domingo, abril 19, 2015

AS MARAVILHAS (Le Meraviglie)



Incrível como o cinema italiano, que já foi o melhor do mundo na década de 1960, está passando por uma crise criativa grave, a julgar pelos títulos que chegam aqui, geralmente já laureados com prêmios e boas recepções de boa parte da crítica. AS MARAVILHAS (2014), por exemplo, segundo longa-metragem de Alice Rohrwacher, até ganhou um prêmio bem importante, o Grande Prêmio do Júri, no Festival de Cannes do ano passado. Como os títulos selecionados para este festival costumam representar o que há de melhor no cinema de autor no mundo, espera-se que os premiados sejam no mínimo muito bons.

E até pode-se dizer isso quanto a AS MARAVILHAS, uma vez que se aprecie o ritmo cadenciado (ou às vezes monótono) e o enredo que é mais construído em prol da atmosfera e do desenvolvimento dos personagens dentro de uma geografia interessante, a da região etrusca, lugar em que uma família muito simples vive e sobrevive da criação de apiários e da extração de mel. Trata-se de uma prática já bastante antiga da região.

O filme, que tem algo de misterioso em alguns momentos, embora tal elemento não chegue a ser algo que o torne suficientemente intrigante, traz algumas cenas memoráveis, a começar pelo início, com uma garotinha saindo de sua cama à noite para fazer xixi e a irmã a segue. Aos poucos, vamos vendo o tamanho da família, toda de meninas, e o modo bem pouco privativo que essas pessoas têm para satisfazer suas necessidades fisiológicas.

O filme lida com uma jovem que está em processo de amadurecimento, a adolescente Gelsomina (Maria Alexandra Lungu), que tem sua rotina perturbada por dois fatores: 1) o grupo de uma estação de televisão do programa "País das Maravilhas" chega na região e faz com que ela perceba o quanto o ambiente em que vive é limitador e quanto o mundo é grande; e 2) o rapazinho que é colocado para ser cuidado pela família, que desperta nela desejos, mas ele é estranho demais para falar qualquer palavra e ela também não quer reconhecer o seu interesse.

Isso gera alguns momentos interessantes, como as cenas que envolvem o apiário que mostram as tensões existentes no processo e na família, muito disso em razão de o pai, um alemão, ser um sujeito bastante autoritário, e tem ciúmes principalmente de Gelsomina, sua filha preferida.

Monica Bellucci aparece num papel pequeno, mas felliniano, parecida saída de um sonho um tanto carnavalizado. Aliás, não só ela remete a Fellini, mas também o próprio nome da menina, Gelsomina, é o mesmo de Giulieta Masina em A ESTRADA DA VIDA, filme da primeira fase do lendário cineasta. Mas embora seja muito bonito isso de homenagear os cineastas da era de ouro do cinema italiano, acaba ficando mais uma vez a impressão de que essa geração nova ainda vive sob a sombra dos veteranos ou falecidos, por mais que tentem buscar inovações e registrar suas próprias inquietações.

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