sexta-feira, julho 29, 2011
HANNA
Hoje em dia, com os cinemas infestados por filmes convertidos em 3D, que mais parecem uma máfia para ganhar dinheiro dos desavisados e ainda por cima tomar o espaço que filmes importantes teriam, é até compreensível que HANNA (2011), o quarto longa-metragem para cinema de Joe Wright, não tenha ganhado espaço e a distribuidora Sony tenha resolvido lançá-lo direto em DVD e Blu-ray no Brasil. Outro problema que também tem afetado a quem gosta de ver filme no cinema são as inúmeras e horrendas cópias dubladas, que antes eram feitas apenas para filmes infantis, mas que agora são usadas para praticamente todo filme hollywoodiano que se pretende ser bem sucedido nas bilheterias. Mas falemos de HANNA.
O filme é uma surpresa para quem está acostumado a associar o nome de Joe Wright a dramas de época. Digo isso, pois prefiro apagar da minha memória o fraquíssimo O SOLISTA (2009). Preferível lembrar do cineasta dos excelentes ORGULHO E PRECONCEITO (2005) e DESEJO E REPARAÇÃO (2007), filmes que se caracterizavam por uma direção moderna, com belos travellings e uso elegante de gruas, que se contrapunham ao que normalmente se vê em filmes do gênero contemporâneos, que em geral seguem uma cartilha mais tradicional.
Quanto a HANNA, ao ver, por exemplo, o espetacular plano-sequência em que Eric Bana luta com vários homens, veio-me à mente a impressão de que Joe Wright é o cineasta mais virtuosista da atualidade. Pelo menos do Ocidente, já que no Oriente, nomes como Johnny To e Wong Kar-wai, entre outros, são mestres do virtuosismo. Outra coisa que chama de imediato a atenção em HANNA é a trilha sonora, a cargo dos Chemical Brothers, que fizeram uma música que casa muito bem com um thriller de ação.
Na trama, a jovem Hanna (Saoirse Ronan) vive num lugar gelado e remoto da Finlândia com o pai (Eric Bana), com quem aprende técnicas de sobrevivência e de luta, bem como as mais diversas línguas. Mas é chegada a hora de ela partir para o mundo, para sua missão, e dar de cara com pessoas que caçam ela e seu pai. Em fuga, Hanna encontra um grupo de turistas que a veem como estranha, mas mesmo assim a acolhem, e também descobre alguns segredos a respeito de si. Cate Blanchett é a vilã perversa e estilosa, que nem de salto alto perde a pose nas cenas de perseguição e tiroteio.
O próximo filme de Joe Wright será uma volta aos dramas de época: uma nova versão de ANNA KARENINA, prevista para estrear no próximo ano. Espero que dessa vez possamos ter o privilégio de vê-lo no cinema. Até porque, esse filme, que conta com Keira Knightley, a atriz de sorte do diretor, tem cara de concorrente ao Oscar.
quinta-feira, julho 28, 2011
HAROLDO TAPA OLHO (The Milky Way)
Este é o primeiro de uma série de três filmes de Leo McCarey que pretendo comentar aqui no blog. Já havia feito uma mini-peregrinação pelos filmes desse diretor, mas, como não é muito fácil conseguir muita coisa dele, só recentemente consegui mais uma série de filmes. E este HAROLDO TAPA OLHO (1936) é o menos importante dos três, mas que entra primeiro, pois pretendo obedecer a uma ordem cronológica. Trata-se de uma comédia, gênero que McCarey dominava tão bem quanto o melodrama. Segundo Peter Bogdanovich, ele foi o responsável por reunir O Gordo e o Magro; foi responsável pela direção de DIABO A QUATRO (1933), considerado por muitos o melhor trabalho dos irmãos Marx; e foi responsável pela persona que Cary Grant assumiria nas comédias a partir de então, depois de ter feito com ele CUPIDO É MOLEQUE TEIMOSO (1937).
HAROLDO TAPA OLHO é outro filme que McCarey fez com um comediante famoso. Dessa vez, um advindo do cinema mudo: Harold Lloyd. Se Lloyd não tinha o mesmo prestígio e nem o mesmo talento que os geniais Charles Chaplin e Buster Keaton, ainda assim era um mestre do humor físico. Tanto é que ele não se adaptou muito bem ao cinema falado. O próprio McCarey, em entrevista a Bogdanovich, afirma que ele era incapaz de representar. Apesar disso, o filme traz vários momentos engraçados, principalmente perto do final, e acaba sendo um bom representante meio torto do subgênero screwball comedy.
No filme, Lloyd é um entregador de leite de uma grande companhia que não é exatamente um funcionário padrão. E o patrão ainda não vai com a cara dele, ainda por cima. Um dia, defendendo sua irmã de uma dupla de boxeadores, ele, que tinha uma habilidade extraordinária em se esquivar, acaba por "nocautear" o famoso boxeador e isso gera notícias nos jornais. A família e os agenciadores do boxeador tentam contatá-lo, mas o melhor que conseguem fazer é trazê-lo para o mundo do boxe. As cenas de "luta" no ringue lembram tanto Charles Chaplin quanto Didi Mocó, que por sua vez copiava Chaplin. São momentos que mais se aproximam das comédias mudas. E são justamente nesses momentos que a gente entende que o mundo de Lloyd estava mesmo com os dias contados.
quarta-feira, julho 27, 2011
CINZAS NO PARAÍSO / DIAS DE PARAÍSO (Days of Heaven)
Aproveitando a proximidade da estreia de A ÁRVORE DA VIDA (2011), resolvi assistir o filme que faltava eu ver de Terrence Malick, esse cineasta que já se tornou uma lenda viva, mesmo tendo apenas cinco filmes no currículo até o momento. DIAS DE PARAÍSO (1978) foi o que ele fez antes de se dar a si mesmo e aos cinéfilos um jejum de simplesmente vinte anos, só finalizado com ALÉM DA LINHA VERMELHA (1998). Seus filmes se caracterizam por serem extremamente ligados à natureza, que se contrapõem às ações do homem, artificiais e violentas. Mas a visão de Malick não parece ser julgadora. Tanto é que o narrador é a garotinha pré-adolescente, irmã de Bill, o personagem de Richard Gere.
A sequência inicial do filme mostra o protagonista brigando numa fábrica com um homem. Logo em seguida, ele foge com a irmã pequena e a namorada Abby (Brooke Adams) para trabalharem nos campos de trigo de uma grande fazenda. O trabalho é duro, mas o lugar aos olhos do espectador parece paradisíaco, graças à fotografia esplendorosa de Nestor Almendros. Ele e Malick se inspiraram em pintores como Johannes Vermeer e Edward Hopper e em filmes mudos e documentários do início do século XX, que é quando se passa a trama.
Malick e Almendros utilizaram luz natural para construir coerência com algo tão próximo da obsessão do cineasta: a natureza, com seus animais silvestres e sua vegetação, tão ou mais importante que o homem. Curiosamente, Almendros fotografou apenas cerca de metade do filme. Por ter um compromisso com François Truffaut, com quem realizaria O HOMEM QUE AMAVA AS MULHERES, ele passou o cargo para Haskell Wexler, que para seu desgosto foi creditado apenas por fotografia adicional. E quem ganhou o Oscar foi Almendros.
