparece na mídia (revistas de fofoca, principalmente) com aspecto quase cadavérico, de tão magra e cheia de pelancas que está. Há boatos que dizem que ela está com uma doença grave, outros dizem que é anorexia. Se continuar desse jeito, Brad Pitt vai acabar caindo fora do barco.

terça-feira, dezembro 04, 2007

A COLECIONADORA (La Collectionneuse)



Mais um Rohmer visto, dessa vez da série "Seis Contos Morais". É o segundo filme desse ciclo do diretor que vejo. Vi O JOELHO DE CLAIRE (1970) e adorei. Considero um dos melhores de sua carreira, mas a julgar por este A COLECIONADORA (1967) e o supracitado, ao que parece, os filmes desse ciclo não têm a mesma leveza dos filmes dos ciclos "Comédias e Provérbios" e "As Quatro Estações" que Eric Rohmer realizou posteriormente. Tanto O JOELHO DE CLAIRE quanto A COLECIONADORA têm um ritmo todo próprio e lidam com homens metidos a gostosões e com um ar blasé de dândis ingleses, que se vêem apaixonados ou obcecados por uma jovem. Mas falemos apenas desse A COLECIONADORA, que aparentemente parece ser um filme menor de Eric Rohmer. O que não quer dizer que não seja uma obra prazerosa e com aquele toque característico do diretor, com a sua verborragia inteligente e inconfundível, como a do começo do filme, com personagens falando sobre o conceito de beleza e sobre uma certa aversão à feiúra.

No filme, Adrien (Patrick Bauchau) é um sujeito que não faz nada da vida. É mais ou menos como o personagem de Hugh Grant em O GRANDE GAROTO, só que Adrien sente um prazer maior pelo ócio, ele não pensa em produzir ou fazer nada. Não trabalhar é um luxo que ele gosta e ele faz questão de se vangloriar disso. Adrien é também um sujeito arrogante e com amizades bastante reservadas. Na casa do amigo onde ele está passando uma temporada, aparece uma jovem de nome Haydee (Haydée Politoff), que a julgar pela quantidade de rapazes que ela leva pra cama, deve ser uma garotinha bem vulgar. Tanto que no início ele nem faz questão de se aproximar da jovem. Só mais tarde, é que a sua aproximação com a moça vai transformando o sentimento de quase repulsa em atração, obsessão até. Mas seu lado racional e cínico faz com que ele cometa atos que nem ele mesmo entende ou aceita, como entregar a menina nas mãos de um de seus colegas colecionadores de antigüidades, que ele nem gosta muito. Talvez para mostrar pra ela que ele não sente nada por ela ou não tem ciúme algum.

O filme preserva um certo mistério de Haydee, ao nos oferecer apenas o ponto de vista de Adrien. Embora ele não seja um personagem exatamente amável ou de fácil identificação por sua persona arrogante, não temos outro a quem nos apegar a não ser ele. E quem também já se arrependeu, ao cometer determinados atos em relacionamentos, tem motivos para uma maior aproximação com o personagem. Principalmente na seqüência final, quando o personagem, depois de ter experimentado a paz de estar sozinho e relativamente contente com seus passeios solitários e seus banhos de rio, fica sabendo o que é sentir a falta de alguém, de sentir aquela dor no peito pela falta de uma pessoa, como se o corpo estivesse intoxicado. Claro que nada como o tempo para curar esses pequenos males do coração, mas como dizem também que o tempo não existe, é uma ilusão, aquela sensação ruim, enquanto dura, parece que vai durar pra sempre.

segunda-feira, dezembro 03, 2007

FAMÍLIA SOPRANO - A PRIMEIRA TEMPORADA COMPLETA (The Sopranos - The Complete First Season)



A semana foi fraca de filmes. Não vi as principais estréias devido ao trabalho e ao cansaço, não vi nenhum filme do festival de cinema francês e o saldo semanal foi de apenas dois títulos: um no cinema, outro na televisão. Pelo menos consegui, finalmente, terminar de ver a primeira temporada de FAMÍLIA SOPRANO (1999). Provavalmente por causa da repercussão entusiasmada dos fãs, criando em mim uma grande expectativa, acabei me decepcionando um pouco com a primeira temporada dessa que é considerada por muitos a melhor série já produzida pela televisão americana. Já estou com a segunda temporada toda completa em casa me esperando, mas sinceramente duvido muito que vá gostar de FAMÍLIA SOPRANO tanto quanto gostei de A SETE PALMOS. Talvez o fato de eu tê-la assistido em esquema de revezamento com outras séries (BIG LOVE, DEXTER, PRISON BREAK, HOUSE, THE OFFICE) tenha prejudicado um pouco a apreciação. Por isso, vou deixar pra ver a segunda só quando tiver terminado de ver as outras, para ver se eu me envolvo um pouco mais com os personagens, vendo os episódios em seqüência.

