segunda-feira, abril 06, 2020

OS INVASORES DE CORPOS - A INVASÃO CONTINUA (Body Snatchers)

Sei que não está fácil para ninguém viver nesta quarentena. Mas, ao mesmo tempo, não deixa de ser um privilégio de quem pode ficar em casa. Por isso, não posso ficar reclamando, embora os sentimentos de angústia e ansiedade oscilem. Embora eu esteja há duas semanas conseguindo ver um filme por dia, esses filmes nunca foram vistos sem interrupções. OS INVASORES DE CORPOS - A INVASÃO CONTINUA (1993), de Abel Ferrara, foi o primeiro a quebrar essa regra na madrugada de ontem.

Isso se deve tanto ao meu interesse pela obra do cineasta, interesse que vem crescendo a cada dia, quanto ao acerto do diretor na condução deste filme de horror e ficção científica que já contava com duas versões muito queridas realizadas décadas atrás, a de Don Siegel, VAMPIROS DE ALMAS (1956), e a de Philip Kaufman, INVASORES DE CORPOS (1978). Ferrara tinha a missão, portanto, de fazer algo tão bom e tão atraente quanto os de seus antecessores.

Pena que o filme não tenha ganhado uma distribuição decente nos Estados Unidos e no mundo. Tinha tudo para ser um sucesso popular incrível. Foi o filme de maior orçamento dirigido pelo cineasta - 20 milhões de dólares -, e o primeiro e único em scope, mas que, por ser descoberto mais em home video ou na televisão, a maioria das pessoas acabaram vendo-o mutilado. Eu, pelo menos, a primeira vez que o vi foi na TNT, que, além de tudo, costuma cortar cenas de nudez. Então, eles mutilam duplamente: com cortes nos lados e de cenas.

O namoro de Ferrara com o cinema de horror já estava presente desde o seu primeiro longa no cinema mainstream, O ASSASSINO DA FURADEIRA (1979), e também depois com SEDUÇÃO E VINGANÇA (1981), mas é com OS INVASORES DE CORPOS que ele abraça com força o gênero, trazendo junto com ele dois grandes mestres do horror, Stuart Gordon e Larry Cohen, que colaboram no roteiro. Junte-se a isso, a participação do então roteirista de Ferrara, Nicholas St. John. Logo, não tinha como dar errado. Gordon, inclusive, ia ser o diretor contratado para a produção, mas, por algum motivo que desconheço, foi substituído.

A história se passa em uma base militar americana e acompanhamos a chegada de uma família que se estabelece naquele espaço, devido ao trabalho do engenheiro químico Steve Malone (Terry Kinney). Com ele, vão a esposa Carol (Meg Tilly), a filha Marti (Gabrielle Anwar, linda!) e o filho pequeno Andy (Reilly Murphy). É principalmente na personagem de Gabrielle Anwar que o filme se concentra. É a partir dela que algumas sugestões e simbolismos podem ser melhor pensados.

Na trama, os seres humanos daquela base (ou do mundo todo?) estavam tendo seus corpos desintegrados e substituídos por duplos alienígenas. A propagação do mal estava se tornando cada vez maior e o primeiro a notar é o garotinho Andy, cujos colegas de sala de aula já estavam todos substituídos por aliens. Ele também percebe que a mãe havia sido substituída. Aliás, vale destacar que um dos momentos mais impressionantes e assustadores do filme é a de Meg Tilly, já transformada, se declarando para a família; e, seguida, fazendo aquele grito para chamar a atenção dos outros invasores na rua.

No catálogo que estou lendo sobre Ferrara, um dos escritores afirma que o conceito de que a única história é a história do mal une a obra de Ferrara à de alguns de seus contemporâneos. Lembrei do quanto isso pode ser verdade, em especial se pensarmos em Lynch, em Cronenberg, em Verhoeven, e em Carpenter, para citar alguns.

Um aspecto muito presente na obra de Ferrara é a rebeldia. E isso pode ser visto principalmente em Marti, a personagem de Anwar. O fato de ela fugir à nova ordem estabelecida, a ordem dos invasores, não deixa de ser um ato de rebeldia. Embora, simbolicamente, se possa dizer que ela estaria também renunciando à própria metamorfose da adolescência. Com relação aos símbolos, alguns falam que o filme fala sobre a AIDS, outros, sobre Hiroshima, sobre futuras guerras químicas e biológicas. Hoje em dia, porém, OS INVASORES DE CORPOS ganha contornos ainda mais alarmantes e próximos da nossa realidade, diante da pandemia em que estamos vivendo.

+ TRÊS FILMES

NÓS (Us)

Não sei se fui com muita sede ao pote, mas a questão é que eu esperava uma obra-prima de NÓS. De todo modo, o talento de Jordan Peele está mais em cenas separadas do que no todo, que sofre com problemas de ritmo. O que não quer dizer que não curti o filme. Admiro muita coisa - o que é a interpretação de Lupita? - e fiquei ainda encucado com a alegoria que ele apresenta. Acho que também faltou mais força no horror de mostrar alguém parecido: lembro agora de dois filmes que fazem isso com muito mais impacto: O HOMEM DUPLICADO, de Villeneuve, e o curta O DUPLO, de Juliana Rojas. Mas NÓS é um filme que vai crescendo na memória, graças, principalmente, às ótimas cenas de destaque. Tem uma com a Elisabeth Moss que é sensacional. Ano: 2019.

JURASSIC WORLD - REINO AMEAÇADO (Jurassic World - Fallen Kingdom)

Que surpresa linda! J.A. Bayona pega uma franquia fadada a se repetir, põe sua mão autoral e nos presenteia com cenas que trazem a sua mão boa para o terror e também para o drama e para questões envolvendo crianças e família. O terceiro ato é maravilhoso. Arrepiei. Ano: 2018.

HAN SOLO - UMA HISTÓRIA STAR WARS (Solo - A Star Wars Story)

Tanta gente falando mal que eu, já ressabiado com o nome de Ron Howard na direção, não esperava encontrar uma aventura tão agradável. Gostei de todos os personagens e de como a história é redondinha e cheia de momentos empolgantes, embora a sensação de perigo nunca esteja assim tão presente. Pontos altos: a cena do trem, o reencontro de Han com Q'Ira, o primeiro encontro com Chewie e as cenas estreladas por Paul Bettany, como o principal vilão. No mais, se deixassem, o filme bem que podia ser mais sensual, graças à Emilia Clarke. Se na época da Princesa Leia e da Rainha Amigdala podia... Ano: 2018.

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