Malick também gosta de destacar tragédias. Em todos os seus filmes, ela aparece de uma maneira ou de outra. No caso de DIAS DE PARAÍSO, ela se dá através do triângulo amoroso entre Bill, Abby e o fazendeiro, interpretado por Sam Shepard. Bill e Abby apresentam-se como irmãos. O fazendeiro, diagnosticado com uma doença fatal que lhe daria apenas um ano de vida, no máximo, apaixona-se por Abby. Apesar de ter ciúme de Abby com o fazendeiro, os dois acreditam que o melhor a fazer é que Abby aceite a proposta de casamento do fazendeiro. Depois que ele morresse, eles poderiam ficar com a fazenda. Seria um belo golpe. Mas o pressentimento de que algo daria muito errado é inevitável.
A trama é simples, os diálogos são econômicos e a força do filme se encontra nas imagens e na trilha sonora de Ennio Morricone. DIAS DE PARAÍSO, assim como os demais filmes de Malick, devem ser melhor apreciados na tela grande, de preferência numa sala de cinema bem equipada com som e imagem que façam jus à beleza plástica que se torna mais importante do que a própria trama. Talvez seja por isso que boa parte da audiência acaba por ver os filmes do diretor com certo distanciamento, já que a ligação com os personagens não é tão forte. Principalmente se comparada à beleza das imagens, próximas ao espiritual, mas ao mesmo tempo muito ligadas ao plano terreno.
O filme foi lançado originalmente nos cinemas brasileiros com o título CINZAS NO PARAÍSO. Em dvd, a Paramount lançou como uma tradução do título original.
terça-feira, julho 26, 2011
JERI 2011
Já perdi a conta de quantas vezes fui a Jericoacoara. A primeira vez, lembro que foi em 2000, com uma namorada da época, mas todas as vezes seguintes que lá estive foram com essa turma especial que eu conheço há mais de dez anos, cujos integrantes foram mudando, mas o núcleo duro permanece. Sempre que a gente se reúne é motivo para festas e momentos memoráveis. E se antes o povo estava atarefado demais para se reunir, agora que boa parte da turma está morando em outras cidades, então, aí é que se torna mais complicado. Por isso que não devemos perder essas oportunidades que surgem de nos encontrarmos novamente.
A turma que foi dessa vez foi pequena: Valéria, Erika, Danilo, Juliana, Bárbara, Amanda, Davi, Rodrigo e quem eu conheci só agora, o Mário. Faltou o Murilo, que devido a um infeliz imprevisto não pôde se juntar a nós como planejado. E faltaram também outras pessoas da turma, claro, que não foram por razões pessoais ou porque não estavam a fim de ir.
Este ano foi quase uma volta ao pique de tempos atrás, com a turma bem mais bagunceira. Não dá pra esquecer o povo cantando uma versão pornográfica de um reggae às quatro da matina no bar Mama África, depois da apresentação "acústica" da banda. Eu, infelizmente, nessa hora, estava sofrendo de hipoglicemia ou algo parecido e precisava comer algo urgente. Mas no dia seguinte, já estando tudo bem, lembrava com bom humor das presepadas da noite, destaque para "Mário e a francesa" e Juliana no microfone recitando um trecho muito bonito de BONITINHA, MAS ORDINÁRIA, o filme de cabeceira do grupo.
No dia seguinte, no domingo, as presepadas da noite anterior ainda renderam muito e o povo aproveitou para filmar uma versão toda própria do inacreditável videoclipe "Armadilha de Satanás". Outro vídeo do youtube que eu não conhecia e que foi várias vezes citado pela turma durante esses dias foi o vídeo da travesti Luisa Marilac. São coisas que muita gente já deve ter visto e até citado no dia a dia, mas que eu, nesses meses de estudo, devo ter deixado passar.
A ida para a Pedra Furada rolou, como sempre, mas desta vez a maré tornou a tarefa de ida quase um suplício, pois tivemos que passar por pedras e morros íngremes. E com o sol já no modo hardcore, eu e a Erika resolvemos voltar de charrete. Foi legal, pois foi algo inédito pra mim. Senti-me um pouco no século XIX. Só acho uma pena que a turma, estando separada em diferentes pousadas, diminuiu as possibilidades de mais conversas interessantes na casa, o que pra mim é sempre motivo de prazer, muitas vezes mais até do que os passeios em si. Ainda assim, fazia tempo que não ria tanto. E isso faz um bem ao espírito...
E, como sempre, para ilustrar melhor o registro da viagem, selecionei algumas fotos para quem quiser dar uma conferida e sentir o clima. Clique AQUI para ver.
sexta-feira, julho 22, 2011
ASSALTO AO BANCO CENTRAL
Era só questão de tempo fazerem um filme sobre o assalto à agência do Banco Central de Fortaleza. O fato em si já era "cinematográfico": o segundo maior assalto a banco de todos os tempos, o maior do Brasil. Tudo bem que o ideal era um filme do nível de um TROPA DE ELITE, mas não se pode ter tudo e a estreia de Marcos Paulo na direção, mesmo tendo seus tropeços aqui e acolá, é um bem-vindo retorno do cinema brasileiro ao gênero policial, que era bastante popular nos anos 1970, mas que foi perdendo a força nas décadas seguintes.
O maior ponto em comum de ASSALTO AO BANCO CENTRAL (2011) com TROPA DE ELITE é a presença de Milhem Cortaz e de algumas frases de efeito usadas como alívio cômico. Aliás, nem dá bem para falar de alívio cômico, pois ASSALTO AO BANCO CENTRAL peca por não trazer a necessária dose de suspense que um filme de assalto deveria ter. Mesmo assim, é prazeroso ver a construção do enredo e dos personagens, alguns deles feitos para fazer o público rir, como o do irmão gay da personagem de Hermila Guedes.
A maior parte das filmagens foi realizada no Rio de Janeiro, mas algumas externas de Fortaleza são reconhecíveis, como a Ponte dos Ingleses e a Av. Santos Dumont perto das dunas. O fato de ser um filme de ficção também deu a liberdade para os roteiristas tomarem os fatos reais apenas como inspiração para o roteiro. Ainda assim coisas como a imprensa ter noticiado a possibilidade de o crime ter relação com o PCC e de um dos assaltantes ter escondido milhões em um caminhão cegonha aparecem no filme.
A edição inicial, intercalando ações presentes e futuras, do ponto de vista dos bandidos e dos policiais, é um ponto a favor do filme. Pena que isso vai se dissipando antes da metade, fazendo de ASSALTO AO BANCO CENTRAL um filme bem ordinário do gênero. Por outro lado, o ótimo elenco, ainda que mal utilizado, de vez em quando traz momentos bons, como Tonico Pereira cantando "comer Tatu é bom..." ("Mundo animal", a canção dos Mamonas), enquanto o Tatu (Gero Camilo) usa as suas ferramentas para aumentar o túnel. Talvez quem ainda tenha escapado um pouco do caricato tenha sido Eriberto Leão, uma das pontas do triângulo amoroso entre Hermila Guedes e Milhem Cortaz. Quanto aos policiais vividos por Lima Duarte e Giulia Gam, eles não têm a mesma sorte em seus retratos. Entre prós e contras, o filme até que se sai bem para quem não espera muito.
quinta-feira, julho 21, 2011
7 HOMENS SEM DESTINO (7 Men from Now)
Diz a lenda que uma vez Sergio Leone encontrou Budd Boetticher e disse: "Budd, eu roubei tudo de você". E o duelo final de 7 HOMENS SEM DESTINO (1956) lembra mesmo uma versão encurtada e mais simplificada do duelo final de TRÊS HOMENS EM CONFLITO. O primeiro western que vejo de Boetticher já me deixou encantando. Fazia mesmo tempo que não via um bom western e tive a sorte de pegar um de primeira grandeza como este 7 HOMENS SEM DESTINO, que saiu em uma edição especial caprichada em dvd pela Paramount, depois que foi realizada uma restauração nos negativos e a imagem ficou linda novamente. Nem parece filme B. Talvez por ser produzido pela produtora de John Wayne, que era muito amigo da heroína do filme, Gail Russell.