Acredito que envolvimento é essencial em se tratando de séries. Por isso, uma temporada de apenas 13 episódios, sendo a maioria deles centrado quase que exclusivamente em Tony Soprano (James Gandolfini), talvez não seja suficiente para uma maior aproximação entre espectador e personagens. E como a maioria deles são mafiosos que escondem seu "verdadeiro eu" em personas agressivas típicas da máfia italiana, fica faltando um outro elo de identificação ou de empatia com o espectador que não seja Tony. Das mulheres, duas se destacam: Carmela Soprano (Edie Falco), a esposa de Tony, e a sexy psiquiatra Dra. Jennifer Melfi, interpretada por Lorraine Bracco. Há também a velha, a mãe de Tony, que ele tenta tratar com carinho, mas que depois mostra não ser flor que se cheire. Há também um velho vaidoso que quer ser o chefão, o Tio Junior. Mal sabe ele que Tony está apenas o usando como bode expiatório.

Quanto aos episódios mais memoráveis, eu destacaria aquele em que Tony viaja com sua filha, Meadow, e acaba encontrando um antigo desafeto pelo caminho e mostrando que ele é capaz de fazer com as próprias mãos os "serviços" que ele normalmente manda os seus capangas desempenharem. Aliás, Tony Soprano, aos poucos vai se mostrando um personagem cada vez mais fascinante, até pela sua fragilidade mais ou menos assumida - pelo menos ele teve coragem de consultar um psiquiatra para resolver os seus ataques de pânico. Logo, FAMÍLIA SOPRANO seria OS BONS COMPANHEIROS da geração Prozac, embora as tradições que eles carreguem tenham ficado meio que estacionadas na década de 50. Tio Junior, por exemplo, fica puto quando a sua amante começa a espalhar por aí que ele pratica sexo oral nela. Para ele, isso é motivo de vergonha. Lá pelo final da temporada, a série vai ganhando ares de tragédia shakesperiana, com membros da própria família sendo mandantes ou suspeitos de matar os outros. Apesar de ter gostado, aguardo melhoras nas próximas temporadas.

sábado, dezembro 01, 2007

GARÇONETE (Waitress)



Estava falando agora há pouco com uma amiga minha por telefone sobre ser feliz, sobre felicidades, sobre se somos felizes, e juntos concordamos que a maior parte da humanidade está feliz se estiver bem dentro do campo afetivo. Não adianta ter muito dinheiro no banco e um emprego dos sonhos se você não está do lado da pessoa que ama. E imagino também que casar com a pessoa errada e odiar o homem - como no caso do filme - ou a mulher com quem você divide a mesma cama deve ser uma tortura. Aí, nesse caso, encaixa-se perfeitamente o título nacional do mais recente filme dos Farrellys: "antes só do que mal casado." E assim vive a garçonete interpretada por Keri Russell em GARÇONETE (2007), último trabalho na direção de Adrienne Shelly, morta prematuramente, vítima de homicídio. O corpo de Shelly foi encontrado pelo seu marido, enforcada com seus próprios lençóis no banheiro de seu apartamento. Inicialmente, acreditava-se que havia sido suicídio, mas depois o assassino confessou o crime.

Voltando ao filme, Keri Russell (bela como sempre) é uma garçonete infeliz com o seu marido, que é realmente um "filho da puta". O ator que o interpreta é o irmão psicótico da Brenda (Jeremy Sisto), da série A SETE PALMOS. Ele é agressivo e não tem a menor sensibilidade ou intenção de agradar a esposa, que acaba fazendo todos os seus desejos e abdicando de suas vontades por puro medo. E agora ela está grávida e odeia estar grávida de um homem que ela odeia. As coisas mudam um pouco para o seu lado quando ela se consulta com um ginecologista (Nathan Fillion), que também é casado, mas que fica apaixonado por ela. E rola uma atração muito forte entre os dois. E, apesar de ser uma relação proibida e perigosa, isso passa a tornar a vida de Jenna (é o nome dela no filme) muito mais interessante e feliz. Há também os casos de amor de suas duas colegas de lanchonete, mas isso serve mais para rechear um pouco o filme e não concentrar apenas numa única personagem.

