segunda-feira, outubro 31, 2005

ROBERTO CARLOS E O DIAMANTE COR-DE-ROSA

 

Final de semana bem chato esse que passou. Além de algumas coisas desagradáveis que aconteceram comigo, ainda por cima, fiquei sem internet por causa do incêndio no prédio da Telemar. Não sei quando que vão regularizar o serviço do Velox. Aqui no Centro, por alguma razão, a internet está funcionando normalmente. Por isso que, por enquanto, só estou podendo atualizar o blog nos dias da semana. 

Comecemos a semana falando do Rei. Sim, embora muita gente questione a realeza do homem, Roberto Carlos é rei. E um dos poucos representantes vivos do ultra-romantismo no Brasil. Há quem critique seu posicionamento diante da morte da esposa e da esperança que ele tem de encontrá-la depois da morte. Acham que ele está perdendo tempo, que devia esquecer logo a mulher, partir pra outra, fazer como o Paul McCartney... Eu, já acho bonito pra caramba esse sentimento duradouro do amor eterno, contrariando os que dizem que o amor só dura no máximo 5 anos e depois passa. 

Mas falemos um pouco de ROBERTO CARLOS E O DIAMANTE COR-DE-ROSA (1969). Esse filme está para HELP!, dos Beatles, assim como ROBERTO CARLOS EM RITMO DE AVENTURA (1968) está para A HARD DAY'S NIGHT. Roberto Farias trocou o nonsense e a ausência de trama do primeiro filme pela estorinha boba mas divertida do segundo. No lugar do anel de Ringo Starr, temos uma estatueta mágica, com direito a gênio e tudo. 

A estória não tem tanta importância, ainda que seja bem divertida. O barato é mesmo ver e ouvir Roberto cantando. O filme começa logo com duas super-canções: "As curvas da estrada de Santos" abre o filme, enquanto vemos imagens do Japão, que é onde a trama se inicia; depois, vemos Roberto cantando num clube "Não vou ficar", canção de autoria de Tim Maia, que ficou eternizada na voz do Rei - há também uma belíssima versão do Kid Abelha. Pena que as canções vão diminuindo à medida que a trama vai ganhando mais importância. Os pontos fracos do filme são justamente as participações da Wanderléa e do Erasmo Carlos cantando. Erasmo é um cantor e compositor bastante subestimado no Brasil, mas a canção escolhida para o filme realmente foi bastante infeliz e até um pouco constrangedora. 

Muito legal ver Roberto, Erasmo e Wanderléia jovens. Eles passam uma sensação de que podem tudo. Com a maior facilidade do mundo, os três lutam contra vários homens, não têm medo de armas de fogo, escalam montanha, sobrevivem a desabamento, resolvem enigmas complicados. Claro que tudo é meio tosco, pouco convincente - as cenas de ação parecem saídas dos filmes dos Trapalhões. Mas aí é que está a graça do filme. A propósito, Roberto Farias chegou a dirigir um filme de Didi Mocó e Cia, que foi OS TRAPALHÕES NO AUTO DA COMPADECIDA (1987), adaptação da obra de Ariano Suassuna, com Didi e Dedé como João Grilo e Chicó. Dizem que o filme seguinte, ROBERTO CARLOS A 300 QUILÔMETROS POR HORA (1971), que completa a trilogia de Roberto, é o melhor dos três. Espero pela oportunidade de conferí-lo um dia. 

Quanto a Roberto Carlos, depois desse período de superstar feliz da vida, ele entrou numas de exorcizar os demônios interiores nos primeiros discos da década de 70. Daí surgiram discos clássicos como o de 1971, que tem "Detalhes" e "Traumas", e o de 1972, que tem "À Janela" e "O Divã", esta última, a canção que conta de maneira muito sutil e extremamente sofrida o lendário acidente que lhe amputou o pé quando criança. Uma obra-prima. 

P.S.: Coluna nova no ar no CCR: reflexões sobre a morte no cinema.

sexta-feira, outubro 28, 2005

A VIDA DE DAVID GALE (The Life of David Gale)



O próprio Alan Parker diz não haver muita coisa em comum em seus filmes. Ele não tem tantas obsessões em sua obra para ser chamado de autor. Mas há algo de comum em filmes como CORAÇÃO SATÂNICO (1987), MISSISSIPI EM CHAMAS (1988) e este A VIDA DE DAVID GALE (2003). Que é a vontade de entender a cultura americana na raiz, longe dos grandes centros como Nova York, Los Angeles ou Miami. Seja na cultura religiosa afro de Nova Orleans, seja no racismo sulista dos anos 60, seja no Texas e seu número recorde em execuções.

A pena de morte é sempre um assunto que me interessa, que me comove e que me deixa indignado. Acho que o filme que mais me fez chorar na vida foi OS ÚLTIMOS PASSOS DE UM HOMEM, de Tim Robbins. Também me emocionei muito com A ÚLTIMA CHANCE, de Bruce Beresford, e À ESPERA DE UM MILAGRE, de Frank Darabond. A VIDA DE DAVID GALE tem um diferencial: não é um filme que se deixa levar pelo sentimentalismo, pelo melodrama. É uma obra mais cerebral, de investigação, onde os personagens se auto-sacrificam em nome de uma causa. A trama parece um pouco improvável e pouco verossímil, mas ainda assim é interessante e surpreendente.

Uma outra razão para eu me interessar pelo filme é a participação de Kate Winslet. Sou doido por essa menina. Pra mim, é uma das grandes atrizes em atividade em Hollywood, além de não ter medo de fazer papéis ousados. Seu papel é um dos mais difíceis do filme, já que ela tem que ouvir muito a narrativa de Kevin Spacey, o condenado à morte, sem ter participado da ação. Já Spacey, nunca me convenceu como ator. O homem ganhou até Oscar, mas, pra mim, ele sempre fez o mesmo papel em todos os filmes. Seu rosto demonstra quase sempre uma certa apatia diante da vida. Já Laura Linney é uma atriz excepcional e que transborda sentimento em todo filme que está.

O que eu gostei da montagem do filme foi que vemos apenas o que Kevin Spacey quis contar. Ele omitiu o que achou conveniente omitir e a personagem de Kate Winslet funciona como um segundo espectador. Diferente, por exemplo, de O JARDINEIRO FIEL, que omite e engana o espectador com o uso do narrador onisciente. Bom, nos fim das contas, somos enganados do mesmo jeito, mas uma coisa é ser engando pelo personagem, outra pelo montador e diretor.

Quanto à questão da pena de morte, não me identifiquei com a proposta do filme. Afinal, acreditar que a pena de morte só é errada porque ela está sujeita a matar pessoas inocentes não combina bem com o que eu penso. Acho que até um estuprador merece piedade e merece continuar vivo até o fim.

Filme visto em DVD. Muitos extras, inclusive comentário em áudio do diretor legendado. Em widescreen 2,35:1.

quinta-feira, outubro 27, 2005

WALTER HUGO KHOURI EM DOIS FILMES

 

Interessante notar o quanto Walter Hugo Khouri tem em sua filmografia esses títulos femininos no plural: AS AMOROSAS (1968), AS DEUSAS (1972), AS FILHAS DO FOGO (1978), AS FERAS (1995). AS CARIOCAS (1966) é o primeiro dessa leva, embora não seja um filme inteiramente dirigido pelo diretor. Isso só demonstra o fascínio que as mulheres lhe despertam e isso se reflete em sua obra. Em seus filmes há espaço tanto para a mulher na figura de mãe, quanto, principalmente, a mulher como amante. Às vezes, essas duas personificações da mulher se fundem e se confundem, como acontece em AMOR, ESTRANHO AMOR (1982), com a cena de sexo do garoto com sua própria mãe (Vera Fischer). 

Entre as várias musas que habitam a obra khouriana, Lilian Lemmertz é das mais importantes. Ela está presente nos dois filmes abaixo, embora apareça apenas rapidamente em AS CARIOCAS. Em AS DEUSAS ela aparece com brilho intenso. Sobre a atriz, Carlos Reichenbach falou no site Mulheres do Cinema Brasileiro: "qualquer close de Lilian Lemmertz em AS DEUSAS diz mais que mil páginas de diálogos." A atriz esteve presente em nada menos que nove filmes de Khouri. 