O filme traz uma densidade na apresentação do herói trágico que faz lembrar os melhores trabalhos de John Ford. E Ford é o primeiro nome que vem à mente quando se vê 7 HOMENS SEM DESTINO. Porém, enquanto Ford utilizava cenários grandiosos ao fundo, Boetticher prefere a simplicidade e a objetividade em um filme de apenas 78 minutos. Enquanto Ford tinha John Wayne e Anthony Mann tinha James Stewart, o astro principal dos melhores filmes de Boetticher era Randolph Scott, um ator que tem um rosto de pedra, que talvez até tenha suas limitações, mas que se adequa perfeitamente ao tipo fechado, cujas angústias e traumas encontram-se escondidos aos olhos do espectador e que vão se revelando aos poucos, à medida que a sua história trágica vai sendo desvendada.
Sua missão é ir em busca de sete bandidos que roubaram vinte mil dólares em ouro de uma transportadora e mataram sua esposa. Ele carrega consigo uma imensa culpa e uma necessidade de vingança. Logo no início do filme, ele encontra dois desses homens. A cena é de uma beleza bruta, com o protagonista chegando num abrigo rochoso e encontrando dois dos bandidos tomando café. O detalhe é que Boetticher nunca mostra o herói atirando em seus inimigos. Só ouvimos os tiros ou o inimigo já caindo.
No caminho, o personagem de Scott encontra um casal de pioneiros que tem como missão chegar à Califórnia. Stride os ajuda a tirar a sua carroça da lama e os acompanha pelo caminho. O lugar é perigoso, tanto por ser povoado por bandidos quanto por índios. Ele logo se sente atraído pela mulher, talvez por lembrar um pouco a sua falecida esposa. Há uma reciprocidade de sentimentos e algumas cenas belíssimas envolvendo os dois. Curiosamente, o grande vilão do filme não está entre os sete homens caçados por Scott, mas na figura de Lee Marvin, que faz um personagem fácil de ganhar a simpatia da audiência, por mais mau caráter que seja.
O dvd traz comentários em áudio com legendas em português do historiador de cinema Jim Kitses, autor de "Horizons West", um livro que analisa os trabalhos de Anthony Mann, Budd Boetticher e Sam Peckinpah. Em geral, comentários em áudio de estudiosos são melhores do que de diretores, pois é como se estivéssemos lendo um bom livro. O dvd ainda conta com um documentário chamado "Budd Boetticher - Um Americano Genuíno", que nos apresenta um pouco mais desse cineasta tão bom, mas tão pouco conhecido do grande público. Legal ver Clint Eastwood e Quentin Tarantino juntos, falando sobre o filme.
E o que me deixou mais impressionado foi que tanto o historiador Jim Kitses quanto Peter Bogdanovich disseram que 7 HOMENS SEM DESTINO nem é o melhor filme de Boetticher. Os trabalhos seguintes, também em parceria com Randolph Scott - O RESGATE DE UM BANDOLEIRO (1957), AMANHECER SANGRENTO (1957), FIBRA DE HERÓIS (1958), O HOMEM QUE LUTA SÓ (1959) e CAVALGADA TRÁGICA (1960) - são tão bons ou até melhores!
quarta-feira, julho 20, 2011
MILDRED PIERCE
E mais uma vez se prova que o formato minissérie é o ideal para a adaptação de um romance. Longas-metragens, ainda que se estendam por mais de duas horas, raramente dão conta de contar, sem atropelos, a história de um romance. Curiosamente, MILDRED PIERCE (2011), a minissérie que Todd Haynes dirigiu para a HBO, se inicia com "A Film by Todd Haynes". Quer dizer, não se trata apenas de uma autoafirmação de autoralidade num veículo que geralmente é mais de roteiristas e produtores executivos do que de diretores. O que estranha e ao mesmo se admira é ele usar o termo "filme", como se a minissérie se tratasse mesmo de um longo filme de mais de cinco horas de duração. E no caso de MILDRED PIERCE, como é uma minissérie totalmente dirigida por Haynes, há uma regularidade que justifica o termo.
Ainda que eu tenha gostado da minissérie já na primeira parte, foi na segunda que MILDRED PIERCE me pegou de jeito. Chorei umas quatro vezes no espaço de uma hora. A história da dona de casa que teve que se virar sozinha depois que o marido a deixou para ficar com outra durante a Grande Depressão americana – o filme inicia o relato em 1931 – é cercada por grandes momentos dramáticos. Trata-se de um belo melodrama classe A, herdeiro de Douglas Sirk, como o próprio Haynes já havia mostrado ser devedor em LONGE DO PARAÍSO (2002). A presença de Kate Winslet contribui bastante para o sucesso da produção. A atriz desempenha com desenvoltura as diversas fases pelas quais a personagem vai passando gradativamente ao longo da história. Geralmente histórias de mães que se dedicam e se sacrificam por seus filhos me deixam bastante comovido. E MILDRED PIERCE não foi exceção.
Quem também se destaca no filme é Guy Pearce, o homem que se torna amante de Mildred. Ele personifica bem o sujeito esnobe. Brían F. O'Byrne como o marido de Mildred também está bem e, à medida que a história avança, passamos a gostar mais dele, que nunca deixou de ser um pai devotado e amado pelas duas filhas. A mais velha, interpretada por duas atrizes, Morgan Turner e Evan Rachel Wood, é especialmente um exemplo de menina arrogante, mas que nunca deixou de receber o amor da mãe, mesmo depois de brigas. Gosto particularmente de uma cena em que o maestro chama a menina de serpente.
Só depois de alguns episódios é que fui saber que "Mildred Pierce", o romance de James M. Cain, já havia sido adaptado para o cinema em 1945 e o filme é até bastante famoso: ALMAS EM SUPLÍCIO, dirigido por Michael Curtiz e estrelado por Joan Crawford, que inclusive ganhou o Oscar de melhor atriz. O filme já está na agulha para ser visto e comparado.
