quarta-feira, julho 22, 2015

CAMINHO PARA O NADA (Road to Nowhere)



Aquela teoria de que não somos nós que encontramos os filmes, eles é que nos encontram, tem uma ponta de verdade. Nem sei se é bem o caso da minha relação com CAMINHO PARA O NADA (2010), do mítico cineasta Monte Hellman. Lembro que o filme estava em cartaz em uma sessão no CineSesc de São Paulo, numa das épocas mais felizes em que visitei a cidade. Mas por algum motivo não foi possível vê-lo. E a distribuição do filme foi muito restrita. O tempo foi passando e, apesar dos elogios de gente que eu considero muito, CAMINHO PARA O NADA acabou não sendo um objeto de busca da minha parte.

Eis que, assistindo a minissérie WAYWARD PINES e me encantando a cada episódio com a beleza da atriz Shannyn Sossamon, que interpreta Theresa Burke, a esposa do protagonista vivido por Matt Dillon, e comentando isso com os amigos na rede social, dois dos meus amigos (Marcelo e Osvaldo) comentam que já haviam se apaixonado por ela desde CAMINHO PARA O NADA.

Se Shannyn ainda é uma atriz pouco conhecida, na época da realização do filme de Hellman, era ainda mais. O que não foi nenhum problema para sua escalação mais do que merecida em um dos papéis principais, de musa inspiradora de um cineasta. Aliás, no próprio filme, há uma brincadeira do cineasta rejeitando Leonardo DiCaprio e Scarlett Johansson para os papéis principais. E assim como acontece em WAYWARD PINES,Shannyn encanta sem fazer muito esforço.

Quanto a CAMINHO PARA O NADA, é um desses filmes mágicos, que podem facilmente entrar numa dessas listas de melhores do novo milênio com todos os méritos. E é uma obra referencial, que diz muito do próprio cineasta, de suas idiossincrasias, de suas obsessões, de suas paixões, como a paixão pelo cinema, que é explicitada não apenas nos momentos em que o protagonista está no set de filmagens, mas também quando ele, junto à sua musa descoberta, assiste a três filmes em seu quarto: AS TRÊS NOITES DE EVA, de Preston Sturges; O SÉTIMO SELO, de Ingmar Bergman; e O ESPÍRITO DA COLMEIA, de Victor Erice. Inclusive, é um dos raros trabalhos que mostram a apreciação de alguém a uma obra fílmica, embora foque nos momentos finais, com a reação de respeito e encanto pelo que acabou de ver.

Uma das coisas que chama muito a atenção em CAMINHO PARA O NADA é a forma como Hellman filma as cenas "reais" como se fossem encenadas (ou até mal encenadas, dada a estranheza da dramaturgia) e as cenas filmadas de forma mais realista, muitas vezes confundindo-as com a realidade fictícia apresentada, a da história do cineasta e de um crime envolvendo o passado sombrio da atriz.

Por isso muitos comparam CAMINHO PARA O NADA com a obra-prima CIDADE DOS SONHOS, de David Lynch. É quando lembramos que Hellman é o cara que fez aqueles westerns existencialistas maravilhosos, estrelados por Jack Nicholson: DISPARO PARA MATAR (1966) e A VINGANÇA DO PISTOLEIRO (1966). São filmes que nos deixam sem chão.

E é assim mais uma vez que nos sentimos durante e ao final de CAMINHO PARA O NADA. Em determinado momento do filme, alguém comenta algo sobre não entender os filmes de Mitchell Haven (o alter-ego de Hellman, vivido por Tygh Runyan), e ele, rindo, responde algo do tipo: se as pessoas entenderem, não seria um filme dele. Ele teria cometido um erro.

Por isso, querer procurar um nexo na trama de assassinato e identidades falsas em meio a flashbacks que nos confundem com cenas filmadas ou algo do tipo é perder tempo e não entrar no espírito da obra. CAMINHO PARA O NADA, assim como os citados westerns e certamente outros trabalhos de Hellman, pede que o espectador se deixe perder na teia de intrigas e adentre o universo de sonhos com o carinho e o respeito que essa obra merece.

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