Passando para deixar meu boletim de saúde. Hoje acordei tarde e com um mal estar estranho na cabeça. Depois do café da manhã em horário pós-almoço e de tomar uns remédios, melhorei um pouco, pelo menos a ponto de ficar ligeiramente mais funcional. Terminei de ver ontem, em formato quase de maratona, CONVERSATIONS WITH FRIENDS (2022), a nova série da Hulu baseada em romance de Sally Rooney, e com quase a mesma equipe que fez NORMAL PEOPLE (2020), que considero uma obra-prima dentre os melodramas românticos que tive a honra de ver.
O nome Sally Rooney já virou um chamariz forte para mim, desde que eu fiquei completamente impactado com a série (ou minissérie?) de 2020, que também me transformou em leitor de seus romances. CONVERSATIONS WITH FRIENDS também conta com episódios dirigidos por Lenny Abrahamson (O QUARTO DE JACK, 2015). Ele dirige sete dos 12 episódios de cerca de meia hora, cada – mesmo formato da série anterior. De certa forma é uma série mais complexa, embora tenha vindo do primeiro romance da escritora.
Isso porque os personagens são mais fechados em suas emoções, mais próximos da realidade, no sentido de demorarem a assimilar o que estão sentindo e o que está acontecendo com suas vidas em situações em que a emoção é mais forte. Há, inclusive, uma série de momentos em que o diálogo é travado e geram situações quase constrangedoras. Isso acontece em especial com Frances, a personagem apaixonante de Alison Oliver, atriz estreante e cuja beleza me faz lembrar um pouco a Jenna Fischer da série THE OFFICE – só que mais bonita, talvez.
Porém, enquanto ela é uma personagem fácil de se apaixonar, os demais personagens não são assim tão fascinantes, nem mesmo o principal interesse amoroso de Frances, um homem casado. Como a primeira e única relação amorosa de Frances havia sido com a agora melhor amiga Bobbi (Sasha Lane), é a primeira vez de Frances com um homem nesta relação confusa mas nem por isso menos empolgante com Nick (Joe Alwyn, um ator que já estreou como protagonista, em A LONGA CAMINHADA DE BILLY LYNN, de Ang Lee).
Uma das coisas que mais me chamava a atenção enquanto via esta série é a melancolia e a solidão dos personagens. Fiquei o tempo todo pensando no fato de que esta nova geração na faixa dos 20 que tem se relacionado tanto com a internet na palma de suas mãos carrega um tipo de tristeza que parece muito difícil de lidar. Em alguns momentos, a personagem principal parece uma espécie de fantasma vagando por Dublin e cidades menores da Irlanda, especialmente quando não está se sentindo tão bem, ou tão amada. O fato de ela amar um homem casado que ainda não quer se separar da esposa mexe um bocado com sua autoestima, por mais que ela se perceba muito acima da média de seus colegas da faculdade de letras.
Em alguns momentos, eu me identifiquei com Frances, mas isso porque a série nos convida a acompanhar a história através de seu ponto de vista – diferente de NORMAL PEOPLE, onde há dois pontos de vista. Dessa forma, a série tanto nos engana ao nos fazer ver Frances como uma moça inocente e não como alguém que pode magoar os sentimentos dos outros, por mais que não seja essa sua intenção. Em comparação com NORMAL PEOPLE, a nova série tem o mesmo estilo, embora seja mais melancólica e menos melodramática – até as canções que encerram os episódios têm uma cadência mais depressiva.
As cenas que provocam choros são mais comedidas, assim como seus personagens. Só fui gostar de Nick lá pelo fim da série (ou temporada?), já que antes disso ele mais parece uma estátua, no sentido de que não consegue exprimir seus sentimentos. Depois, no final, vemos que isso está longe de ser o caso. Gosto de como a série termina, ainda que tenha achado um tanto brusca, mas achei um final satisfatório para os personagens. Queria ter gostado mais de Jemima Kirke na série. Em GIRLS ela interpreta a minha personagem favorita, mas aqui ela pega o papel ingrato da escritora e esposa traída e meio ranzinza (embora com razão).