E por falar em recheio, como a protagonista é uma especialista em tortas, ela sempre imagina receitas de tortas para cada ocasião de sua vida. E isso é uma das coisas que diferem GARÇONETE das atuais comédias românticas e dos vários filmes que lidam com o sentido do paladar, com a arte da culinária. No caso dos americanos, parece que eles se especiliarizam mesmo foi em tortas, bolos, donuts e coisas do tipo. Isso me lembra muito o Agente Cooper em TWIN PEAKS tendo quase que orgasmos ao experimentar as guloseimas da cidade. E já que estamos nesse plano onde os sentidos desempenham um papel tão importante e tão ligados ao prazer, nada como aproveitar e sentir o gosto de uma torta bem gostosa. Se bem que com essa ditadura do peso que existe hoje em dia, os sentimentos de culpa acabam se acumulando e o prazer tem que ser bem comedido.

quarta-feira, novembro 28, 2007

MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (Coeurs / Cœurs)



Decepções amorosas, seguidas de novas esperanças, seguidas de novas decepções fazem parte da vida. E mesmo assim, é comum nos apegarmos à esperança de um novo amor. E quando isso acontece pensamos: agora vai! Só que nem sempre o resultado é positivo. E essa série de frustrações vai se acumulando e fazendo com que as pessoas se tornem com freqüência amargas, retraídas ou preferindo se isolar do mundo exterior. Esse filme de Alain Resnais trata dessas pessoas. Eu poderia fazer uma comparação - um pouco ruim, já adianto -, dizendo que MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS (2006) seria um negativo de SIMPLESMENTE AMOR, aquela comédia romântica onde quase todo mundo termina feliz e que serve para aquecer um pouco os nosso corações, muitas vezes carentes de afeto na época natalina, que coincide com o inverno no hemisfério norte - o que deve piorar ainda mais o sentimento de solidão nessa época do ano. O filme de Alain Resnais, ao contrário de SIMPLESMENTE AMOR, é frio como a neve que cai constantemente no inverno parisiense. E diferente do filme americano, a obra de Resnais contém bem menos personagens principais (apenas seis). Talvez se fossem mais, Resnais não teria conseguido dar a profundidade necessária para o sucesso de seu trabalho. Se bem que eu falo sucesso, mas por mais que eu respeite o seu trabalho, em momento algum eu me senti na pele ou sensibilizado de verdade com os problemas e as dores desses seis personagens.

Aviso, desde já, que sou um leigo na obra de Alain Resnais. O único filme do diretor que eu vi foi o essencial HIROSHIMA, MEU AMOR (1959), mas já faz muito tempo, e eu não tinha maturidade suficiente para assistí-lo. Portanto, não tenho familiaridade com o seu universo e não sei o quanto de seu estilo ou de seus traços autorais se apresentam nesse novo filme, adaptado da peça “Private Fears in Public Places”, do inglês Alan Ackynbourn. Talvez a minha tendência a não gostar muito de adaptações de peças teatrais para o cinema tenha contribuído um pouco para o fato de eu não ter me juntado ao grupo dos adoradores do filme.

Em MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS, como já disse, temos seis personagens, todos eles, almas solitárias, em busca de afeto, ou ao menos de companhia. Logo no início, conhecemos um senhor idoso e corretor de imóveis, mostrando um apartamento para uma jovem mulher. Ele mora sozinho com a irmã mais nova, também solitária, e que finge que sai com as amigas, quando na verdade vai até um barzinho com uma rosa na lapela, sozinha, à procura de alguém, um encontro às cegas (blind date), que dificilmente funciona. Quanto à mulher que procurava o apartamento, ela está tendo problemas com o seu atual companheiro, um sujeito que está desempregado e que passa os dias dormindo ou bebendo. Completando o mosaico, temos a secretária do agente imobiliário, que por trás de sua fachada de beata (ou evangélica), se esconde uma mulher que gosta de se fantasiar de stripper e de gravar suas performances em fita. Tem também um senhor que trabalha como barman num hotel e que cuida do pai, moribundo.

Claro que em se tratando de um diretor como Resnais, o filme não é apenas enredo, estória. Há os detalhes na construção dos ambientes, nos discretos movimentos de câmera e na maneira como ele nos mostra o quanto o mundo pode ser frio, mesmo no aconchego de um apartamento com aquecedor de ambiente, em especial na cena do diálogo entre o barman e a secretária, com a neve caindo em cima deles como se eles estivessem do lado de fora.

