Acho bem complicado falar de VINGADORES - ULTIMATO (2019) evitando os spoilers. Portanto, já aviso que este texto deve ser lido apenas por quem já viu o filme, a fim de que não comprometa a apreciação da obra cinematográfica. A própria Marvel já vinha guardando a sete chaves o roteiro e o que de fato acontece nesta sequência de VINGADORES - GUERRA INFINITA (2018). Os trailers disponibilizados não dão ideia do caminho que o filme trafegará e levará junto os espectadores. E isso é muito positivo, já que temos uma grande surpresa logo nos primeiros minutos.
Ora, quem conseguiria imaginar que a chegada da Capitã Marvel (Brie Larson) seria tão rápida e o reencontro dos heróis com seu algoz Thanos (Josh Brolin) ocorreria tão de imediato? Assim, depois de recolhermos nosso queixo do chão e nos adiantarmos cinco anos na narrativa, somos apresentados a heróis alquebrados, sentindo-se totalmente frustrados por não terem conseguido recuperar as joias do infinito e vivendo em um mundo tão calmo quanto um cemitério. É neste mundo terrível que reaparece do universo subatômico Scott Lang, o Homem-Formiga (Paul Rudd). E é justamente ele quem traz uma ideia meio maluca que pode ser a resposta para a resolução dos problemas da humanidade: e se pudéssemos voltar no tempo para reverter o que foi feito por Thanos?
E eis que estamos diante de mais um excitante filme sobre viagens no tempo, e que consegue aproveitar isso para homenagear os mais de dez anos de produções dos estúdios Marvel. Assim, até mesmo filmes menores, como THOR - O MUNDO SOMBRIO (2013) e VINGADORES - ERA DE ULTRON (2015), podem ser reavaliados positivamente. Como, aliás, todo o conjunto da obra do estúdio, que contou com mais acertos do que erros nesse período celebrado pelos talentosos irmãos Anthony e Joe Russo, que saem de cena como gigantes depois de quatro bem-sucedidas produções para a Casa das Ideias.
Uma das características da Marvel, desde sua criação nos anos 1960, é conseguir apresentar heróis tão humanos que se torna fácil a identificação com o público leitor. O mesmo não se pode dizer da distinta concorrência, por exemplo, que eleva quase sempre à categoria de deuses os seus heróis. Aqui, no entanto, até mesmo um deus, Thor (Chris Hemsworth), se torna humano e fraco, especialmente quando sobre si está o peso maior de ter falhado em sua luta contra Thanos em momento tão decisivo. Daí ele se entrega à bebida e fica fora de forma. A figura patética de um Thor barrigudo é motivo de riso, mas ao mesmo tempo que rimos sabemos que aquele homem-deus está sofrendo e que merece a nossa solidariedade.
Aliás, um dos grandes méritos do filme (dentre vários) é saber lidar com a trajetória de seus três principais heróis: Steve Rogers/Capitão América (Chris Evans), Tony Stark/Homem de Ferro (Robert Downey Jr.) e o já mencionado Thor. Eles são a base dos Vingadores e a cena dos três avançando, já no terceiro ato do filme, para duelar contra Thanos, tem um significado simbólico muito forte.
Por isso, terminar a história com uma vitória com gosto amargo, devido à morte de dois heróis tão queridos, é também uma vitória da força da construção de personagens pelos quais nos importamos. Daí tanta gente estar saindo da sessão tão emocionada. Para quem é fã de quadrinhos, então, VINGADORES - ULTIMATO é um verdadeiro presente, algo jamais imaginado 15 anos atrás. Ainda mais quando pensamos na batalha final, trazendo tantos heróis juntos. Nem o grande número de efeitos digitais diminuem a empolgação e a torcida dos espectadores pelos heróis.
E isso acontece principalmente porque os roteiristas e os diretores sabem muito bem lidar com tantos personagens diferentes agindo em espírito de equipe no meio do caos daquela batalha. E se dizem que quadrinhos de super-heróis fazem as pessoas melhores, podemos dizer o mesmo de um filme como este, que prestigia tanto o heroísmo quanto o amor, em seu sentido mais amplo.
Falar de cada personagem aqui levaria tempo e tornaria o texto chato e sem unidade. Mas vale destacar que tivemos o melhor momento de Scarlett Johansson como a Viúva Negra; o melhor momento do Hulk (trazer o Hulk inteligente com a cara do Mark Ruffalo foi uma ideia genial, e mais genial ainda foi confrontá-lo com sua imagem no primeiro filme dos Vingadores); e o melhor momento também do Clint Barton (Jeremy Renner), como personagem atormentado - o filme começa com ele. Enfim, quem falou que três horas é demais é não pensar em quantos heróis os realizadores precisavam dar conta. E podemos dizer que o resultado foi glorioso. Eis um sério candidato a melhor filme de super-heróis já feito.
+ TRÊS FILMES
DUMBO
Eu ando bem desanimado com o cinema de Tim Burton, embora não perca nenhum filme dele no cinema. É sem dúvida um autor, mas sua ligação direta com o cinema clássico estilo sessão da tarde modorrenta me cansa um bocado. Quem sabe se trocassem o trilheiro habitual o filme ganhasse o meu interesse. Eu gosto bastante da Eva Green e sua personagem, inclusive. E o Colin Farrell também está muito bem. Mas por que tudo parece pouco atraente? Ano: 2019.
CÓPIAS - DE VOLTA À VIDA (Replicas)
É um filme que eu torcia muito para que desse certo. E até que deu, em parte. A primeira metade, focando na angústia do personagem e na sua obsessão em trazer a família morta de volta, é muito boa. O personagem do rapaz que ajuda Keanu Reeves na missão secreta também é muito bom. O filme se perde quando tenta finalizar com uma trama de gato e rato que, além de começar quando a história já está perdendo o pique, não tem tempo para conquistar o sentimento de credulidade do espectador. Direção: Jeffrey Nachmanoff. Ano: 2018.
VINGANÇA A SANGUE FRIO (Cold Pursuit)
O mesmo diretor realiza a refilmagem de O CIDADÃO DO ANO (2014). Não vi o original, mas tenho impressão que deve ser melhor do que este aqui, mesmo com a boa presença de cena do Liam Neeson. O que me incomodou nem foi a frieza com que a morte é tratada, de todas as maneiras, inclusive por parte do protagonista, mas como a gente não dá a mínima para o que acontece com os personagens e nem torce para que ele se vingue dos responsáveis pela morte do filho. Destaca-se o humor negro e o personagem do garotinho, que podia ter um papel maior. Aliás, ridículo o papel dado a Laura Dern. Direção: Hans Petter Moland. Ano: 2019.
domingo, abril 28, 2019
quarta-feira, abril 24, 2019
21 CURTAS BRASILEIROS
CARAMUJO-FLOR
Para se ver cinema-poesia é preciso estar em um estado de espírito bem apropriado. Acho que estava um pouco quando vi OLHO NU (2014), do Pizzini, longa-metragem que contou com Ney Matogrosso. Na época do longa, muito se falava deste curta, também com o Ney, mas com uma proposta totalmente distinta. Confesso que nem sei dizer sobre o que é o filme, mas gosto da força das imagens, tanto as primeiras, focadas na cidade grande, quanto as da natureza e dos corpos humanos e animais. Direção: Joel Pizzini. Ano: 1998.
CHÁ VERDE E ARROZ
Belo filme sobre exibidores japoneses de cinema itinerante no interior paulista. Quase todo falado em japonês, o filme se passa nos anos 50 e conta a história de um ex-benshi (narrador de filmes mudos) que agora tem a missão de exibir filmes japoneses para comunidades. O personagem do menino lembra um pouco o de CINEMA PARADISO, mas as condições aqui são mais precárias. Direção: Olga Futemma. Ano: 1989.
BREVÍSSIMA HISTÓRIA DAS GENTES DE SANTOS
Época ainda em que os curtas brasileiros faziam sucesso lá fora, mesmo quando a retomada ainda estava iniciando. Havia também esse tipo de filme bem-humorado um pouco herdeiro da TV PIRATA, que brinca de maneira inteligente com o documentário para contar uma longa história da cidade de Santos desde a colonização até a redemocratização. Ney Latorraca aparece como diversos personagens. Direção: André Klotzel. Ano: 1996.
EL MACHO
Admirável animação que aborda a libido masculina frente a uma mulher com uma voluptuosidade digna de Druuna, mas ainda mais acentuada pelos exageros cartunescos. Ainda assim, o filme, ao mesmo tempo que tira onda do desejo masculino, também namora a moça no elevador, passando por baixo de seu vestido e acentuando os faróis acesos. Não conhecia e fiquei admirado. Só não gosto tanto da segunda metade, centrada na possessividade. Direção: Ennio Torresan. Ano: 1993.
