domingo, março 20, 2016
RESSURREIÇÃO (Risen)
Levar às telas uma história tão fantástica quanto a de Jesus, especialmente a que envolve sua ressurreição, não é fácil. Aliás, as histórias bíblicas em geral raramente têm resultado em bons e impactantes filmes ultimamente. Há cineastas que preferem um território mais realista, dando o benefício da dúvida para os céticos, como Ridley Scott, em ÊXODO – DEUSES E REIS; e há aqueles que assumem de vez o universo fantasioso e aumentam ainda mais o aspecto mitológico da história, como Darren Aronofsky, em NOÉ, um filme controverso, mas que justamente por sua coragem acabou tendo um resultado melhor como cinema.
Mas a verdade é que desde A PAIXÃO DE CRISTO, de Mel Gibson, que não tivemos mais uma obra baseada na Bíblia tão poderosa e emocionante. Em seu inspirado trabalho, Gibson não abriu mão do fantástico, do sobrenatural, da fé, embora seja um filme centrado na carne arrancada e no sangue derramado.
E eis que chegamos a RESSURREIÇÃO (2016), de Kevin Reynolds, cineasta que entrou numa espécie de lista negra depois de sofrer o repúdio da crítica e o martírio nas filmagens de WATERWORLD – O SEGREDO DAS ÁGUAS (1995), um filme que não é tão feio como pintam. Aliás, é um belo trabalho, sim. O amigo Kevin Costner, inclusive, o convidou mais recentemente para dirigir uma minissérie para a televisão e o resultado foi muito satisfatório, o western HATFIELDS & McCOYS (2012).
É na posição de cineasta decadente (na verdade, nunca teve fama de cineasta de primeiro escalão) que Reynolds chega quase anônimo na direção de uma história envolvendo um tribuno que investiga o misterioso caso da ressurreição de Jesus, a mando de Pilatos, que, por sua vez, parece se sujeitar muito às vontades de Caifás, Sumo Sacerdote judaico mencionado nos evangelhos de Mateus e João como participante no julgamento do Messias.
Joseph Fiennes interpreta Clavius, um homem que parece não estar muito a par do que esteve acontecendo nos últimos dias, quando Jesus foi julgado e condenado à morte na cruz. Ele havia chegado de uma luta contra judeus rebeldes quando Pilatos o chama para ir até o local da crucificação de Jesus. Já é fim de tarde e as últimas palavras do Nazareno haviam sido ditas, enquanto os dois ladrões que estavam ao seu lado gritavam e agonizavam de dor. O fato de Jesus ter morrido tão rápido é algo surpreendente, levando em consideração que muitos desses homens passavam até três dias para morrer. Daí a necessidade de quebrar-lhes as pernas para acelerar o processo.
Se RESSURREIÇÃO não tem o mesmo impacto violento de A PAIXÃO DE CRISTO nessa sequência, é por escolha mesmo. Ainda assim, não deixam de ser perturbadores os gritos e a cruz caindo ao chão para jogar os corpos em um buraco cheio de cadáveres. O corpo de Jesus, no entanto, conseguiu ser salvo das pernas quebradas e foi reivindicado por José de Arimateia, homem que forneceu um sepulcro de sua família para acolher o corpo do Rei dos Judeus.
Toda essa sequência é muito bem desenvolvida por Reynolds, que também consegue criar uma situação bem interessante de investigação policial nos interrogatórios que Clavius faz a algumas pessoas, depois que se descobre que o corpo de Jesus desapareceu. O problema é que em determinado ponto o cineasta parece perder a mão e o timing é prejudicado, assim como há também alguns problemas envolvendo as falas de certas pessoas que o romano entrevista.
A partir de então é ladeira abaixo, por mais que se possa achar intrigante o encontro de Clavius com Jesus ressuscitado. Mas aí é que está o grande problema: é preciso criar uma atmosfera de magia, de ainda maior suspensão da descrença, a fim de que o ceticismo de Clavius seja também perturbado e transformado em crença pelo espectador. E nisso RESSURREIÇÃO perde ainda mais suas forças e se junta a outra série de filmes bíblicos ruins que existem por aí, ainda que se beneficie de uma maior suavidade no aspecto panfletário que tem caracterizado a grande maioria das obras cristãs recentes.
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