AS CARIOCAS 

Como é de se esperar em filmes de episódios, AS CARIOCAS é uma obra irregular. Mais pela diversidade de estilos dos três diretores do que pela qualidade dos episódios. O episódio de Khouri é o mais sério, mais destituído de humor. Mas é um dos mais belos. As cenas de close da protagonista - alguém sabe o nome da moça? - que abrem e encerram o episódio são muito bonitos. A heroína desse filme lembra a protagonista de O PALÁCIO DOS ANJOS (1970), mas sem a mesma amargura. A mulher aqui tem suas razões para trair o noivo, mas sem nunca deixar de lhe oferecer carinho. O episódio de Fernando de Barros é o que mais se parece com as chanchadas tradicionais. Norma Bengell é uma mulher que tenta ganhar um carro pago tanto pelo marido quanto pelo amante. O episódio de Roberto Santos fecha o filme, mostrando uma mulher que luta pelo direito de usar pouca roupa no Rio de Janeiro. Muito divertido e o mais inventivo dos três. 

AS DEUSAS 

Uma das obras-primas da filmografia de Khouri, AS DEUSAS traz Mário Benvenutti num triângulo amoroso com a mulher (Lilian Lemmertz) e sua terapeuta (a belíssima Kate Hansen). Assim como AMOR VORAZ (1984), AS DEUSAS mostra uma mulher com problemas de depressão. Lilian Lemmertz viaja com o marido para uma casa afastada da cidade para esquecer um pouco dos problemas e tentar se curar de sua enfermidade. Chegando na casa, porém, ela começa a ficar perturbada e a sentir uma presença maligna no ambiente. Em certos momentos, o filme se assemelha a um filme de horror, e serve como um aperitivo para quem nunca viu os filmes fantásticos de Khouri. Algumas cenas são difíceis de sair da cabeça, como a das duas meninas tomando banho nuas no rio ou a cena da bebedeira com Benvenutti e as duas mulheres. Khouri acaba mostrando qual o melhor remédio para a depressão. Agradecimentos ao Renato, que me forneceu cópias dos filmes, gravados do Canal Brasil. 

P.S.1: Continuo revoltado com a falta de fotografias de filmes brasileiros mais antigos na internet. 

P.S.2: A propósito de Khouri, recomendo um blog que foi criado há uns dois meses e que merece visitação diária. Estranho Encontro é o blog de Andréa Ormond. A moça é especialista em cinema brasileiro e fã de Walter Hugo Khouri. Cada texto bacana.

quarta-feira, outubro 26, 2005

UM FILME FALADO (A Talking Picture / Un Film Parlato / Un Film Parlé)

 

Enquanto os cinéfilos paulistas estão tendo a sorte e a oportunidade de conferir uma retrospectiva com a filmografia completa de Manoel de Oliveira, inclusive com a presença do próprio cineasta, só agora eu, cinéfilo cearense "sem dinheiro no bolso" e "sem parentes importantes", tive a oportunidade de ver pela primeira vez um filme do mestre, em DVD. Verdadeira lenda viva e cineasta mais velho em atividade no mundo (97 anos!), Manoel dirige filmes desde os tempos do cinema mudo. Um amigo meu chegou a ficar emocionado durante a Mostra Internacional de Cinema, ao encontrar com o diretor no banheiro e assistindo reverentemente a um documentário sobre Ingmar Bergman. 

Assim como Eric Rohmer, Manoel de Oliveira é tido como um cineasta da palavra. Fala-se muito em seus filmes. UM FILME FALADO (2003) é uma de suas obras mais festejadas. Muito saboroso ouvir Rosa Maria (Leonor Silveira), em bom português, dando uma aula de História para a filha de 7 anos e, por tabela, para nós, espectadores. Sentimos como se estivéssemos vendo uma tele-aula, mas com uma estranheza intrigante que só as grandes obras têm. 

A primeira metade do filme mostra Rosa Maria, professora de História, falando sobre a história por trás dos monumentos e das ruínas encontrados em diversos países visitados por elas, ao redor do Mediterrâneo. Passamos por Portugal, Espanha, França, Itália, Grécia, Egito, Turquia. Uma maneira gostosa e barata de fazer uma viagem pela Europa. A segunda metade do filme consiste basicamente nas conversas poliglotas entre o comandante do navio (o americano John Malkovich) e três atrizes de três países diferentes: Catherine Deneuve (França), Stefania Sandrelli (Itália) e Irene Papas (Grécia). Cada um conversa em sua própria língua, sendo milagrosamente entendido por todos. Só depois, com a chegada da moça portuguesa na mesa, é que o inglês passa a ser a língua utilizada por todos. Os assuntos discutidos são dos mais interessantes. E o filme passa de tele-aula a talk show televisivo, desses que mostram grupo de pessoas discutindo quase que livremente sobre diversos assuntos. 

Alguns dos temas ficaram mais guardados na memória. Em certo momento, Catherine Deneuve diz que às vezes a prisão de estar com alguém pode até ser pior do que o inferno da solidão. Fala-se sobre a dominação da língua inglesa, enquanto que uma língua fundamental para a construção da civilização ocidental - o grego - hoje é falada apenas na Grécia. Fala-se até da nossa língua portuguesa, que, ainda que pouco falada nos países de primeiro mundo, está presente nos quatro cantos do mundo. A noção de civilização é questionada pela garotinha por causa da barbárie, com a mãe dizendo que foram com as guerras que se fizeram as nações, que o ser humano é cheio de paradoxos. 

O final de UM FILME FALADO é surpreendente, chocante, até pelo andamento e pela forma como o filme se desenvolve antes do final. Se com as guerras se fizeram as nações, para onde iremos com essa série de atentados terroristas? Qual será o nosso destino? O Brasil é o país do futuro?

terça-feira, outubro 25, 2005

DOUTORES DA ALEGRIA

 

Não deixei de ficar um pouco decepcionado com esse DOUTORES DA ALEGRIA (2005). Aliás, no começo, nem cogitava ver o filme por ser dirigido por Mara Mourão, a diretora da horrorosa comédia romântica AVASSALADORAS (2002). Depois de ter lido várias críticas favoráveis foi que comecei a me interessar. A sessão de sábado pela manhã no Iguatemi foi curiosa. Alguns pais levaram os filhos para ver o filme, achando, talvez, que eles fossem gostar por causa das cenas de palhaço brincando com crianças. Não sei se todas as crianças curtiram o filme, já que um garoto sentado perto de mim ficava o tempo todo perguntando pro adulto ao seu lado se faltava muito para acabar, se o filme era só aquilo mesmo etc. Legal que foi convidado um palhaço para ficar fazendo gracinha antes do filme. O palhaço faz parte do grupo Trupe do Riso, o equivalente cearense do Doutores da Alegria. 

Minha decepção se deu porque eu achava que ia me emocionar mais, que o filme teria mais momentos tocantes de criancinhas doentes se alegrando - fazer o quê se eu gosto de PATCH ADAMS? Outro aspecto negativo do documentário é a indecisão entre abordar o belo trabalho dos atores/palhaços ou dissertar sobre a natureza subversiva do palhaço, contando um pouco da história dos palhaços desde os tempos dos bobos da côrte. 

Ainda assim, DOUTORES DA ALEGRIA não deixa de ser um bom filme. Pode até aborrecer em alguns momentos as crianças, mas os adultos vão curtir tanto as cenas que captam a espontaneidade e a inocência das crianças, quanto as cenas com os depoimentos de membros do grupo. Para tornar o filme mais dinâmico, Mara Mourão optou por variar na forma como é documentado cada depoimento: ora o entrevistado está andando de bicicleta, ora sentado na praia, ora amamentando o filho etc. 

Porém, a maior graça do filme está nos momentos de aplicação da "besteirologia", técnica utilizada pelos "doutores" para medicar os pacientes enfermos e torná-los mais alegres, facilitando sua recuperação. O momento mais triste do filme é deixado para o final, com um garotinho esquelético, e respirando com ajuda de aparelhos, balançando-se ao som da música dos doutores.

segunda-feira, outubro 24, 2005

PLANO DE VÔO (Flightplan)

 

Espécie de atualização de A DAMA OCULTA (1938), de Alfred Hitchcock, PLANO DE VÔO (2005), dirigido pelo alemão Robert Schwentke, é desses filmes que deixam a gente com o olho grudado na tela do começo ao fim. Eletrizante, e com um trabalho de câmera digno de nota, o filme conta a história de uma técnica de aviões (Jodie Foster) abalada pela morte do marido e em viagem com a filha da Alemanha para os EUA. As duas estão a bordo de um mega jumbo com capacidade para 600 passageiros, quando no meio da noite a filha desaparece. A mulher fica ainda mais perturbada ao perceber que nenhum dos passageiros ou membros da tripulação afirma ter sequer visto a menina. Embora muito da força do filme esteja em Jodie Foster, dois atores também contribuem com personagens de grande impacto: Peter Sarsgaard, como o policial pouco confiável, e Sean Bean, como o comandante da nave. Não dá pra falar muita coisa sob o risco de estragar as surpresas para quem ainda não viu o filme. 