BRASIL PITORESCO: VIAGENS DE CORNÉLIO PIRES
Um filme que requer olhares curiosos sobre o Brasil dos anos 1920 e sobre o que há de registrado desse país em filme. Este é um filme de uma viagem do diretor à Bahia, passando primeiro por Salvador e depois adentrando outras cidades, com aspecto mais "exótico". Brigas de galos, pessoas subindo no coqueiro, a pesca etc. Curiosamente o final não tem cara de final. Ou então se perdeu no meio do caminho. Direção: Cornélio Pires. Ano: 1925.
DEUS É PAI
Curta bastante anárquico sobre uma DR entre Deus e Jesus em um consultório de psicanálise. O diretor faz questão de deixar sua técnica de animação tão anárquica quanto as palavras do rebelde Jesus, que tem ressentimento do pai, que por sua vez lamenta certos atos do filho. Queria ter achado mais graça. Talvez depois de 20 anos a heresia tenha deixado de ser tão forte. Direção: Allan Sieber. Ano: 1999.
O ATAQUE DAS ARARAS
O filme tem um clima anárquico e aparentemente descompromissado que parece não ter muito interesse em contar em detalhes sobre a viagem de Jairo Ferreira, acompanhando um grupo de teatro. Mesmo com a narração divertida de Carlos Reichenbach, a impressão que fica é que o grupo ali formado é do pessoal da Boca, já que são eles os citados. Gostaria de saber mais detalhes dos bastidores deste curta. Direção: Jairo Ferreira. Ano: 1975.
CANTOS DE TRABALHO
Além da ideia ser muito boa (selecionar cantos de trabalho de diferentes tipos de labuta e mostrar homens e mulheres trabalhando), as imagens de Humberto Mauro são sempre certeiras e poéticas, com uma montagem brilhante. Com o distanciamento temporal, é fácil achar tudo muito estranho: aquelas canções, as imagens etc, mas isso é normal. As canções já eram velhas em 1955. Leon Hirszman fez algo parecido posteriormente. Ano: 1955.
CARRO DE BOIS
Filmaço este último trabalho de Humberto Mauro e o único colorido de sua carreira. Com narração linda de Hugo Carvana, o filme tem um tom de poesia dolorida. O próprio som do carro de bois já é um lamento em si, e ver aqueles animais passando pelos mais diversos obstáculos para fazerem aquele trabalho não é tão fácil. Em meio à dor, a poesia, a beleza tanto do trabalho quanto da inteligência do homem em saber lidar com aquilo que lhe é possível ter e fazer. Em algum momento, o filme tenta ser um tanto didático, mas só em algum momento. Em sua maior parte é poesia pura. Tanto em imagens quanto na palavra narrada. Ano: 1974.
HANDEBOL
Pra quem viu e gostou de MATE-ME POR FAVOR vai gostar bastante de voltar ao universo escolar e juvenil de meninas tão atraentes quanto enigmáticas, tão violentas quanto doces. A primeira cena remete a Crepúsculo e achei que fosse entrar como uma versão melhorada do blockbuster, mas o filme nega isso e vai por um outro caminho, nunca deixando de ser intrigante. As imagens são lindas. Baita realizadora a Anitta. Direção: Anitta Rocha da Silveira. Ano: 2010.
DOV'È MENEGHETTI?
Passei muito tempo para finalmente ver este curta, que já era famoso antes mesmo de Beto Brant se tornar o cineasta prestigiado que se tornou. Hoje é um dos meus preferidos realizadores em atividade. Aqui ele faz um filme quase todo falado em italiano sobre um ladrão difícil de ser capturado pela polícia e que tem muita intimidade com os telhados. As cenas dos telhados com as imagens ao fundo são admiráveis do ponto de vista formal. Mas o filme não me empolgou, não. Fodas mesmo são os longas do Brant. Ano: 1988.
DI
Impressionante como fiquei incomodado com o grau de irreverência com que Glauber Rocha se utiliza do velório do pintor Di Cavalcanti pra fazer seu filme. Tudo bem que não deixa de ser uma homenagem e espantar a tristeza pode ser uma ótima pedida, mas ainda assim a sobreposição de músicas com a narração em voice-over do próprio Glauber, com aquele jeito todo próprio de falar, como se estivesse vendendo mais uma vez o projeto do Cinema Novo, tudo é um bocado estranho. Como estranheza é algo bem-vindo no cinema, e Di é desses filmes cultuados, é obra imperdível sim. Eu é que tenho cisma com o diretor. Ano: 1977.
CARTÃO VERMELHO
Havia esquecido que já tinha visto este filme. Não achei tão marcante, ainda mais que me incomoda no começo a menina ficar chutando bola nas bolas dos meninos. Mas isso tem uma razão de ser no conto, embora eu também ache questionável a conclusão, por mais que tenha sido pensado por uma mulher. Dá impressão que hoje a atitude de revanche dos meninos seria vista como quase um estupro, e extremamente traumatizante para a protagonista. Mas isso pode ser sinal de que o curta ainda segue forte. Direção: Laís Bodanzky. Ano: 1994.
CHAPELEIROS
A princípio pode parecer um filme tedioso sobre operários trabalhando em uma fábrica de chapéus em Campinas-SP. E não há nenhum diálogo, apenas imagens do trabalho desses homens e dessas mulheres. Mas é preciso que a câmera insista nas imagens, inclusive na cena da saída da fábrica, para que finalmente possamos perceber o quanto é desumana a rotina de trabalho dessas pessoas. E isso faz com que o filme cresça muito na memória. Direção: Adrian Cooper. Ano: 1983.
O BANDO DOS TANGARÁS
Eis um filme que vale mais pelo valor histórico, por ser a única imagem em movimento com Noel Rosa, e também por ter usado técnicas mais antigas de sincronização que as de O CANTOR DE JAZZ. A lata com o negativo foi descoberta em 1992 e o clipe foi restaurado. A música é "Vamo fallá do Norte" e Rosa fez parte do grupo por cerca de dois anos. Direção: Paulo Benedetti. Ano: 1930.
DIAS DE GREVE
Confesso que gostei mais deste curta do que dos longas seguintes de Adirley, embora reconheça que ele foi se tornando mais sofisticando e se mostrando cada vez mais preocupado com as desigualdades sociais. Não sei se por ser mais compacto, mais aqui Adirley consegue passar o sentimento de impotência do trabalhador diante do patrão, mesmo quando ele se vê no direito de fazer uma greve. A cena do desfile da escola de samba é bem representativa da realidade brasileira; do quanto o pobre tem aquele momento de alegria junto com o rico, mas fica que não fica muito além disso. Direção: Adirley Queirós. Ano: 2009.
BOCA ABERTA
Muito boa a discussão que o filme traz sobre o cinema brasileiro que insistia em sobreviver em tempos de crise. Na época, foi com o advento do sexo explícito na Boca do Lixo. E por isso há dentre os quatro cineastas presentes um que defende o sexo explícito, Ody Fraga. Quem se manifesta mais saudoso da época de seu sucesso como realizador de bangue-bangues é Alex Prado, que apresenta para um pequeno público um de seus filmes. Ozualdo Candeias e Tony Vieira também entram na ótima discussão, que hoje em dia muda um pouco, mas o cinema continua em crise. Direção: Rubens Xavier. Ano: 1985.
CAROLINA
Breve e contundente filme sobre Carolina de Jesus, a primeira (creio eu) escritora negra com obra publicada no Brasil. Vivendo na favela e com dificuldades imensas de manter a si e a filha pequena, ela consegue ainda assim esse feito. Os trechos da obra Quarto de Despecho são fortes, assim como as imagens de arquivo e a dramatização de Zezé Motta. Terminar com Racionais Mc's só aumenta o impacto da obra, já que a busca de igualdade social do negro ainda permanece até os dias hoje. Direção: Jeferson De. Ano: 2003.
ATÉ A CHINA
Delícia de animação sobre a primeira viagem à China do diretor. Dá para gargalhar diversas vezes com as experiências pelo que o cineasta passou, e tudo narrado com um tom de conversa entre amigos. Isso porque a narrativa foi adaptada de e-mails que ele mandava diariamente para os amigos contando de sua experiência no país. Divertido demais. E a técnica de animação é muito legal, sem a limpeza dos rascunhos, deixando as imagens ainda mais bonitas. É coisa de se assistir com um sorriso de orelha a orelha do início ao fim. Não à toa ficou em 13º na lista da Abraccine de melhores animações brasileiras. Direção: Marão. Ano: 2015. (Foto)
BAILÃO
Belo documentário sobre a vida um tanto escondida dos homens gays de meia-idade. O título do filme se refere a uma boate em que há predominância gay. Mas o forte do filme são os depoimentos de alguns homens que sofreram no passado com o preconceito e com a dificuldade de lidar com o seu desejo no trabalho, na família ou em outros ambientes públicos. Há bastante melancolia, mas há também uma sensação de liberdade muito bonita. Direção: Marcelo Caetano. Ano: 2009.
