terça-feira, abril 25, 2006

ABC DO AMOR (Little Manhattan)

 

Meu primeiro amor aconteceu quando eu tinha 9 anos de idade. Acho que fui um pouco precoce nesse sentido, embora as outras coisas tenham demorado um pouco mais para acontecer por culpa de minha timidez crônica. A menina era uma loirinha linda e de olhos verdes. Eu sonhava acordado com essa menina todas as noites. Sonhava que ela aparecia pela minha rua e eu conversava com ela, sonhava que a gente passeava romanticamente. Mas o meu lado pessimista vinha e destruía até mesmo meus sonhos. Eu perdia o controle deles. Geralmente aparecia algum ladrão ou algum sujeito com uma faca na mão e transformava o sonho num pesadelo. Quando eu passei para a quarta série, me apaixonei por outra menina. Dessa vez, uma morena. Foi uma paixão até maior e mais marcante, já que com essa eu falava, abraçava, beijava (no rosto) de vez em quando, disputava com um rival. Engraçado que esse rival tinha uma bicicleta e oferecia carona pra ela. Eu, obviamente, ficava morrendo de ciúmes. Aí pedi ao meu pai para comprar uma bicicleta pra mim. "Você está interessado em alguma menina da escola?", perguntou ele. "Não", disse eu, todo sem jeito. Como será que ele adivinhou, hein? 

Se eu não fosse tão tímido e tão travado até poderia conversar com o meu pai sobre essas coisas. Infelizmente não foi isso que aconteceu e meu pai sempre foi meio que um estranho pra mim. No fim das contas, ele não me deu a bicicleta - ele ganhava pouco, trabalhando de mecânico de automóveis. Na verdade, eu nunca aprendi a andar de bicicleta. E essa menina foi responsável pelo fato de eu ir para determinada escola pública, em vez da particular que minha mãe queria me colocar. Lembro que um dos momentos mais dor-de-cotovelo pra mim foi aquele em que eu a vi dançando numa festa da escola com o meu rival. Imagina, eu com dez, onze anos, chorando minha primeira desilusão amorosa. 

ABC DO AMOR (2005), a estréia na direção de Mark Levin, nos leva para esses momentos mágicos e um pouco constrangedores da nossa infância. O primeiro amor é mostrado como geralmente é: um sentimento forte demais para uma criança. Afinal, até as pessoas mais escaldadas sempre sofrem com o frio na barriga - que pode levar a perda de apetite -, o coração batendo mais forte quando perto da pessoa amada e a incrível capacidade de falar idiotices nos piores momentos, justo quando se quer impressionar a menina. O amor na infância é mais puro, não tem ligação com pensamentos sobre sexo ou algo do tipo. Não diria que é um amor mais espiritual, pois o fator estético desempenha um papel muito importante: eu, pelo menos, sempre me apaixonava pela mais bonita da classe. 

O filme trata com delicadeza de um tema até que pouco abordado pelo cinema. Que eu me lembre, tem a série ANOS INCRÍVEIS e o desenho animado da turma do Charlie Brown, que mostrava o carequinha tendo um colapso nervoso sempre que tinha que passar perto da "Garotinha Ruiva". Em ABC DO AMOR, o garoto tem sua vida virada de cabeça para baixo quando, na aula de caratê, se vê apaixonado por uma menina. Sua chance de se aproximar dela surge quando ele passa a ser o parceiro dela durante as aulas. Depois, ela o chama para treinarem juntos em sua casa. Se há um ponto que possa depor contra o filme, talvez esteja nos diálogos, um pouco maduros demais para a idade deles. Eles conversam, por exemplo, sobre o rápido amadurecimento das meninas, enquanto os meninos continuam agindo como crianças durante um bom tempo. Mas, por outro lado, o fato de os personagens serem mais maduros psicologicamente torna o filme mais atraente para o público adulto. Mais até do que para as crianças, eu diria. 

Há até quem compare o filme a MANHATTAN do Woody Allen, já que a ilha de Manhattan também é mostrada com carinho na fotografia, também em scope. Um dos momentos mais belos do filme é quando a menina o convida para ir ao show de um cantor com os pais dela. É quando ele tem a oportunidade de pegar na mão dela. Na narração em off, ele diz que não lembra direito o que o artista estava cantando, mas que deve ter tudo a ver com aquele momento de felicidade que ele estava vivendo. Difícil não nos colocarmos um pouco no lugar do garoto, sentirmos aquele friozinho na barriga, sentir um pouco de sua ansiedade, especialmente quando ele percebe que precisa agir se não quiser que a relação dos dois fique apenas na amizade. Eu diria que ABC DO AMOR é um dos mais belos filmes sobre o amor que eu já vi. E que se torna ainda mais belo graças àquele final, meio agridoce.

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