Depois de VÔO NOTURNO, de Wes Craven, PLANO DE VÔO é o segundo título do ano que se passa quase que inteiramente no interior de um avião. O filme causou polêmica nos EUA por trazer uma visão nada confiante de uma comissária de bordo. Ainda assim, o filme fez bastante sucesso nos EUA e é bastante representativo da atual paranóia americana - há, inclusive, árabes suspeitos dentro do avião. O filme faz com que uma simples viagem aérea se transforme num pesadelo aterrador. O som do filme é outro elemento de destaque. Os ruídos que ouvimos de diversas partes do avião são perturbadores. 

Recentemente temos visto muitos diretores estrangeiros aportando na indústria americana. Robert Schwentke é mais um bom exemplo do que os olheiros de Hollywood são capazes. Alguns desses cineastas, eu já conheço de seus trabalhos em seus próprios países, como é o caso de Hideo Nakata (RINGU, DARK WATER) e de Alexandre Aja (HAUTE TENSION); outros já me deixaram bastante curioso para conhecer a sua filmografia, como foi o caso dos franceses Jean-François Richet (ASSALTO À 13ª D.P.) e Florent Emilio Siri (REFÉM) e agora deste Robert Schwentke. Quem será esse sujeito de sobrenome complicado que entrou em Hollywood pela porta da frente, abusando dos travellings num ambiente apertado e passando uma segurança que experientes diretores americanos parecem não ter? Schwentke só dirigiu dois longas-metragens na Alemanha: um filme de serial killer chamado TATOO (2002) e uma comédia de humor negro chamado EIERDIEBE (2003). Pra se prestar atenção.

sexta-feira, outubro 21, 2005

A NOIVA-CADÁVER (Corpse Bride)



Não é todo ano que a gente pode ver dois filmes inéditos de Tim Burton. (Não que eu seja fã, mas ele não deixa de ser um dos cineastas mais importantes da atualidade.) Poucos meses depois do sucesso de A FANTÁSTICA FÁBRICA DE CHOCOLATE (2005), chega às telas brasileiras a animação em stop-motion A NOIVA-CADÁVER (2005). Os dois filmes têm em comum o fato de terem como protagonista o versátil Johnnie Depp e de possuirem números musicais. Aliás, isso de colocar musiquinhas e coreografias me irrita um pouco. Nesse, mais até do que no filme da fábrica.

Em alguns momentos, principalmente nas duas vezes que Victor (Johnnie Depp) toca piano, eu senti vontade de ver um filme sério de Tim Burton. De preferência um horror gótico que em nenhum momento quisesse ser uma paródia ou uma caricatura do gênero. Burton quase consegue isso em A LENDA DO CAVALEIRO SEM CABEÇA (1999), um de seus melhores filmes. Enquanto esse dia não chega, o momento é de se curtir essa fase de comédias musicais do diretor. Aliás, nem sei se esse dia vai chegar, já que o espírito moleque e engraçado é característico do diretor desde o início da carreira, vide OS FANTASMAS SE DIVERTEM (1988), filme que guarda uma relação muito próxima com esse novo trabalho.

Em A NOIVA-CADÁVER, na Inglaterra vitoriana, Victor é um rapaz tímido cuja família lhe arranja um casamento de conveniência com uma moça de família nobre (Emily Watson), mas que está com problemas financeiros. Ele fica nervoso com a idéia de se casar e procura treinar os ritos matrimoniais no meio de uma floresta escura. Sem querer, acaba por despertar uma morta vestida de noiva (Helena Bonham Carter), que o leva para o mundo dos mortos.

Achei interessante o fato de que o mundo dos mortos é todo alegre e colorido, enquanto o dos vivos é cinzento e sem graça. Os bonecos usados no filme também são uma atração que por si só já é merecedora de uma espiada. Cada um desses bonecos custou 15 mil dólares, levando 9 meses para ficarem prontos. Eles são feitos com pele de silicone e esqueleto de aço e resina. O material de que são feitos os bonecos exige cuidados muito especiais. Se expostos ao sol ou mesmo a uma temperatura mais quente, eles derretem. Acho que o DVD do filme vai ser interessante se mostrar as técnicas utilizadas para a feitura da animação, bem como as casinhas criadas para os bonecos, todas cheias de detalhes na mobília.

Não lembro muito bem de O ESTRANHO MUNDO DE JACK (1993), mas acredito que o melhor filme em stop-motion de Burton ainda é o curta VINCENT (1982), exatamente por ser mais sério e passional.

quinta-feira, outubro 20, 2005

GÂNGSTERES DA WARNER PARTE 3

 

Com esses dois filmes, termino de ver os seis primeiros filmes da coleção "Gângsteres", lançada recentemente pela Warner. Já esperava mesmo que eles não fossem tão bons quanto as duas obras-primas de Raoul Walsh, que vi da última vez. ALMA NO LODO (1931) é o menos brilhante de toda a coleção e A FLORESTA PETRIFICADA (1936) é o mais estranho. Os DVDs dos filmes, assim como os demais, contêm um minidocumentário de cerca de 16 minutos, além dos já tradicionais curtas-metragens apresentados por Leonard Maltin. 

ALMA NO LODO (Little Caesar) 

Engraçado. Edward G. Robinson era um homem que odiava armas. Contam que até usaram fita adesiva nos olhos dele para mantê-los abertos enquanto disparava um revólver no filme. Não sei se isso é lenda ou verdade. Robinson era totalmente oposto à figura do bandido que interpretava. Ele era um colecionador de arte, um intelectual, nada a ver com o grosseiro Rico de ALMA NO LODO. Mas esse foi o filme que o lançou ao estrelato, quase na mesma época que James Cagney também recebia tratamento parecido pela mídia. Só não sei se Robinson era tão bom e tão versátil quanto Cagney. Suspeito que não. Em ALMA NO LODO, ele é um bandido ambicioso, que se aproveita da máfia das bebidas na época da Lei Seca para ganhar um bom dinheiro. Mas a sua principal finalidade era o poder, ele queria se sentir por cima do resto dos mortais. Rico tem um amigo (Douglas Fairbanks Jr.) que não tem a mesma ambição e que até tenta sair da máfia, mudar de vida e se casar com uma moça. O personagem de Rico, ou Little Caesar, foi baseado no Al Capone. Diferente de Cagney em INIMIGO PÚBLICO Nº 1, Robinson não é, nesse filme, um assassino que tem prazer em matar. Ele só mata se necessário, quando se sente traído, mas ainda assim, dá com um pé atrás quando tem que dar cabo da vida de seu amigo. O final, eu achei muito fraco. Direção de Mervyn LeRoy. 

A FLORESTA PETRIFICADA (The Petrified Forest) 

Claramente inspirado numa peça teatral, A FLORESTA PETRIFICADA até poderia ter ficado de fora dessa coleção da Warner, por ser tão diferente dos outros. Só a partir de sua segunda metade é que o filme vai saindo de uma atmosfera atemporal e poética para dar lugar ao mundo dos gângsteres. A ação se passa quase que totalmente num restaurante localizado no meio do deserto do Arizona. Lá trabalha a jovem Bette Davis (nunca a vi tão bonita), que gosta de poesia e sonha em ir um dia para a França. Chega no restaurante um forasteiro (Leslie Howard) que acaba por conquistar a moça com seu jeitão intelectual. Depois de muito papo entre os dois - vale dizer que o texto da peça é muito bom -, entra em cena o grande fora-da-lei interpretado por Humphrey Bogart. A propósito, esse filme foi fundamental para ajudar a consolidar a carreira de Bogart. Ele ainda não era um protagonista, mas estava chegando lá - seu estrelado só chegaria no começo dos anos 40. O final é excessivamente melodramático. Não que eu não goste de melodrama, é que nesse filme ficou teatral demais. Mas no geral, posso dizer que A FLORESTA PETRIFICADA é um ótimo filme. Agradável do início ao fim. Direção de Archie Mayo 

Curtas-metragens presentes no DVD de ALMA NO LODO: 

THE HARD GUY (6 min). Pai de família tenta se virar para conseguir botar comida em casa durante a Grande Depressão. Um dos primeiros trabalhos de Spencer Tracy antes da fama. 
LADY PLAY YOUR MANDOLIM (7 min). Outro curta daquele ratinho parecido com o Mickey. Esse é bem mais divertido que o presente no DVD de INIMIGO PÚBLICO Nº 1. 