terça-feira, novembro 27, 2007

HONKYTONK MAN



E finalmente consegui ver HONKYTONK MAN (1982), tão famoso entre os cinéfilos mais antenados, dentro da filmografia de Clint Eastwood. E uma coisa que eu mais notei foi a semelhança desse filme com o meu favorito do diretor, UM MUNDO PERFEITO (1993). Ambos mostram crianças aprendendo a lidar com a vida, seguindo os passos de um homem rebelde, um sujeito um pouco avesso às convenções sociais. Não que o cantor de música country interpretado pelo próprio Clint Eastwood seja um crimonoso como o protagonista do filme de 93, mas alguém um pouco mais moralista obviamente não o consideraria um modelo ideal de figura paterna para a formação de uma criança. Roubar galinhas, beber muito e resistir a um tratamento médico de tuberculose crônica não é bem um exemplo a se seguir, alguns diriam. Mesmo assim, o sobrinho do honkytonk man Red Stoval, interpretado por um dos filhos de Clint, Kyle Eastwood, tem um respeito e uma fascinação por esse homem que se recusa a seguir às tradições e a permanecer em seu lugar de origem, como os seus pais, para alcançar o sonho de vencer o Gran’Ole Opry, um concurso de música country de Nashville. O garoto também não quer passar o resto da vida recolhendo algodão numa fazenda empoeirada e decadente em Oklahoma e vê a chance de seguir o tio como uma oportunidade de ouro. A estória se passa nos anos 30, durante a Grande Depressão e isso acentua o clima de melancolia que perpassa toda a obra.

O gosto do diretor por personagens rebeldes e uma mórbida atração pela tragédia humana está presente de maneira forte em HONKYTONK MAN, tornando o filme, talvez, o mais arquetípico e sintetizador de toda sua obra. Além do exemplo do supracitado UM MUNDO PERFEITO, lembremos também dos velhos astronautas de COWBOYS DO ESPAÇO (2000) e dos militares japoneses do recente CARTAS DE IWO JIMA (2006). Se a vida é curta, principalmente para quem está com os pulmões corroídos pela tuberculose e mal consegue cantar uma canção inteira sem tossir sangue, ela é para ser aproveitada ao máximo. Vendo a cena de Clint se esforçando para cantar e deixar o seu legado em disco, não pude deixar de me lembrar de Renato Russo gravando o seu disco testamento, "A Tempestade", também em condições físicas e emocionais extremamente delicadas.

Quanto à comparação com o cinema de John Ford, HONKYTONK MAN estaria mais próximo dos filmes que Ford fez sobre a Grande Depressão, no início dos anos 40, como VINHAS DA IRA, COMO ERA VERDE O MEU VALE e CAMINHO ÁSPERO. Mas uma coisa que não pode deixar de ser mencionada em relação a HONKYTONK MAN é a música e o seu poder de - assim como o cinema, a literatura e as artes em geral - de representar o espírito da época e de eternizar os sentimentos e pensamentos de quem compõe ou canta. No caso da música do filme, em particular, ela fala de amores perdidos, ou deixa nas entrelinhas, pelo menos, depois que ficamos sabendo, ainda que de maneira superficial, da mulher que Red Stovall amou no passado, na cena em que seu sobrinho lhe pergunta se ele um dia já foi casado. E por mais que essa melancolia esteja presente em praticamente o filme inteiro, até mesmo nas seqüências que se pretendem cômicas, como no roubar galinhas ou em ser perseguido por um touro, o filme mal nos dá tempo para chorar. E esse é o jeito rústico e fordiano de ser de Clint Eastwood em toda a sua glória.

segunda-feira, novembro 26, 2007

O PASSADO (El Pasado)



Os últimos dias estão sendo difíceis em todas as áreas da minha vida. Aliás, o ano de 2007 está, como bem disse o Marcelo V. em alguma caixa de comentário da blogosfera, muito "estranho", pra não usar um adjetivo negativo. Quero sempre acreditar que tudo que acontece com a gente, por mais doloroso que seja, seja um mal necessário para um final feliz. E por falar em dor, o que é que dói mais do que o amor, que já até compararam com dor de dente? E quantas vezes eu mesmo não quis fugir desse sentimento, embora nos dias atuais ande querendo entrar de cabeça nesse "negócio"? Acho que porque percebi que no fim das contas o amor e os relacionamentos acabam sendo muito mais importantes em nossa memória do que qualquer outra coisa, além de ser também fundamental para o nosso bem estar físico e espiritual.

O PASSADO (2007) mostra as conseqüências do fim de um casamento na vida de Rímini (Gael García Bernal), um jovem tradutor. Depois de 12 anos casado com Sofia (Analía Couceyro), sua primeira namorada, eles terminam o relacionamento. A separação é tranqüila, pelo menos até onde é mostrado no filme, mas Sofia insiste em manter contato com o ex-marido, principalmente quando ele começa um relacionamento com uma modelo fotográfica um tanto quanto possessiva e mais adiante com outra mulher. Ele faz de tudo para evitá-la, mas ela sempre aparece para perturbá-lo, como um fantasma. Para Rímini, o passado é como um cadáver enterrado e esquecido, deixado para trás. Para Sofia, Rímini ainda é o homem de sua vida.