BRASÍLIA - CONTRADIÇÕES DE UMA CIDADE NOVA
Um filme que ficou perdido durante muito tempo por conta de seu tom crítico em pleno regime militar, quando foi realizado. O documentário de Joaquim Pedro de Andrade só pôde ser conhecido mais recentemente, quando uma cópia foi encontrada no MAM e restaurada para lançamento no DVD de Macunaíma. O filme mostra o contraste daquela cidade muito nova, limpa e asséptica feita para abrigar os políticos e a realidade dos trabalhadores nas cidades satélites, gente que chegou lá para trabalhar na construção, mas que ficou sem emprego com a finalização da cidade. Destaque para a entrevista em um ônibus em direção à cidade, com mais nordestinos em um busca do sonho de uma vida digna. Ano: 1967.
Para se ver cinema-poesia é preciso estar em um estado de espírito bem apropriado. Acho que estava um pouco quando vi OLHO NU (2014), do Pizzini, longa-metragem que contou com Ney Matogrosso. Na época do longa, muito se falava deste curta, também com o Ney, mas com uma proposta totalmente distinta. Confesso que nem sei dizer sobre o que é o filme, mas gosto da força das imagens, tanto as primeiras, focadas na cidade grande, quanto as da natureza e dos corpos humanos e animais. Direção: Joel Pizzini. Ano: 1998.
CHÁ VERDE E ARROZ
Belo filme sobre exibidores japoneses de cinema itinerante no interior paulista. Quase todo falado em japonês, o filme se passa nos anos 50 e conta a história de um ex-benshi (narrador de filmes mudos) que agora tem a missão de exibir filmes japoneses para comunidades. O personagem do menino lembra um pouco o de CINEMA PARADISO, mas as condições aqui são mais precárias. Direção: Olga Futemma. Ano: 1989.
BREVÍSSIMA HISTÓRIA DAS GENTES DE SANTOS
Época ainda em que os curtas brasileiros faziam sucesso lá fora, mesmo quando a retomada ainda estava iniciando. Havia também esse tipo de filme bem-humorado um pouco herdeiro da TV PIRATA, que brinca de maneira inteligente com o documentário para contar uma longa história da cidade de Santos desde a colonização até a redemocratização. Ney Latorraca aparece como diversos personagens. Direção: André Klotzel. Ano: 1996.
EL MACHO
Admirável animação que aborda a libido masculina frente a uma mulher com uma voluptuosidade digna de Druuna, mas ainda mais acentuada pelos exageros cartunescos. Ainda assim, o filme, ao mesmo tempo que tira onda do desejo masculino, também namora a moça no elevador, passando por baixo de seu vestido e acentuando os faróis acesos. Não conhecia e fiquei admirado. Só não gosto tanto da segunda metade, centrada na possessividade. Direção: Ennio Torresan. Ano: 1993.
BRASIL PITORESCO: VIAGENS DE CORNÉLIO PIRES
Um filme que requer olhares curiosos sobre o Brasil dos anos 1920 e sobre o que há de registrado desse país em filme. Este é um filme de uma viagem do diretor à Bahia, passando primeiro por Salvador e depois adentrando outras cidades, com aspecto mais "exótico". Brigas de galos, pessoas subindo no coqueiro, a pesca etc. Curiosamente o final não tem cara de final. Ou então se perdeu no meio do caminho. Direção: Cornélio Pires. Ano: 1925.
DEUS É PAI
Curta bastante anárquico sobre uma DR entre Deus e Jesus em um consultório de psicanálise. O diretor faz questão de deixar sua técnica de animação tão anárquica quanto as palavras do rebelde Jesus, que tem ressentimento do pai, que por sua vez lamenta certos atos do filho. Queria ter achado mais graça. Talvez depois de 20 anos a heresia tenha deixado de ser tão forte. Direção: Allan Sieber. Ano: 1999.
O ATAQUE DAS ARARAS
O filme tem um clima anárquico e aparentemente descompromissado que parece não ter muito interesse em contar em detalhes sobre a viagem de Jairo Ferreira, acompanhando um grupo de teatro. Mesmo com a narração divertida de Carlos Reichenbach, a impressão que fica é que o grupo ali formado é do pessoal da Boca, já que são eles os citados. Gostaria de saber mais detalhes dos bastidores deste curta. Direção: Jairo Ferreira. Ano: 1975.
CANTOS DE TRABALHO
Além da ideia ser muito boa (selecionar cantos de trabalho de diferentes tipos de labuta e mostrar homens e mulheres trabalhando), as imagens de Humberto Mauro são sempre certeiras e poéticas, com uma montagem brilhante. Com o distanciamento temporal, é fácil achar tudo muito estranho: aquelas canções, as imagens etc, mas isso é normal. As canções já eram velhas em 1955. Leon Hirszman fez algo parecido posteriormente. Ano: 1955.
CARRO DE BOIS
Filmaço este último trabalho de Humberto Mauro e o único colorido de sua carreira. Com narração linda de Hugo Carvana, o filme tem um tom de poesia dolorida. O próprio som do carro de bois já é um lamento em si, e ver aqueles animais passando pelos mais diversos obstáculos para fazerem aquele trabalho não é tão fácil. Em meio à dor, a poesia, a beleza tanto do trabalho quanto da inteligência do homem em saber lidar com aquilo que lhe é possível ter e fazer. Em algum momento, o filme tenta ser um tanto didático, mas só em algum momento. Em sua maior parte é poesia pura. Tanto em imagens quanto na palavra narrada. Ano: 1974.
HANDEBOL
Pra quem viu e gostou de MATE-ME POR FAVOR vai gostar bastante de voltar ao universo escolar e juvenil de meninas tão atraentes quanto enigmáticas, tão violentas quanto doces. A primeira cena remete a Crepúsculo e achei que fosse entrar como uma versão melhorada do blockbuster, mas o filme nega isso e vai por um outro caminho, nunca deixando de ser intrigante. As imagens são lindas. Baita realizadora a Anitta. Direção: Anitta Rocha da Silveira. Ano: 2010.
DOV'È MENEGHETTI?
Passei muito tempo para finalmente ver este curta, que já era famoso antes mesmo de Beto Brant se tornar o cineasta prestigiado que se tornou. Hoje é um dos meus preferidos realizadores em atividade. Aqui ele faz um filme quase todo falado em italiano sobre um ladrão difícil de ser capturado pela polícia e que tem muita intimidade com os telhados. As cenas dos telhados com as imagens ao fundo são admiráveis do ponto de vista formal. Mas o filme não me empolgou, não. Fodas mesmo são os longas do Brant. Ano: 1988.
DI
Impressionante como fiquei incomodado com o grau de irreverência com que Glauber Rocha se utiliza do velório do pintor Di Cavalcanti pra fazer seu filme. Tudo bem que não deixa de ser uma homenagem e espantar a tristeza pode ser uma ótima pedida, mas ainda assim a sobreposição de músicas com a narração em voice-over do próprio Glauber, com aquele jeito todo próprio de falar, como se estivesse vendendo mais uma vez o projeto do Cinema Novo, tudo é um bocado estranho. Como estranheza é algo bem-vindo no cinema, e Di é desses filmes cultuados, é obra imperdível sim. Eu é que tenho cisma com o diretor. Ano: 1977.
CARTÃO VERMELHO
Havia esquecido que já tinha visto este filme. Não achei tão marcante, ainda mais que me incomoda no começo a menina ficar chutando bola nas bolas dos meninos. Mas isso tem uma razão de ser no conto, embora eu também ache questionável a conclusão, por mais que tenha sido pensado por uma mulher. Dá impressão que hoje a atitude de revanche dos meninos seria vista como quase um estupro, e extremamente traumatizante para a protagonista. Mas isso pode ser sinal de que o curta ainda segue forte. Direção: Laís Bodanzky. Ano: 1994.
CHAPELEIROS
A princípio pode parecer um filme tedioso sobre operários trabalhando em uma fábrica de chapéus em Campinas-SP. E não há nenhum diálogo, apenas imagens do trabalho desses homens e dessas mulheres. Mas é preciso que a câmera insista nas imagens, inclusive na cena da saída da fábrica, para que finalmente possamos perceber o quanto é desumana a rotina de trabalho dessas pessoas. E isso faz com que o filme cresça muito na memória. Direção: Adrian Cooper. Ano: 1983.
