segunda-feira, maio 25, 2020

JODOROWSKY'S DUNE

A leitura da biografia de David Lynch, Espaço para Sonhar, escrito a quatro mãos pelo próprio cineasta e por Kristine McKenna, me fez lembrar que eu ainda não tinha visto este documentário, que conta a história da produção do que é considerado por muitos como o melhor filme nunca feito, a adaptação de Duna, pelo cineasta, ator, quadrinista, romancista e bruxo chileno Alejandro Jodorowsky.

Já conhecia duas obras do diretor, justamente as mais aclamadas, EL TOPO (1970) e A MONTANHA SAGRADA (1973), respectivamente, seu segundo e seu terceiro longa. Foi graças à repercussão de A MONTANHA SAGRADA, aliás, que Jodorowsky foi recebeu do produtor francês Michel Seydoux carta branca para realizar o que quisesse. O diretor, então, diz que quer fazer Duna, a adaptação do celebrado romance de ficção científica de Frank Herbert. E ele falou isso sem sequer ter lido o romance, o que não deixa de ser curioso.

JODOROWSKY'S DUNE (2013), de Frank Pavich, conta a trajetória de pré-produção desse filme, que ganha muito com o entusiasmo do diretor em contar com prazer todo o processo. Há depoimentos de alguns cineastas mais jovens, como Nicolas Winding Refn e Richard Stanley, mas o mais importante é mesmo a fala de Jodorowsky e também daqueles que foram chamados para a produção. O diretor via aquela tarefa como uma grande missão religiosa e cada pessoa que ele convidava seria uma espécie de guerreiro espiritual.

Assim, é admirável que ele tenha conseguido tanta gente de peso para seu projeto, como o quadrinista Moebius, que fez todos os storyboards, o artista plástico H.R. Giger (que nunca tinha feito nada no cinema e ficaria famoso pelo visual da criatura em ALIEN, O 8º PASSAGEIRO), o então roteirista Dan O'Bannon (por Jodorowsky ter ficado empolgado com seu trabalho em DARK STAR, de John Carpenter), uma participação especial milionária do pintor surrealista Salvador Dalí, Orson Welles como um dos personagens, Mick Jagger, David Carradine, o desenhista Chris Foss, entre outros nomes de peso.

E não custa falar também de que Jodorowsky teve a coragem de dispensar o Pink Floyd para ser a banda responsável pela trilha sonora e também o supervisor de efeitos especiais de 2001 - UMA ODISSEIA NO ESPAÇO, Douglas Trumbull. E lembremos que Pink Floyd era talvez a maior banda de rock daquele momento (1973) e 2001 era (ainda é, na verdade) o melhor exemplo do que se poderia fazer com a ficção científica no cinema. A ambição de Jodorowsky era superar o filme de Kubrick.

E é justamente essa ambição que me deixou um tanto incomodado ao ver toda essa preparação e convites para a realização do filme que o diretor queria que fosse o mais importante da história do cinema. O orçamento foi ficando cada vez mais gigante e foram procurar apoio em Hollywood. Nos Estados Unidos acharam tudo brilhante (tanto que muitas dos artistas e das ideias foram aproveitados em várias produções posteriores), mas tinha muitos pés atrás com o realizador. Sem falar que era uma produção muito complicada, cheia de referências esotéricas e as excentricidades características de Jodorowsky, o que afastou os executivos de Hollywood, que são geralmente bem pouco corajosos em projetos arriscados como esse. Jodorowsky sonhou alto demais, talvez. Ainda mais sem ter uma carreira longa e uma relação de proximidade com Hollywood, como era o caso de Kubrick, quando fez 2001.

É engraçada a cena em que ele conta do dia que foi ao cinema ver DUNA, de David Lynch, produzido por Dino De Laurentiis, e ficou feliz pelo fato de o filme ser uma droga. Foi um alívio para ele, mesmo ele gostando de Lynch e acreditar que o realizador era o cara certo para encarar a difícil missão de adaptar para o cinema o romance de Herbert. Ele atribui o fracasso como culpa dos produtores.

Enfim, está nos meus planos rever (talvez com certo sacrifício) o filme de Lynch, e aguardo com ansiedade a versão de Denis Villeneuve, um cineasta que eu muito admiro. Creio que ele finalmente conseguirá entregar um trabalho fantástico. Tomara que a pandemia tenha passado quando o novo DUNA estrear. Oremos.

+ TRÊS DOCUMENTÁRIOS

MARIELLE - O DOCUMENTÁRIO

Gosto muito de como o documentário se articula de maneira mais emotiva, centrando os dois primeiros episódios no impacto da morte na família e amigos e na figura em vida da vereadora assassinada. Os demais episódios se centram mais nas investigações. E até começam de forma empolgante, mas depois passam a adotar um estilo muito similar ao jornalismo do Fantástico, o que não é demérito, mas que diminui a obra formalmente falando. O que funciona muito bem e que é constantemente colado na edição são as cenas de mensagens no WhatsApp de Marielle com Monica Benicio, sua esposa. Há muita coisa inédita e muita coisa que eu não sabia, por não acompanhar ativamente as notícias, mas é um caso que torcemos que seja solucionado. Como o carro dos assassinos sumiu do radar das câmeras? E as maiores perguntas: quem mandou matar e por quê? Criadores: Caio Cavechini e Eliane Scardovelli. Ano: 2020.

O ESCÂNDALO CLOUZOT (Le Scandale Clouzot)

Curioso eu ter começado a conhecer a obra de Henri-Georges Clouzot a partir de dois documentários e não a partir de seus próprios filmes. Este doc para a televisão parece um bom extra de DVD, mas cai como uma luva para quem não conhece nada sobre o diretor. E para quem achava que Hitchcock era carrasco, precisa ver o que esse homem fazia no set de filmagens com seus atores. O filme dá uma geral nas principais obras do diretor. Eu fiquei particularmente curioso no filme que ele fez com a Bardot, A VERDADE. Muito interessante a questão do sadomasoquismo que era mostrado nos filmes e também na vida privada do diretor. Direção: Pierre-Henri Gibert. Ano: 2017.

DEMOCRACIA EM VERTIGEM

Uma das vantagens de se ter um filme como este lançado direto na Netflix é que há um público muito mais amplo do que se fosse lançado nos cinemas. Petra Costa adota um tom pessoal para contar a história recente do Brasil, trazendo fatos de sua vida e da vida de sua família para construir a narrativa, junto com a costura dos principais fatos, da eleição de Lula no início do século até a eleição de Bolsonaro, passando pelo horror que dá rever o processo de impeachment da Dilma e a tristeza intensa da prisão do maior personagem do filme e um dos mais importantes homens da história de nosso país. Ano: 2019.

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