O filme é angustiante - eu fiquei com um aperto no peito durante toda a projeção - e por mais que eu goste do outro filme argentino de Hector Babenco - CORAÇÃO ILUMINADO (1996) -, acredito que O PASSADO é ainda mais incômodo e perturbador, até por ser menos enigmático que o supracitado, por não ser cheio de metáforas. Ambos os filmes são extremamente pessoais para o diretor. Se CORAÇÃO ILUMINADO serviu para exorcizar o período em que ele quase morreu de leucemia, O PASSADO também tem relação com sua vida particular. Numa entrevista, o diretor comentou ter vivido recentemente uma situação semelhante: "Em março me separei de minha mulher e percebi que ainda tinha suas fotos em minha casa. Senti a necessidade de jogá-las fora. Ou seja, a vida real estava imitando meu filme", afirmou Babenco. A clara referência à obra de Victor Hugo, "A História de Adèle H.", me fez ficar ainda mais interessado em assistir a adaptação homônima de François Truffaut.

O PASSADO é talvez o mais pesado, mais denso, filme sobre separação já produzido. A seqüência da separação das fotos pelo casal é uma das mais belas da carreira multi-nacional do cineasta. Não que o filme não tenha outras seqüências também bastante marcantes. É que contar mais pode estragar a surpresa de quem ainda não viu o filme, que também conta com a última participação de Paulo Autran no cinema, já com uma aparência bastante debilitada. Além do mais, o filme mostra o poder da mulher numa relação. A mulher já nasce com essa tendência de organizar e de manter as relações, desde criança, brincando de boneca, tendo, portanto, uma tendência a ter mais poder numa relação. Já o homem costuma evitar o famoso "discutir relações", talvez por ser mais imaturo nesse sentido e é aí que a mulher se aproveita. Claro que o fato de que quem ama mais dentro de uma relação também contribui para o peso de quem tem mais "poder". Quem ama mais é sempre o mais fragilizado, o mais preocupado com o possível fim de um relacionamento e quem sofre mais no final.

Top 5 Babenco:

1. BRINCANDO NOS CAMPOS DO SENHOR (1991)
2. CARANDIRU (2003)
3. O PASSADO
4. PIXOTE: A LEI DO MAIS FRACO (1981)
5. CORAÇÃO ILUMINADO

Filme fundamental de Babenco ainda não visto: LÚCIO FLÁVIO, O PASSAGEIRO DA AGONIA (1977).

quinta-feira, novembro 22, 2007

O GATO PRETO (The Black Cat)



Aproveitando a oportunidade que eu tive de baixar uma cópia deste O GATO PRETO (1934), da série de filmes de terror da Universal dos anos 30, resolvi assistí-lo antes de ver A NOIVA DE FRANKENSTEIN, por razões cronológicas. Sem falar que quando eu for ver A NOIVA... vou querer ver também logo depois os extras e os comentários em áudio, o que necessitaria de mais tempo disponível. E tempo para o lazer é uma coisa que anda faltando pra mim. O que tenho feito mesmo é trabalhar. Sorte que esses dias estão menos conturbados e pelo menos estou conseguindo atualizar o blog no horário do almoço.

Mas não é apenas por ser um terror da Universal que O GATO PRETO me atraiu. Existem pelo menos outras três razões: 1) foi o primeiro filme em que os dois "monstros sagrados" da Universal, Bela Lugosi e Boris Karloff, trabalharam juntos; 2) o filme foi dirigido por um mestre do cinema B: Edgar G. Ulmer; e 3) seria mais uma adaptação da famosa obra de Edgar Alan Poe que eu passaria a conhecer. Acontece que o filme não tem nada a ver com o conto de Poe. O nome do escritor aparece nos créditos provavelmente por pura picaretagem. Se por um lado, eu fiquei desapontado, por outro, havia a vantagem de assistir uma estória totalmente nova, original, ainda que, no final, o filme em si não tenha me agradado tanto. Quanto a um gato preto, pelo menos tem um no castelo do personagem de Karloff. E o bichano aparece umas duas ou três vezes.

A estória parece ter sido criada meio que "na coxas", mas Ulmer conseguiu se virar muito bem com o material que dispunha. Na trama, jovem casal americano em lua-de-mel na Hungria conhece um estranho (Bela Lugosi) num trem (ou seria um ônibus?, não lembro bem). Em certo momento, acontece um acidente e o motorista morre. Como eles já estavam perto da casa onde Lugosi ficaria, eles aceitam ir a pé até o castelo onde o personagem de Lugosi ficaria para se acomodarem por lá durante uma noite. O tal castelo, construído em cima de um campo de batalha, pertence ao personagem de Karloff, cujo grande hobbie é matar e colecionar corpos, que ficam imóveis feito estátuas em redomas de vidro, escondidos numa sala secreta em seu castelo. Logo, o casal estaria correndo grande perigo naquele lugar.