O BANDO DOS TANGARÁS
Eis um filme que vale mais pelo valor histórico, por ser a única imagem em movimento com Noel Rosa, e também por ter usado técnicas mais antigas de sincronização que as de O CANTOR DE JAZZ. A lata com o negativo foi descoberta em 1992 e o clipe foi restaurado. A música é "Vamo fallá do Norte" e Rosa fez parte do grupo por cerca de dois anos. Direção: Paulo Benedetti. Ano: 1930.
DIAS DE GREVE
Confesso que gostei mais deste curta do que dos longas seguintes de Adirley, embora reconheça que ele foi se tornando mais sofisticando e se mostrando cada vez mais preocupado com as desigualdades sociais. Não sei se por ser mais compacto, mais aqui Adirley consegue passar o sentimento de impotência do trabalhador diante do patrão, mesmo quando ele se vê no direito de fazer uma greve. A cena do desfile da escola de samba é bem representativa da realidade brasileira; do quanto o pobre tem aquele momento de alegria junto com o rico, mas fica que não fica muito além disso. Direção: Adirley Queirós. Ano: 2009.
BOCA ABERTA
Muito boa a discussão que o filme traz sobre o cinema brasileiro que insistia em sobreviver em tempos de crise. Na época, foi com o advento do sexo explícito na Boca do Lixo. E por isso há dentre os quatro cineastas presentes um que defende o sexo explícito, Ody Fraga. Quem se manifesta mais saudoso da época de seu sucesso como realizador de bangue-bangues é Alex Prado, que apresenta para um pequeno público um de seus filmes. Ozualdo Candeias e Tony Vieira também entram na ótima discussão, que hoje em dia muda um pouco, mas o cinema continua em crise. Direção: Rubens Xavier. Ano: 1985.
CAROLINA
Breve e contundente filme sobre Carolina de Jesus, a primeira (creio eu) escritora negra com obra publicada no Brasil. Vivendo na favela e com dificuldades imensas de manter a si e a filha pequena, ela consegue ainda assim esse feito. Os trechos da obra Quarto de Despecho são fortes, assim como as imagens de arquivo e a dramatização de Zezé Motta. Terminar com Racionais Mc's só aumenta o impacto da obra, já que a busca de igualdade social do negro ainda permanece até os dias hoje. Direção: Jeferson De. Ano: 2003.
ATÉ A CHINA
Delícia de animação sobre a primeira viagem à China do diretor. Dá para gargalhar diversas vezes com as experiências pelo que o cineasta passou, e tudo narrado com um tom de conversa entre amigos. Isso porque a narrativa foi adaptada de e-mails que ele mandava diariamente para os amigos contando de sua experiência no país. Divertido demais. E a técnica de animação é muito legal, sem a limpeza dos rascunhos, deixando as imagens ainda mais bonitas. É coisa de se assistir com um sorriso de orelha a orelha do início ao fim. Não à toa ficou em 13º na lista da Abraccine de melhores animações brasileiras. Direção: Marão. Ano: 2015. (Foto)
BAILÃO
Belo documentário sobre a vida um tanto escondida dos homens gays de meia-idade. O título do filme se refere a uma boate em que há predominância gay. Mas o forte do filme são os depoimentos de alguns homens que sofreram no passado com o preconceito e com a dificuldade de lidar com o seu desejo no trabalho, na família ou em outros ambientes públicos. Há bastante melancolia, mas há também uma sensação de liberdade muito bonita. Direção: Marcelo Caetano. Ano: 2009.
BRASÍLIA - CONTRADIÇÕES DE UMA CIDADE NOVA
Um filme que ficou perdido durante muito tempo por conta de seu tom crítico em pleno regime militar, quando foi realizado. O documentário de Joaquim Pedro de Andrade só pôde ser conhecido mais recentemente, quando uma cópia foi encontrada no MAM e restaurada para lançamento no DVD de Macunaíma. O filme mostra o contraste daquela cidade muito nova, limpa e asséptica feita para abrigar os políticos e a realidade dos trabalhadores nas cidades satélites, gente que chegou lá para trabalhar na construção, mas que ficou sem emprego com a finalização da cidade. Destaque para a entrevista em um ônibus em direção à cidade, com mais nordestinos em um busca do sonho de uma vida digna. Ano: 1967.
sábado, abril 20, 2019
VIDAS DUPLAS (Doubles Vies)
Os filmes anteriores de Olivier Assayas, ACIMA DAS NUVENS (2014) e PERSONAL SHOPPER (2016), são bastante ambiciosos na forma. Por isso a impressão de que VIDAS DUPLAS (2018) é um trabalho menor e menos desafiador, semelhante talvez a HORAS DE VERÃO (2008), que também é um filme sobre pessoas conversando sobre comportamento, mudanças no cenário político e social e sobre relacionamentos. É como se o cineasta estivesse descansando um pouco enquanto prepara outra obra-prima.
Mas engana-se quem subestima VIDAS DUPLAS (2018), que encanta não apenas por trazer um elenco muito talentoso, mas por colocar nas bocas de seus personagens falas tão inteligentes e sensíveis que fazem com que eles se materializem em criaturas reais. O que dizer, por exemplo, de Vincent Macaigne, que brilha como o romancista Léonard Spiegel, um homem inseguro que coloca todos os seus dramas e relacionamentos em suas obras literárias? Os momentos em que ele se mostra especialmente deprimido, ao lado do editor vivido por Guillaume Canet, da amante vivida por Juliette Binoche ou da esposa interpretada por Nora Hamzavi, são pontos altos de um filme cheio de pontos altos.
No caso das cenas envolvendo Macaigne, uma espécie de coração do filme, elas se tornam grandes por serem mais relacionadas a discussões da vida real, de problemas ligados a relacionamentos. Os outros personagens se tornam menos sensíveis por discutirem mais assuntos do mundo contemporâneo, como o fim ou não do livro de papel, a diminuição do número de leitores de livros, a popularização dos audio-books etc. E o filme faz isso dando nomes aos bois: Facebook, YouTube, Kindle, Twitter.
Todo esse filosofar sobre o mercado editorial também vem junto com discussões acerca da natureza autobiográfica da arte e de sua imunidade a essas mudanças. Assayas, que havia trazido à tona um debate bem interessante sobre os blockbusters em ACIMA DAS NUVENS, mostra-se agora tão entusiasmado com a discussão sobre a revolução trazida pela internet que chega a contagiar. E no debate, há espaço tanto para Adorno quanto para Taylor Swift, para A FITA BRANCA e STAR WARS - O DESPERTAR DA FORÇA.
Falando nesses dois filmes, um dos momentos mais engraçados de VIDAS DUPLAS envolve sexo oral durante a sessão de um dos filmes e o modo como isso é contado em um romance. Sim, há o cuidado para não cansar o espectador com tanta discussão sobre internet e mercado editorial, já que a ciranda de amores dos personagens se tornam tão ou mais importantes do que o debate. Quase todos no filme têm um(a) amante e isso é outra coisa que diverte: nos fazer cúmplices de seus personagens. Ao final, a sensação de bem-estar faz com que gostemos tanto do filme, de seus personagens tão vivos, de suas discussões tão empolgantes, que o sentimento de gratidão pelo diretor e por todo o elenco se torna inevitável.
+ TRÊS FILMES
APRENDIZ DE ALFAIATE (Petit Tailleur)
Média-metragem cheio de paixão e de sentimentos de estar à deriva de seus personagens. Que baita diretor que o jovem Louis Garrel se tornou, seguindo os passos do pai e da Nouvelle Vague. Aqui temos um aprendiz de alfaiate que quer deixar a carreira quando conhece uma jovem atriz que também tem uma relação de amor e ódio com a profissão. Os dois se apaixonam, mas o destino parece não contribuir para a união dos dois, por mais que haja paixão. Aliás, como não ficar apaixonado por Léa Seydoux, pelo amor de Deus? Nunca ela esteve tão bela quanto aqui. Ano: 2010.
MEU ANJO (Gueule d'Ange)
Primeiro longa-metragem de Vanessa Filho e que já ganha um espaço no Festival de Cannes. Marion Cotillard faz mais uma personagem um tanto desestruturada emocionalmente. Não é uma personagem tão boa quanto a de UM INSTANTE DE AMOR, mas é bem interessante, inclusive por nos fazer julgar a personagem por seus atos irresponsáveis. Mas é a garotinha Ayline quem conquista a plateia. O grito dela de "não me deixe sozinha" é tocante. Ano: 2018.