Curtas-metragens presentes no DVD de FLORESTA PETRIFICADA: 

RHYTHMITIS (19 min). Comédia musical que hoje parece meio cafona. Sobre uma pílula que transforma as pessoas em exímios dançarinos. 
THE COO COO NUT GROVE (6 min). Divertidíssimo desenho que traz caricaturas de inúmeras celebridades hollywoodianas. Um ótimo passatempo é ficar adivinhando quem é quem. Eu só reconheci Clark Gable (que orelhonas!), o Gordo e o Magro, Groucho Marx, Edward G. Robinson e Katharine Hepburn.

quarta-feira, outubro 19, 2005

O VIRGEM DE 40 ANOS (The 40 Year Old Virgin)

 

Ver o O VIRGEM DE 40 ANOS (2005) foi um alívio pra mim. Já estava achando que eu tinha me transformado num sujeito ranzinza. A maior parte das comédias recentes que vi no cinema, achei-as bem sem graça. Até suspeitava que era pelo fato de eu tê-las visto sozinho, que eu estava meio deprimido e não estava me dando conta disso. A última comédia que eu tinha visto no cinema e que tinha realmente gostado foi AMOR EM JOGO, dos irmãos Farrelly, que eu vi acompanhado. Mas esse filme não conta tanto, já que ele me encantou mais pelo romance e pela identificação com o protagonista do que pelas piadas em si. 

O VIRGEM DE 40 ANOS é a comédia mais engraçada do ano até o momento. É verdade que esse ano não está muito bom pra comédias, mas mesmo assim deixo registrado o superlativo. O filme também é representativo desse atual momento da sociedade, do fenômeno da adolescência prolongada, conseqüência também do aumento na expectativa de vida. Já ouvi dizer que atualmente a adolescência vai até os 35 anos. Os jovens estão demorando mais a sair da casa dos pais. Eu gosto dessa idéia. Passa uma sensação de que eu ainda tenho muito tempo pela frente, de que eu não preciso me preocupar muito com as coisas que eu deixei de fazer no passado - e que deveria ter feito. Em determinada cena do filme, o personagem de Paul Rudd fala para o quarentão virgem (Steve Carell) que ele não é tão velho assim, que hoje os 40's são os novos 20's. 

O personagem de Carell tem um bloqueio que foi aumentando com o passar dos anos. Ele sempre teve medo de se aproximar das mulheres. Depois de algumas tentativas frustradas de fazer sexo no passado, ele simplesmente desistiu da idéia com o tempo. Nem masturbação passa mais por sua cabeça. Ele vive num estado de infantilização, onde o sexo é algo sujo e pouco atraente. Prefere ficar em casa, pintando alguns dos bonequinhos de sua coleção. Sua vida ganha um novo sentido, quando seus colegas de trabalho descobrem que ele é virgem e planejam fazer alguma coisa para mudar essa situação. E isso é combustível para várias e ótimas piadas ao longo do filme. Fazia tempo que eu não ria tanto no cinema. E sozinho. 

Alguém poderá dizer que o final de O VIRGEM DE 40 ANOS sai perdendo, se comparado com o de AMOR EM JOGO, dos Farrelly, já que os Farrelly não fazem com que seu personagem principal deixe de ser um freak no final. Ele não precisa se adaptar à normalidade para ser feliz. Por isso, dá até pra se questionar: será que o diretor Judd Apatow e o ator e roteirista Steve Carell estariam julgando o comportamento do freak quarentão como uma doença, algo que merece uma cura? A solução para o personagem seria, então, deixar de lado todos os seus bonecos de criança, passar a tomar gosto por sexo e arranjar uma mulher? Ok, isso seria se ajustar à sociedade, mas quem discorda de que isso não é mesmo a melhor coisa que poderia acontecer com o velho rapaz? 

P.S.: Hoje foi um dia particularmente triste pra mim. Um velho amigo faleceu, vítima de um acidente de moto. Foi com pesar que vi o seu corpo sem vida hoje pela manhã. O Érico era um desses caras que sempre faziam piada com tudo. Acho que a única vez que o vi triste foi quando sua mãe faleceu. Ele tinha um jeito brincalhão como nenhuma outra pessoa que eu já conheci. Pra completar, ainda estou lendo o livro Por um Fio, do Drauzio Varella. Pensar na morte deixa a gente mais silencioso e meditativo.

terça-feira, outubro 18, 2005

O JARDINEIRO FIEL (The Constant Gardener)

 

Muita gente anda falando bem por aí de O JARDINEIRO FIEL (2005), a estréia no mercado internacional de Fernando Meirelles. Embora considere-o um bom filme, não tive o mesmo entusiasmo que a maioria das pessoas parece estar tendo. Achei o filme frio e a montagem, com um narrador onisciente - em vez do ponto de vista do personagem de Ralph Fiennes -, procura confundir o espectador com pistas falsas. Outra coisa que me incomodou no filme foi o fato de se parecer plasticamente com o último de Tony Scott, CHAMAS DA VINGANÇA. Mas isso se deve ao fotógrafo, Cézar Charlone. (Antonio Pinto, o músico que trabalhou com Meirelles em CIDADE DE DEUS (2002), não está no filme; mas ele está em O SENHOR DAS ARMAS, filme também de contestação e que também tem locações na África.) 

A trama de O JARDINEIRO FIEL é um pouco complicada de resumir, mas é mais ou menos assim: o filme começa com a morte de Tessa, encontrada morta no deserto do Quênia. O filme vai se estruturando com idas e vindas no tempo. Ao voltar no tempo, ficamos sabendo de como começou o envolvimento amoroso de Tessa, ativista humanitária, com o diplomata inglês interpretado por Fiennes. A coisa se complica quando Tessa procura denunciar o fato de as indústrias farmacêuticas estarem usando os quenianos como cobaias de suas experiências, resultando, às vezes, na morte dessas pessoas. 

Entre as qualidades do filme, além da beleza de Rachel Weisz, numa de suas melhores atuações, está o fato de o filme ser uma obra bastante corajosa por mexer com peixes grandes como as indústrias farmacêuticas. Há também um belo trabalho de direção de atores. Gostei bastante da cena de sexo do filme. Ainda que ela seja fria e nada excitante, não deixa de ser muito bonita, com o uso da câmera muito próxima e da montagem fragmentada. 

Alguns momentos do filme me deixaram um pouco aborrecido, especialmente nas partes mais políticas, que acontecem logo após o fim das seqüências anteriores à morte de Tessa (personagem de Weisz). Não acho que o filme tenha sido bem sucedido na construção de um clima de suspense. Mas gostei bastante da cena em que Ralph Fiennes desembarca num país da África à procura de Pete Postlethwaite. Esse é talvez o momento de maior suspense do filme. Também não me convenceu o sentimento de Fiennes em relação à esposa. Não me senti contagiado pelo sentimento de amor. Há quem veja isso como uma qualidade, assim o filme não soa melodramático, mas eu não.

segunda-feira, outubro 17, 2005

O SENHOR DAS ARMAS (Lord of War)

 

Em O SENHOR DAS ARMAS (2005), Nicolas Cage é um negociante de armas de família ucraniana, mas morando nos EUA, que adquire uma fixação por armas de fogo depois de testemunhar um tiroteio no bairro onde mora. Depois disso, ele bota na cabeça que quer fazer negócios com armas. O negócio começa a ir de vento em popa quando ele descobre o filão do comércio internacional. Ele faz negócios tanto na época da Guerra Fria, quanto depois, com o esfacelamento da União Soviética, quando ele aproveita pra comprar o enorme arsenal soviético e vender para países em guerra. 

O filme já impressiona desde os créditos iniciais, mostrando da fabricação da bala até a sua finalidade final, isto é, atingindo a cabeça de uma criança africana. Cage tem nesse filme o seu melhor papel em muitos anos. Vale destacar também a performance do jovem Jared Leto, como o irmão do personagem de Cage, meio que retomando o papel de junkie que o celebrou em RÉQUIEM PARA UM SONHO, de Darren Aronofsky. O filme também tem no elenco Ethan Hawke, como o policial que não sai do pé de Cage; Ian Holm, como o negociante rival; e a pouco conhecida Bridget Moynahan, como a esposa. 

Muitas seqüências do filme vão ficar guardadas na memória por muito tempo, como aquela em que Cage é obrigado a experimentar o brown-brown, que é a mistura de cocaína com pólvora, que os soldados tomam nas guerrilhas para aumentar a coragem. Uma verdadeira viagem ao inferno. A fotografia e a música tem um papel fundamental nessa hora. 