O filme tem o mesmo espírito das tradicionais produções de horror da Universal daquele período, inclusive, com direito àquela mesma música romântica que abriu filmes como A MÚMIA nos créditos de abertura. Quanto aos dois astros rivais, lendo a entrevista de Edgar G. Ulmer no livro "Afinal, quem faz os filmes", o cineasta conta que gostou muito de Karloff, que era um sujeito de muito bom humor. Já Lugosi, segundo ele, dava muito trabalho, sendo necessário mantê-lo sempre na linha pra ele não exagerar muito na dramatização. Lembro que em ED WOOD, de Tim Burton, Lugosi era mostrado não apenas como um velho decadente, mas Burton também escancara a inveja que ele tinha de Karloff. Lugosi era revoltado, achava-se um ator muito melhor, dizia que Karloff só sabia grunhir, devido às várias vezes em que o astro interpretou a criatura de Frankenstein.

Um dos maiores méritos de O GATO PRETO se deve ao seu visual, influenciado pelo expressionismo alemão. O filme é muito rico no uso das sombras. Na entrevista, Ulmer conta que a força visual do filme se deve ao período em que ele freqüentou a Bauhaus, a escola de design, arquitetura e artes que funcionou na Alemanha, do final da década de 1910 ao início dos anos 30. Apesar de seus méritos, a melhor fase de Ulmer aconteceria mesmo nos anos 40, quando ele faria obras-primas do cinema noir como CURVA DO DESTINO (1946).

quarta-feira, novembro 21, 2007

TRÊS CURTAS



Acho difícil avaliar curtas-metragens. Talvez pela curta duração, vários deles necessitem de revisões para que suas qualidades sejam melhor apreciadas e detalhes que passam desapercebidos sejam notados. O destaque desse post é, sem dúvida, AMOR SÓ DE MÃE (foto), mas o curta do Balagueró também é muito legal.

AMOR SÓ DE MÃE

Esse é um filme que sempre ansiava assistir, desde as notícias das primeiras repercussões, nos bons tempos de atividade da lista de discussão Canibal Holocausto. Esperava que um dia o filme passasse numa daquelas sessões de curtas patrocinadas pela Petrobrás, mas infelizmente não rolou. E talvez por causa de toda essa expectativa, talvez por isso, eu tenha me decepcionado um pouco. Gostei muito de NOCTURNU (1998), o primeiro curta de Dennison Ramalho, que recentemente co-escreveu o novo filme do Mojica, A ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO, e fiquei feliz ao ver disponibilizada na internet uma cópia em divx em excelente qualidade e com direito a áudio-extra, trazendo comentários (em inglês) de Ramalho e de André Kapel, técnico responsável pelos efeitos visuais, de maquiagem etc. Ainda assim, apesar dessa pequena decepção, que se deve também ao pouco impacto que eu senti vendo o filme, é inegável o talento de Ramalho com as imagens, fotografadas com capricho pelo craque José Roberto Eliezer, e com a construção de uma atmosfera sinistra. Junte-se a isso, o auxílio valioso de Débora Muniz, atriz que trabalhou em vários filmes pornôs da Boca do Lixo, e de Everaldo Pontes (o São Jerônimo no filme homônimo de Julio Bressane). AMOR SÓ DE MÃE (2003) conta a trágica estória de um homem que vive dividido entre ter que cuidar de sua mãe idosa e católica fervorosa e sua paixão pela prostituta Formosa, que lhe dá um ultimato: ou ele abandona a mãe e vai com ela pra longe daquele lugar ou ela o deixa. Por influências maléficas (demônios, macumba?), ele é levado a matar a própria mãe. Do jeito que é mostrado, com direito a seqüências gore e muito sangue, o filme não é recomendado para todas as audiências. Mas se a intenção de Ramalho é também chocar ou dar uma chacoalada no cinema brasileiro, ele foi bem sucedido. Perfeita a cena de Formosa toda banhada em sangue andando de maneira esquisita. No áudio, Ramalho explica que essa cena foi filmada "de trás pra frente", daí ter ficado tão sinistra. Soube através do blog do Leandro Caraça que Dennison Ramalho está com um longa-metragem "na agulha", baseado numa obra de Lourenço Mutarelli (O CHEIRO DO RALO). Aliás, foi lá do blog do Leandro que eu baixei o arquivo em divx. Aproveitem enquanto o link ainda está funcionando e confiram AMOR SÓ DE MÃE!

