quarta-feira, julho 09, 2014

O CONGRESSO FUTURISTA (The Congress)



Às vezes precisamos de tempo para digerir certos filmes e entender os motivos que os levaram a fazer com que ele mexesse com nossas emoções. O ruim é quando deixamos para muito tarde, quando esse efeito já começa a se distanciar diante do efeito de filmes mais recentes. Daí até pensamos que poderia ser um alarme falso o que havíamos sentido. Não sei se esse é o caso de O CONGRESSO FUTURISTA (2013), de Ari Folman, mas estou aqui justamente para tentar repensá-lo, trazê-lo de minha memória ruim para procurar descrever suas qualidades e sua força.

O israelense Ari Folman chamou a atenção do mundo em grande escala com seu híbrido de animação com documentário VALSA PARA BASHIR (2008), que na verdade já era o seu terceiro trabalho na direção. O CONGRESSO FUTURISTA, adaptação do romance distópico de Stanislaw Lem, também aposta na mistura de gêneros ao juntar o filme em live action com um estilo de animação quase lisérgica para falar de perda. Aliás, talvez tenha sido isso, o sentimento de perda, que tenha me deixado tão angustiado ao ver este filme.

Na trama, Robin Wright vive a si mesma – ou pelo menos um alter-ego de si mesma – que está em decadência em Hollywood. Uma Hollywood que cada vez mais deixa de valorizar os atores veteranos, que são considerados obsoletos. No caso de Robin, ela é lembrada principalmente pela fantasia romântica A PRINCESA PROMETIDA, realizado em 1987, quando a atriz tinha apenas 21 e ainda podia se passar por adolescente.

Agora uma mulher madura e com dificuldades para encontrar trabalho num mundo que valoriza cada vez mais os atores e atrizes criados por computador, Robin, precisando de dinheiro para tratamento de saúde do filho, resolve se submeter a um contrato no qual ela seria eternamente jovem em sua versão computadorizada nos filmes, mas abdicaria de qualquer aparição em filmes, séries de televisão ou mesmo peças de teatro. Ela ganharia por tudo que a sua versão computadorizada e sempre jovem fizesse, mas deixaria de existir para o mundo.

O filme tem uma primeira parte em live action bem interessante, com a conversa nos bastidores envolvendo o tal contrato, em que Harvey Keitel é o seu empresário de confiança e Danny Huston é uma espécie de Mefistófelis, mas também se torna bem interessante quando dá um salto no tempo e a atriz é convidada a ingressar numa espécie de congresso em que todas as pessoas se transformam em desenho animado.

Daí entra a sensação de perda do corpo. Sua alma agora habita uma espécie de recipiente bidimensional com a sua caricatura. Outras pessoas, no entanto, preferem viver naquele mundo com a forma que escolherem. Trata-se de um mundo que também tem pessoas insatisfeitas e prontas para programar uma rebelião contra aquele sistema criado pelo homem e cada vez mais afastado do mundo real e das realidades sociais.

Em alguns momentos o filme prefere se perder naquele mundo de animação que parece ter saído da mente de alguém numa viagem de ácido, mas o sentimento de aflição da personagem está sempre presente, tanto na busca pelo filho, que pode ter ido para o mundo real, quanto pelo encontro de um amor no mundo animado. O CONGRESSO FUTURISTA acaba também pondo em discussão o conceito de alma ou espírito, que de uma forma ou de outra está sempre preso. E que pode se estender até mesmo para essa tendência da sociedade atual de se tornar cada vez mais virtual e perder o elo com o mundo material.

Para sair um pouco do tom sempre sério, há referências divertidas, como o modo como Tom Cruise é mostrado no mundo animado, entre outras citações do cinema, e momentos muito lindos, como quando Robin canta "If It Be Your Will", de Leonard Cohen, ou "Forever Young", de Bob Dylan.

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