segunda-feira, fevereiro 25, 2019

OSCAR 2019

Para um Oscar com poucos indicados ótimos dentre os oito da categoria principal, até que a festa se mostrou boa, com alguns momentos memoráveis, como a premiação a Spike Lee pelo excelente INFILTRADO NA KLAN. Ainda que tenha sido na categoria de roteiro adaptado, a alegria foi muito maior, com Lee subindo nos braços do amigo Samuel L. Jackson. A comemoração foi muito maior do que quando Alfonso Cuarón subiu para receber a estatueta de melhor direção por ROMA. Sem falar que o discurso de Lee foi o melhor da noite, metendo o dedo na ferida sem dó.

Outro momento muito bonito, talvez o mais bonito da noite, foi a apresentação de "Shallow", cantada por Lady Gaga e Bradley Cooper, de forma comovente e bem destacada das demais canções que disputadas. A cantora e Cooper não saíram de trás do palco, nem tiveram seus nomes chamados por alguém. Já começou daí a diferença. O prêmio já era garantido.

Falando em música, se na edição deste ano não tivemos um host, ao menos a festa começou ao som de Queen, com Adam Lambert substituindo Freddie Mercury, como foi quando a banda se apresentou na edição do Rock in Rio de 2015. Pena que foi muito rápido, apenas versões compactas de duas canções muito famosas ("We will rock you" e "We are the champions"). Ainda assim, o suficiente para alegrar a audiência presente e dar uma pontada de inveja de quem só viu pela televisão.

Do ponto de vista político, foi um Oscar bastante misto e muito interessado em tratar das questões raciais. Três dos oito filmes tratavam do assunto, cada um à sua maneira: PANTERA NEGRA, INFILTRADO NA KLAN e GREEN BOOK - O GUIA. E três também tratavam de relações homoafetivas: BOHEMIAN RHAPSODY, GREEN BOOK - O GUIA e A FAVORITA. E dois filmes tratam da conjuntura política do passado para falar do presente: INFILTRADO NA KLAN e VICE.

E não devemos esquecer de ROMA, que também tem tudo a ver com esse momento atual, de construção de pontes para "proteger" os americanos dos imigrantes. Quando Javier Bardem subiu ao palco para dar o prêmio de filme estrangeiro para Cuarón isso ficou muito claro. Além do mais, em determinado momento, Barbra Streisand, ao falar de Spike Lee e de INFILTRADO NA KLAN, disse "A verdade é muito importante nos dias de hoje." A gente aqui do Brasil sente na pele isso também.

No terreno das premiações, além do Oscar para Spike Lee, também foi uma surpresa boa a premiação de melhor atriz para Olivia Colman, o único Oscar para A FAVORITA. Tudo bem que o mais justo seria premiar as três atrizes do filme, já que as três são protagonistas, mas na falta dessa opção, muito melhor dar um prêmio de um trabalho ótimo de uma atriz do que um prêmio pelo "conjunto da obra" para um filme morno como A ESPOSA, o então favorito a ganhar na categoria. Foi tão surpreendente que nem Colman nem Glenn Close acreditaram.

Outra zebra da noite foi o prêmio de melhores efeitos visuais para O PRIMEIRO HOMEM, que desbancou o favorito, o épico da Marvel/Disney VINGADORES - GUERRA INFINITA. A Disney também perdeu na categoria de animação para a animação da Sony HOMEM-ARANHA NO ARANHAVERSO, que já era a favorita na categoria e de fato apresenta algo novo.

E é isso. Para quem reclamava do Oscar so white, tivemos até o momento a premiação com o maior número de Oscars para atores e técnicos negros em muito tempo. Sem falar nos prêmios para ROMA (se bem que no fim das contas, Cuarón foi quem subiu ao palco as três vezes, já que a direção de fotografia também era dele).

