terça-feira, janeiro 20, 2015

A PELE DE VÊNUS (La Vénus à la Fourrure)



As distribuidoras brasileiras andam cada vez mais temerosas em lançar certos filmes mais ousados. Mesmo os que trazem a assinatura de um grande cineasta. Aconteceu com PASSION, de Brian De Palma, e agora acontece também com A PELE DE VÊNUS (2013), de Roman Polanski. São dois filmes que certamente ganhariam muito se vistos na telona, mas também não dá para ficar esperando o resto da vida até que essas distribuidoras resolvam tirar os filmes do limbo, nem que seja para colocar no mercado de home video, que só não morreu de vez mesmo por causa do blu-ray.

A PELE DE VÊNUS dá continuidade ao namoro de Polanski com o teatro, iniciado com o anterior, o ótimo DEUS DA CARNIFICINA (2011). Aqui esse romance é mais explicitado, já que a história toda se passa dentro de um teatro e temos apenas dois personagens em cena, um diretor de teatro, Thomas, vivido por Mathieu Amalric, e uma atriz que chegou atrasada para as audições, Vanda, vivida por Emmanuelle Seigner.

O filme conquista o espectador desde o começo, com o modo como Vanda entra, toda ensopada de chuva, no teatro, e fazendo chantagem emocional para que Thomas a aceite como candidata à protagonista feminina. O filme é baseado na peça Venus in Fur, do americano David Yves. Até achei que a peça fosse mais antiga, mas ela é bem recente (encenada pela primeira vez em 2010) e é um jogo no qual há uma peça dentro da peça. Curioso ver o filme após ter visto tão recentemente ACIMA DAS NUVENS, de Olivier Assayas, que também tem momentos assim.

Mas A PELE DE VÊNUS vai bem além, no sentido de confundir ainda mais o que é "real" e o que é encenado, já que quando Vanda se mostra uma personagem perfeita o diretor fica fascinado a tal ponto de o jogo de ativo-passivo, diretor-ator etc. ser totalmente invertido, o que tem tudo a ver com o que a peça propõe, isto é, mostrar o relacionamento de sadomasoquismo entre um homem e uma mulher.

Já sabemos o quanto Amalric é bom ator, mas quem brilha mesmo no filme é Emmanuelle Seigner, a esposa do diretor, em sua quarta parceria com o marido, tendo começado com ele com BUSCA FRENÉTICA (1988), deixado a audiência à beira da loucura em LUA DE FEL (1992) e flertado com o demônio em O ÚLTIMO PORTAL (1999). Aliás, há semelhança de sua personagem aqui com a de LUA DE FEL, no sentido de que ambos os filmes lidam com relações de sofrimento e prazer.

O que torna A PELE DE VÊNUS singular é mesmo esse jogo de inversões, esse duelo psicológico entre esses dois personagens, e o quanto, pelo teor metalinguístico do filme, esquecemos que estamos diante de um filme adaptado de uma peça, já que há algumas interrupções, como o telefone de Thomas que toca, ou nas vezes em que ela dá ideias geniais para abrilhantar a peça do dramaturgo. O que sentimos é algo misto, situado entre o desconforto e a excitação. Deve ser assim a entrega sentimental, física e sensual no universo S&M.

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