Andrew Niccol pode estar finalmente entrando no primeiro escalão de Hollywood. Trata-se de uma das melhores surpresas do ano. Filme corajoso e que chega ao Brasil num momento bem oportuno: o do referendo que vai decidir sobre a proibição ou não do comércio de armas de fogo no país. Também é importante notar que O SENHOR DAS ARMAS estreou no país no mesmo dia que O JARDINEIRO FIEL. Ambos os filmes passam uma visão nada feliz da África. A maior parte do continente africano está tomada pelo vírus da AIDS, mas o pior é que isso nem é a principal preocupação deles. 

Numa cena de O SENHOR DAS ARMAS, Nicolas Cage está num hotel e duas prostitutas tentam convencê-lo a transar com elas sem camisinha. Segundo uma delas, por que se preocupar com algo que vai te matar em dez anos, se as chances de você ser morto antes disso, por uma bala ou mesmo pela fome, são muito maiores? É, meus amigos. Ver a triste situação da África faz com que a gente veja o Brasil como um pequeno paraíso. Os nossos problemas ficam até pequenos perto dos deles. E filmes como esse são importantes para que quem mora nos países ricos, e não sabe dos podres de seus governantes, tenha conhecimento de quem é que está botando as armas nas mãos do povo. Se bem que não é por falta de arma de fogo que o povo vai deixar de matar, como pôde ser visto no filme HOTEL RUANDA, que mostra um genocídio a base de facões. Mas é verdade que essas armas facilitam muito mais a matança. 

P.S.: No ar, no Cinema com Rapadura, nova coluna, dessa vez sobre os selos que estão trazendo os clássicos para as locadoras.

sábado, outubro 15, 2005

UMA AVENTURA NA MARTINICA (To Have and Have Not)























Ver filmes do Howard Hawks tem um sabor especial pra mim. É como se eu estivesse saboreando um prato bem gostoso, desses que quando acaba a gente lamenta que acabou, mas ainda assim satisfeito por ter experimentado. Claro que a comparação pode não ter sido muito feliz, já que os filmes de Hawks também envolvem uma certa dose de emoção e sentimento que vão muito além dos prazeres gastronômicos.

UMA AVENTURA NA MARTINICA (1944) é puro Hawks. Estão lá as pessoas de passado obscuro; a ausência da família; o homem durão que já teve algum relacionamento mal sucedido no passado e por isso prefere se concentrar no trabalho; a mulher que toma sempre a iniciativa; a relação de amizade e respeito entre os companheiros; a sensação de perigo nos momentos difíceis; a opção pelo cinismo nos diálogos, como meio de ocultar os sentimentos. Interessante que eu sempre fico comovido com a dedicação amorosa que os pares românticos dos heróis hawksianos lhes demonstram.

Como o próprio Hawks falou em entrevista no "Afinal, Quem Faz os Filmes", a trama política não é importante. É apenas um meio de Hawks contar uma história de amor num ambiente hostil. Lembrando que o diretor já mostrou ambientes bem mais hostis em filmes como O PARAÍSO INFERNAL (1939) e HATARI!(1962). E o grande barato é que a química entre Humphrey Bogart e a estreante Lauren Bacall não ficou apenas na telona. A paixão dos dois astros foi tamanha que o casal se tornou um das mais célebres da história do cinema. Bogart até largou a esposa, dependente do alcool, para ficar com Lauren. No DVD do filme, lançado no Brasil pela Warner, tem um mini-documentário de 11 minutos dedicado exclusivamente ao histórico encontro dos dois. Fiquei sabendo que Hawks ficou puto com o Bogart, porque ele queria agarrar a moça também. Mas, no fim, Hawks não ficou atrás e ainda teve um caso com a coadjuvante, a bela Dolores Moran.

Entre as minhas seqüências favoritas, estão as cenas de intimidade de Bogart com Bacall, a cena em que Bogart carrega Dolores Moran nos braços e as duas cenas mais eletrizantes do filme: a do resgate no barco - teria Brian De Palma se inspirado nesse filme para fazer a cena do barco de O PAGAMENTO FINAL? - e aquela em que Bogart atira num dos policiais. Sensacional.

Interessante que o filme foi feito a partir de uma aposta entre Hawks e Ernest Hemingway. Hawks apostou para Hemingway que conseguiria fazer um filme a partir do pior livro do escritor, que era o "To Have and Have Not". Ele aceitou a aposta, Hawks comprou os direitos do livro, e chamou outro famoso escritor para fazer o roteiro, William Faukner.

No DVD, além do minidoc que eu comentei, há um desenho animado de 6 minutos que é impagável. Sinceramente, foi o desenho da Warner que eu mais gostei até hoje. (Só perdendo, é claro, praquele em que o Gaguinho constrói um robô para exterminar o Pernalonga.) Mas BACALL TO ARMS é um desenho que deve ser melhor apreciado por quem assistiu ao filme do Hawks.

sexta-feira, outubro 14, 2005

CARNE

 

Pra um cineasta de apenas dois longas-metragens no currículo, Gaspar Noé até que deu o que falar nos últimos anos. Se bem que sua intenção era mesmo aparecer, chocar, causar náuseas no público. Aqui no Brasil, apenas IRREVERSÍVEL (2002) foi lançado comercialmente. O primeiro longa de Noé, SEUL CONTRE TOUS (1998), ainda permanece inédito. Na época da repercussão causada por seu primeiro longa, Noé dava depoimentos bombásticos na imprensa: dizia que seu objetivo era criar um cinema que fizesse oposição ao cinema tradicional francês, que queria fazer um filme que desonrasse a França. Seu filme era carregado de ódio e de energia negativa. 

Tive a oportunidade de ver ontem o curta-metragem que lhe deu a primeira repercussão internacional. CARNE (1991) lhe valeu o prêmio de melhor curta no Festival de Cannes daquele ano e tem tudo a ver com SEUL CONTRE TOUS. É uma espécie de preparatório para o longa. Nesse sentido, Noé me fez lembrar o brasileiro Cláudio Assis, que também é um cineasta que tem a intenção de chocar o público, e que também reaproveitou o enredo de um de seus curtas - TEXAS HOTEL - na sua estréia no cinema de longa-metragem. Não duvido que Assis tenha copiado a cena da morte do cavalo de CARNE no seu AMARELO MANGA, só que trocando o cavalo por um boi. 

Acontece que a cena do açougueiro matando o cavalo em CARNE é muito mais chocante, já que mostra o processo em três estágios: 1) furando a cabeça do cavalo e botando o sangue pra fora; 2) tirando o couro do bicho, deixando só a caveira; e 3) a carne no prato, pronta para ser comida. O termo "carne" se refere justamente à carne de cavalo, que é consumida normalmente na França e dizem ter sabor doce. CARNE é desses filmes que divertem justamente por serem apelativos e chocantes. Em alguns momentos, o filme nos pega mesmo desprevenidos, como na cena do açougueiro atacando o suposto cara qeu estaria paquerando com sua filha. Não dá pra contar muita coisa da história, sob o risco de contar demais, já que é um curta, mas o que posso dizer é que o filme mostra a rotina de um açougueiro de cavalos, que durante anos cria a filha, pois a mãe da menina tinha a abandonado logo após o nascimento. Aliás, outra cena de choque no filme é a seqüência explícita do parto. 

Ainda sobre Gaspar Noé, me arrependo hoje de não ter ido ver IRREVERSÍVEL no cinema. Tinha visto em divx e, como não gosto de rever filmes com um intervalo de tempo curto, acabei não indo ver esse que deve ser uma experiência única, se visto na telona. Qual será o próximo trabalho de Noé, hein? O homem tem uma dificuldade imensa pra conseguir financiamento para seus filmes. Parece que os franceses não gostam nada dele. A maior parte dos críticos da revista Cahiers du Cinéma odiou os seus filmes. Já nos EUA, críticos de renome, como Jonathan Rosenbaum (Chicago Reader), chegaram a considerar SEUL CONTRE TOUS uma obra-prima. P.S.: No site Senses of Cinema, Gaspar Noé está incluído na seção Great Directors. O artigo sobre o diretor está muito bom e há uma boa explanação sobre o chamado "cinema de atrações". 

