sábado, setembro 08, 2012

O QUE EU MAIS DESEJO (Kiseki)



O que passa pela cabeça de alguém que não é acostumado com o estilo de narrativa japonesa como eu é pensar no abismo que existe em nossas culturas, a ponto de eu estranhar ou mesmo não compreender muitos filmes produzidos no arquipélago. E o curioso é que o mesmo não costuma ocorrer com os filmes chineses, que aparentemente são menos contaminados com a cultura americana, já que os japoneses receberam ajuda dos Estados Unidos na reconstrução das cidades de Hiroshima e Nagazaki e assimilaram muito da cultura do país rival. Há também a música, que nos filmes chineses são claramente mais dissonantes, enquanto que nos filmes japoneses são carregadas de um ar pop. O que se percebe é que a cultura japonesa é muito forte. Mesmo tendo uma cultura capitalista próxima da ocidental, tem um enorme diferencial que transparece nos filmes.

Talvez a maior estranheza ao ver O QUE EU MAIS DESEJO (2011) esteja mesmo no estilo narrativo do cineasta, Hirokazu Kore-Eda, que em DEPOIS DA VIDA (1998) mostrou uma visão bem particular da vida após a morte e uma capacidade – que parece ser própria dos japoneses – de parecer mais físicos, mesmo quando mostram fantasmas. Assim como DEPOIS DA VIDA, O QUE EU MAIS DESEJO tem um aspecto enigmático, ao mostrar o povo de uma ilha que se acostuma com um vulcão em atividade, que joga cinzas todos os dias para as ruas e casas. Além do mais, as crianças do filme ficam sabendo de uma lenda que diz que é possível fazer um pedido e ser prontamente atendido, ao ficar próximo de dois trens-bala, quando eles passam muito perto um do outro, gerando uma energia semelhante à de uma estrela cadente.

Mas é de NINGUÉM PODE SABER (2004), talvez o filme mais conhecido de Kore-Eda, que O QUE EU MAIS DESEJO se aproxima. Principalmente por mostrar crianças tendo que se virar sozinhas. Não tanto quanto no filme anterior, já que essas têm pais, embora separados, mas o diretor sabe muito bem trabalhar com as crianças e um dos principais méritos do filme é que todas elas estão muito à vontade em seus papéis.

Os personagens principais são dois irmãos que vivem separados após o divórcio dos pais. Koichi tem 12 anos e mora com a mãe e Ryonosuke, o mais novo, mora com o pai. Os dois moram em cidades diferentes e costumam se comunicar com frequência por telefone. Entre os demais personagens, há o avô, que faz uma espécie de doce não muito doce, as outras crianças e os pais e familiares dos meninos. Nem sempre a junção dessas pequenas subtramas são felizes. É o caso de filme que talvez seja melhor assimilado numa segunda vez, mas não dá muita vontade de ver uma segunda vez. A duração de mais de duas horas parece um tanto excessiva.

O QUE EU MAIS DESEJO é um filme sobre sonhos e desejos. Desde o início, quando o professor pede para que as crianças escrevam uma redação sobre o que eles querem ser quando crescerem, o filme já explicita a questão e depois vai além, quando mostra a peregrinação dos meninos até o local onde os trens-bala se cruzam. É também um filme sobre o olhar das crianças sobre a vida trivial e de pouco sentido dos adultos.

Vi o filme numa cópia em digital bem escura no Cine Dragão do Mar. O lugar, pelo menos dentro da atual gestão, está com os dias contados. Diminuíram o preço do ingresso de 12,00/6,00 para 8,00/4,00. Na próxima semana vai para 6,00/3,00 e na última semana, que se encerra no dia 27 de setembro, o preço vai para 4,00/2,00. Espera-se que não seja o fim, mas um novo começo.