MILDRED PIERCE é campeã de indicações ao Emmy 2011, sendo indicada às categorias de minissérie, atriz (Kate Winslet), ator coadjuvante (Guy Pearce e Brían F. O'Byrne), atriz coadjuvante (Melissa Leo, Mare Winningham e Evan Rachel Wood), direção, roteiro, direção de arte, elenco, fotografia, figurino, edição, penteado (!), maquiagem, trilha sonora (parte 5), tema musical, edição de som (parte 5), mixagem de som (parte 5) e efeitos visuais (parte 5).
terça-feira, julho 19, 2011
COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS
Interessante como a obsessão de um cineasta por um projeto faz toda a diferença. Quando Nelson Pereira dos Santos estava doido para fazer VIDAS SECAS (1963), o universo parecia conspirar contra ele, mas, no fim das contas, o filme foi realizado no tempo certo, depois de ele ter feito alguns trabalhos inferiores, mas que funcionaram como um ensaio para a criação de uma obra-prima. Do mesmo modo, COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS (1972) era um projeto antigo de Nelson e que por uma razão ou outra acabava não dando certo. E os filmes que ele fez antes são também ensaios para esta obra marcante do cinema brasileiro que deu muito o que falar.
O diretor utilizou uma locação próxima a Parati, onde havia rodado AZYLLO MUITO LOUCO (1971), para contar de maneira muito mais caprichada e com mais rigor formal a história de um francês que, durante a colonização brasileira, fazia parte de um grupo que procurava se estabelecer em nossas terras. Os franceses fizeram amizade com os índios para que os nativos entrassem em guerra com os portugueses. Arduíno Colasanti é Jean, o francês que é capturado por uma tribo de índios canibais que o confundem com um português e o deixam de molho para ser devidamente comido.
Mas, como era de costume, a tribo espera sete luas para que Jean fique pronto para o abate, e ele tenta nesse tempo se integrar à tribo, aceitando o casamento com uma nativa e participando de caçadas e guerras contra tribos inimigas. Ele até mesmo se despe de suas vestimentas e fica nu junto com os índios. Aliás, essa questão da nudez foi um dos maiores obstáculos para que o filme passasse pela censura aqui no Brasil. Mas, uma vez que passou pela censura, COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS recebeu classificação livre. Contribuiu para que o filme fosse visto como uma obra de importância cultural o fato de ser quase inteiramente falado em idioma tupi, com diálogos traduzidos pelo cineasta e estudioso da língua Humberto Mauro.
As filmagens foram complicadas. Faltou dinheiro durante a produção e Nelson teve que falar com a esposa para que eles vendessem um terreno que tinham em Niterói. Se não fosse por isso, o filme teria ficado parado e talvez não visse mais a luz do dia. Mas tirando esse e outros problemas, as filmagens foram uma maravilha para os atores, que até se acostumaram a andar nus pelo set e ficavam sem roupa em volta da fogueira, conversando. As cenas foram realizadas sempre de dia, pois não havia gerador. Dib Lutfi sempre fazendo milagres com a câmera.
Não posso terminar este texto sem deixar destacada a minha cena preferida, uma próxima do final, quando a "esposa" de Jean (Ana Maria Magalhães) conta a ele, com requintes de crueldade, como será o ritual de sua morte. Essa sequência, além de muito bem conduzida, mostra uma interpretação totalmente incorporada da atriz. E faz com que o espectador, naturalmente identificado com o branco que quer escapar de ser comido pela tribo, sinta-se no mínimo desconfortável. Por mais que Nelson Pereira dos Santos defenda a ideia de que o herói era o índio, anos de identificação com o branco e com a cultura europeia não nos ajudam a aceitar isso.
segunda-feira, julho 18, 2011
HARRY POTTER E AS RELÍQUIAS DA MORTE – PARTE 2 (Harry Potter and the Deathly Hallows – Part 2)
E chega ao fim uma das sagas mais lucrativas da indústria cinematográfica. Oito filmes num espaço de dez anos conquistaram uma geração de fiéis fãs. Por mais que alguns desses filmes não sejam tão bons aos olhos de quem não é fã, a franquia foi ganhando cada vez mais respeito com o passar dos anos e à medida que seus personagens amadureciam. Ao convidarem um cineasta que dirigiu uma minissérie política para a televisão britânica (STATE OF PLAY, 2003), os produtores de Harry Potter mostraram interesse em dar à série do jovem bruxo não apenas uma conotação política, como foi demonstrado em HARRY POTTER E A ORDEM DA FÊNIX (2007), mas um andamento narrativo mais adulto, com tempo para criar uma maior atmosfera de mistério que até então não era tão possível. Isso se tornou bem mais evidente nestes últimos filmes da série, com um andamento bem mais lento.
HARRY POTTER E AS RELÍQUIAS DA MORTE – PARTE 2 (2011) traz até mesmo um sentido religioso, com uma aproximação do protagonista com a figura de Jesus. Mas isso é feito com sutileza, até para a Igreja Católica não atacar os filmes novamente. Apesar de o filme mostrar o velho tema da batalha do bem contra o mal, há tons de cinza também, especialmente no personagem de Alan Rickman, o Professor Severo Snape, que tem roubado a cena já faz alguns filmes. Mas quem rouba a cena mesmo é Emma Watson, essa menina cada vez mais bela e cheia de charme, no papel da inteligente e poderosa Herminone. Ela chega a eclipsar sem esforço algum o melhor amigo de Harry Potter, Weasley (Rupert Grint), que além de bobalhão, não parece merecer ter o segundo nome nos créditos, quando é ela quem mais se destaca.
A trama desta segunda parte dá imediato prosseguimento aos eventos da primeira, com o cada vez mais iminente embate entre Harry Potter e o mal personificado, Lorde Voldemort (Ralph Fiennes). Se na primeira parte havia mais espaço para conversas mais intimistas entre o trio de protagonistas, o final definitivo dá mais espaço para a ação e para resoluções que não parecem apenas magias inventadas para os personagens saírem de situações difíceis e que provocam mais tédio do que encanto. Vendo uma cena, por exemplo, como a da invasão do grupo de Voldermort a Hogwarts, nem dá para imaginar que se trata da mesma série que mostrava garotos jogando quadribol (aquele jogo que se joga em cima de vassouras voadoras) em tardes ensolaradas. O aspecto sombrio toma conta de vez da série nesta conclusão. E as trevas se tornam ainda mais destacadas quando entramos em contato também com a luz. E se o epílogo pareceu um dos maiores equívocos do filme, pelo menos dá a entender que a série realmente chegou ao seu final. E um final bem digno.
sexta-feira, julho 15, 2011
CRASH – ESTRANHOS PRAZERES (Crash)
Tenho uma leve impressão que a versão de CRASH – ESTRANHOS PRAZERES (1996) que eu assisti no cinema há quinze anos era mais "apimentada" do que essa versão que eu peguei na internet. Lembro de uma cena de sexo no início do filme com a Deborah Kara Unger e o James Spader na sacada de um prédio que parecia filme do Buttman, tal a voltagem erótica. A cena era mais demorada também, se eu não me engano. No IMDB, vi que existe uma versão com dez minutos a mais, que foi a versão que eu vi no cinema naquela época, e outra feita para chocar menos a audiência. Uma pena. Isso tira um pouco da graça do filme, cuja boa parte da força está no erotismo.
Isso pode ter prejudicado um pouco a minha impressão de CRASH nesta revisão. O filme até então estava no topo dos meus favoritos de David Cronenberg. Ainda continua em posição privilegiada, mas não está mais no topo. Hoje em dia, perde para VIDEODROME (1983) e para CALAFRIOS (1975), pelo menos. De todo modo, foi muito bom, ainda que com esse pequeno agravante, rever um grande trabalho de Cronenberg depois de duas obras não muito animadoras, pelo menos para mim – MISTÉRIOS E PAIXÕES (1991) e M. BUTTERFLY (1993).
