terça-feira, janeiro 20, 2004

ÔNIBUS 174



- Ailton, você viu "ÔNIBUS 174"??? Estava pensando em ver hj no North Shopping, quer ir?
- Márcio, já ia chamar vc pra ir ver o EM NOME DE DEUS no Aldeota às 19 hs. Hehehe... É que eu tenho que entregar umas fitas lá na King Vídeo depois do trabalho e ia dar certo pra mim. Não quer trocar o ônibus por Deus?? hehehhe
- Não posso trocar pois tenho um compromisso lá pelas bandas da Bezerra às 19:00h, por isso optei pelo ônibus. Faz o seguinte: deixa tuas fitas lá na king, vai para casa, toma banho, come e depois me encontra no NS lá pelas 9:00. Além do mais, o ônibus só tem hj, já Deus vai ficar mais um tempo à disposição.

Esse foi um diálogo por e-mail ontem com o Márcio. Acabei mudando de idéia (filme malhado por filme malhado, né?) e fui lá conferir o documentário nacional. Liguei para o Zezão, que falou que já ia mesmo ver o filme com a Juliana e a Marcélia. Legal. Fui então encontrar todo mundo no North Shopping ontem para a re-estréia das tradicionais sessões de arte aqui em Fortaleza.

Estava temendo encontrar um filme chato. Ainda por cima a duração do filme era de 133 minutos. Se até os ótimos documentários do Eduardo Coutinho são às vezes cansativos, imagina esse que já foi tão malhado. Por sorte, o filme tem um bom ritmo, não aborrece em instante algum.

A história é velha conhecida da população brasileira: aquele assalto num ônibus que aconteceu no bairro do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, e que culminou com a morte de uma cearense e com a posterior morte do assaltante, asfixiado pelos policiais. O assaltante tinha várias mulheres como reféns.

O interessante é que esse filme provocou sentimentos contraditórios em mim. Em certa altura do assalto/seqüestro eu já estava impaciente e queria mesmo era que matassem logo o filho da puta. Mas vendo o pobre coitado do Sandro sendo enterrado em caixão simples e com apenas a sua mãe adotiva no enterro pra chorar por ele... Puxa, é triste, hein. Fico comovido com amor de mãe. Talvez por isso que tenha chorado tanto vendo CARANDIRU. No fim das contas o que aquela estudante de comunicação falou pra ele na tensão daquele momento era verdade: a principal vítima daquilo tudo era ele mesmo.

Outro assunto relevante que é abordado pelo filme é o da "invisibilidade". A maioria de nós passa pelos mendigos nas ruas e apesar de se sentir incomodado pela presença deles, procura esquecer, fazer de conta que eles não estão lá. É mais cômodo. O que acontece é que geralmente só nos sentimos solidários com quem nos identificamos e acabamos ajudando apenas as pessoas que vivem em situação semelhante à nossa. Eu sei que tem gente que ajuda mesmo, que tem consciência e deixa de ter um pouco de luxo na vida porque pensa em quem não tem o que comer. Como é o caso, por exemplo, da Soninha, ex-vj da MTV.

Também é interessante que enquanto Sandro estava com o revólver na cabeça de uma das moças do ônibus, ele citava os incidentes da Candelária e de Vigário Geral, culpando os policiais pelos massacres. Ele era um dos meninos de rua que dormiam na praça da Candelária quando aconteceu a chacina que vitimou dezenas deles. Morreram como baratas. Para a sociedade foram 60 marginais a menos. Mas o foda é que as pessoas só enxergam o ponto de vista delas. Quem está vivendo miseravelmente não quer desaparecer não. Quer é lugar pra morar, uma casa, uma cama pra dormir, comida todo dia. Isso pra essas pessoas é felicidade. E a gente tem essa felicidade e nem sabe, né?

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