DE CARONA PARA O AMOR (Tout le Monde Debout)
Uma comédia bem divertida sobre homem que finge ser cadeirante para se dar bem em uma situação e acaba não sabendo desfazer a mentira. Ri a valer, por mais que reconheça que muitos acharão bobo ou coisa parecida. Estou começando a tomar gosto pelas comédias mais comerciais francesas. Direção: Franck Dubosc. Ano: 2018.
Mas engana-se quem subestima VIDAS DUPLAS (2018), que encanta não apenas por trazer um elenco muito talentoso, mas por colocar nas bocas de seus personagens falas tão inteligentes e sensíveis que fazem com que eles se materializem em criaturas reais. O que dizer, por exemplo, de Vincent Macaigne, que brilha como o romancista Léonard Spiegel, um homem inseguro que coloca todos os seus dramas e relacionamentos em suas obras literárias? Os momentos em que ele se mostra especialmente deprimido, ao lado do editor vivido por Guillaume Canet, da amante vivida por Juliette Binoche ou da esposa interpretada por Nora Hamzavi, são pontos altos de um filme cheio de pontos altos.
No caso das cenas envolvendo Macaigne, uma espécie de coração do filme, elas se tornam grandes por serem mais relacionadas a discussões da vida real, de problemas ligados a relacionamentos. Os outros personagens se tornam menos sensíveis por discutirem mais assuntos do mundo contemporâneo, como o fim ou não do livro de papel, a diminuição do número de leitores de livros, a popularização dos audio-books etc. E o filme faz isso dando nomes aos bois: Facebook, YouTube, Kindle, Twitter.
Todo esse filosofar sobre o mercado editorial também vem junto com discussões acerca da natureza autobiográfica da arte e de sua imunidade a essas mudanças. Assayas, que havia trazido à tona um debate bem interessante sobre os blockbusters em ACIMA DAS NUVENS, mostra-se agora tão entusiasmado com a discussão sobre a revolução trazida pela internet que chega a contagiar. E no debate, há espaço tanto para Adorno quanto para Taylor Swift, para A FITA BRANCA e STAR WARS - O DESPERTAR DA FORÇA.
Falando nesses dois filmes, um dos momentos mais engraçados de VIDAS DUPLAS envolve sexo oral durante a sessão de um dos filmes e o modo como isso é contado em um romance. Sim, há o cuidado para não cansar o espectador com tanta discussão sobre internet e mercado editorial, já que a ciranda de amores dos personagens se tornam tão ou mais importantes do que o debate. Quase todos no filme têm um(a) amante e isso é outra coisa que diverte: nos fazer cúmplices de seus personagens. Ao final, a sensação de bem-estar faz com que gostemos tanto do filme, de seus personagens tão vivos, de suas discussões tão empolgantes, que o sentimento de gratidão pelo diretor e por todo o elenco se torna inevitável.
+ TRÊS FILMES
APRENDIZ DE ALFAIATE (Petit Tailleur)
Média-metragem cheio de paixão e de sentimentos de estar à deriva de seus personagens. Que baita diretor que o jovem Louis Garrel se tornou, seguindo os passos do pai e da Nouvelle Vague. Aqui temos um aprendiz de alfaiate que quer deixar a carreira quando conhece uma jovem atriz que também tem uma relação de amor e ódio com a profissão. Os dois se apaixonam, mas o destino parece não contribuir para a união dos dois, por mais que haja paixão. Aliás, como não ficar apaixonado por Léa Seydoux, pelo amor de Deus? Nunca ela esteve tão bela quanto aqui. Ano: 2010.
MEU ANJO (Gueule d'Ange)
Primeiro longa-metragem de Vanessa Filho e que já ganha um espaço no Festival de Cannes. Marion Cotillard faz mais uma personagem um tanto desestruturada emocionalmente. Não é uma personagem tão boa quanto a de UM INSTANTE DE AMOR, mas é bem interessante, inclusive por nos fazer julgar a personagem por seus atos irresponsáveis. Mas é a garotinha Ayline quem conquista a plateia. O grito dela de "não me deixe sozinha" é tocante. Ano: 2018.
DE CARONA PARA O AMOR (Tout le Monde Debout)
Uma comédia bem divertida sobre homem que finge ser cadeirante para se dar bem em uma situação e acaba não sabendo desfazer a mentira. Ri a valer, por mais que reconheça que muitos acharão bobo ou coisa parecida. Estou começando a tomar gosto pelas comédias mais comerciais francesas. Direção: Franck Dubosc. Ano: 2018.
sexta-feira, abril 05, 2019
SHAZAM!
É interessante notar a guinada que a Warner/DC deu até chegar em SHAZAM! (2019), de David F. Sandberg, o filme mais voltado para a comédia do Universo Compartilhado DC até o momento. No entanto, embora a Warner tenha uma tradição de fazer produções mais sombrias desde suas origens com os filmes de gângster, lá pelos anos 1990, houve o trabalho de Joel Schumacher nos filmes do Homem-Morcego; além do mais, muita gente quer esquecer do fracasso que foi LANTERNA VERDE, de Martin Campbell, que também enveredava pelo terreno da comédia.
De todo modo, o caminho que MULHER-MARAVILHA começou de maneira suave, que LIGA DA JUSTIÇA tentou sem sucesso, e que AQUAMAN conquistou rindo de si mesmo, atinge o seu auge em SHAZAM!, que tem uma leveza muito bem-vinda ao contar a história de um garoto que, através de um encontro quase que casual com um mago, se transforma em um super-herói muito poderoso.
O que não deixa de ser uma ironia é o fato de que atualmente são super-heróis de segundo escalão da DC Comics que estão conseguindo sucesso entre os fãs. Primeiro Aquaman; agora o Capitão Marvel/Shazam. Ambos super-heróis que tiveram uma trajetória bastante tortuosa nos quadrinhos. No caso do Capitão Marvel, pode-se dizer que houve até mesmo uma auto-sabotagem por parte da DC, já que o personagem foi inspirado no Superman e, ainda por cima, tinha esse problema de ter o mesmo nome de um super-herói da Marvel. Tanto que no filme o herói não tem um codinome, e ainda brinca muito com isso.
SHAZAM! começa apresenta o arqui-inimigo do herói, na figura de um bem jovem Dr. Thadeus Silvana, quando ele tem o seu primeiro contato com o Mago Shazam (Djimon Hounsou) e é rejeitado por não ser considerado digno - ele é tentado pelos demônios dos sete pecados capitais. Só muitos anos depois, com o desespero do envelhecido e enfraquecido mago, que um adolescente assume, não exatamente com tanta vontade, a imagem e os poderes do Capitão Marvel, uma entidade que tem os poderes e as virtudes de figuras mitológicas como Hércules, Sansão, Zeus etc.
O bom humor do filme é contagiante, sabendo brincar com os estereótipos das falas de vilões e também do Mago. Há também um belo colorido que serve não apenas para destacar o uniforme do herói, mas também para dar ao filme um ar de produção feita para agradar também aos bem mais jovens, por mais que os atos do supervilão possam parecer bem violentos, se vistos por crianças pequenas.
O filme ainda tem o mérito de, em meio à comédia, lidar com questões delicadas, como o sentimento de abandono dos órfãos, como é o caso de Billy Batson (Asher Angel), o menino que viria a ser o Shazam, e de seu irmão nerd Freddy Freeman (Jack Dylan Grazer), que é quem ajuda o inexperiente herói a lidar com seus novos e desconhecidos poderes. Ambos são acolhidos por uma família muito carinhosa que cuida de vários meninos e meninas adotados.
SHAZAM! tem tudo para ser um sucesso. Só não tem o selo Marvel, que é quem está com toda a força atualmente no que se refere à conquista dos corações de milhões de pessoas.
+ TRÊS FILMES
HOMEM-FORMIGA E A VESPA (Ant-Man and the Wasp)
Sequência que só comprova a bela fase que a Marvel está passando, com uma pluralidade de filmes muito interessante. Este aqui, se não é tão divertido quanto o primeiro, tem algumas cenas quase que inacreditáveis, como a perseguição nas ruas envolvendo mini-carros. Mesmo sendo mais sério que o primeiro filme, fica muuito leve depois da porrada que foi VINGADORES - GUERRA INFINITA. Mas tudo bem. Era pra ser assim mesmo. Só achei que o filme é rápido demais e acaba ficando raso. Nem sobra espaço para o romance do casal de protagonistas. Direção: Peyton Reed. Ano: 2018.
OS INCRÍVEIS 2 (Incredibles 2)
Beleza de aventura, que deixa no chão um monte de outros filmes de super-heróis em sua homenagem não só ao Quarteto Fantástico, mas aos filmes de espionagem e de ação dos anos 60, com um sabor retrô muito bom. A música do Michael Giacchino é ótima e conduz muito bem o filme. Legal também focar na Mulher Elástica como protagonista da ação fora de casa, enquanto o marido fica cuidando da casa e das crianças. Direção: Brad Bird. Ano: 2018.
