quinta-feira, julho 07, 2011

AZYLLO MUITO LOUCO



A obsessão de Nelson Pereira dos Santos por COMO ERA GOSTOSO O MEU FRANCÊS (1972) é semelhante a que ele teve por VIDAS SECAS (1963). Mas ele teria que esperar mais um ano. Enquanto isso, outro projeto aparece: AZYLLO MUITO LOUCO (1971), adaptação livre do conto/novela de Machado de Assis, "O Alienista". Ele trouxe a mesma turma de FOME DE AMOR (1968) para este novo filme. Estão lá, ainda que em papéis pequenos, Arduíno Colasanti (seu ator-fetiche), Irene Stefânia e Leila Diniz. Também estão de volta o diretor de fotografia Dib Lutfi e o cenografista Luiz Carlos Ripper. A produção foi mais caprichada, a cargo do próprio Nelson, de Roberto Farias e de Luiz Carlos Barreto.

Porém, apesar disso tudo, o filme não me agradou. Até prefiro FOME DE AMOR, que é muito mais charmoso com seu jeitão godardiano, do que AZYLLO MUITO LOUCO, que lembra bastante as loucuras de Glauber Rocha em TERRA EM TRANSE. Como o filme foi produzido em 1969, a onda tropicalista ainda estava rendendo seus frutos e este filme é mais uma vez produto de sua época. A música do filme é cheia de cacofonia e ora interrompe, ora complementa os diálogos. Isso não me agradou. A fotografia em cores até pode ter sido muito bonita na época da exibição, mas não dá para avaliar com a cópia disponível na internet e ainda não restaurada. A cópia que se tem à disposição é feia e desbotada.

Ao contrário do que Nelson fez nos seus trabalhos anteriores, em que ele mudou praticamente tudo das obras literárias que serviram de base para os filmes, em AZYLLO MUITO LOUCO pouca coisa foi mudada em relação ao conto de Machado. A principal delas foi a junção de dois personagens em um. Aliás, eu tive vontade de reler (e reli) "O Alienista" para retomar o filme, que não estava me agradando no começo. E, que na verdade, não me agradou no final também. Talvez a falta de mais rigor formal da parte de Nelson, que continuou com seu estilo de fazer as falas na hora das filmagens, tenha contribuído para deixar o filme assim tão anárquico. Senti-me vendo um daqueles programas do Chacrinha, que me davam dor de cabeça na infância.

Mas se era para falar de doido, que o espectador também ficasse doido ao sair da sessão. Pode ter sido essa a lógica. Na trama, já bastante conhecida de quem leu o conto de Machado, um homem chega a uma cidadezinha e começa a tratar dos loucos da cidade. Seu principal objetivo é abrigar todos os loucos na recém-criada Casa Verde, local que cada vez vai ficando mais cheio, já que qualquer coisa é motivo para levar um sujeito para o hospício. Muito interessante a analogia que Nelson criou com o Brasil da época da ditadura. Com muita esperteza, ele conseguiu passar tranquilo pela censura.

O filme foi bom mesmo para a turma que participou das gravações, na paradisíaca Parati. O clima estava tão bom que, passados os cinco meses de filmagens, ninguém queria arredar o pé de lá. Principalmente as meninas. E por falar em mulheres, é interessante observar o quanto elas são fortes nos filmes de Nelson. Se na obra machadiana, elas não têm tanta importância, no filme, elas são fundamentais para a reviravolta final. Curioso como algumas características de alguns cineastas se manifestam, ainda que de forma involuntária.