CRASH é fascinante em sua temática "sexo e acidentes de automóvel" e no quanto isso cabe perfeitamente na obra do cineasta. A cena em que Spader faz sexo com sua esposa (Kara Unger) e ela pergunta coisas como o gosto do sêmen de Vaughan (Elias Koteas) ou se ele viu o seu ânus são puramente cronenberguianas. Outro momento bem familiar na obra de Cronenberg é quando Spader vê as cicatrizes nas pernas de Rosana Arquette, que se assemelham a uma vagina. Quer dizer, até onde não há sexo, tudo é sexo. Inclusive, e principalmente, numa batida de carro que pode ser fatal.
O curioso é que Cronenberg não faria outro filme tão picante em sua carreira. Em que outro filme veríamos personagens masturbando uns aos outros enquanto veem vídeos de acidentes automobilísticos? E que outro filme mostraria de maneira tão mórbida uma simulação do acidente fatal de James Dean? Mas algumas sutilezas também fazem a diferença, como o modo como os personagens interagem uns com os outros, quase sempre com uma estranha calma; ou detalhes como o aumento no tráfego, visto em plano geral, e que se nota antes de os personagens de Spader e Holly Hunter mencionarem tal fato.
quinta-feira, julho 14, 2011
HAPPINESS IS A WARM BLANKET, CHARLIE BROWN
Recebi recentemente do amigo Renato Doho uns dvds contendo alguns filmes interessantes. O que mais me deu vontade de ver logo foi este HAPPINESS IS A WARM BLANKET, CHARLIE BROWN (2011), mais recente desenho animado da turma do Charlie Brown e lançado em dvd em março nos EUA. O motivo da vontade de ver é óbvio: saudosismo. Quem é da minha geração ou próximo a ela vai se lembrar com carinho da série que passava na tv durante as manhãs com Charlie Brown, Snoopy e cia. O carinho que eu tinha por esse desenho se dava principalmente porque, assim como o protagonista, eu também era tímido e despreparado para o mundo. Meu mundo era praticamente a escola e os amigos do bairro, mas mesmo assim, para mim, já era um mundo amedrontador o bastante. E era bom ter com quem se identificar.
HAPPINESS IS A WARM BLANKET, CHARLIE BROWN só não me agradou mais por não se centrar em Charlie Brown, mas em seu amigo Linus, aquele que fica o tempo todo agarrado com um cobertor azul e com frequência põe o polegar na boca. A trama gira em torno de seus amigos tentarem tirar esse hábito feio do garoto. Para Linus, aquele cobertor é como uma droga, algo de que ele não consegue se desvencilhar, por mais que sua irmã Lucy reprove e tente tirar aquela mania dele a todo custo.
Embora se estenda mais do que deveria para uma trama tão simples, o barato do pequeno filme de menos de uma hora é poder rever parte da turma, como a Lucy, que continua apaixonada pelo pianista Schroeder, fã de Beethoven. Aliás, que lindo ouvir Schroeder tocando Sonata ao Luar, uma das mais tristes e belas composições já feitas. No mais, senti falta de outros personagens marcantes, como a Patty Pimentinha. De todo modo, a temática é abrangente: pode tanto remeter às drogas como a uma falha ou necessidade humana. Linus, como o filósofo da turma, sabe bem expressar isso no final do filme. O desenho foi baseado em uma tira de Charles Schultz e mantém um padrão clássico de animação que ficou bem bonito, com sua frequente ausência de cenários.
P.S.: Está no ar a edição de julho da Revista Zingu! O destaque do mês é o Dossiê Tony de Souza, outro diretor da Boca do Lixo que também desempenhou outras funções em sua carreira. Mas as tradicionais colunas estão inspiradas. Tem desde a discussão sobre o que é cinema brasileiro (por Laura Cánepa) até o texto apaixonado de Matheus Trunk sobre O SEXO NOSSO DE CADA DIA, de Ody Fraga.
quarta-feira, julho 13, 2011
PAUL IS DEAD
Aproveitando o Dia Mundial do Rock, escrevo sobre um filme muito simpático e que deve atrair a atenção dos fãs dos Beatles, PAUL IS DEAD (2000), produção alemã dirigida por Hendrik Handloegten. Eu não sei quem é esse diretor, nem tinha ouvido falar desse filme até bem pouco tempo atrás, mas o enredo em si já é bastante convidativo. Recheado de canções dos Beatles, do Clash, de Neil Young, de Paul McCartney, dá a impressão de que ele não foi lançado em dvd por questões de direitos autorais. Mas está rolando na internet uma boa cópia ripada da televisão alemã.
O filme se passa em 1980, quando o garotinho Tobias, apaixonado por Beatles, está bastante animado com o novo single do John Lennon, que acabara de sair, "(Just like) starting over". Enfim algo novo do John, que havia passado um tempão sumido. Tobias tem todos os discos dos Beatles e ouve sempre um programa dedicado aos Fab Four, que fala sobre curiosidades do grupo. Ele grava os programas nas saudosas fitinhas cassete, colando um papel na fita e organizando-as à sua maneira. Beatles é o tipo de banda que nunca cessa de ter assunto e no rádio perguntam aos ouvintes o que John Lennon fala no final de "Strawberry fields forever". E lá vai o garoto conferir o que é aquele balbuciado estranho que não dá para identificar. O menino pede ajuda a um sujeito que fala inglês e conhece Beatles. É quando ele diz que lhe contará um segredo: que a frase de John é "Eu enterrei Paul". E aí ele conta toda aquela teoria de que Paul morreu num acidente e que foi substituído por um sósia, mostra as evidências nas capas dos álbuns etc.
Esse é um assunto que todo bom apaixonado pela banda já está careca de saber, mas era uma novidade e tanto para o garoto. Isso se junta ao fato de ter aparecido um fusca branco com a mesma placa da capa do álbum ABBEY ROAD em sua cidade. Em paralelo, o filme também mostra a vida mais "normal" do irmão mais velho de Tobias e sua namorada. A cena em que ele não consegue ereção e vai ter que bater uma no banheiro para chegar "no ponto" para o sexo é divertida e lembra as comédias juvenis americanas dos anos 80. Mas o mais importante do filme é mesmo a história do garotinho às voltas com o misterioso sujeito do fusca e a tal "revelação" que ele achava que era um "segredo de estado". O legal é que o filme também brinca com as capas dos discos, já que o "s" do título do filme aparece "quebrado" nos créditos, como o "s" de "Beatles" na contracapa de ABBEY ROAD.
terça-feira, julho 12, 2011
CILADA.COM
O que dizer de CILADA.COM (2011)? Que o filme é um mal para o cinema brasileiro, com sua dramaturgia descartável e sua direção ruim? (Se é para usar o scope, como é que deixam cortar as cabeças dos atores?) Ou que o filme é um incentivo para o público jovem passar a frequentar os cinemas e servir como uma janela para o bom cinema? Pouco provável a segunda opção, mas não impossível. De qualquer maneira, o filme tem o seu atrativo. O trailer é engraçado e convidativo até para quem tem um pouco mais de exigência com esse cinema mais "televisivo".