Outra coisa que me agrada na série é o modo como Frances às vezes parece se quebrar, de tão frágil que parece. Frágil fisicamente - há uma questão de saúde que é levantada - e frágil em ter que lidar com o turbilhão de emoções que surge dessa paixão por um homem casado e a dificuldade de verbalizar essa situação com a melhor amiga. Há também uma dificuldade de verbalização dela com o próprio pai, alcóolatra e depressivo, que me trouxe para o meu passado também. E é por isso que vejo CONVERSATIONS WITH FRIENDS como uma obra que me falou bastante. Mesmo não trazendo a catarse arrebatadora de NORMAL PEOPLE, a assinatura de Sally Rooney está lá, a ponto de quase vermos a autora nua, do ponto de vista simbólico.
+ DOIS FILMES
QUERIDA LÉA (Chère Léa)
Este filme é tanto um estudo da tristeza de um homem frente à vida e frente ao fim de um relacionamento, quanto um olhar afetivo para a criação, para a poesia da linguagem (a escrita, mas que pode se ampliar para a cinematográfica, também). Quando Jonas (Grégory Montel) para em um café a fim de escrever uma longa carta (de despedida?) para Léa (Anaïs Demoustier), ele também tem um interesse em como sua escrita ficará, além de explicitar suas feridas abertas. Tanto que a presença do atendente do café (o simpático Grégory Gadebois), interessado no que ele está escrevendo, é representativo da arte sendo apreciada e criticada pelo espectador. QUERIDA LÉA (2021), de Jérôme Bonnell, tem um ritmo muito bom, ainda mais levando em consideração que se passa em pouquíssimos lugares (o café, principalmente), e consegue tratar da arte da escrita trazendo sempre interesse.
PETER VON KANT
Não adiantou muito caprichar na direção de arte e nas cores vivas (ênfase no vermelho) da casa do personagem-título, que é onde se passa toda a trama de PETER VON KANT (2022), e não conseguir nos tocar com suas dores. A opção de François Ozon em adotar um tom debochado dos personagens acaba causando um distanciamento não muito interessante. Ainda assim é possível que o filme encontre os seus apreciadores. Gostaria de saber, inclusive, de quem viu AS LÁGRIMAS AMARGAS DE PETRA VON KANT, de Rainer Werner Fassbinder, para saber se a homenagem fez jus à obra original.
Outra coisa que me agrada na série é o modo como Frances às vezes parece se quebrar, de tão frágil que parece. Frágil fisicamente - há uma questão de saúde que é levantada - e frágil em ter que lidar com o turbilhão de emoções que surge dessa paixão por um homem casado e a dificuldade de verbalizar essa situação com a melhor amiga. Há também uma dificuldade de verbalização dela com o próprio pai, alcóolatra e depressivo, que me trouxe para o meu passado também. E é por isso que vejo CONVERSATIONS WITH FRIENDS como uma obra que me falou bastante. Mesmo não trazendo a catarse arrebatadora de NORMAL PEOPLE, a assinatura de Sally Rooney está lá, a ponto de quase vermos a autora nua, do ponto de vista simbólico.
+ DOIS FILMES
QUERIDA LÉA (Chère Léa)
Este filme é tanto um estudo da tristeza de um homem frente à vida e frente ao fim de um relacionamento, quanto um olhar afetivo para a criação, para a poesia da linguagem (a escrita, mas que pode se ampliar para a cinematográfica, também). Quando Jonas (Grégory Montel) para em um café a fim de escrever uma longa carta (de despedida?) para Léa (Anaïs Demoustier), ele também tem um interesse em como sua escrita ficará, além de explicitar suas feridas abertas. Tanto que a presença do atendente do café (o simpático Grégory Gadebois), interessado no que ele está escrevendo, é representativo da arte sendo apreciada e criticada pelo espectador. QUERIDA LÉA (2021), de Jérôme Bonnell, tem um ritmo muito bom, ainda mais levando em consideração que se passa em pouquíssimos lugares (o café, principalmente), e consegue tratar da arte da escrita trazendo sempre interesse.
PETER VON KANT
Não adiantou muito caprichar na direção de arte e nas cores vivas (ênfase no vermelho) da casa do personagem-título, que é onde se passa toda a trama de PETER VON KANT (2022), e não conseguir nos tocar com suas dores. A opção de François Ozon em adotar um tom debochado dos personagens acaba causando um distanciamento não muito interessante. Ainda assim é possível que o filme encontre os seus apreciadores. Gostaria de saber, inclusive, de quem viu AS LÁGRIMAS AMARGAS DE PETRA VON KANT, de Rainer Werner Fassbinder, para saber se a homenagem fez jus à obra original.
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