quinta-feira, julho 31, 2003

OS FUZIS



Assisti nessa semana OS FUZIS (1964), filme considerado não apenas a obra-prima de Ruy Guerra, como também um dos filmes mais importantes da cinematografia nacional. Na edição # 27 da revista Contracampo, foi promovida uma votação dos melhores filmes brasileiros de todos os tempos. A votação foi feita por vários críticos e pessoas ligadas ao cinema. Resultado: OS FUZIS ficou em 10º lugar, empatado com A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA (1965), de Roberto Santos.

Não sou muito conhecedor da filmografia de Ruy Guerra. Vi apenas OS CAFAJESTES (1962), que tem uma impressionante cena de humilhação com a Norma Bengell e foi o primeiro filme brasileiro a exibir um nu frontal feminino; e KUARUP (1989). Este último foi bastante malhado pela crítica e público, mas eu vi no cinema e gostando bastante. Talvez por ter muita mulher pelada. hehehe..Imagina só eu ir ao cinema e ver Fernanda Torres, Cláudia Raia, Maitê Proença e Cláudia Ohana, todas nuazinhas na telona. Bom, nem todas tiram a roupa e eu já nem me lembro direito do filme. Talvez não seja lá grande coisa mesmo, mas na minha memória afetiva ele tem um bom lugar.

Ruy Guerra também é o responsável por eu ter quebrado uma regra básica. Nunca sair do cinema sem o que o filme tenha terminado. ESTORVO (2000), adaptação do romance de Chico Buarque, é tão chato que eu não agüentei. Fui embora. Na tv, também comecei a ver A ÓPERA DO MALANDRO (1985), também baseado em Chico, mas não fui até o final. Talvez porque antigamente eu não tivesse esse hábito de gravar os filmes em vhs pra ver depois com calma. Acabei perdendo muita coisa.

Agora OS FUZIS. O filme é um espetáculo de deixar a gente atordoado. Começa com a câmera com luz estourada e a voz gritada de Antonio Pitanga, entoando preces no sertão da Bahia. Em seguida, a imagem dos sertanejos seguindo um boi e cantando numa procissão. Na primeira meia hora de filme não há bem um enredo, algo que deixe a gente vendo qual é o "objetivo" do filme. (Não gosto dessa palavra "objetivo" ligada à arte, mas...) Guerra apresenta primeiro a geografia do lugar. A câmera passeia pela miséria das pessoas, que passam fome e, cegas e desanimadas, passam a acreditar nas palavras de um beato e em um boi que dizem ser sagrado e que pode ajudar a mandar chuva. Os movimentos de câmera são maravilhosos. Tem uma cena que ela (a câmera) passeia pelo interior de uma casa humilde e parece que é tudo verdade. Quase um documentário.

O filme tem dois núcleos. Há os sertanejos, apresentados mais como uma multidão do que como pessoas individuais; e há os cinco policiais (entre eles Nelson Xavier, Hugo Carvana e Paulo César Pereio), chamados para defender os armazéns do comerciante local. A situação por si só já é revoltante. Enquanto o povo passa fome, a comida fica guardada, estragando no armazém. Uma das melhores cenas é uma em que Gaúcho (Átila Iório), a pessoa mais sóbria do lugar, um motorista de caminhão, num acesso de revolta, toma o fuzil de um dos soldados e sai atirando nos caminhões com os mantimentos.

Por um momento, parecia que eu estava vendo um western de Sergio Leone, só que com a história se passando pertinho daqui, no Nordeste sofrido do Brasil. Em vez de um western spaghetti, um western feijoada. E sem feijão pro povo comer. Falando em comida, a seqüência final é a mais revoltante. Muito foda. Uma aberração gerada pelo descaso do Governo e dos poderosos. Somos homens ou bichos?

A fita foi gravada pelo chapa Renato, do Canal Brasil. Thanx, buddie!

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