POWER RANGERS
Quase que o diretor Dean Israelite consegue fazer um belo filme. O problema é mesmo a fonte. Não tinha como se afastar muito do original, e acho que ele até tenta, fazendo em boa parte da metragem uma história sobre a autodescoberta e a amizade de um grupo de adolescentes. E dá liga. Fica chato quando entram os monstros, a vilã etc. e o diretor parece não se interessar em fazer algo legal com isso. Ano: 2017.
De todo modo, o caminho que MULHER-MARAVILHA começou de maneira suave, que LIGA DA JUSTIÇA tentou sem sucesso, e que AQUAMAN conquistou rindo de si mesmo, atinge o seu auge em SHAZAM!, que tem uma leveza muito bem-vinda ao contar a história de um garoto que, através de um encontro quase que casual com um mago, se transforma em um super-herói muito poderoso.
O que não deixa de ser uma ironia é o fato de que atualmente são super-heróis de segundo escalão da DC Comics que estão conseguindo sucesso entre os fãs. Primeiro Aquaman; agora o Capitão Marvel/Shazam. Ambos super-heróis que tiveram uma trajetória bastante tortuosa nos quadrinhos. No caso do Capitão Marvel, pode-se dizer que houve até mesmo uma auto-sabotagem por parte da DC, já que o personagem foi inspirado no Superman e, ainda por cima, tinha esse problema de ter o mesmo nome de um super-herói da Marvel. Tanto que no filme o herói não tem um codinome, e ainda brinca muito com isso.
SHAZAM! começa apresenta o arqui-inimigo do herói, na figura de um bem jovem Dr. Thadeus Silvana, quando ele tem o seu primeiro contato com o Mago Shazam (Djimon Hounsou) e é rejeitado por não ser considerado digno - ele é tentado pelos demônios dos sete pecados capitais. Só muitos anos depois, com o desespero do envelhecido e enfraquecido mago, que um adolescente assume, não exatamente com tanta vontade, a imagem e os poderes do Capitão Marvel, uma entidade que tem os poderes e as virtudes de figuras mitológicas como Hércules, Sansão, Zeus etc.
O bom humor do filme é contagiante, sabendo brincar com os estereótipos das falas de vilões e também do Mago. Há também um belo colorido que serve não apenas para destacar o uniforme do herói, mas também para dar ao filme um ar de produção feita para agradar também aos bem mais jovens, por mais que os atos do supervilão possam parecer bem violentos, se vistos por crianças pequenas.
O filme ainda tem o mérito de, em meio à comédia, lidar com questões delicadas, como o sentimento de abandono dos órfãos, como é o caso de Billy Batson (Asher Angel), o menino que viria a ser o Shazam, e de seu irmão nerd Freddy Freeman (Jack Dylan Grazer), que é quem ajuda o inexperiente herói a lidar com seus novos e desconhecidos poderes. Ambos são acolhidos por uma família muito carinhosa que cuida de vários meninos e meninas adotados.
SHAZAM! tem tudo para ser um sucesso. Só não tem o selo Marvel, que é quem está com toda a força atualmente no que se refere à conquista dos corações de milhões de pessoas.
+ TRÊS FILMES
HOMEM-FORMIGA E A VESPA (Ant-Man and the Wasp)
Sequência que só comprova a bela fase que a Marvel está passando, com uma pluralidade de filmes muito interessante. Este aqui, se não é tão divertido quanto o primeiro, tem algumas cenas quase que inacreditáveis, como a perseguição nas ruas envolvendo mini-carros. Mesmo sendo mais sério que o primeiro filme, fica muuito leve depois da porrada que foi VINGADORES - GUERRA INFINITA. Mas tudo bem. Era pra ser assim mesmo. Só achei que o filme é rápido demais e acaba ficando raso. Nem sobra espaço para o romance do casal de protagonistas. Direção: Peyton Reed. Ano: 2018.
OS INCRÍVEIS 2 (Incredibles 2)
Beleza de aventura, que deixa no chão um monte de outros filmes de super-heróis em sua homenagem não só ao Quarteto Fantástico, mas aos filmes de espionagem e de ação dos anos 60, com um sabor retrô muito bom. A música do Michael Giacchino é ótima e conduz muito bem o filme. Legal também focar na Mulher Elástica como protagonista da ação fora de casa, enquanto o marido fica cuidando da casa e das crianças. Direção: Brad Bird. Ano: 2018.
POWER RANGERS
Quase que o diretor Dean Israelite consegue fazer um belo filme. O problema é mesmo a fonte. Não tinha como se afastar muito do original, e acho que ele até tenta, fazendo em boa parte da metragem uma história sobre a autodescoberta e a amizade de um grupo de adolescentes. E dá liga. Fica chato quando entram os monstros, a vilã etc. e o diretor parece não se interessar em fazer algo legal com isso. Ano: 2017.
quinta-feira, abril 04, 2019
ELEGIA DE UM CRIME
Há quem diga que Cristiano Burman, diretor de ELEGIA DE UM CRIME (2018), construiu sua obra (ou boa parte dela) em torno da morte de três familiares seus. Para quem não sabe, este novo trabalho é o terceiro da chamada trilogia do luto, que começou com os filmes CONSTRUÇÃO (2007), sobre a morte do pai do diretor, e MATARAM MEU IRMÃO (2013), de título autoexplicativo.
Como não cheguei a ver ainda os dois anteriores, só posso falar de ELEGIA DE UM CRIME, que considero um trabalho bem impactante e diria que bastante respeitoso no que se refere à figura da mãe. Pode haver algum oportunismo, mas a história das obras de arte é cheia desse tipo de situação, em que artistas procuram transformar uma tragédia ou uma dor em algo belo, transcendental.
ELEGIA DE UM CRIME traz à tona uma série de questionamentos, a partir da apresentação de familiares e da história que vai sendo construída da vida e da morte de Isabel Burlan da Silva, assassinada pelo namorado, aos 52 anos de idade. O crime ocorreu em 2011 e Burlan volta a Uberlândia para conversar com os irmãos e também com outras pessoas próximas sobre fatos relativos à mãe.
E eis que no meio de tudo isso, uma revelação sobre o próprio diretor é feita: ele foi adotado. Isso pode trazer à tona alguns questionamentos a respeito da natureza do sangue como possível elemento de dádiva ou maldição para uma família. Afinal, Cristiano parece muito diferente dos outros dois irmãos, que enveredaram pelo crime e passaram pela prisão mais de uma vez.
Um dos irmãos, inclusive, é o personagem mais trágico da história, mostrando-se extremamente fragilizado, física e espiritualmente, e muito arrependido de tudo que fez na vida. Conta do preconceito que sofre por ter fama de ladrão, mas logo em seguida o diretor faz questão de mostrar que o mesmo rapaz cairia mais uma vez, como se roubar ou cometer um crime fosse uma doença, tanto quanto o alcoolismo ou o vício em outras drogas. Mas sabemos que as circunstâncias econômicas e sociais são também fundamentais para o que ocorre com essa família.
Mas, voltando à questão da adoção, o momento mais emocionante do filme é a conversa de Cristiano com a irmã, que diz já saber sobre ele ter sido adotado e até conta a comovente história de Isabel e o filho que nasceu morto. Daí ela ter compensado com uma criança adotada e até fantasiava um parto de Cristiano, como se para apagar a perda da criança que não sobreviveu.
E o curioso é que essas questões se mostram até mais intensas na estrutura dramática do filme do que a própria morte da mãe de Burlan, que é o motivo de o filme existir. De todo modo, a figura da mãe e as circunstâncias trágicas de sua morte fornecem muitos momentos fortes, como o descaso da polícia, coisa que já aparece desde o prólogo, com Cristiano ligando para a Polícia Militar de uma cidade informando o paradeiro do assassino e recebendo a resposta de que isso não é da alçada deles. Há também a visita à casa onde ocorreu o crime etc. Assim, se há oportunismo por parte do cineasta, o resultado do filme faz com que nos esqueçamos disso e nos solidarizemos com o drama daquela família.
+ TRÊS FILMES
O SILÊNCIO DOS OUTROS (El Silencio de Otros)
Filme importante para estes tempos de ascensão da extrema direita no mundo. O caso da Espanha tem semelhanças com o que ocorreu na América Latina e em outros países, com ditaduras sendo levantadas e patrocinadas pelos Estados Unidos para bloquear o comunismo e levando à morte e à tortura de muitos. No caso da Espanha, a situação foi bem complicada, pois a Lei da Anistia também perdoou aqueles que torturaram. O filme começa em 2010 e vai até 2017, acompanhando o drama de pessoas que buscam justiça.O final é emocionante. Na minha sessão, houve gritos de "Lula livre". Direção: Almudena Carracedo e Robert Bahar. Ano: 2018.