Uma pena, porém, que a Academia resolveu premiar como melhor filme uma obra tão ultrapassada como GREEN BOOK - O GUIA, uma versão pouco inteligente e muito demasiadamente pacificadora da questão racial. Depois de alguns prêmios acertados, ver a equipe do filme de Peter Farrelly subindo ao palco deixou um amargo na boca. Talvez, afinal, fosse querer demais da Academia uma postura ao mesmo tempo progressista e revolucionária. Raramente isso é possível.

Os Premiados

Melhor Filme – GREEN BOOK - O GUIA
Direção – Alfonso Cuarón (ROMA)
Ator – Rami Malek (BOHEMIAN RHAPSODY)
Atriz – Olivia Colman (A FAVORITA)
Ator Coadjuvante – Mahershala Ali (GREEN BOOK - O GUIA)
Atriz Coadjuvante –Regina King (SE A RUA BEALE FALASSE)
Roteiro Original – GREEN BOOK - O GUIA
Roteiro Adaptado – INFILTRADO NA KLAN
Fotografia – ROMA Montagem – BOHEMIAN RHAPSODY
Trilha Sonora Original – PANTERA NEGRA
Canção Original - "Shallow", de NASCE UMA ESTRELA
Mixagem de Som – BOHEMIAN RHAPSODY
Edição de Som – BOHEMIAN RHAPSODY
Efeitos Visuais – O PRIMEIRO HOMEM
Design de produção – PANTERA NEGRA
Figurino – PANTERA NEGRA
Maquiagem e cabelos – VICE
Filme Estrangeiro – ROMA (México)
Longa de Animação – HOMEM-ARANHA NO ARANHAVERSO
Curta de Animação – BAO
Curta-metragem – SKIN
Documentário – FREE SOLO Curta Documentário – ABSORVENDO O TABU

segunda-feira, fevereiro 18, 2019

O QUE VOCÊS FIZERAM COM SOLANGE? (Cosa Avete Fatto a Solange?)


Acabei esbarrando neste giallo porque no box da Versátil que eu comprei tem uma espécie de continuação do filme. Aí resolvi ver primeiro este aqui. Qual não foi minha surpresa quando me deparo com o melhor exemplar do gênero que eu já vi. Talvez melhor até que os filmes do Argento e do Bava, mas teria que rever vários para ter certeza.

É o tipo de filme que conquista o espectador desde a cena inicial, com o professor e a aula em um rio, namorando, quando acontece um assassinato. Depois disso, há todo um mistério em torno de mais mortes que surgem. O filme tem um visual lindo, um andamento narrativo de dar gosto, um pouco de sexo e violência e muitos elementos clássicos dos gialli - o assasino de luvas pretas, o seu ponto de vista.

O diretor é Massimo Dallamano, que tem um currículo maior como diretor de fotografia e assumiu a carreira de cineasta já na virada dos anos 50 para 60, tendo feito tanto spaghetti westerns quanto dramas eróticos, filmes de horror e comédias. Mas o que marcou mesmo sua carreira foram os gialli, sendo O QUE VOCÊS FIZERAM COM SOLANGE? (1972) o seu trabalho mais festejado, presente em várias listas de melhores filmes do gênero de todos os tempos.

Eu confesso que não sabia da fama desta obra e estava um tanto afastado do cinema de gênero italiano. Nem sei dizer o motivo. O fato é que atualmente estou passando por uma fase de revalorização das obras italianas que possuem um toque pulp – tanto é que estou adorando os fumetti de Dylan Dog e sentindo mais vontade de ler mais coisas parecidas também.

Os italianos têm (e nas décadas de 60 e 70 eram especialmente ótimos nisso) uma capacidade impressionante de pegar criações de outros países e transformar em algo diferente e envolvente, ainda que com um leve toque de imitação. No caso dos filmes policiais, a atração que eles têm por países de língua inglesa é algo que já deve ter sido objeto de estudo por muitos acadêmicos. Afinal, por que motivo a história teria que se passar na Inglaterra e não na Itália? De todo modo, eles tinham um fino faro para negócios e sabiam que o mercado era mais receptivo para obras de gênero saídas dos Estados Unidos e da Inglaterra. Por isso, as dublagens em inglês eram tão populares no mercado internacional.

