terça-feira, dezembro 26, 2023

O SEQUESTRO DO VOO 375



O cartaz do filme é horroroso, não há rostos muito bonitos no elenco e não houve dinheiro o suficiente para a publicidade, o que acabou por não chamar a atenção de muitos espectadores potenciais. Eu mesmo, por conta dessa enxurrada de filmes sendo lançados ao mesmo tempo, só fui ver o filme após umas críticas positivas de alguns amigos e logo na quarta-feira da primeira semana de exibição. Ou seja, eu estava subestimando esta pequena pérola, surgida neste fim de ano sem que eu soubesse muito bem do que se tratava, apesar do título já antecipar. Mas a alegria que O SEQUESTRO DO VOO 375 (2023) me proporcionou não está no gibi. A começar pela surpresa de uma história incrível como a contada pelo filme ser tão pouco conhecida. Aparentemente, só quem conhecia eram as pessoas ligadas a casos especiais de voos. O cinema brasileiro precisa contar esses impressionantes casos reais que não necessariamente fazem parte de uma história grande, de grandes eventos presentes nos livros de história.

O diretor Marcus Baldini, de BRUNA SURFISTINHA (2011), OS HOMENS SÃO DE MARTE... E É PRA LÁ QUE EU VOU! (2014) e UMA QUASE DUPLA (2018) aparentemente é um diretor sem uma marca autoral. Seus filmes são muito diferentes entre si e este suspense baseado numa história real se distingue dos demais por não ter rostos muito conhecidos (ao contrário de outros filmes que ele dirigiu). Mas isso é um acerto, pois ajuda a criar ainda mais o tom de realismo necessário para o melhor envolvimento por parte do espectador.

Na trama, homem revoltado com o governo Sarney e com as mazelas de sua vida, resolve sequestrar um avião e jogá-lo no Palácio do Planalto. Só esse ponto de partida já é incrível, mas o que vem ao longo da narrativa é ainda mais impressionante, tanto em se tratando de surpresas, quanto no modo acertado como Baldini vai nos introduzindo ao ambiente de uma aeronave dos anos 1980.

A aproximação com os personagens, em especial o piloto, o sequestrador e a operadora de voo, é feita com muita naturalidade, e chegamos ao fim de todas as intensas emoções mais próximos deles. O que dizer da cena em que o sequestrador comete seu primeiro ato fatal? Depois desse momento, não tive como desgrudar os olhos da tela e me segurando na cadeira como se estivesse dentro daquela aeronave (essa parte é só um exagero estilístico).

O SEQUESTRO DO VOO 375 não fica atrás de filmes como VOO UNITED 93, de Paul Greengrass, ou PLANO DE VOO, de Robert Schwentke, e está acima da grande maioria de outros filmes de pânico dentro de um avião feitos em Hollywood neste século, como é o caso do hoje pouco lembrado O VOO, de Robert Zemeckis. O próprio SULLY – O HERÓI DO RIO HUDSON, se não fosse visto à luz da poética de Clint Eastwood, não sei se daria tanto valor. Enquanto isso, temos uma produção com pouca grana, mas que ainda assim consegue ter esse impacto incrível. Inclusive, recomendo que quem for ver o filme (ainda em cartaz nos cinemas) vá sabendo o mínimo possível.

E é isso: temos um belo suspense dentro de um avião para chamar de nosso agora. O triste é que pouca gente está indo ver nos cinemas e deixando passar a experiência fantástica que é vê-lo.

+ DOIS FILMES

PEDÁGIO

Sou do time que curtiu CARVÃO (2022) e do quanto é um filme que funciona como thriller de horror com alguns momentos de humor. Em PEDÁGIO (2023), Carolina Markowicz fala de uma mãe que toma a decisão de levar o filho para um curso de "cura gay" é mostrado de forma quase desinteressada, em certo tom debochado. Mas entendo que é preciso comprar a proposta da diretora de se ter um filme sobre personagens dotadas de hipocrisia (Maeve Jinkings e Aline Marta Maia) e aqueles que sofrem com seus atos, como é o caso do filho que só quer ser ele mesmo (Kauan Alvarenga). Uma das coisas interessantes que achei foi o espaço onde a história se passa, em Cubatão, cidade que ganhou fama anos atrás por ser uma das mais poluídas do Brasil. A cidade comparece em tons rosados e gosto da plástica da fotografia, mas desgosto do tom de humor que também me incomodou um pouco com DIVINO AMOR, de Gabriel Mascaro. Além do mais, não trazer a personagem da mãe para um lugar de perigo (pelo menos não foi assim que ficou) tornou sua história um pouco fria e pouco interessante. Para completar, a história do rapaz e o desenvolvimento do personagem também se perde.

TRÊS TIGRES TRISTES

Do Gustavo Vinagre, gosto muito da trilogia de filmes de entrevista, LEMBRO MAIS DOS CORVOS (2018), A ROSA AZUL DE NOVALIS (2018) e VIL, MÁ (2020). Depois disso, ao assumir os longas de ficção, com exceção de DEUS TEM AIDS (2021), que é documentário, seus filmes foram ganhando mais gordura e menos interesse, por mais que tenham um cuidado visual, especialmente nas cenas em interiores. TRÊS TIGRES TRISTES (2022) se passa numa quarta onda da COVID, uma onda que também traz o esquecimento para as mentes. Gosto da primeira meia hora e da dinâmica dos três personagens caminhando pelas ruas de São Paulo, de como eles ganham personalidades próprias. Depois, em certo momento, ao abraçar mais fortemente a imaginação, o filme foi me perdendo, por algum motivo.

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