SEXO NOS QUADRINHOS (Sex in the Comix)
Belo documentário exibido na GNT sobre quadrinhos eróticos. Contém depoimentos de mestres da nona arte, como Milo Manara, Robert Crumb, Zep, Bastien Vivès, que eu nem sabia que tinha escrito erótico... E ainda tem uma apresentadora-quadrinista gatíssima (Molly Crabapple). Deu vontade de ler mais obras do gênero. Atualmente tenho achado que diminuiu bastante a publicação. Até Manara está saindo pouco. Direção: Joëlle Oosterlinck. Ano: 2012.
BERGMAN 100 ANOS (Bergman – A Year in the Life)
Uma beleza este documentário comemorativo de um dos maiores gênios do cinema mundial. O que me assustou foi o tanto de coisas com que eu me identifiquei com o atormentado Bergman. Pena que não tenho o talento nem a sorte com as mulheres, só as dores e as angústias. O formato é bem tradicional, com entrevistados e cenas dos filmes e relatos mais ou menos em ordem cronológica, mas funciona muito bem. Direção: Jane Magnusson. Ano: 2018.
Como não cheguei a ver ainda os dois anteriores, só posso falar de ELEGIA DE UM CRIME, que considero um trabalho bem impactante e diria que bastante respeitoso no que se refere à figura da mãe. Pode haver algum oportunismo, mas a história das obras de arte é cheia desse tipo de situação, em que artistas procuram transformar uma tragédia ou uma dor em algo belo, transcendental.
ELEGIA DE UM CRIME traz à tona uma série de questionamentos, a partir da apresentação de familiares e da história que vai sendo construída da vida e da morte de Isabel Burlan da Silva, assassinada pelo namorado, aos 52 anos de idade. O crime ocorreu em 2011 e Burlan volta a Uberlândia para conversar com os irmãos e também com outras pessoas próximas sobre fatos relativos à mãe.
E eis que no meio de tudo isso, uma revelação sobre o próprio diretor é feita: ele foi adotado. Isso pode trazer à tona alguns questionamentos a respeito da natureza do sangue como possível elemento de dádiva ou maldição para uma família. Afinal, Cristiano parece muito diferente dos outros dois irmãos, que enveredaram pelo crime e passaram pela prisão mais de uma vez.
Um dos irmãos, inclusive, é o personagem mais trágico da história, mostrando-se extremamente fragilizado, física e espiritualmente, e muito arrependido de tudo que fez na vida. Conta do preconceito que sofre por ter fama de ladrão, mas logo em seguida o diretor faz questão de mostrar que o mesmo rapaz cairia mais uma vez, como se roubar ou cometer um crime fosse uma doença, tanto quanto o alcoolismo ou o vício em outras drogas. Mas sabemos que as circunstâncias econômicas e sociais são também fundamentais para o que ocorre com essa família.
Mas, voltando à questão da adoção, o momento mais emocionante do filme é a conversa de Cristiano com a irmã, que diz já saber sobre ele ter sido adotado e até conta a comovente história de Isabel e o filho que nasceu morto. Daí ela ter compensado com uma criança adotada e até fantasiava um parto de Cristiano, como se para apagar a perda da criança que não sobreviveu.
E o curioso é que essas questões se mostram até mais intensas na estrutura dramática do filme do que a própria morte da mãe de Burlan, que é o motivo de o filme existir. De todo modo, a figura da mãe e as circunstâncias trágicas de sua morte fornecem muitos momentos fortes, como o descaso da polícia, coisa que já aparece desde o prólogo, com Cristiano ligando para a Polícia Militar de uma cidade informando o paradeiro do assassino e recebendo a resposta de que isso não é da alçada deles. Há também a visita à casa onde ocorreu o crime etc. Assim, se há oportunismo por parte do cineasta, o resultado do filme faz com que nos esqueçamos disso e nos solidarizemos com o drama daquela família.
+ TRÊS FILMES
O SILÊNCIO DOS OUTROS (El Silencio de Otros)
Filme importante para estes tempos de ascensão da extrema direita no mundo. O caso da Espanha tem semelhanças com o que ocorreu na América Latina e em outros países, com ditaduras sendo levantadas e patrocinadas pelos Estados Unidos para bloquear o comunismo e levando à morte e à tortura de muitos. No caso da Espanha, a situação foi bem complicada, pois a Lei da Anistia também perdoou aqueles que torturaram. O filme começa em 2010 e vai até 2017, acompanhando o drama de pessoas que buscam justiça.O final é emocionante. Na minha sessão, houve gritos de "Lula livre". Direção: Almudena Carracedo e Robert Bahar. Ano: 2018.
SEXO NOS QUADRINHOS (Sex in the Comix)
Belo documentário exibido na GNT sobre quadrinhos eróticos. Contém depoimentos de mestres da nona arte, como Milo Manara, Robert Crumb, Zep, Bastien Vivès, que eu nem sabia que tinha escrito erótico... E ainda tem uma apresentadora-quadrinista gatíssima (Molly Crabapple). Deu vontade de ler mais obras do gênero. Atualmente tenho achado que diminuiu bastante a publicação. Até Manara está saindo pouco. Direção: Joëlle Oosterlinck. Ano: 2012.
BERGMAN 100 ANOS (Bergman – A Year in the Life)
Uma beleza este documentário comemorativo de um dos maiores gênios do cinema mundial. O que me assustou foi o tanto de coisas com que eu me identifiquei com o atormentado Bergman. Pena que não tenho o talento nem a sorte com as mulheres, só as dores e as angústias. O formato é bem tradicional, com entrevistados e cenas dos filmes e relatos mais ou menos em ordem cronológica, mas funciona muito bem. Direção: Jane Magnusson. Ano: 2018.
segunda-feira, abril 01, 2019
UMA CANTA, A OUTRA NÃO (L'une Chante l'Autre Pas)
Como o blog anda meio parado e a última em vez que escrevi aqui foi para homenagear o cineasta Domingos de Oliveira, falecido recentemente, e como agora a homenagem é para outro cineasta que se foi para um novo plano astral, fica essa impressão de que esse espaço se transformou em um local de despedida de pessoas queridas e, no caso desses, em especial, também de lamento pelo fato de não ter visto os filmes que deveria. No caso de Agnès Varda, a situação ainda é pior para mim, levando em consideração que ela tem mais de 50 títulos na direção.
Figura importante na história do cinema francês e contemporânea da turma da Nouvelle Vague, ainda que pertencente a outro grupo, junto com o então marido Jacques Demy, Varda foi vítima do machismo que impera em nossa sociedade e que o cinema naturalmente assimilou. É por isso que atualmente tem se buscado uma maneira de diminuir essa diferença de louvação de diretores homens e mulheres, através do reconhecimento e descoberta do trabalho das grandes cineastas da história do cinema. E não há dúvidas de que Agnès Varda está entre as mais importantes do mundo.
Atuando por sete décadas, a cineasta que faleceu aos 90 anos no último dia 29, experimentou bastante, fazendo tanto ficção quanto documentário e sendo uma das pioneiras de um cinema essencialmente feminista. UMA CANTA, A OUTRA NÃO (1977), por exemplo, é um desses filmes em que esse tema se mostra poderoso.
Acompanhamos aqui a história da amizade entre duas mulheres de diferentes estilos de vida ao longo de quase duas décadas. Começando em 1962, a trama apresenta Pauline aka Pomme (Valérie Mairesse) e Suzanne (Thérèse Liotard) passando por pelo menos duas situações perturbadoras. Uma delas é o aborto da amiga mais velha, Suzanne, que, ao não ter condições financeiras de manter um terceiro filho, é encorajada pela jovem amiga de então 17 anos a fazer um aborto. A outra situação é ainda mais perturbadora, e embora seja algo que as una espiritualmente ainda mais, será o fator que as distanciará fisicamente.
Vivendo em cidades diferentes, Pomme e Suzanne se encontrarão novamente apenas 10 anos depois, durante uma manifestação a favor do aborto. A questão do direito de ter filhos quando desejar é tão importante na trama quanto a dádiva e a alegria de ser mãe. Assim, há momentos musicados no filme em que os dois temas são cantados. Inclusive, uma das cenas mais belas é a ida de um grupo de mulheres em um barco para uma clínica de aborto na Holanda.