Hoje em dia, porém, há uma preferência pelo áudio em italiano pelos aficionados pelos gialli e filmes de horror produzidos na Itália. Há um encanto todo particular que essas produções provocam. No caso de O QUE VOCÊS FIZERAM COM SOLANGE?, temos uma narrativa envolvente do início ao fim. O que é admirável, levando em consideração os caminhos que a obra percorre, dando a imaginar que alguma coisa vai sair muito errado no filme a qualquer momento, levando em consideração a trama em que não se sabe quem é o assassino de luvas pretas que mata as mulheres com uma facada na genitália.

Para nossa alegria, Massimo Dallamano conduz de maneira magistral a narrativa, brincando com as expectativas do espectador, tanto em relação a Elizabeth, personagem vivida pela bela e jovem espanhola Cristina Galbó, quanto pela introdução da personagem Solange, do título. Há que se destacar também a força do protagonista, vivido pelo italiano Fabio Testi. Ele faz o papel do professor de Educação Física casado que tem um caso com uma de suas alunas. A personagem da esposa, interpretada pela alemã Karin Baal, também tem uma importância fundamental no enredo, e há uma reviravolta interessante na personagem.

O QUE VOCÊS FIZERAM COM SOLANGE faz parte de uma trilogia inacabada de Dallamano sobre jovens estudantes em perigo. O segundo filme foi O QUE ELES FIZERAM A SUAS FILHAS? (1974), também presente em um dos boxes da Versátil. Infelizmente, o diretor morreu em 1976, antes de completar a trilogia.

+ TRÊS FILMES

ESCAPE ROOM

Um filme que tem os seus méritos, principalmente antes de chegar à sua conclusão. Até então funciona como boa distração. Mas depois bate até saudade de O ALBERGUE e JOGOS MORTAIS, já que segue-se a mesma linha, só que sem o gore e os excessos, que se tornaram coisa de mau gosto nos dias atuais. Mas até que eu me divertia. Foi bom também para rever Deborah Ann Woll, a melhor personagem de TRUE BLOOD. Direção: Adam Robitel. Ano: 2019.

O TERCEIRO ASSASSINATO (Sandome No Satsujin)

Hirokazu Koreeda se sai muito melhor quando trata de dramas familiares. Aqui ele trata de uma investigação sobre um assassinato. Em alguns momentos do filme eu fiquei um tanto desinteressado ou pensando em outras coisas. O que eu vejo como um problema (meu em relação ao filme, ao menos). Mas há uma discussão interessante sobre sentir-se impotente diante do que o destino nos reserva e também sobre justiça. Ano: 2017.

MUSEU (Museo)

O grande barato de MUSEU é procurar fugir dos clichês de filmes de roubo. Principalmente na cena do roubo, por mais tensa que ela seja. Depois vemos que não é exatamente um filme de roubo, talvez seja mais sobre frustrações e tentativas toscas de seguir um caminho grandioso, no caso, conseguindo dinheiro "fácil" com um roubo inédito. Destaque também para várias tomadas atípicas. Só achei que podia ser um pouco mais curto. Direção: Alonso Ruizpalacios. Ano: 2018.

quinta-feira, fevereiro 14, 2019

CLIMAX

Às vezes basta uma cena para que um filme se torne memorável. Mesmo quando esse filme é cheio de problemas e que provoca mais insatisfações do que alegrias. Aliás, falar de alegrias quando o assunto é Gaspar Noé é até um pouco complicado, ainda que as intenções do diretor de provocar náuseas e outras reações ruins dêem com os burros n’água. Com relação à tal cena marcante de CLIMAX (2018), trata-se de uma sucessão de performances solo dos dançarinos e dançarinas, mostrada através de uma câmera que visualiza a ação de cima. Aquilo é tão belo e sensual e a música é tão intensa e envolvente que, por alguns minutos, até parece que estamos vendo um dos melhores filmes do ano.