VISTA A MINHA PELE

Joel Zito Araújo, diretor de FILHAS DO VENTO (2005) e A NEGAÇÃO DO BRASIL (2000), parece ter a intenção de ser o Spike Lee brasileiro. Pelo menos, no sentido de querer tocar na ferida do preconceito racial no Brasil. Não vi os seus longas, mas a julgar por VISTA A MINHA PELE (2003), curta institucional educativo que ele fez e que está sendo exibido nas escolas com o objetivo de provocar a discussão sobre racismo e preconceito, não levo muita fé em seu trabalho. Vi o filme na escola em que trabalho e ele mostra uma realidade alternativa. Como seria se os papéis dos brancos e dos negros fossem invertidos na história da sociedade brasileira? É mais um trabalho para discutir em escolas mesmo. A idéia nem é tão original assim, já que existe um filme americano, A COR DA FÚRIA (1995), que já havia mostrado um mundo em que os negros são os privilegiados e os brancos são os discriminados e de posição social inferior. Pena que ficou muito parecido com MALHAÇÃO. :(

DÍAS SIN LUZ

Segundo curta-metragem do catalão Jaume Balagueró, DÍAS SIN LUZ (1995) consegue em apenas oito minutos construir imagens poderosas. Até pela curta duração, o filme é para ser revisto para ser melhor assimilidado. É como se Balagueró tivesse centenas de idéias e quisesse colocar tudo num único curta. Sou interessado na obra do diretor desde A SÉTIMA VÍTIMA (2002), e estou me preparando para ver qualquer dia desses FRAGILE (2005), um de seus últimos trabalhos. O filme é narrado pelo personagem principal, que conta do dia em nasceu, numa noite de intensa tempestade. Ele perdeu os seus pais ainda cedo e foi criado por um casal praticante de sadomasoquismo. Ele era freqüentemente torturado e a sua madrasta vestia roupa preta de dominatrix(!). Depois, vemos imagens dele adulto, numa cena bem produzida na qual ele corta o próprio braço, infestado e destruído por uma espécie de vírus. O curta teria tudo pra se transformar num longa dos bons. Quem sabe um dia, Balagueró resolva estendê-lo. Nacho Cerdà foi produtor do curta.

terça-feira, novembro 20, 2007

CRIMES DE AUTOR (Roman de Gare)



Com quase cinqüenta títulos nas costas, Claude Lelouch não desfruta do mesmo prestígio de alguns de seus colegas contemporâneos e conterrâneos. Mesmo assim, ganhou uma retrospectiva de oito filmes na última edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, tendo conquistado alguns fãs, como o Michel e a Alê, por exemplo. Como sou totalmente leigo no cinema de Lelouch - não vi nem mesmo o famoso UM HOMEM, UMA MULHER (1966)-, minha porta de entrada pelos seus filmes foi com o seu trabalho mais recente, CRIMES DE AUTOR (2007), que assisti em cópia digital no último domingo no Espaço Unibanco Dragão do Mar. A vantagem da instalação desse equipamento digital aqui na cidade é a possibilidade de ter filmes mais alternativos como esse estreando às vezes simultaneamente com o circuito paulista. Mas sem querer reclamar e já reclamando, achei que o filme ficou um pouco escuro nesse tipo de exibição. Mas tudo bem. Deu pra curtir assim mesmo, já que a trama é intrigante o suficiente para manter o espectador interessado até o final.

A primeira personagem de CRIMES DE AUTOR que conhecemos é a escritora de best-sellers Judith Ralitzer, interpretada por Fanny Ardant. Ela é uma das convidadas de um programa de entrevista. Logo em seguida ficamos sabendo que um perigoso assassino serial fugiu da prisão. Seu modus operandi é fazer sempre uma mágica, um truque, momentos antes de dar cabo de sua vítima. Dentro de um carro, numa noite chuvosa, um casal briga. Depois da briga, ele a abandona num posto de gasolina. Ela (Audrey Dana) fica desesperada e chorando e encontra um sujeito cabeçudo e suspeito, cujas descrições batem com a do assassino serial procurado pela polícia. Bom, pelo menos, ele fica fazendo truques de mágica na Loja de Conveniência. Ele oferece carona à ela. Ficamos esperando sempre o pior, mas um dos maiores méritos do filme é contrariar todas as nossas expectativas. Por isso, é bom ver CRIMES DE AUTOR sem saber ou ler nada sobre o filme.

Eu diria que o que eu menos gostei foi da segunda parte, onde a escritora interpretada por Fanny Ardant mais aparece. Não que eu não goste da atriz, longe disso, só acho que um vez que descobrimos quem realmente é o personagem de Dominique Pilon, o filme perde um pouco da graça, do mistério e do suspense. Sem falar que eu adorei a personagem de Audrey Dana, a tal moça abandonada pelo noivo no posto de gasolina. Pra mim, o melhor do filme está no meio, no momento em que o então misterioso Dominique Pilon se instala na casa da família de Audrey. E por mais que o final seja bem bolado, Pilon é feio demais para fazer par romântico com Audrey. Pra mim, isso quase estragou o que poderia ser um filme quase perfeito. Acho que eu não fui com a cara do ator, foi isso.

