sábado, maio 29, 2021

MIRACLE MILE



Há um par de meses vi este MIRACLE MILE (1988) sem saber nada a respeito. E digo uma coisa: é a melhor coisa a fazer. Saber um pouquinho sequer da trama pode estragar um pouco o prazer que é ficar impressionado com cada momento deste filme, segundo e último longa para cinema dirigido por Steve De Jarnatt e presente no box Clássicos Sci-Fi Vol. 7. Ao que parece, esse cineasta, que agora mora em uma casa no interior ao lado de um bunker que ele mesmo construiu, parecia ser mesmo a pessoa ideal para dirigir esta obra tão singular.

MIRACLE MILE é fantástico, louco, eletrizante e também profundamente romântico. Começamos com os dois protagonistas, Anthony Edwards e Mare Winnigham, se conhecendo, por acaso (?), em um museu natural. O início do filme já denuncia um pouco sobre tratar-se de uma obra ao mesmo tempo intimista, com uma voice-over de Edwards falando sobre encontrar alguém, e um vídeo explicando a origem do universo. Ou seja, o filme lida com duas escalas.

A trama começa com o encontro desses dois jovens que têm um amor à primeira vista e curtem bastante esse pouco tempo que passam juntos. Trocam os números de telefone. Em seguida, porém, o personagem de Edwards ouve, por acaso, no orelhão, uma ligação informando que, em 50 minutos, boa parte dos Estados Unidos (senão todo o mundo ocidental) seria destruído por uma bomba nuclear. E, ao saber disso, qual é a principal preocupação do rapaz? Tentar escapar, mas principalmente tentar salvar a mulher amada que àquela hora devia estar dormindo.

Claro o enredo que não é tão simples assim. Muita coisa acontece. As cenas no café durante a madrugada, quando o herói tenta falar sobre isso com as pessoas que lá estão, têm uma carga de desespero forte. Mas há algo que ultrapassa o desespero (um sentimento compreensível diante de tal situação), que é a vontade imensa de viver intensamente cada minuto. Esse sentimento é exponencializado com o fato de o filme conseguir passar o clima de noite/madrugada, auxiliado pela pouca movimentação daquela área de Los Angeles. A noite possui algo de misterioso por si só, e o filme, com sua carga surreal, acentua esse mistério.

Então, junta-se à noite o anseio para ver a pessoa amada o mais rápido possível, a vontade de permanecer vivo para experienciar o novo amor e todas as situações loucas que se apresentam ao longo da narrativa.  Assim, estamos diante de uma obra que até pode falar com os nossos tempos perigosos, por mais que seja um filme nascido de um outro zeitgeist, o medo de uma bomba nuclear ocasionado pela Guerra Fria, pela disputa de nervos entre Estados Unidos e União Soviética, que na era Reagan foi novamente intensificada.

Há quem costume comparar este filme a WEEK-END À FRANCESA, de Jean-Luc Godard, que infelizmente ainda não vi, mas é possível também fazer comparações com outro filme sobre o iminente fim do mundo, 4:44 - O FIM DO MUNDO, de Abel Ferrara, que também traz essa expectativa pelo fim de tudo, mas de uma maneira mais zen, mais espiritualmente preparada. Em ambos os filmes, o fim está relacionado a uma irresponsabilidade do ser humano. O filme de De Jarnatt, porém, parece mais "americano", tanto pelo consumismo quanto pelo egoísmo. Mas esses dois ismos servem como pano de fundo para o que realmente importa: a salvação ou o abraço final do casal apaixonado. Enquanto isso, a trilha sonora do Tangerine Dream embala esse pacote perfeito e infelizmente ainda pouco conhecido.

+ DOIS CURTAS

ALÔ TETÉIA

10 minutos de sorriso de orelha a orelha. É o que ALÔ TETÉIA (1978), estreia na direção de José Joffily, oferece ao espectador. Na simples trama, Louise Cardoso (linda!) é uma jovem burguesa que se prepara para ir à praia. Porém, depois que o carro não pega, ela tenta transportes alternativos para curtir o seu domingo (imagino que seja um domingo). É interessante como o cinema brasileiro desse período (anos 70), mesmo feito por pessoas de bom poder aquisitivo, gostava muito de apresentar a pobreza com certa crueza, mas também com muita simpatia, o que faz com que a antipatia da personagem de Louise seja um combustível para essa crônica social feita com bom humor. Anselmo Vasconcelos está ótimo como o trocador do ônibus.

LICK THE STAR

Curta que antecedeu a estreia na direção de longas de Sofia Coppola, este LICK THE STAR (1998) tem uma atmosfera que antecipa o estilo e um pouco das obsessões da diretora, como o tédio e o espaço de pessoas da elite. A trilha sonora remete a bandas com vocal feminino dos anos 1990 e a trama não parece ter mais importância do que o visual, o que também parece ter continuado a valer para alguns de seus trabalhos. A trama envolve um grupo de meninas e a relação que elas têm com uma garota cheia de si. Destaque para a fotografia em p&b e para a participação especial de Peter Bogdanovich como o diretor da escola.

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