A cena acontece depois que vamos conhecendo um grupo relativamente grande de dançarinos prontos a participar de uma experiência um tanto misteriosa, mas apresentada de uma maneira interessante e ao mesmo tempo dispersiva que abre o filme. É dispersiva principalmente para quem gosta de livros, filmes e estantes. Do lado de uma televisão há duas prateleiras que completam a tela scope da janela com livros e capas de VHS (o filme se passa nos anos 90) relacionados a cinema ou a temas ao gosto do diretor: Buñuel, Argento, Fassbinder, Pasolini, Nietzsche, entre outros.

Falando em Buñuel, o fato de as pessoas não poderem sair daquele espaço em que estão (só depois atentei para uma ligação da cena que serve de prólogo, de uma mulher agonizando no gelo, com o espaço em que eles se encontram confinados), o fato de que elas estão naquele espaço lembra um pouco O ANJO EXTERMINADOR, do mais talentoso dos cineastas espanhóis. Mas esse elemento acaba sendo esquecido ao longo das conversas entre os personagens, muitas delas sobre sexo. Destaque para o papo entre dois homens sobre quais mulheres do grupo eles já transaram e quais desejam transar e como vão fazer.

Uma pena que Noé tenha essa obsessão quase infantil por querer chocar a plateia e transforma algo que poderia ser impactante do ponto de vista formal, sensual e poético em algo que vai para uma linha do desagradável, como já é tradicional no cinema do diretor, desde antes de ele ficar famoso mundialmente pela cena prolongada de estupro de IRREVERSÍVEL (2002). Assim, o terceiro ato do filme tenta emular o estado de perturbação dos personagens, depois de terem sido drogados por uma substância alucinógena, abrindo espaço para cenas de câmeras rodopiantes e algumas cenas de violência gráfica e brutal (não é nada agradável ver uma mulher grávida receber chutes na barriga).

Ainda assim, a lembrança que guardarei desta experiência filmada apenas com um fiapo de roteiro de cinco páginas e muita vontade de fazer algo diferente, será das referidas danças sensuais ao som de um áudio poderoso. Lembrarei de como esse filme poderia ser tão mais gostoso se não precisasse efetivamente contar uma história.

+ TRÊS FILMES

CONQUISTAR, AMAR E VIVER INTENSAMENTE (Plaire, Aimer et Courir Vite)

Não tenho acompanhado todos os filmes do Christophe Honoré. Só vi os que passaram nos cinemas da cidade. Os três de homenagem à Nouvelle Vague dos anos 2000 e mais o BEM AMADAS (2011). Este é certamente um dos melhores dele. E provavelmente um dos mais pessoais (minha suspeita apenas). O filme parece ter umas gorduras e uma duração maior do que eu gostaria, mas não sei o que tiraria. Ele cresce na memória e seus personagens são fortes e simpáticos o bastante para nos envolvermos com seus dramas. A questão da AIDS no início dos anos 1990 o aproxima bastante de 120 BATIMENTOS POR MINUTOS (que prefiro). Ano: 2018.

A NOSSA ESPERA (Nos Batailles)

Que baita filme lindo! Apresenta a porrada da vida real sem nos dar muito espaço para chorar e descarregar as emoções de tanta emoção. Aí o que fica é um nó na garganta. A história não é apenas a de um homem que é abandonado pela esposa e tem que cuidar dos dois filhos pequenos. Isso é apenas o tronco de uma árvore que apresenta diversos galhos, diversas dores. Adoro uma cena do Duris com a personagem da irmã (que linda!), as cenas de apoio dos amigos que também passam por situação difícil etc. Meus agradecimentos a todos os envolvidos. Direção: Guillaume Senez. Ano: 2018.