CILADA.COM também é espaço para Bruno Mazzeo mostrar as suas habilidades como humorista a um público maior que o do seu programa no canal Multishow. Além do mais, o filme, num único fim de semana já conquistou o título de mais visto entre os brasileiros em 2011, ultrapassando a bilheteria de BRUNA SURFISTINHA. Não deixa de ser uma surpresa, afinal, não se trata de um filme com atores tão famosos, como era o caso do filme com a Deborah Secco, que ainda por cima tinha um forte apelo erótico. No caso de CILADA.COM, o aspecto sexual é só um meio para a construção das várias piadas do roteiro. (E BRUNA SURFISTINHA pode também ter espantado muita gente moralista justamente por causa do tema.)
A influência da comédia americana é evidente em CILADA.COM, mas o problema é que poderiam pelo menos construir personagens melhores. O mais frágil é, sem dúvida, o da namorada de Bruno, interpretada por Fernanda Paes Leme. A jovem atriz merecia uns diálogos melhores. Do jeito que ficou, eu fiquei constrangido por ela. No caso de Bruno Mazzeo e do elenco masculino, nem tanto. Até que funcionaram bem as cenas no escritório, principalmente as do começo do filme, quando descobrem o tal vídeo da ejaculação precoce que o tornará tão famoso quanto o "Pedro do chip".
Porém, uma vez explorada a melhor parte da história, a etapa seguinte, que passa a ser a construção de um novo vídeo para levantar a baixa moral do rapaz e a recuperação da namorada com a ajuda do Marconha (Sérgio Loroza), o filme vai perdendo a força, ganhando mais vulgaridade, até chegar naquele final de deixar o espectador envergonhado e se esquecer até dos bons momentos de risos do começo.
segunda-feira, julho 11, 2011
UM CORPO QUE CAI (Vertigo)
As obras de Alfred Hitchcock tendem a crescer na revisão. Principalmente os filmes da fase áurea do mestre o suspense, que corresponde à década de 1950 e início dos anos 1960. UM CORPO QUE CAI (1958) é um filme bem especial na filmografia do mestre do suspense. Não tem um andamento rápido como é mais comum na maioria de suas obras; apresenta maior densidade. Possui um ritmo todo próprio e uma história de amor um tanto fantasmagórica. James Stewart, em sua quarta e última parceria com Hitchcock, interpreta um ex-detetive de polícia que, por causa de seu problema de acrofobia, acaba levando à morte seu colega, durante uma perseguição a um criminoso nos telhados.
O filme até poderia explorar mais a culpa do personagem nesse início, mas Hitchcock guarda a culpa, ou melhor, a transferência de culpa, para mais adiante, preferindo apresentar a simpática personagem de Barbara Bell Geddes, uma bela jovem que nutre sentimentos pelo personagem de Stewart. Logo depois, numa conversa relativamente longa do protagonista com um velho amigo, ele é convidado a agir como detetive particular. Seu amigo está preocupado com a esposa, que parece estar sofrendo de dupla personalidade ou está possuída pelo espírito de outra mulher. Toda essa cena da conversa entre os dois homens é feita com sutil agilidade. Um diretor qualquer talvez fizesse tudo usando campo e contracampo. Ou mostraria os dois homens sentados o tempo inteiro em um único plano-sequência. Hitchcock é mais elegante: os homens se movimentam ao redor do escritório, a câmera muda o campo de visão com frequência e a cena fica ágil.
Isso é só pra falar de um pequeno detalhe que nem tem tanta importância diante da grandeza do filme, de como ele ainda se torna espetacular, a partir da entrada em cena da personagem de Kim Novak, a tal mulher supostamente tomada pelo espírito de uma espanhola que morreu no século XIX. Mas o mais importante disso tudo é que, diante de todo o mistério, desenvolve-se uma paixão, uma obsessão, que só aumenta a partir do momento em que ela pula no rio e ele a salva, a leva para casa e despe-a de suas roupas.
Falando em despir, muito interessante a ideia de Hitchcock em relação ao último ato do filme, que é quando Stewart, depois de ter sofrido de uma grave depressão por causa da morte da mulher, a reencontra nas ruas, sem ainda saber que é ela mesma, disfarçada, de cabelos negros. Quando ele passa a vesti-la com as mesmas roupas da "falecida" e finalmente a pede que pinte os cabelos de loiro, fica faltando ainda um detalhe: o coque no cabelo, para que ele possa, então, ter de volta a sua amada, ainda que "reencarnada". Para Hitchcock, todo esse processo é como se ele estivesse despindo-a. Faltava apenas "tirar a calcinha", que seria ajeitar o cabelo de modo a ficar idêntica a Madeleine.
Há tanto o que se falar sobre UM CORPO QUE CAI que o risco de se estender é grande, mas destaquemos um pouco mais Kim Novak, que não era uma Grace Kelly, mas digamos que, das loiras de Hitchcock, ela talvez tenha sido a que mais se aproximou em beleza e sensualidade. Sua elegância se acentuaria ainda mais com os figurinos da lendária Edith Head. Aliás, impressionante como Hitchcock estava rodeado de profissionais talentosos. Bernard Herrmann, seu principal músico, compõe aqui uma de suas melhores e mais inspiradas trilhas. A música do filme é ao mesmo tempo romântica e misteriosa. Lembrei de Angelo Badalamenti nos filmes de David Lynch na construção da atmosfera. E a fotografia em cores de Robert Burks, restaurada, é outro espetáculo.
Tive sorte de conseguir uma cópia de UM CORPO QUE CAI em qualidade 720p, já que infelizmente o dvd da Universal não traz o filme em widescreen anamórfico, mas em letterbox, o que faz toda a diferença para quem tem uma televisão digital. Assim, essa cópia em alta resolução veio bem a calhar. Pelo menos, o dvd vem com um bom documentário de meia-hora, falando um pouco sobre o processo de restauração e dos bastidores das filmagens. Não chega a ser tão saboroso quanto os documentários do Laurent Bouzereau presentes nos demais dvds, mas quebra o galho.
sexta-feira, julho 08, 2011
ATERRORIZADA (The Ward / John Carpenter's The Ward)
Tivemos que esperar quase uma década para ver um filme novo de John Carpenter. Infelizmente o fracasso comercial de FANTASMAS DE MARTE (2001) foi fatal para a carreira do mestre do horror, que amargou a pior década de sua carreira. Ainda que os médias-metragens CIGARETTE BURNS (2005) e PRO-LIFE (2006), feitos para a série MASTERS OF HORROR, sejam exemplares de sua vitalidade e até mesmo genialidade, o que mais queríamos era o retorno de Carpenter ao cinema. Infelizmente o mercado tem cada vez respeitado menos o legado e o talento dos mestres do horror americano que tiveram o seu auge de popularidade na década de 1980. Mas deixemos de lamentações, pois tem filme novo do homem na praça.
ATERRORIZADA (2010) foi lançado direto em vídeo no Brasil, o que não chega a ser motivo de tanto lamento assim, já que tanta porcaria tem passado no circuito, enquanto o melhor do cinema não ganha espaço. Logo, digamos que ATERRORIZADA está em boa companhia. Além do mais, o filme é uma obra menor de Carpenter, que até tem um jeito de produção feita para a televisão, mas que não deixa de ser uma delícia de se assistir, por mais que se vejam os seus problemas. A assombração do hospital, por exemplo, dificilmente assusta. Em compensação, a protagonista (Amber Heard) defende muito bem o seu papel de garota de passado obscuro que é levada para um hospício assombrado após ter incendiado uma casa.
