sábado, janeiro 15, 2022

PÂNICO (Scream)



Muito bom sair da sessão do novo PÂNICO (2022) com um sorriso de orelha a orelha. Além de ser, muito provavelmente, o mais sangrento dos filmes da franquia, há um amor pelo gênero slasher e um amor ainda maior pelo primeiro PÂNICO (1996), de Wes Craven, que chega a arrepiar. Há uma cena que explicita esse sentimento, com uma das novas atrizes do elenco de jovens vítimas/heróis/possíveis assassinos. Trata-se daquele momento em que Jasmin Savoy Brown, que faz a primeira personagem LGBTQI+ da série, além de contar as regras da chamada requel (uma mistura de reboot com sequência que está muito em voga atualmente), também fala, apaixonadamente, o quanto o filme de 1996 representa para nossas vidas.

Esses novos personagens são tão bons – eu arriscaria dizer que são melhores do que os do filme original, em termos de construção e de maior aprofundamento – que durante a primeira parte do filme sequer sentimos falta do trio de protagonistas dos filmes anteriores. Na verdade, embora eles sejam extremamente importantes para a trama e para passar o bastão, ou melhor passar a tocha (e essa brincadeira no filme é impagável), Dewey (David Arquette), Gale (Courteney Cox) e Sidney (Neve Campbell) são coadjuvantes neste novo trabalho.

A “nova Sidney”, que ganha o nome sugestivo de Sam Carpenter, é a uma atriz mexicana, Melissa Barrera, e ela não é apenas uma moça que está sendo caçada pelo novo ou novos assassinos vestidos de Ghostface. Ela carrega consigo o fantasma do pai, ninguém menos que um dos primeiros assassinos, Billy Loomis. Não deixa de ser muito ousado da parte dos criadores construírem uma heroína que toma medicação para evitar a visão do falecido pai conversando com ela. Inclusive, dada a consciência de que qualquer pessoa ali é suspeita de ser o Ghostface, ela também é uma possível assassina. E com “motivos” para cometer os atos.

Acredito que nenhum outro filme da franquia teve isso em tão alta conta: o fato de explicitar que o assassino está entre o grupo de amigos, a ponto de isso ser a frase presente no cartaz. A essa altura, depois de quatro filmes, isso pode ser lógico, mas os diretores Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett tornam o whodunit ainda mais saboroso.

Gosto muito de como este novo filme talvez seja ainda mais autoconsciente do que os dirigidos por Craven, e carrega consigo uma gama ainda maior de filmes de horror, inclusive aqueles citados pela primeira vítima do assassino, o que ela chama de “horror elevado”, termo horroroso por si só, mas que chegou a ser utilizado para descrever filmes que também foram chamados de “pós-horror” até uns anos atrás. E há também as autocitações dos filmes da série “Stab”, que representam os filmes da série PÂNICO na nossa realidade. 

Também é importante destacar que, ao mesmo tempo que o novo filme é bem violento, não apenas pelo gore (é como se a catarse dos anos 1990 estivesse de volta), ele é também muito engraçado. É muito bom ver o humor surgindo em momentos de nervosismo. Lembro que sempre que revejo o primeiro filme, fico bastante impressionado com o aspecto doentio dos dois assassinos se esfaqueando entre si em um misto de comédia de gosto duvidoso e horror. Como a essa altura essa imagem se fixou em nossa memória coletiva, esse tipo de situação envolvendo comédia, violência gráfica e diálogos espirituosos e metalinguísticos já até pode chegar a outros níveis. Na sala em que assisti ao filme, uma moça gargalhava de prazer na famosa (e tradicional) cena da revelação e explicação (tipo Scooby-Doo).

Outra coisa que muito me agradou neste quinto filme foi o quanto ele se mostra saboroso em simplesmente todos os momentos. No famoso prólogo, com a ligação para a jovem Tara (Jenna Ortega); no retorno do elenco de veteranos e do quanto eles ainda são queridos e vistos como quase lendas; no quanto os atores se sentiram à vontade no papel (inclusive, conta-se que David Arquette chorou algumas vezes no set ao contracenar com a ex-esposa Courteney Cox); nas cenas que homenageiam clássicos (inclusive há uma homenagem explícita a PSICOSE, do Hitchcock); no quanto somos divertidamente enganados o tempo todo; no quanto a cena da festa é primorosamente orquestrada. Aliás, lembrando da festa, volto a falar do elenco: que fantástica e engraçada que é a Mikey Madison, atriz que anteriormente havia aparecido em papel pequeno em ERA UMA VEZ EM... HOLLYWOOD, do Tarantino. 

Que venham novas continuações deste filme. Ghostface ressuscitou de vez para o novo milênio. 

+ DOIS FILMES

A BABÁ (The Sitter)

Este curta está presente nos extras do box Slashers X e trata-se do embrião do que seria o pequeno clássico MENSAGEIRO DA MORTE (1979), além de ser uma referência direta para a franquia PÂNICO. Inclusive a voz do sujeito do outro lado da linha é muito parecida com a voz ameaçadora que aterroriza as vítimas nos filmes de Wes Craven. Em A BABÁ (1977), uma jovem estudante universitária se encarrega de olhar a casa de um casal rico, enquanto eles saem para jantar. Ela recebe constantes ligações de um estranho; a voz pergunta: "você já checou as crianças?". Em pouco mais de 20 minutos, o diretor Fred Walton demonstra um domínio muito bom do suspense. Nos extras, do DVD há também comentários do próprio diretor sobre seu curta e seu longa, e sobre o fato de ele nunca ter visto a reflmagem, o ótimo e subestimado QUANDO UM ESTRANHO CHAMA (2006), de Simon West.

CASAMENTO SANGRENTO (Ready or Not)

Este filme teve um pequeno hype uns dois anos atrás (não chegou a ser lançado nos cinemas brasileiros, creio eu), mas acabei não vendo por um motivo ou outro. O motivo maior de eu ter visto CASAMENTO SANGRENTO (2019) agora foi o fato de a direção ser dos sujeitos escalados para o novo PÂNICO (2022). E agora já sei que a escolha da dupla de diretores Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett foi acertada, já que não faltam sangue e muito humor negro nesta história de uma jovem que se casa com um rapaz de família rica e, na noite do casamento, precisa se submeter a um jogo tradicional daquela família bizarra. O que ela não sabia era que o jogo seria tão perigoso. Lembrei-me de alguns filmes de mulheres enfrentando valentemente outras pessoas e/ou psicopatas, como no ótimo VOCÊ É O PRÓXIMO, de Adam Wingard, ou mesmo no remake de 2003 de O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA, sem falar no subgênero rape and revenge. Mas aí já seria outra história.

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