É lá que Pomme passa a namorar um rapaz iraniano, Darius (Ali Rafie), que está passando alguns meses na Europa. Pomme gosta de cantar e participa de apresentações musicais. Quando a peça em que está participando não dá certo, ela aceita o convite de Darius de ir com ele até o Irã. Apaixonada, ela aceita a proposta. Enquanto isso, Suzanne se sente tentada a ter um relacionamento com mais um homem casado.
Um dos méritos do filme é contar a história dessas duas mulheres com idas e vindas no tempo de maneira muito hábil e estabelecendo uma proximidade com as personagens, através dos textos dos cartões postais usados para correspondência entre as duas. Assim, depois de um salto de 10 anos, o filme volta no tempo para contar o que aconteceu entre os anos de distância entre as duas protagonistas.
Embora tenha gostado mais de Suzanne , o filme dá mais destaque a Pomme , até por ela ter uma vida mais ativa, sem filhos para prendê-la ao lar durante mais tempo. Assim, enquanto Pomme é alegre e sempre disposta a aventuras, Suzanne tem um sorriso geralmente triste, talvez por carregar o trauma da morte do antigo companheiro, mas também por não ter muita sorte nos relacionamentos e na vida financeira.
Por mais que alguns cineastas homens tenham lidado muito bem com a alma feminina, como Bergman ou Cukor, ter uma cineasta mulher abordando assuntos da feminilidade com força e sensibilidade faz muita diferença. Além do mais, quem só conhece Varda do recente VISAGES, VILLAGES (2017), pode ver em ELA CANTA, A OUTRA NÃO um momento em que a diretora já gostava de filmar em viagens no interior não-atores participando das cenas. Não à toa, Varda é tão querida: ela expande o amor para além de suas personagens.
+ TRÊS FILMES
IMAGEM E PALAVRA (Le Livre d’Image)
Não deixa de ser uma experiência bem interessante poder ver uma colagem de imagens do Jean-Luc Godard em pleno 2019. Pena que as imagens são mostradas de maneira tão rápida e com um ruído tão incômodo que fica muito difícil de estabelecer conexões e entender os elos, de modo a buscar uma aproximação maior com a obra. Sabemos que Godard dificilmente é fácil e o filme é pra ser incômodo mesmo, mas poderia ao menos ter saído da sessão com certos questionamentos. Acabei saindo com sono mesmo. Ano: 2018.
NORMANDIA NUA (Normandie Nue)
O curioso deste filme, que lembra bastante o inglês OU TUDO OU NADA pela temática (mas sem a mesma graça, claro), é o quanto ele consegue ser careta. Talvez a intenção seja aproximar-se das pessoas do vilarejo, que ficam em polvorosa com a história da fotografia com todos nus. Não deixa de ser um filme simpático (o diretor é o mesmo do ótimo A VIAGEM DE MEU PAI), mas isso não é suficiente. Quando eu penso em cinema francês, jamais vou querer pensar nesse tipo de cinema. Direção: Philippe Le Guay. Ano: 2018.
O PARQUE (Le Parc)
É um filme que cresce à medida que pensamos nele. Muitas imagens ficam fortes na lembrança. Ele se constrói de maneira realista, como uma espécie de romance tímido entre dois jovens, mas depois vai ficando mais misterioso. Na trama, dois jovens se encontram pela primeira vez em um parque. Seria um encontro amoroso, mas um deles não se interessa tanto a ponto de querer um relacionamento. Grande filme. Direção: Damien Manivel. Ano: 2016.
Figura importante na história do cinema francês e contemporânea da turma da Nouvelle Vague, ainda que pertencente a outro grupo, junto com o então marido Jacques Demy, Varda foi vítima do machismo que impera em nossa sociedade e que o cinema naturalmente assimilou. É por isso que atualmente tem se buscado uma maneira de diminuir essa diferença de louvação de diretores homens e mulheres, através do reconhecimento e descoberta do trabalho das grandes cineastas da história do cinema. E não há dúvidas de que Agnès Varda está entre as mais importantes do mundo.
Atuando por sete décadas, a cineasta que faleceu aos 90 anos no último dia 29, experimentou bastante, fazendo tanto ficção quanto documentário e sendo uma das pioneiras de um cinema essencialmente feminista. UMA CANTA, A OUTRA NÃO (1977), por exemplo, é um desses filmes em que esse tema se mostra poderoso.
Acompanhamos aqui a história da amizade entre duas mulheres de diferentes estilos de vida ao longo de quase duas décadas. Começando em 1962, a trama apresenta Pauline aka Pomme (Valérie Mairesse) e Suzanne (Thérèse Liotard) passando por pelo menos duas situações perturbadoras. Uma delas é o aborto da amiga mais velha, Suzanne, que, ao não ter condições financeiras de manter um terceiro filho, é encorajada pela jovem amiga de então 17 anos a fazer um aborto. A outra situação é ainda mais perturbadora, e embora seja algo que as una espiritualmente ainda mais, será o fator que as distanciará fisicamente.
Vivendo em cidades diferentes, Pomme e Suzanne se encontrarão novamente apenas 10 anos depois, durante uma manifestação a favor do aborto. A questão do direito de ter filhos quando desejar é tão importante na trama quanto a dádiva e a alegria de ser mãe. Assim, há momentos musicados no filme em que os dois temas são cantados. Inclusive, uma das cenas mais belas é a ida de um grupo de mulheres em um barco para uma clínica de aborto na Holanda.
É lá que Pomme passa a namorar um rapaz iraniano, Darius (Ali Rafie), que está passando alguns meses na Europa. Pomme gosta de cantar e participa de apresentações musicais. Quando a peça em que está participando não dá certo, ela aceita o convite de Darius de ir com ele até o Irã. Apaixonada, ela aceita a proposta. Enquanto isso, Suzanne se sente tentada a ter um relacionamento com mais um homem casado.
Um dos méritos do filme é contar a história dessas duas mulheres com idas e vindas no tempo de maneira muito hábil e estabelecendo uma proximidade com as personagens, através dos textos dos cartões postais usados para correspondência entre as duas. Assim, depois de um salto de 10 anos, o filme volta no tempo para contar o que aconteceu entre os anos de distância entre as duas protagonistas.
Embora tenha gostado mais de Suzanne , o filme dá mais destaque a Pomme , até por ela ter uma vida mais ativa, sem filhos para prendê-la ao lar durante mais tempo. Assim, enquanto Pomme é alegre e sempre disposta a aventuras, Suzanne tem um sorriso geralmente triste, talvez por carregar o trauma da morte do antigo companheiro, mas também por não ter muita sorte nos relacionamentos e na vida financeira.
Por mais que alguns cineastas homens tenham lidado muito bem com a alma feminina, como Bergman ou Cukor, ter uma cineasta mulher abordando assuntos da feminilidade com força e sensibilidade faz muita diferença. Além do mais, quem só conhece Varda do recente VISAGES, VILLAGES (2017), pode ver em ELA CANTA, A OUTRA NÃO um momento em que a diretora já gostava de filmar em viagens no interior não-atores participando das cenas. Não à toa, Varda é tão querida: ela expande o amor para além de suas personagens.
+ TRÊS FILMES
IMAGEM E PALAVRA (Le Livre d’Image)
Não deixa de ser uma experiência bem interessante poder ver uma colagem de imagens do Jean-Luc Godard em pleno 2019. Pena que as imagens são mostradas de maneira tão rápida e com um ruído tão incômodo que fica muito difícil de estabelecer conexões e entender os elos, de modo a buscar uma aproximação maior com a obra. Sabemos que Godard dificilmente é fácil e o filme é pra ser incômodo mesmo, mas poderia ao menos ter saído da sessão com certos questionamentos. Acabei saindo com sono mesmo. Ano: 2018.
NORMANDIA NUA (Normandie Nue)
O curioso deste filme, que lembra bastante o inglês OU TUDO OU NADA pela temática (mas sem a mesma graça, claro), é o quanto ele consegue ser careta. Talvez a intenção seja aproximar-se das pessoas do vilarejo, que ficam em polvorosa com a história da fotografia com todos nus. Não deixa de ser um filme simpático (o diretor é o mesmo do ótimo A VIAGEM DE MEU PAI), mas isso não é suficiente. Quando eu penso em cinema francês, jamais vou querer pensar nesse tipo de cinema. Direção: Philippe Le Guay. Ano: 2018.
O PARQUE (Le Parc)
É um filme que cresce à medida que pensamos nele. Muitas imagens ficam fortes na lembrança. Ele se constrói de maneira realista, como uma espécie de romance tímido entre dois jovens, mas depois vai ficando mais misterioso. Na trama, dois jovens se encontram pela primeira vez em um parque. Seria um encontro amoroso, mas um deles não se interessa tanto a ponto de querer um relacionamento. Grande filme. Direção: Damien Manivel. Ano: 2016.