sábado, dezembro 05, 2015
CHATÔ – O REI DO BRASIL
E depois de 20 anos de espera, CHATÔ – O REI DO BRASIL (2015) finalmente entra em cartaz nos cinemas brasileiros. Foi uma trajetória que daria certamente um grande documentário de bastidores, equivalente a O APOCALIPSE DE UM CINEASTA, sobre as filmagens de APOCALYPSE NOW, de Francis Ford Coppola, que, aliás, foi um dos homens que chegaram a fazer parte da parceria com Guilherme Fontes na criação deste suposto épico sobre o maior magnata das comunicações do Brasil. Coppola caiu fora do projeto, mas seu nome e de sua produtora aparecem nos créditos, até por ter contribuído em parte.
CHATÔ é filme irmão de CARLOTA JOAQUINA – PRINCESA DO BRASIL (1995), de Carla Camurati, considerado o filme-marco do início da chamada retomada do cinema brasileiro. Ambos são filmes de época contados com um toque de humor típico até de algumas bandas de rock dos anos 1990, embora Carla tenha sido bem mais feliz em sua empreitada. Além do mais, ambos os filmes são estreias de atores na direção. Ambos, principalmente CHATÔ, ao adotarem o tom de farsa, procuram se desviar da dificuldade que é tratar o tema com seriedade e maior competência. No caso de CHATÔ, o aspecto fragmentário da narrativa também tenta disfarçar as deficiências da narrativa, que se esconde na edição picotada.
O filme é narrado como um delírio de Assis Chateaubriand (Marco Ricca), depois de ter sofrido um AVC e começar a lembrar de momentos de seu passado e até de situações que nunca existiram, como o tal julgamento a que ele é submetido, quando ele reencontra as várias mulheres que ele chegou a ter alguma relação (e vários filhos), além do falecido Presidente Getúlio Vargas (Paulo Betti) em um programa de televisão nos moldes do Chacrinha.
Inclusive, a vontade de emular esse ar anárquico do "Velho Guerreiro" faz lembrar TERRA EM TRANSE, de Glauber Rocha, o que para muitos pode ser um bom motivo para agradar ou ser motivo de elogios, mas que no fim das contas só serve para aumentar ainda mais o histerismo que domina todo o filme. Se o corte final fosse mesmo de mais de três horas de duração seria uma obra insuportável, mas do jeito que ficou dá pra assistir principalmente como curiosidade, como um filme que veio do túnel do tempo, com todo mundo envelhecido 20 anos, e até atores que já morreram, como José Lewgoy e Walmor Chagas, embora suas participações neste corte final tenham sido apenas como pontas.
Na época, Marco Ricca não era ainda o grande intérprete que iria se tornar, nem Leandra Leal, que na época só tinha cerca de 13 anos de idade, e já fazendo o papel de uma das esposas de Chatô, esse que é um dos personagens mais odiosos da história de nosso país, e que em nenhum momento Fontes parece dar-lhe trégua ou torná-lo agradável aos olhos do espectador, ainda que não haja dúvida em admitir sua inteligência e tino comercial, na construção de uma imprensa escrita mais atraente e vendável. Seu papel no rádio e na televisão também é destaque. Como a televisão na época era filmada ao vivo, ele chega a interromper uma cena de uma telenovela a fim de deixar recados a seus desafetos.
Embora o filme destaque bastante a relação de Chatô e Getúlio, há algo que parece ser mais forte do que isso e até do que os fatos, que nem são levados tão a sério por causa do tom adotado: trata-se da personagem Vivi, interpretada por uma Andrea Beltrão que parece não envelhecer nunca (comparada com a atriz nos dias de hoje). Vivi é uma mulher que parece saída dos sonhos do protagonista, o amor inalcansável, quase como a Conchita de ESSE OBSCURO OBJETO DO DESEJO, de Luis Buñuel.
Como se vê, há toda uma tentativa de Fontes de se aproximar de grandes cineastas: Welles, Glauber, Coppola, Buñuel, Fellini, mas todas as tentativas resultam em uma obra que só vale mesmo a conferida pelo aspecto de curiosidade, de uma obra que vê a luz do dia já velha e moribunda, como o protagonista, no início e no final. Aliás, o filme vale pelo final também, mais uma vez, graças à participação de Andrea Beltrão.
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