P.P.S: Agradecimentos ao Fábio Ribeiro, que me forneceu o filme em divx há um tempão.

quinta-feira, outubro 13, 2005

FEDERICO FELLINI EM DOIS FILMES

 

Ser cinéfilo também significa esforçar-se para ver os filmes de cineastas importantes, mesmo quando eles não são muito do nosso agrado. Já ficou famosa a cisma que eu tenho com Federico Fellini. Mas pouca gente lembra que eu adorei A DOCE VIDA (1960), considero uma obra-prima, um filme de uma força tremenda. Agora, sempre que posso, vou dando novas chances às obras do homem. Quero ver quando chegar a vez de eu rever 8 E 1/2 (1963), filme que eu não entendi bulhufas na época em que o assisti. Esses dois filmes que eu comento abaixo pertencem à primeira fase de Fellini. São filmes mais melodramáticos, mas que já traziam momentos puramente fellinianos. Os dois títulos também contam com a música poderosa de Nino Rota, colaborador habitual do diretor e dono de temas antológicos, como os de O PODEROSO CHEFÃO, por exemplo. 

ABISMO DE UM SONHO (Lo Sceicco Bianco) 

A heroína de ABISMO DE UM SONHO (1952) lembra muito a prostituta de bom coração de AS NOITES DE CABÍRIA (1957). A personagem Cabíria (Giulietta Masina), inclusive, aparece numa cena pela primeira vez nesse filme, tentando consolar uma mulher arrependida por ter agido de maneira insensata. Na trama, Brunella Bovo é uma mulher que está em lua de mel e que dá uma escapulida do marido (Leopoldo Trieste) assim que os dois chegam em Roma. Seu objetivo é realizar o sonho de conhecer pessoalmente o seu ídolo das fotonovelas, o Sheik Branco (Alberto Sordi). No geral, achei o filme bem chato, não gostei dos personagens. Parecem todos muito idiotas. Desde o marido que precisa fingir para seus familiares que sua mulher está doente e não desaparecida, até o sheik branco que se acha o gostosão e a ingênua mulher que se mete numa enrascada. De bonito, tem o encontro do casal no final, sem vergonha de ser exageradamente dramático e sem medo de ser patético. 

OS BOAS VIDAS (I Vitelloni) 

Provavelmente, o primeiro grande filme de Fellini. OS BOAS VIDAS (1953) é sobre quatro amigos com dificuldades para encarar as responsabilidades da vida. Tem o mulherengo (Franco Fabrizi) que engravida a irmã do amigo (Franco Interlenghi, narrador do filme); o aspirante a dramaturgo (Leopoldo Trieste) que suspeita que seu ídolo é gay e está tentando lhe assediar; e tem Alberto Sordi como o mais solitário e fracassado do grupo. O filme tem um gostoso sabor agridoce, misturando os momentos de melancolia com outros de alegria de viver. Um dos momentos mais memoráveis do filme é aquele em que o personagem mulherengo é cara-de-pau o suficiente para dar em cima de outra mulher dentro do cinema, mesmo estando do lado da esposa. O início do filme também é digno de nota, com a cena da chuva durante a festa, que antecipa alguns dos momentos mais mágicos dos meus Fellinis preferidos, que são A DOCE VIDA e ROMA (1972). Filmes vistos nas cópias em DVD da Versátil.

quarta-feira, outubro 12, 2005

A CARTOMANTE

 

Impressionante como esse filme é ruim. Quer dizer, não é um tipo de filme que vai te deixar aborrecido ou entediado, dá pra ver até o fim. Mas pode te deixar constrangido e se perguntando como tanta gente boa se permite participar de um negócio desses. Talvez o nome de Machado de Assis tenha servido como espécie de meio para enganar o elenco. Ah, mas que bobagem a minha: as pessoas trabalham por dinheiro também. 

A CARTOMANTE (2004), de Wagner de Assis e Pablo Uranga, é uma espécie de thriller sobre o destino, sobre pessoas desorientadas que precisam de algo ou alguém para lhe guiar. Por isso, a personagem de Deborah Secco, a mais desorientada de todas, escolhe três vias de orientação: além de olhar o horóscopo todos os dias, ela ainda faz consulta com uma analista (Silvia Pfeifer) e ainda vai até uma cartomante. Ela quer saber se vai mesmo casar com o noivo (Ilya São Paulo), se vai ser feliz etc. A coisa se complica pra ela, quando aparece em sua vida uma paixão arrebatadora na figura de Luigi Baricelli. O rapaz havia passado por uma experiência traumática ao se envolver com uma maluca que quase o matou com comprimidos de ecstasy (Giovanna Antonelli, em papel ridículo). 

Existe uma regra que diz que filme ruim que não tem mulher pelada não merece ser visto - bom, só uma tomada de um dos seios da Deborah Secco não vale. A CARTOMANTE faz parte dessa vergonhosa lista de filmes que desmerecem o espectador com esse tipo de sem-vergonhice. E eu ainda passei o filme inteiro esperando pela participação da Mel Lisboa. Sou fã dessa menina. Já tinha até desistido, quando ela aparece em close, no final, falando umas bobagens durante menos de um minuto e o filme acaba. Sou da teoria de que esse filme foi feito exclusivamente pra fazer todo mundo de palhaço. Ainda bem que eu não paguei pra ver. Gravado da Globo.

terça-feira, outubro 11, 2005

ALIAS: CODINOME PERIGO - 1ª TEMPORADA (Alias - First Season)

 

Meu interesse por ALIAS começou quando o Renato me falava entusiasmado que assistia um episódio atrás do outro e não tinha vontade de parar mais de ver a série. Não tinha como não ficar curioso. O interesse pela série aumentou por causa do fenômeno LOST, criada pelo mesmo J.J.Abrams. Se ALIAS não teve, pra mim, o mesmo impacto de LOST, ao menos o final dessa primeira temporada (2001/2002) me deixou com ótima impressão e bem a fim de ver como as coisas irão se desenrolar na "segundona" - nas locadoras e lojas, a série já está disponível até a terceira temporada. 

A vantagem (financeira) de se alugar o DVD de ALIAS é que cada DVD vem com dois discos, com cerca de 4 episódios em cada disco. Quando não dá tempo de ver tudo até o dia de eu devolver o DVD (o que sempre ocorre) é só gravar os episódios ainda não vistos numa fitinha VHS para eu ver depois, com calma. 

O que me incomodou na série foi uma certa repetição da mesma estrutura em quase todo episódio. Sempre se começa com Sydney Bristol (Jennifer Garner) agindo no mundo da espionagem e saindo de alguma situação perigosa, depois entra a vinheta com a música instrumental (bem legal), aí mostram cenas da vida dupla dela, seus poucos amigos, sua relação com a CIA e com a SD-6, a missão e a contramissão e, novamente, uma cena de perigo pra ficar como gancho para o próximo episódio. 

J.J.Adams se mostrou um excelente enrolão. As coisas vão acontecendo de maneira muito lenta nos 22 episódios que compõem essa temporada. Alguns mistérios permanecem insolúveis. Por isso que quando vi o season finale, o episódio "Almost Thirty Years", fiquei bem entusiasmado. Muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Foi o melhor que eu vi até agora da série. 

Um dos personagens mais interessantes de ALIAS é o chefe da SD-6, o Sloane (Ron Rifkin). Ele é odioso, mas há momentos em que a gente até gosta dele. Por isso que o drama de Sydney é tão complexo. Ela, ao mesmo tempo que quer destruir a SD-6, não deixa de gostar daqueles que trabalham lá. O personagem do pai da Sydney, o Jack Bristol (Victor Garber) é outra criatura interessante. A cena do episódio final, dele matando um dos traidores da CIA é surpreendente, até lembrando a violência semi-terrorista de Jack Bauer em 24 HORAS. 

Entre os episódios de maior destaque dessa primeira temporada, há a participação memorável de Quentin Tarantino, confesso fã da série, lá pelo meio da temporada. Também gosto dos episódios em que Sydney é presa pela CIA por ser considerada uma ameaça à segurança nacional por causa de uma profecia de Rambaldi. E parece que essa novela do Rambaldi ainda vai persistir nas temporadas seguintes. 