Além de assombrado, ela percebe que o lugar também tem mistérios relacionados a garotas que desaparecem misteriosamente. Como, logo no prólogo, vemos uma delas sendo assassinada, já sabemos que é a tal assombração de maquiagem tenebrosa que está fazendo sumir as meninas daquela ala. O mistério se intensifica com o modo como o médico e os enfermeiros e enfermeiras guardam os segredos. Assim como as próprias colegas da ala de Kristen, a personagem de Amber Heard.
Trata-se de diversão agradável, especialmente para fãs de horror que não esperem muito de filmes de fantasmas. O problema é que o nome de Carpenter carrega uma forte aura e a expectativa em torno de seu retorno foi frustrada com um filme que não faz jus ao cineasta de grandes obras como ASSALTO À 13ª D.P. (1976), O ENIGMA DE OUTRO MUNDO (1982), CHRISTINE – O CARRO ASSASSINO (1983), PRÍNCIPE DAS SOMBRAS (1987) e ELES VIVEM (1988). Mas a torcida por outro grande filme de Carpenter continua.
quinta-feira, julho 07, 2011
AZYLLO MUITO LOUCO
A obsessão de Nelson Pereira dos Santos por COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS (1972) é semelhante a que ele teve por VIDAS SECAS (1963). Mas ele teria que esperar mais um ano. Enquanto isso, outro projeto aparece: AZYLLO MUITO LOUCO (1971), adaptação livre do conto/novela de Machado de Assis, "O Alienista". Ele trouxe a mesma turma de FOME DE AMOR (1968) para este novo filme. Estão lá, ainda que em papéis pequenos, Arduíno Colasanti (seu ator-fetiche), Irene Stefânia e Leila Diniz. Também estão de volta o diretor de fotografia Dib Lutfi e o cenografista Luiz Carlos Ripper. A produção foi mais caprichada, a cargo do próprio Nelson, de Roberto Farias e de Luiz Carlos Barreto.
Porém, apesar disso tudo, o filme não me agradou. Até prefiro FOME DE AMOR, que é muito mais charmoso com seu jeitão godardiano, do que AZYLLO MUITO LOUCO, que lembra bastante as loucuras de Glauber Rocha em TERRA EM TRANSE. Como o filme foi produzido em 1969, a onda tropicalista ainda estava rendendo seus frutos e este filme é mais uma vez produto de sua época. A música do filme é cheia de cacofonia e ora interrompe, ora complementa os diálogos. Isso não me agradou. A fotografia em cores até pode ter sido muito bonita na época da exibição, mas não dá para avaliar com a cópia disponível na internet e ainda não restaurada. A cópia que se tem à disposição é feia e desbotada.
Ao contrário do que Nelson fez nos seus trabalhos anteriores, em que ele mudou praticamente tudo das obras literárias que serviram de base para os filmes, em AZYLLO MUITO LOUCO pouca coisa foi mudada em relação ao conto de Machado. A principal delas foi a junção de dois personagens em um. Aliás, eu tive vontade de reler (e reli) "O Alienista" para retomar o filme, que não estava me agradando no começo. E, que na verdade, não me agradou no final também. Talvez a falta de mais rigor formal da parte de Nelson, que continuou com seu estilo de fazer as falas na hora das filmagens, tenha contribuído para deixar o filme assim tão anárquico. Senti-me vendo um daqueles programas do Chacrinha, que me davam dor de cabeça na infância.
Mas se era para falar de doido, que o espectador também ficasse doido ao sair da sessão. Pode ter sido essa a lógica. Na trama, já bastante conhecida de quem leu o conto de Machado, um homem chega a uma cidadezinha e começa a tratar dos loucos da cidade. Seu principal objetivo é abrigar todos os loucos na recém-criada Casa Verde, local que cada vez vai ficando mais cheio, já que qualquer coisa é motivo para levar um sujeito para o hospício. Muito interessante a analogia que Nelson criou com o Brasil da época da ditadura. Com muita esperteza, ele conseguiu passar tranquilo pela censura.
O filme foi bom mesmo para a turma que participou das gravações, na paradisíaca Parati. O clima estava tão bom que, passados os cinco meses de filmagens, ninguém queria arredar o pé de lá. Principalmente as meninas. E por falar em mulheres, é interessante observar o quanto elas são fortes nos filmes de Nelson. Se na obra machadiana, elas não têm tanta importância, no filme, elas são fundamentais para a reviravolta final. Curioso como algumas características de alguns cineastas se manifestam, ainda que de forma involuntária.
quarta-feira, julho 06, 2011
VÊNUS NEGRA (Vénus Noire)
A primeira impressão que eu tinha, antes de ver VÊNUS NEGRA (2010), é que se tratava de uma espécie de versão feminina de O HOMEM ELEFANTE, de David Lynch. Esperava um filme diferente e acabei não gostando do resultado final deste quarto longa-metragem do diretor tunisiano Abdellatif Kechiche (do elogiado O SEGREDO DO GRÃO, 2007). Sem querer fazer comparação com a gordura da personagem principal, o filme tem muita gordura a ser eliminada. São quase três horas de duração de momentos que se repetem de maneira exaustiva. Pelo menos uma meia hora a menos iria fazer bem ao filme.
VÊNUS NEGRA se passa no início do século XIX em Londres. Vemos um espetáculo no qual um homem diz ter trazido uma selvagem africana que tem o corpo grande em que se destacam os glúteos enormes – nada de mais para nós, brasileiros, mas que na época e lugar era algo quase monstruoso. Se não fosse assim, não seria atração de circo. A polêmica começa por alguns círculos e logo aparece na imprensa a notícia de que a mulher está sofrendo humilhações, ao se apresentar vestida com uma roupa colante e com a cor parecida com a da sua pele e ainda ter a sua bunda beliscada pelos espectadores. Nos bastidores, vemos a personagem bastante triste com sua condição, mas aceitando as condições impostas pelo seu "gerente". No fim, ele diz, eles sairão dali com dinheiro suficiente para se aposentarem e ela poderá voltar para o seu lar ou para onde ela preferir.
VÊNUS NEGRA se inicia com um médico mostrando a estátua do corpo nu da mulher para um grupo de estudantes curiosos, o que já dá o tom de que se trata de uma obra a lidar com o preconceito e a desumanidade. O fato de ter também a genitália da mulher guardada em vidro para exibição é um fator que contribui para essa visão preconceituosa. Em algumas cenas mais incômodas, parte da plateia desistiu do filme. Eu, sinceramente, não achei tão forte quanto as pessoas diziam ao final da sessão. Já vi mais fortes, mais violentos e melhores também. O fato de ser baseado numa história real e de a mulher ter se tornado um símbolo na luta pelos direitos humanos acaba não fazendo muita diferença, afinal.
terça-feira, julho 05, 2011
UM NOVO DESPERTAR (The Beaver)
Há algo de patético em UM NOVO DESPERTAR (2011). Mas patético no sentido amplo do termo. Ter Mel Gibson como protagonista desse conto sobre um sujeito que encontra a solução para seu problema num fantoche de um castor é uma boa sacada da diretora e amiga Jodie Foster. Ela dirige e interpreta a esposa de Gibson, um sujeito que já tentou de tudo para se livrar do fantasma da depressão, mas sem resultado. Pouco depois de uma tentativa frustrada de suicídio, ele encontra esse fantoche que toma as rédeas de sua vida e passa a administrá-la. A ponto de ele conseguir a simpatia de sua esposa de volta, a alegria de poder estar em contato com o filho mais novo e o sucesso na vida profissional. Só ainda não consegue é a amizade e o respeito do filho mais velho (Anton Yelchin), que aprendeu a odiar o pai e a vê-lo como exemplo a não ser seguido.