O VALOR DE UM HOMEM (La Loi du Marché)

O diretor Stéphane Brizé parece ter se especializado em dramas sobre pessoas vivendo os piores momentos de suas vidas. Bom que está cercado sempre de atores e atrizes muito bons, como é o caso aqui de Vincent Lindon. Na trama, ele é um homem de meia idade que está enfrentando uma dificuldade de encontrar emprego. E mesmo quando consegue, o filme se torna ainda mais incômodo. Ano: 2015.

sexta-feira, fevereiro 08, 2019

BOY ERASED - UMA VERDADE ANULADA (Boy Erased)

Os dias estão cada vez mais sombrios em nosso país e no mundo. Por isso que certos filmes que uma década atrás teriam um peso menor adquirem um gesto político muito mais intenso e cheio de fúria. BOY ERASED - UMA VERDADE ANULADA (2018) ganhou os holofotes recentemente por ter tido sua estreia nos cinemas cancelada no Brasil pela Universal, sua distribuidora, que não quis se arriscar com um filme menor e que não recebeu nenhuma indicação ao Oscar - Lucas Hedges havia recebido uma indicação de ator no Globo de Ouro.

Não é a primeira vez que Hedges, 22, interpreta um jovem gay tendo que esconder do mundo o que ele é - pudemos ver em menor escala no ótimo LADY BIRD - A HORA DE VOAR, de Greta Gerwig um papel parecido, quase uma prévia do que ele faria no filme de Joel Edgerton.

O impacto de BOY ERASED para o espectador, principalmente o espectador de linha progressista, é de raiva mesmo, a cada sessão que o protagonista tem que passar na terrível terapia de reorientação sexual. Há igrejas que não chegam ao cúmulo de fazer ou criar tais terapias, mas acabam por também fazer com que as pessoas vivam em negação e auto-enfrentamento de seus desejos, ao pensar que tudo o que pensam e querem é fruto do pecado, de tentações demoníacas.

Na trama, Jared Eamons (Hedges) é um jovem que inicia a vida universitária e é quase estuprado por um colega. O tal colega, passando por um momento difícil, deseja se confessar para Eamons, mas depois começa a achar que o rapaz será um perigo para ele. Por isso, o garoto prefere dizer mentiras sobre Eamons aos pais dele, que começam a questionar o filho sobre sua orientação sexual. Detalhe: o pai de Jared, vivido por Russell Crowe, é um pastor evangélico.

Na mesma noite, Jared resolve contar aos pais que tem pensamentos com homens, e que acredita ser homossexual. A mãe (Nicole Kidman) também fica muito transtornada. A solução que o pai encontra é chamar homens da igreja para orar e tomar medidas que possam "ajudar" o filho. A ajuda, então, vem na forma da terapia de reorientação sexual. Cada cena que se passa nesse lugar é carregado de uma aura tão pesada que é impossível não ficar com raiva de tudo aquilo.

Jared Eamons é o alter-ego de Garrard Conley, autor do livro de memórias que deu origem ao filme. Pelo que vemos, ele chegou a testemunhar pouca coisa. Poderia ter ficado mais tempo para contar mais detalhes dos bastidores terríveis desse lugar. Mas o que viu foi suficiente para escrever um artigo para o The Times e depois um livro.

Há uma cena em BOY ERASED, de diálogo entre pai e filho, que dá para fazer uma paralelo com o diálogo do pai do garoto de ME CHAME PELO SEU NOME, de Luca Guadagnino. A diferença é que aqui a realidade dói mais, pois temos um pai com uma dificuldade muito grande de aceitar o filho como ele é, devido à sua formação moral e religiosa.

