terça-feira, julho 21, 2020

MULHER TENTAÇÃO

É possível imaginar, enquanto vemos MULHER TENTAÇÃO (1982), o público, composto de plateias sem frescura e obviamente adultas, gargalhando em muitas das cenas do filme, uma vez que esse mesmo público terá aceitado o divertido jogo de alternância entre sofisticação e vulgaridade proposto por Ody Fraga. Afinal, os créditos iniciais parecem antecipar um daqueles clássicos de muito bom gosto, com uma flauta tocando "She", de Charles Aznavour, enquanto vemos imagens de pinturas célebres (Vermeer, Rembrandt e Cézanne).

Porém, logo em seguida, as imagens que introduzem as cenas são de closes das genitálias de dois amantes sendo acariciados. Ou seja, é também interessante tentar imaginar o que o público daquele momento teria sentido com essas sequências iniciais. Por mais que o sexo explícito já tivesse chegado na Boca naquele momento, este é um filme de sexo simulado, como os de outrora. O que acontece é que o grafismo nos exemplares eróticos daqueles primeiros anos da década de 1980 estavam cada vez mais ousados, com o afrouxamento maior da censura, seguida de uma maior vontade por parte do público de ver uma oferta maior de pele e sexo no cinema popular.

Quanto ao humor, que é o que dá o tom e que pode ganhar ou perder o espectador, ele se manifesta de maneira mais bem-sucedida nas cenas protagonizadas por Luiz Carlos Braga, que faz o pai de família que tem problemas de ereção em uma relação corpo a corpo, mas que fica bastante feliz e satisfeito em ver, em satisfazer a sua tara pessoal, através do voyeurismo ao vivo. Não à toa, ele já está acostumado a pagar o capataz da casa para que ele transe com uma ou duas das empregadas de sua residência.

Na primeira cena de diálogo do filme, esse personagem do pai está na sala, ao lado da jovem e bela filha (Sandra Graffi) esperando a mãe (Renée Casemart). Ela está impaciente; ele, tranquilo. Ela o acusa de "manso"; ele parece pouco se importar se a esposa está transando com outro ou não. Veremos em instantes que aquele sexo da patroa com o capataz no quarto é algo de que todos na casa têm conhecimento.

O registro cômico de Ody é acertado e foca no sexo, que, ao mesmo tempo que é, em alguns momentos motivo de preocupação principalmente para a filha, ao final, se percebe um elemento de celebração da vida. Até o final, marcado principalmente pela alegria do pai em visualizar o sexo dos empregados, da esposa e até da filha em quartos distintos, algumas cenas ainda mostraram um pouco do drama (se é que podemos usar essa palavra aqui) de seus personagens. Como é o caso da filha, que se vê como vítima da mãe, uma mulher que tem por hábito roubar os seus namorados, transar com eles. Isso é o motivo de ela não conseguir fazer sexo com um homem em um motel: tem medo de que a mãe o tome dela.

Fraga, um dos maiores nomes do sexo no cinema brasileiro, seja como diretor, seja como roteirista, se não faz aqui um de seus melhores trabalhos - eu destacaria como os melhores que vi A FÊMEA DO MAR (1981) e PALÁCIO DE VÊNUS (1980), além de seu segmento no ótimo A NOITE DAS TARAS (1980) - ,consegue o feito de criar um filme leve (embora esse conceito varie de acordo com o público), divertido e compacto, ainda que esteja longe de ser tão bem-sucedido na voltagem erótica, o que prova que grafismo mais explícito e closes de genitálias não são garantia de satisfação nesse aspecto.

+ TRÊS FILMES

JOÃO, O MAESTRO

O filme tem o problema de tentar dar conta da vida do personagem e acaba saltando as cenas com diálogos, especialmente os diálogos com as mulheres da história, que acabam ficando muito ruins. Mas há um momento que funciona melhor, especialmente quando é o Rodrigo Pandolfo que está encarnando o protagonista. Direção: Mauro Lima. Ano: 2017.

EU TE LEVO

O filme é melhor do que eu esperava, embora seja bem simples. Ao menos não tem a intenção de ser grandioso e morrer na praia. Acaba funcionando muito bem como um filme sobre a opressão familiar em uma pessoa que quer se sentir livre. De certa forma, lembrou um pouco AMANTES, do James Gray, mas só nesse aspecto. É outra coisa bem diferente. Interessante terem filmado em preto e branco e mostrado a cidade de Jundiaí como um lugar meio morto. Nem sei se é o caso. Direção: Marcelo Müller. Ano: 2016.

ERA O HOTEL CAMBRIDGE

Que beleza de projeto arriscado e original. Um trabalho de ficção que parece um documentário e feito de mãos dadas com os vários movimentos de sem teto e assemelhados. Bom quando os artistas abraçam as causas humanas diante de momentos em que o ódio parece dominar. Direção: Eliane Caffé. Ano: 2016.

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