Em todos esses anos como cinéfilo não tive tanto interesse em conhecer a obra de Jacques Becker. Muito provavelmente por ele ser um diretor que não foi tão badalado quanto contemporâneos seus como Robert Bresson e Alain Resnais, mas também por não integrar o corpo de cineastas que formaria a Nouvelle Vague. Uma pena, pois a força deste seu último filme, A UM PASSO DA LIBERDADE (1960), finalizado pouco antes de sua morte, é impressionante. E só pela forma como ele trata de estender o tempo já se percebe que ele era tão vanguardista quanto seus colegas conterrâneos citados.
A UM PASSO DA LIBERDADE é também um deleite para quem gosta de filmes sobre tentativas de fuga. É curioso, aliás, por que não fazem mais filmes desse subgênero, já que boa parte de obras desse tipo, como FUGINDO DO INFERNO, UM SONHO DE LIBERDADE, ALCATRAZ - FUGA IMPOSSÍVEL, PAPILLON, A GRANDE ILUSÃO, O SOBREVIVENTE etc. têm bastante apelo popular. Incluo nessa categoria o meu favorito, UM CONDENADO À MORTE ESCAPOU, de Robert Bresson.
O filme de Bresson é o que é mais frequentemente comparado ao A UM PASSO DA LIBERDADE. Tanto pelo intervalo pequeno de tempo de cada produção quanto pelo fato de ambos os filmes não terem um viés tão comercial. No caso do filme de Becker, a trama se passa quase que exclusivamente em um cubículo, a cela onde convivem quatro prisioneiros que planejam uma fuga e mais um novato que acabou de chegar e que deixa os demais desconfortáveis: eles devem desistir do plano ou contar ao rapaz? Será ele de confiança?
Pouco sabemos sobre Gaspard (Marc Michel), mas, como o filme começa sendo narrado pelo seu ponto de vista (ou quase isso), é de se esperar que ele seja um personagem de confiança, embora saibamos muito pouco dos motivos de ele estar na prisão e também do porquê de ele ter sido transferido de cela. De todo modo, ele parece se integrar bem ao grupo, ainda que seja sempre tratado de maneira diferente pelos demais.
Um dos aspectos bem curioso de A UM PASSO DA LIBERDADE é que todo o elenco é composto por então não-atores e que um deles, Jean Keraudy, o Roland do filme, interpreta a si mesmo. Ele esteve naquela prisão (recriada em estúdio) e foi o grande mentor dessa tentativa de fuga que inspirou a realização de um romance escrito por José Giovanni e que posteriormente se transformaria neste fantástico filme tão cheio de tensão, dirigido por Becker.
É também uma obra que trata de camaradagem masculina, comparável a muitos exemplares de Howard Hawks. A UM PASSO DA LIBERDADE até poderia explorar mais a tensão que é viver junto em um único cubículo, dormindo no chão e compartilhando aquele pequeno espaço, mas a intenção também é outra, já que todos estavam unidos por um objetivo único: sair dali. E difícil não torcer por eles. E o que dizer da cena da rua? Quase sentimos o ar da liberdade e o cheiro da noite naquele momento. Esses e outros detalhes fazem deste um filme singular.
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