domingo, dezembro 28, 2014
ÊXODO – DEUSES E REIS (Exodus – Gods and Kings)
Dos cineastas veteranos que ainda fazem superproduções em Hollywood, Ridley Scott é, curiosamente, um dos que mais têm sido alvo de críticas, tanto dos especialistas quanto do próprio público. E apesar de ter dirigido duas lindas obras tortas mas cheias de vigor como PROMETHEUS (2012) e O CONSELHEIRO DO CRIME (2013) nos últimos anos, infelizmente ele errou a mão feio no novo ÊXODO – DEUSES E REIS (2014), uma de suas obras mais problemáticas.
A comparação com NOÉ, de Darren Aronofsky, é inevitável, já que ambos são os dois filmes bíblicos mais ambiciosos do ano. Porém, enquanto Aronofsky teve a coragem de tornar a história do dilúvio ainda mais fantástica e apresentar um protagonista próximo de um psicopata, Scott não parece nem mesmo saber o que quer em seu épico sobre parte da história de Moisés, o profeta mais importante do Judaísmo.
Diferente de OS DEZ MANDAMENTOS, de Cecil B. DeMille, ÊXODO – DEUSES E REIS não tem a intenção de mostrar de maneira mais detalhada uma história mais extensa de Moisés, aqui vivido por Christian Bale. Não vemos, por exemplo, a cesta sendo deixada com o bebê indo parar nas mãos da filha do Faraó. Também não há espaço para a voz de Deus. Ou um deus nos moldes dos antigos épicos bíblicos. Ao que parece, isso se tornou quase proibitivo, além de bem anacrônico, para o cinema que se produz hoje.
Então, neste mundo esquecido por Deus, a opção em ÊXODO é mostrá-lo na figura de um garoto, embora fique a dúvida se se trata realmente de Deus ou de um mensageiro. De todo modo, não deixa de ser curioso e remete ao diabo mostrado como uma menina em A ÚLTIMA TENTAÇÃO DE CRISTO, de Martin Scorsese. Scott prefere deixar para o espectador decidir se Moisés estava mesmo falando com Deus ou se ele era uma espécie de esquizofrênico.
Mas isso se torna bem problemático quando é preciso mostrar as sete pragas e o povo atravessando o Mar Vermelho. Assim, por mais que seja criativa a forma como ele faz as águas ficarem manchadas de vermelho, as demais pragas adquirem mesmo um caráter fantástico. Mas o pior mesmo é a cena da travessia no Mar Vermelho, totalmente broxante, se pensarmos em quão fantástica é a versão de DeMille. Ao tentar fazer algo mais "realista", talvez por culpa de um roteirista ateu, quem sabe, o resultado foi pífio. E embora o roteiro seja ridículo em diversos momentos, a direção de Scott não compensou em instante algum.
E há um problema de casting impressionante. Para que escalar uma atriz do porte de Sigourney Weaver se é para lhe oferecer falas escassas e extremamente bobas? A essa altura ela ainda deve estar chateada com o diretor de ALIEN, O OITAVO PASSAGEIRO (1979), mesmo ela tendo sido alçada à fama graças a Scott. A conversa sobre a maternidade e origem de Moisés - uma das poucas em que ela participa - é bastante confusa, o que dá a entender que muita coisa deve ter ficado na sala de edição.
Aaron Paul, como Josué, é outra escalação infeliz. O ator parece não ter se livrado de seu personagem viciado e malandro de BREAKING BAD. Só faltou dizer um "yo" em meio a uma conversa com Moisés. E nem é preciso falar de Ramsés, vivido por Joel Edgerton (de GUERREIRO), um exemplo de como não se criar um antagonista. E, meu Deus, pra que colocá-lo frente a frente com Moisés no final, novamente?
Pode-se atribuir uma das falhas do filme à edição, já que as duas horas e meia de projeção passam de maneira bem travada e as elipses ao final passam uma impressão clara de terem sido feitas às pressas, como para arranjar uma conclusão mais ou menos satisfatória, já sabendo que seria quase impossível salvar a produção.
Felizmente há poucas cenas de batalha, pois as que Scott tenta dirigir no começo são bem constrangedoras, lembrando as edições picotadas de GLADIADOR (2000), só que um tanto piores. Há uma cena de uma lança atravessando um homem que é tão ruim que parece teatro infantil. A melhor coisa do filme acaba sendo a beleza encantadora da espanhola María Valderde, que interpreta Séfora, esposa de Moisés.
Mais sorte no próximo projeto de Scott, pois se trata de um cineasta talentoso, apesar dos altos e baixos. Ele costuma se sair melhor em projetos com orçamento menor e com mais ênfase nos personagens.
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