quarta-feira, setembro 13, 2017

POLÍCIA FEDERAL - A LEI É PARA TODOS

Vivemos em um momento particularmente delicado em nosso país. Desde 2013 que a sociedade brasileira está dividida, embora as manifestações daquele ano tenham sido bem distintas das que culminaram com o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, no ano passado. São de grupos distintos, aliás. Hoje, nem se trata mais de dificuldade de comunicação entre as partes (direita e esquerda, coxinhas e petralhas), mas de uma separação tão irracional quanto torcer por um time de futebol. E esse momento o próprio filme POLÍCIA FEDERAL - A LEI É PARA TODOS (2017) ajuda a captar: na cena em Lula está no Aeroporto de Congonhas, depois de ter sido levado coercitivamente para depor .

Pelo que é mostrado no filme, havia dois times muito bem delineados: os que achavam que aquilo era um absurdo e estavam ali para dar uma força para o ex-Presidente, vestidos de vermelho e com o apoio da CUT, e aqueles que tinham escrito "Somos todos Moro" em suas bandeiras, e se vestiam de verde e amarelo, todos exultantes por aquele momento que, embora não representasse a prisão de Lula, representou algo próximo disso para eles, que conseguiram com paneladas expulsar uma presidente eleita. Logo, foi um dia de festa para muitos brasileiros.

POLÍCIA FEDERAL - A LEI É PARA TODOS é desses filmes que merecem ser vistos nem que seja por curiosidade mórbida, seja por quem acompanha o cinema brasileiro e quer pensar o filme dentro do cenário do gênero policial brasileiro contemporâneo, seja por quem está interessado em ver como foi o recorte e de que maneira o diretor Marcelo Antunez e seus roteiristas resolveram contar a história da ação da Lava-Jato desde o primeiro momento até o ano passado.

E por mais que a primeira metade do filme funcione até bem como thriller policial, apesar de alguns diálogos bem ruins, o aspecto político é muito frágil e também muito covarde, no sentido de querer vilanizar pessoas que ainda estão sob investigação. Como é o caso do Presidente Lula, que é pintado como uma figura enjoada e afetada por Ary Fontoura. Sabemos que os próprios representantes da direita brasileira dão o braço a torcer quanto ao carisma do ex-presidente e o que é mostrado está bem longe de sua figura. Na sessão em que assisti, porém, que terminou com uma salva de palmas pelo público presente, muitos se divertiram com o modo como Lula foi representado, alguns até dizendo coisas como "olha a cara de pau dele" etc., como se estivessem vendo o próprio Presidente ou uma cena de novela.

Porém, a imagem do verdadeiro Lula nos créditos finais, dizendo que "a jararaca está viva", em entrevista coletiva após o tal depoimento, ajuda a esquecer um pouco a interpretação infeliz de Fontoura. Há outras situações forçadas do roteiro, como as de Bruce Gomlevsky, que vive um dos quatro principais agentes da Lava-Jato. Seu quadro branco contendo as palestras do Lula por diversos países e o dinheiro supostamente desviado mais parece o famoso powerpoint de Dallagnol.

Quanto ao juiz Sérgio Moro, vivido por Marcelo Serrado, o filme o deixa um pouco mais distanciado do caso, como que para torná-lo o mais isento e apartidário possível. Até mesmo cenas do juiz preparando pizza e conversando com o filho em sua casa o filme mostra. Mas os verdadeiros heróis são mesmo os quatro cavaleiros da operação, vividos ficcionalmente por Antonio Calloni, Flávia Alessandra, João Baldasserini e o já citado Gomlevsky, que é o sujeito que canta "Inútil", do Ultraje a Rigor, em um karaokê, mostrando mais uma vez que o filme adotou sim uma posição partidária.

Mesmo quando em determinado momento um deles se questiona sobre quem estaria sendo beneficiando por tantas prisões e acusações naquele momento de tensão política intensa, logo aparece alguém para deixá-lo tranquilo, dizendo que eles estão sim tornando o Brasil melhor. Por um momento, o filme quase conseguiu uma autorreflexão lúcida frente a tudo aquilo que foi mostrado.

Claro não se pode demonizar o filme por assumir uma posição no jogo, muito embora se possa responsabilizá-lo por alguns julgamentos que, mais à frente, poderão ser considerados injustos. Falar de um cenário político sem o distanciamento temporal adequado é sempre arriscado. Mas, como vivemos um momento em que a urgência e o pré-julgamento parecem imperar, a busca pela verdade aparecerá sempre borrada.

No meio deste caldo fervendo, há ainda outros projetos por vir, como a série da Lava-Jato criada pelo José Padilha para a Netflix e os quatro documentários sobre o impeachment de Dilma Rousseff, sendo que dois optaram por retratar a situação mais próximo do ponto de vista da ex-presidenta. Até lá, ficamos na torcida pelo Brasil.

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