O último DVD vem com o making of do piloto da série. Legal que a cena de Sydney rebolando no aeroporto foi feita ao som de uma música do Moby. Ficou bem sexy. Interessante que a cena em que ela cai num lago dentro do carro foi feita pela própria Jennifer Garner e não por uma dublê.

segunda-feira, outubro 10, 2005

CLEAN

 

De uma coisa não resta dúvida: Olivier Assayas é um dos grandes cineastas franceses da atualidade. Ele escreveu durante a década de 80 nos Cahiers du Cinéma, pertence a uma geração que assimilou uma quantidade enorme de filmes de todas as partes do mundo e tem uma queda pela cultura pop, pelo subversivo e pelo rock and roll. O Sonic Youth até colaborou com o diretor para a trilha sonora do excelente ESPIONAGEM NA REDE (2002). O rock também está bastante presente em CLEAN (2004). Senti um entusiasmo tremendo na cena do show do Metric tocando "Dead Disco". Nem parece aquela coisa deprimente dos shows filmados por Michael Winterbottom em 9 CANÇÕES. Assayas mostra o rock como ele deve ser: uma poderosa força que abala as nossas estruturas, um sopro de vida juvenil. Outro astro do rock que aparece no filme numa cena antológica é Tricky, num hipnotizante show de trip-hop

CLEAN mostra o sofrimento de Emily (Maggie Cheung, ex-esposa do diretor), uma mulher dependente de heroína, e sua luta para botar sua vida nos trilhos e reaver a guarda do filho. Ela passa seis meses na prisão depois da morte por overdose de seu marido. Assim como acontece em ESPIONAGEM NA REDE, boa parte das coisas importantes da vida dos personagens acontece fora da tela, nas elipses. Muita coisa a gente fica sabendo pelas conversas e pelos novos personagens que aparecem. 

Assayas pode levar a fama de cineasta mais globalizado do mundo. Seus filmes se passam em vários países e são falados em diversas línguas. CLEAN é falado em inglês, francês e cantonês e se passa em cidades do Canadá, França, Inglaterra e EUA. E é impressionante a segurança e fluência de Maggie Cheung nessas três línguas. Ela já havia se mostrado brilhante em IRMA VEP (1996), também de Assayas, mas é em CLEAN que ela mostra mais a sua força. Tanto que ela ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes do ano passado por esse filme. 

A fotografia de CLEAN impressiona desde o começo, quando vemos os créditos passando nos cantos do belo enquadramento em scope, mostrando ao fundo as fábricas da cidade de Hamilton, perto de um lago enevoado. O mesmo lago onde Emily vai dormir sedada, depois de aplicar uma dose heroína na veia. Depois disso sua vida se transforma num inferno. 

Apesar de Maggie Cheung estar presente em quase todo quadro do filme, vale destacar também as presenças luminosas de Nick Nolte, como o gentil sogro de Emily, Béatrice Dalle como a melhor amiga e Laetitia Spigarelli como a lésbica atraente. Pelo visto Assayas nasceu para filmar mulheres fortes, vide a trinca sexy formada por Connie Nielsen, Chlöe Sevigny e Gina Gershon em ESPIONAGEM NA REDE. Assayas, com certeza, deve concordar com Woody Allen, que diz que a mulher é psicologicamente muito mais interessante do que o homem.

domingo, outubro 09, 2005

OS IRMÃOS GRIMM (The Brothers Grimm)

 

Mesmo sem merecer, Terry Gilliam acabou ganhando a fama de maldito e ficando próximo, de certa forma, de Orson Welles. Assim como Welles, Gilliam também tem no currículo um filme problemático e inacabado sobre Don Quixote. O filme se chama THE MAN WHO KILLED DON QUIXOTE e Gilliam garante que seu projeto não morreu. O tal filme do Don Quixote até rendeu um documentário, LOST IN LA MANCHA (2002), sobre os problemas nas filmagens, que eu gostaria muito de ver um dia. 

Nunca fui fã de Terry Gilliam. Sou fã do Monty Python, o hilário grupo do qual ele participava. Tirando o seu trabalho no grupo inglês, seus filmes de que mais gosto são O PESCADOR DE ILUSÕES (1991) e AS AVENTURAS DO BARÃO DE MUNCHAUSEN (1988), mas ainda assim com restrições, com um pé atrás. OS IRMÃOS GRIMM (2005) seria um filme de concessões, mais para pagar as contas e poder depois retomar o seu projeto dos sonhos. Se bem que com o fracasso do filme nos EUA, não sei se isso vai ser fácil. 

OS IRMÃOS GRIMM lembra bastante A LENDA DO CAVALEIRO SEM CABEÇA, de Tim Burton. Além da direção de arte e da atmosfera parecidas, há também a questão da descrença no sobrenatural e o pavor ao perceber que ele existe e está ali na sua frente. 

Gilliam apresenta os lendários irmãos Grimm (Matt Damon e Heath Ledger), criadores de contos de fada clássicos como Chapeuzinho Vermelho, A Bela Adormecida e Cinderella, como dois sujeitos trapaceiros, que ganham a vida enganando os que acreditam em bruxas e coisas do tipo. Eles são enviados à força para um vilarejo que está realmente enfeitiçado. A história se passa numa Alemanha frágil e ocupada pela França, no início do século XIX. 

Os melhores momentos do filme são aqueles que mostram as crianças sendo tragadas pelas forças do mal. A cena da garotinha de chapéu vermelho é a minha preferida, mas também gosto muito da cena do poço e da lama preta. Os efeitos especiais são bem caprichados, com destaque para a cena do lobisomem. O problema maior talvez seja o final, ficando a impressão de que não sabiam como acabar o filme e inventaram alguma coisa só pra dar o assunto por encerrado. E é uma pena que a deslumbrante Monica Bellucci apareça tão pouco.

sábado, outubro 08, 2005

WALLACE & GROMIT: A BATALHA DOS VEGETAIS (Wallace & Gromit: The Curse of the Were-Rabbit)

  

Não tinha intenção de ver esse filme, apesar de dizerem que é muito divertido. É que ultimamente não tenho me animado muito com filmes infantis. Mas, como o meu sobrinho já acordou dizendo que queria ir pro cinema comigo, aproveitei pra ver esse filme com ele. Sozinho, acho que eu não iria. O filme é realmente muito divertido. 

Os criadores de Wallace e de seu cãozinho Gromit já tinham ganhado vários prêmios mundo afora quando faziam apenas curtas-metragens na Inglaterra. Nick Park, um dos diretores do longa e principal mentor do projeto, já tinha experimentado o sucesso com A FUGA DAS GALINHAS (2000), mas animação de massinha é um negócio tão trabalhoso que levou mais cinco anos para que WALLACE & GROMIT: A BATALHA DOS VEGETAIS (2005) ficasse pronto. Não deixa de ser curioso ainda haver, em plena era da animação digital, filmes com esse tipo de animação, tão artesanal - até as impressões digitais dos animadores a gente vê no rosto dos personagens. 

O título brasileiro é meio equivocado. Deveriam ter sido mais fiéis ao título original, colocando o subtítulo "A Maldição do Coelhosomem". Do jeito que ficou, a impressão que se tem é que o filme é sobre um monte de pepinos e abóboras lutando entre si. A trama do filme é a seguinte: Wallace e Gromit trabalham de capturar coelhos que infestam os jardins de uma pequena cidade. As pessoas da cidade têm o hábito de participar de uma tradicional feira que premia o maior legume. Wallace e seu cão também têm o seu legume gigante em casa. Wallace é conhecido por gostar muito de queijo além de ser metido a inventor. A trama do filme gira em torno do resultado de uma de suas experiências. 

Antes de começar o longa-metragem, passa um curta divertidíssimo chamado OS PINGÜINS DE MADAGASCAR EM UMA MISSÃO DE NATAL, estrelando justamente os tais pingüins tentando resgatar um colega. Destaque para o pingüim terrorista. Mais engraçado que o longa.

quinta-feira, outubro 06, 2005

FORÇA DO MAL (Force of Evil)

 

Assim como Terrence Malick, o diretor Abraham Polonsky é conhecido por sua resumida filmografia (de apenas três títulos). Diferente de Malick, que teve razões pessoais pelo afastamento de vinte anos no cinema, Polonsky foi vítima do macarthismo, da caça às bruxas que assolou Hollywood durante as décadas de 50 e 60. Polonsky era marxista e filiado ao Partido Comunista. Ele nunca negou quando teve que prestar contas com o Comitê de Atividades Anti-Americanas. Seu parceiro, o ator John Garfield, também entrou na malha fina do comitê. 

FORÇA DO MAL (1948) é um filme bastante complexo e que precisa ser visto mais de uma vez para que seja melhor absorvido, mas logo de cara já é possível ver que Polonsky faz questão de mostrar que a força do mal do título é o dinheiro. Respondendo a uma entrevista, Polonsky disse que "não há nada de errado com o dinheiro, exceto que você pode manipular o dinheiro e, conseqüentemente, as pessoas." O tema de FORÇA DO MAL é a eliminação do indivíduo no mundo dos negócios. No filme, ele ataca de frente o sistema capitalista. 

