quarta-feira, agosto 26, 2015
HOMEM IRRACIONAL (Irrational Man)
Na minha passagem por Nova York, uma das coisas mais marcantes pra mim foi poder ver um filme de Woody Allen na terra que ele ajudou a desenhar em nosso inconsciente coletivo em vários de seus trabalhos em que a cidade é também uma personagem. E ver um filme de Allen, para quem já acompanha sua carreira e aprecia mesmo aqueles que não recebem as melhores críticas, é sempre um prazer, por acrescentar algo a mais ao seu rico conjunto da obra.
HOMEM IRRACIONAL (2015), se não é tão espiritualmente elevador quanto o irmão feliz MAGIA AO LUAR (2014), acaba encontrando companhia com outros trabalhos da linha dostoievskiana de Allen, como CRIMES E PECADOS (1989), PONTO FINAL – MATCH POINT (2005) e O SONHO DE CASSANDRA (2007), sem falar que se trata de um filme que flerta com PACTO SINISTRO, de Alfred Hitchcock, embora o registro aqui seja bem mais leve.
Na trama, Joaquin Phoenix é Abe, um professor de Filosofia que não encontra mais sentido na vida. Pessimista e amargo, ele não tem amor nem mesmo pela disciplina que leciona e vive num processo de autodestruição com o álcool. Apesar de exibir uma barriga de cerveja bem evidente, seu pessimismo e sua acidez acabam atraindo a atenção de uma aluna, Jill (Emma Stone), que se apaixona por ele. Acontece o mesmo com uma professora vivida por Parker Posey.
Apesar de duas mulheres interessantes em sua vida, o que passa a dar sentido à vida de Abe de verdade é a possibilidade de matar um homem que fez algo inaceitável a uma mulher que ele desconhece. Abe ser um estranho na vida daquele homem pode diminuir as possibilidades de culpa no caso de o assassinato de fato ocorrer.
Curiosamente, apesar de o tema ser pesado, há uma leveza que Allen parece trazer de outros filmes, especialmente de MAGIA AO LUAR. Isso pode ser visto tanto como um problema quanto como um trunfo. Um problema quando a leveza torna o suspense menos impactante; um trunfo quando gera um produto estranho, o que quase sempre é algo muito bom, passa um ar de frescor, mesmo se analisarmos o parentesco com outros trabalhos do cineasta.
Assim, ao mesmo tempo em que estamos vendo uma tragédia, estamos vendo uma comédia. HOMEM IRRACIONAL é tudo isso junto e traz também aquela impressão de que foi influenciado fortemente pelo cinema europeu, embora isso não seja nenhuma novidade para alguém que já homenageou Bergman e Fellini em trabalhos bem anteriores. Agora é a vez de Hitchcock. E Allen faz isso com brilhantismo, livrando dessa vez o seu protagonista da pecha de se parecer mais uma vez explicitamente com um alter-ego seu, graças também ao trabalho mais sutil de interpretação de Phoenix.
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