P.S.: Já está no ar a Zingu! de novembro, que conta como destaque o dossiê do crítico Paulo Perdigão - de quem nunca ouvi falar. Merece destaque um artigo do amigo e especialista em "western feijoada" Rodrigo Pereira, um dos autores do livro sobre Anthony Steffen. O artigo, dividido em duas partes, intitula-se "Faroestes Made in Brazil". Tem outras coisas legais na revista pra conferir. Mas o que eu mais recebi com alegria foi a sessão Musas Eternas, onde Matheus Trunk homenageia a adorável Denise Dumont. Ah, que saudade que eu tenho dos filmes em que ela aparecia. E até hoje não esqueci da câmera subjetiva de Khouri se aproximando de seu corpo nu em EROS, O DEUS DO AMOR. Valeu, Matheus!!

segunda-feira, novembro 19, 2007

OS DONOS DA NOITE (We Own the Night)



Interessante como muitas vezes o início de um filme já nos conquista de imediato. Claro que há filmes que começam muito bem e perdem o rumo lá pelo meio, mas a cena inicial de OS DONOS DA NOITE (2007), o novo trabalho de James Gray, com a sensualíssima Eva Mendes masturbando-se para o namorado (Joaquin Phoenix) ao som de "Heart of Glass", do Blondie, é de mexer com o coração até do mais insensível dos homens. (Aliás, vale lembrar que essa canção foi muito bem utilizada num comercial recente de televisão que David Lynch dirigiu para a Gucci e que está no youtube para quem quiser conferir.) A inclusão da canção também serve para nos situar temporalmente, embora a data e o lugar já tenham sido destacados logo no início.

Estamos em Nova York no ano de 1988 e Joaquin Phoenix é Bobby Green, gerente de um clube noturno que, como era comum na época, aceitava com facilidade o consumo de cocaína e outras drogas. A princípio, há uma certa semelhança com O PAGAMENTO FINAL, de Brian De Palma, por causa do clube noturno e da ambientação, mas aos poucos notaremos que o OS DONOS DA NOITE tem cara própria. Principalmente a partir do momento em que ficamos conhecendo a família de Bobby Green, tradicionalmente ligada à polícia de Nova York. Seu pai (Robert Duvall) é um respeitado chefe de polícia e seu irmão (Mark Wahlbergh) acabou de ser condecorado capitão da instituição. Muitos policiais estão sendo assassinados pela máfia russa e o pai e o irmão de Bobby pede a ele uma ajuda no sentido de destruir os planos dos líderes da quadrilha de traficantes. Como ovelha negra da família e preferindo manter distância dos assuntos da polícia, por razões óbvias, já que ele também é consumidor de drogas, Bobby nega o apoio nessa missão. A coisa começa a mudar de figura quando seu irmão sofre um atentado dos mafiosos.

OS DONOS DA NOITE é um sopro de alívio dentro dos dramas policiais que recentemente vêm sofrendo de uma mediocridade sem precendentes na história do cinema, perdendo feio para os seriados televisivos policiais. James Gray comete o tipo de filme que faz com que os estudiosos de cinema passem a querer reavaliar a sua obra de tão impactante que foi o seu trabalho. Seria James Gray um cineasta realmente subestimado pela crítica? Seus filmes carregariam uma autoralidade? Pelo visto, esse é o momento ideal para fazer essa reavaliação. Mas o que há de tão bom assim nesse novo filme que mexeu de tal maneira com as estruturas da crítica e dos cinéfilos?

Além de ser um eletrizante drama policial, o filme trabalha as emoções de seus personagens, em especial de Bobby Green, interpretado magistralmente pelo cada vez melhor Joaquin Phoenix. E além de possuir seqüências de alta combustão, como a da perseguição de carros, de deixar a gente com o coração na mão, o filme é ao mesmo tempo intimista, cheio de sutilezas na construção dos personagens e suas relações. Eva Mendes talvez nunca tenha encontrado um papel tão bom em sua carreira e Mark Walhberg nunca esteve tão bem nas telas. Além do mais, a presença do veterano Robert Duvall, ator que esteve presente numa das mais importantes e "mágicas" cenas da história do cinema - refiro-me à cena da "revelação" de Michael Corleone em O PODEROSO CHEFÃO -, sua presença funciona como um aval, como uma maneira simbólica de mostrar aos mais céticos que OS DONOS DA NOITE é cinema excepcional. E apesar de o filme terminar de uma maneira um pouco estranha e anticlimática, o que fica mais forte em nossa memória é a perseguição de carros na chuva, o som dos limpadores de vidro e o desespero de um filho.