A dificuldade de entender a rede de intrigas do filme já começa com a estranheza do ambiente. A história se passa no mundo das empresas de loteria ilegal dos anos 40. Como os EUA ainda estavam se reerguendo por causa da Grande Depressão, muita gente tinha que procurar caminhos alternativos para sobreviver. A própria polícia sabia dos inúmeros "bancos" de loteria, mas só agia quando recebia telefonemas de denúncia. É mais ou menos o que acontece com os camelôs do centro da cidade aqui no Brasil. O comércio é proibido, mas dificilmente as autoridades intervêm. 

Na trama de FORÇA DO MAL, John Garfield (também produtor do filme) trabalha com um desses bancos. Ele aceita fazer parte de um complô que acabará por unificar os vários "bancos" e garantir o poderio de um poderoso gângster de Nova York. Garfield quer que o irmão, que também trabalha num desses bancos, entre no negócio, até para protegê-lo da quebra que derrubará quem não fizer parte da chamada corporação. 

O filme é uma espécie de melodrama em film noir carregado de elementos do expressionismo, com destaque para o uso de muitas escadarias e prédios antigos. Achei curioso o filme mostrar uma Wall Street esvaziada, dando uma sensação de angústia. O sentimento de culpa dá o tom no filme de modo crescente até o trágico final. A fotografia em preto e branco acentuando a arquitetura do local lembra alguns filmes de Hitchcock, como A TORTURA DO SILÊNCIO e O HOMEM ERRADO. 

FORÇA DO MAL saiu em DVD no Brasil pela ClassicLine, uma das distribuidoras que mais têm contribuído com filmes de qualidade no mercado. Suas capinhas amarelas podem não parecer nada atraentes, mas até nisso a empresa tem melhorado, agora que assinou uma parceria com a FOX. Reparem nas capinhas dos novos DVDs, como as de BUFFALO BILL e CONSCIÊNCIAS MORTAS, ambos de William Wellman, lançados recentemente. De dar gosto.

terça-feira, outubro 04, 2005

TERRA DE NINGUÉM (Badlands)

 

Nem sempre é fácil definir ou perceber as características de um autor no cinema. Terrence Malick é um desses casos. Por isso que há pouco trabalho crítico aprofundado em cima de seu trabalho. Ajuda o fato de ele ter apenas quatro longas-metragens no currículo, sendo que um deles - THE NEW WORLD (2005) - ainda nem estreou. Malick se tornou mais famoso pelo sumiço de 20 anos que deu depois de dirigir dois importantes filmes nos anos 70 - TERRA DE NINGUÉM (1973) e DIAS DE PARAÍSO (1978) - e reaparecer só em 1998 com o drama de guerra ALÉM DA LINHA VERMELHA. 

Pelos textos que li sobre Malick, no Senses of Cinema, vi que suas principais influências estão no cinema mudo, na pintura moderna de artistas como Hopper e Wyeth, e na filosofia de Wittgenstein e Heidegger. Malick acredita na pureza da imagem. Seus filmes não discutem nenhuma questão moral ou sociológica, nem suas imagens estão lá para simbolizar uma tese ou algum outro valor. Em seus filmes, o significado já está presente na imagem. A realidade não está escondida sob o olhar. 

Uma vez sabendo disso, fica até mais fácil entender a completa falta de julgamento que ele tem para com os personagens de TERRA DE NINGUÉM. Ele evita até mesmo tornar simpático o protagonista (Martin Sheen), um sujeito que se torna um assassino em série perseguido pela polícia. Na história, que se passa nos anos 50 no sul dos EUA, Sheen é um sujeito que trabalha como apanhador de lixo e se apaixona por uma moça meio cabeça de vento (Sissy Spacek) que mora sozinha com o pai (o ótimo Warren Oates). O velho não aprova o namoro dos dois e um dia entra em casa e os flagra se preparando para ir embora. Ele ameaça ir até a polícia, mas é baleado e morto pelo rapaz, que foge com a garota para não ser pego pelos tiras. 

Malick não apóia nem condena a ação dos dois jovens perseguidos. É diferente, por exemplo, de um BONNIE AND CLYDE, que nos apresenta anti-heróis simpáticos e fáceis de serem admirados. Não é o que acontece com o casal de TERRA DE NINGUÉM. No caso da personagem de Sissy Spacek, é mais fácil se deixar absorver pela voz do que pela personagem dela. Spacek narra, em off, a estória de modo suave. Sua personagem é a que mais se aproxima do espectador, até por causa de sua passividade diante dos acontecimentos, do aceitar as coisas do jeito que elas são. Apenas num único momento do filme ela decide não seguir o caminho do namorado. 

Li que no cinema de Terrence Malick, o som das vozes é quase tão importante quanto as imagens. O que me lembra o valor dado à musicalidade da voz na poesia simbolista, o que é uma ironia, já que os filmes de Malick evitam a simbologia. Seus três primeiros filmes, todos trazem um narrador. No caso de ALÉM DA LINHA VERMELHA, são múltiplos narradores interferindo, muitas vezes, em momentos que nem são eles que aparecem na tela. Será que em THE NEW WORLD haverá também um narrador? 

Dizem que atualmente o maior seguidor do cinema de Malick é o jovem David Gordon Green, dos filmes PROVA DE AMOR e CONTRACORRENTE. É uma comparação a se observar.

domingo, outubro 02, 2005

A FEITICEIRA (Bewitched)

 

Nessas últimas semanas, a atividade de ir ao cinema tem sido menos prazerosa pra mim. A quantidade de filmes ruins que pipocam nas salas de exibição chega a ser assustadora. Ou desanimadora. Na semana passada, tive o desprazer de ver OS GATÕES - UMA NOVA BALADA, filme baseado numa série de televisão dos anos 70. A FEITICEIRA (2005), de Nora Ephron, não é tão ruim quanto o tal filme dos idiotas que curtem carros, mas também faz parte dessa época negra que Hollywood está atravessando, tendo que apelar para versões de séries de tv. A explicação talvez esteja no fato de que muitas séries de televisão da atualidade estão dando de dez a zero na maioria dos blockbusters idiotas que são despejados nas salas de cinema, sem o menor respeito com o público, nem com o passado glorioso que o cinema americano ostenta. Como muita gente está se voltando para as séries, os executivos de Hollywood talvez imaginem que os apreciadores de seriados irão sair de suas casas para ver versões milionárias, mas ridículas, das séries de sucesso do passado. Ledo engano. 

A FEITICEIRA foi um estrondoso fracasso, apesar do carisma e da beleza de Nicole Kidman e da popularidade de Will Ferrell. Sou fã de Nicole e aprendi a gostar de Ferrell recentemente, com MELINDA E MELINDA, mas o casal de astros não segura essa comédia boba e sem graça. Dois outros astros veteranos - Michael Caine e Shirley MacLaine - também estão presentes para pagar suas contas. 

O nome de Nora Ephron está associado a um de meus filmes favoritos, que é a bela comédia romântica HARRY E SALLY - FEITOS UM PARA O OUTRO (1989), de Rob Reiner: Nora é creditada como roteirista. Pena que, depois desse filme, sua carreira como diretora não deu muito certo, mesmo se contarmos com o sucesso comercial de outras comédias românticas com a presença de Meg Ryan - SINTONIA DE AMOR (1993) e MENSAGEM PARA VOCÊ (1998) - que ela dirigiu. 

Na trama de A FEITICEIRA, Nicole Kidman é uma bruxa com problemas de auto-estima por não conseguir fazer nada em sua vida que não seja com o auxílio dos seus truques de bruxaria. Ela sonha em encontrar algum homem perdido que precise de sua ajuda. Esse homem surge na figura de Will Ferrell, o astro de cinema egocêntrico, mas que no fundo também tem problema de auto-estima. Seu agente tem que lhe dar um empurrãozinho de vez em quando para que ele possa agir da melhor maneira possível. Seus caminhos vão se cruzar quando Ferrell está à procura de uma desconhecida para viver a bruxa Samantha na versão para cinema do antigo seriado A FEITICEIRA (1964-1972). 

A FEITICEIRA seria um filme sobre a dificuldade de se fugir de si mesmo, seja por causa do preconceito da sociedade (no caso da personagem de Nicole), seja por causa do egoísmo (no caso do personagem de Ferrell). Mas falta ao filme muita coisa para que esse tipo de mensagem ganhe algum significado. Faltam diálogos bons, faltam cenas engraçadas e falta, principalmente, cinema. Em seu favor, o filme consegue recriar o clima dos anos 60 mesmo se passando no mundo contemporâneo. O que é muito pouco.