+ TRÊS FILMES

A ROTA SELVAGEM (Lean on Pete)

Do mesmo diretor de 45 ANOS (2015), este filme segue a tortuosa vida de um jovem adolescente que mora só com o pai que não tem dinheiro para lhe sustentar. É então que ele resolve trabalhar como ajudante de um homem que cuida de cavalos de corrida. O elenco é bom e o rapaz que faz o protagonista é ótimo. Há pelo menos três cenas muito boas e fortes. Pena que eu estava muito cansado no dia. Direção: Andrew Haigh. Ano: 2017.

EU NÃO SOU UMA BRUXA (I Am Not a Witch)

Depois de ver PERSONA, de Bergman, ver este filme aqui é um balde de água fria. Não que não tenha sua importância no quesito de denúncia sobre um caso absurdo. Mas é tão absurdo que parece surreal o que é mostrado na tela. Ainda não tive a chance de ver se o que apresentam na trama acontece de fato na Zâmbia. Acho que me incomodei também com o país. Mesmo o Brasil de hoje fica parecendo um paraíso. Direção: Rungano Nyoni. Ano: 2017.

MEU QUERIDO FILHO (Weldi)

O filme, pela temática, lembra um pouco OS COWBOYS, de Thomas Bidegain, mas tem menos força na hora de nos colocar no lugar dos personagens. Mesmo o personagem do pai parece um tanto bobo em sua busca pelo melhor para o filho. E o filho, do modo como é pintado, acaba sendo visto por nós como digno de nosso desprezo e do destino ruim que ele escolheu. Embora haja esse pano de fundo da situação na Síria, o filme é até bem universal, na questão de pais e filhos. Direção: Mohamed Ben Attia. Ano: 2018.

segunda-feira, fevereiro 04, 2019

A FAVORITA (The Favourite)

O grego Yorgos Lanthimos é o caso de cineasta que conseguiu prestígio internacional através, primeiramente, do caráter único de seus filmes. O indicado ao Oscar de filme em língua estrangeira DENTE CANINO (2009) foi a obra que deu início ao domínio mundial desse cineasta cheio de idiossincrasias. Nesse filme já se percebia um gosto tanto pelo bizarro quanto por um senso de humor muito particular. Afinal, por mais que alguém ache o filme um tanto perturbador em diversos aspectos, há ali tantos momentos desconcertantes que às vezes o que nos resta é rir.

O gosto pelo surreal inundou o seu primeiro filme em língua inglesa, O LAGOSTA (2015), que contou com astros de Hollywood de primeiro escalão (Colin Farrell e Rachel Weisz).Trata-se de uma obra difícil de classificar, embora alguns possam imaginá-la como uma comédia romântica perversa e bizarra. A trama nos apresenta a um mundo em que pessoas que não conseguem um par são condenadas a se transformarem em animais. Detalhe: elas tem o direito de escolher que animal se tornar.

O trabalho seguinte de Lanthimos, O SACRIFÍCIO DO CERVO SAGRADO (2017), já se encaminhava mais para o gênero horror, embora fuja dos clichês e seja igualmente estranho. Mas é inegável o flerte pela atmosfera de medo, que intensifica os climas dos trabalhos anteriores do diretor. O filme contou novamente com Colin Farrell, no papel de um cirurgião, e mais uma vez em um trabalho de dramaturgia estranha, como pede o diretor, e também com Nicole Kidman, no papel da esposa. Os dois são perturbados por um jovem adolescente com sede de vingança.

Eis que o cineasta grego chuta a porta com os dois pés em seu mais recente trabalho, já que A FAVORITA (2018) recebeu 10 indicações ao Oscar. Trata-se de um filme bem mais acessível, do ponto de vista das esquisitices, mas ainda assim pega desprevenido muitos espectadores que vão ao cinema ver um drama de época inglês típico. Para começar, há quem entre na sala sem saber que o filme também lida com a temática do relacionamento homossexual. Como estamos vivendo um período em que o conservadorismo está mais forte, isso pode incomodar a alguns desavisados.