Quanto a Gibson, ele é um exemplo de ator-autor. Por isso atribuo a autoria do filme não apenas a Foster, mas também a ele, que ultimamente tem se entregado a papéis dolorosos, como o de O FIM DA ESCURIDÃO. Os problemas que ele passou por falar o que não devia na imprensa na vida real e que têm causado rejeições a sua pessoa em Hollywood, bem como o seu estado envelhecido, em comparação com a figura do galã dos filmes de ação da década de 1980, tudo isso contribui para a construção convincente do personagem.
Não deixa de ser corajoso da parte de Foster dirigir um filme que tem ingredientes de uma comédia, mas cujo tom, o tempo todo, é carregado de uma grande melancolia. Mesmo não sendo um filme perfeito, é uma bela obra sobre superação, mas não apenas isso, já que o tal castor também vai se tornando uma espécie de muleta. Ou algo mais perigoso do que isso. A subtrama de Yelchin e seu relacionamento com a personagem de Jennifer Lawrence – cada vez mais bela, ainda mais em trajes de torcedora, uma delícia – fica em segundo plano, mas ganha um link interessante, pois ambos carregam problemas ligados à família.
E foi justamente o relacionamento de Yelchin com o pai o que mais me comoveu ao final do filme, a ponto de eu chegar às lágrimas. Muito provavelmente porque eu tenho um sentimento de débito para com meu pai e me projetei naquele abraço doloroso e amargo. Um abraço emocionado já é algo que me comove quando mostrado com sinceridade e delicadeza nos filmes. E quando há alguma identificação, então, aí já é covardia. O fato de ter um ator como Mel Gibson, com quem eu sempre tive muita simpatia, no papel dessa pessoa que precisa de ajuda e que só encontra rejeição por parte do filho, me fez ver o filme sob outra perspectiva: sob a perspectiva do meu pai. E confesso que não foi fácil pra mim.
segunda-feira, julho 04, 2011
A FALTA QUE NOS MOVE
Ainda existe um pouco de preconceito com relação a realizadores de outras áreas ingressando no cinema. Seja vindo da publicidade, das artes plásticas ou do teatro. É o caso da diretora Christiane Jatahy, que veio do teatro e trouxe para as telas esse exercício experimental interessante que chega para enriquecer e trazer variedade para o cinema brasileiro. A FALTA QUE NOS MOVE (2011) já é conhecido de quem o viu nas Mostras de São Paulo, do Rio e de Tiradentes em 2009, mas só agora estreia no circuito comercial, com poucas cópias.
O filme é adaptação da peça "A falta que nos move ou todas as histórias são ficção". Na transposição para as telas, os atores filmaram durante treze horas consecutivas para se ter um resultado de cerca de 100 minutos após a edição. Os cinco atores (os mesmos da peça) são convidados para ficar numa casa à espera de uma sexta pessoa. Enquanto isso, eles preparam um jantar, tomam champanhe e vinho, conversam, brigam, discutem e falam sobre assuntos interessantes e de maneira até bastante natural. Há semelhança com o Big Brother, principalmente com o fato de você simpatizar mais com um ou outro personagem. Porém, com a desvantagem de não termos tempo suficiente para conhecermos melhor aquelas pessoas. Além do mais, o fato de sabermos que há uma pessoa comandando suas ações, deixa no ar a dúvida se o que estamos vendo é pura encenação ou se há algo de verdade.
A FALTA QUE NOS MOVE também guarda semelhanças com uma experiência recente de Beto Brant, O AMOR SEGUNDO B. SCHIANBERG, filme de que eu até prefiro. Uma das diferenças entre o filme de Brant e o de Jatahy está no fato de que o da diretora começa a perder a essência da "verdade" à medida que se aproxima do final. Em certos momentos, o filme também ganha um ar de pedantismo que chega a incomodar. Sem falar no clímax, no momento de maior embate no grupo, que pareceu mesmo encenação. Puro teatro filmado. Ainda assim, é um filme que mantém o interesse até o fim e que tem os seus momentos memoráveis, como os debates acerca de gerações.
sexta-feira, julho 01, 2011
ALEXANDRIA (Ágora)
Alejandro Amenábar estava sumido desde MAR ADENTRO (2004), o filme que tirou o diretor do cinema de horror para os dramas classe A. ALEXANDRIA (2009) é a volta de Amenábar em grande estilo, fazendo desta vez um drama de época baseado na vida de Hipátia, filósofa dos séculos IV e V d.C., que até hoje é reverenciada. Não conhecia a sua história e fiquei fascinado. O filme trata de intolerância religiosa, no tempo em que conviviam em Alexandria os "pagãos", aqueles que cultuavam deuses egípcios, mas que também mantinham um forte elo com a sabedoria e o conhecimento dos gregos; um grupo de judeus que professavam sua fé de maneira discreta; e os adeptos da nova religião que se propagava em progressão geométrica, o Cristianismo, agora a religião oficial do Império Romano.
Pelo pouco que li sobre Hipátia na internet, ao que parece o filme não foi exatamente fiel aos fatos históricos, mas isso não tem a menor importância. Acredito que a essência foi mantida. Rachel Weisz é Hipátia e dá aula de ciências para um grupo de alunos devotos, a maioria, se não todos, homens. Daí já se percebe o destaque que uma mulher inteligente (e no filme, bonita, ainda por cima) ganha diante de um grupo de homens que a amam e respeitam. Ela é cobiçada por dois rapazes: um dos alunos, Orestes, que se tornaria prefeito da cidade, e o seu escravo, que vê com simpatia o Cristianismo.
Algumas sequências são de doer o coração, como a invasão dos cristãos ao templo onde se encontrava a biblioteca. Tanta coisa se perdeu por causa de tamanha ignorância e rivalidade. Os cristãos, de torturados, perseguidos e mártires, passaram a algozes. Mas os judeus é que não têm muita sorte mesmo, já que desde a época de José do Egito, que eles sempre foram um povo sem pátria. E nem dá para dizer que isso é castigo por causa da crucificação de Jesus. Essa sorte deles veio antes.
A produção do filme é de dar gosto. Apesar de falado em inglês, ele foi todo produzido com dinheiro espanhol. Não sei se chegou a se pagar, mas o importante é o excelente resultado artístico. ALEXANDRIA impressiona tanto pela narrativa ágil e empolgante, como pela construção de uma personagem tão rica e admirável quanto Hipólita, que não se dobrou à hipocrisia geral daqueles que se "converteram" ao Cristianismo apenas para salvar a própria pele. Tudo bem que salvar a própria pele é um motivo até justo, mas ter seus princípios é uma atitude tão nobre. E não é qualquer um que tem essa coragem, não.
Post dedicado à minha amiga Erika Bataglia, mestra em filosofia, especializada em Platão e uma autêntica filha de Minerva.