Mas A FAVORITA é, antes de tudo, um filme sobre o jogo de poder. E há tempos não vemos um trio de atrizes tão fortes representando seus papéis com tanta beleza que até parece que o jogo de poder também acontece por trás das câmeras, no sentido de que Emma Stone, Rachel Weisz e Olivia Colman, que se tornou famosa nos Estados Unidos com este filme, parecem disputar não apenas o seu papel, mas também o nosso respeito e admiração.

Na trama, Emma Stone é uma jovem pobre que é recebida para trabalhar no palácio de Anne (Colman), Rainha da Inglaterra do início do século XVIII. Além de ela chegar toda cheia de lama e fezes, ainda é ridicularizada pela mulher que é o braço direito da rainha (Weisz, inspirada). O que a jovem descobre, graças à sua inteligência e luta pela sobrevivência naquele ninho de cobras, é que as personagens de Colman e Weisz também são amantes. É então que ela percebe o caminho para conquistar o seu lugar ao sol, através daquela rainha que na maioria das vezes mais parece uma criança mimada.

Para contar essa história, Lanthimos usa lente grande angular que se destaca principalmente nos interiores. Há também cenas com utilização apenas de luz natural, o que só aumenta a comparação que o filme vem recebendo com BARRY LYNDON, de Stanley Kubrick. Há também uma suntuosidade nos cenários e figurinos que é de dar gosto, mesmo a quem não está muito interessado no enredo. Se bem que é difícil não se divertir com a trama e com o show de interpretação das três atrizes. Gostei especialmente de Stone, que ganha talvez até mais tempo de cena que a Olivia Colman. As cenas dela tentando seduzir um dos nobres do castelo a base de porrada são muito engraçadas.

Em tempos de safra fraca de filmes indicados à categoria principal do Oscar, A FAVORITA é um alívio e tanto.

A FAVORITA recebeu indicações ao Oscar nas categorias de filme, direção, atriz (Olivia Colman), atrizes coadjuvantes (Emma Stone e Rachel Weisz), roteiro original, desenho de produção, figurino, direção de fotografia e montagem.

+ TRÊS FILMES

GREEN BOOK - O GUIA (Green Book)

Que safra horrível a do Oscar deste ano, hein! O que é isso, meu Deus? Há tempos eu não vejo um filme tão medíocre assim. Não é que seja ruim, mas tem toda pinta de filme ultrapassado, que até se costumava a ver em premiações dos anos 80, por exemplo. E que discussões rasas que o filme provoca. Um desperdício de uma dupla de atores ótimos. Na  trama, homem branco e rude de origem italiana é contratado para ser o chofer de um músico negro nos Estados Unidos dos anos 1960. Indicado ao Oscar nas categorias de filme, ator (Viggo Mortensen), ator coadjuvante (Mahershala Ali), roteiro original e montagem. Direção: Peter Farrelly. Ano: 2018.

A ESPOSA (The Wife)

Perde na originalidade e na construção dramática para o MONSIEUR & MADAME ADELMAN, de Nicolas Bedos, mas não dá para negar que é um filme que consegue capturar o espectador do início ao fim. Gosto bastante das cenas de flashback e da personagem jovem. Como não é uma história real, mas baseado em um romance, fica difícil comprar às vezes a trama. Ainda mais em pelo século XX. Indicado ao Oscar de melhor atriz para Glenn Close. Direção: Björn L Runge. Ano: 2017.

ASSUNTO DE FAMÍLIA (Manbiki Kazoku)

Difícil não gostar do Koreeda e do modo sensível com que ele aborda os dramas familiares. Acho que ainda gosto mais de PAIS & FILHOS e DEPOIS DA TEMPESTADE, mas este aqui tem algo em comum com o primeiro. O interessante é que primeiro o filme faz com que a gente goste daquelas pessoas imperfeitas para depois fazê-las entrar em situações mais dramáticas, longe da rotina de comer e se socializar em família. O último frame é lindo. Indicado ao Oscar de filme em língua estrangeira. Direção: Hirokazu Koreeda. Ano: 2018.