quinta-feira, agosto 25, 2022
CEGA OBSESSÃO (Môjû)
Atualmente a Versátil Home Video está fazendo um trabalho fantástico de criação de livros temáticos, que são presenteados como brindes para quem compra em pré-venda nos primeiros dias os packs de cada mês. Já foram publicados e enviados Filme Noir – Dez Filmes Essenciais da Coleção, Obras-Primas do Terror – Dez Filmes Essenciais dos Spin-Offs e um que estou aguardando ansiosamente para que chegue em minha casa, Mestres Japoneses – Dez Filmes Essenciais do Cinema Clássico Nipônico. Os recortes em dez filmes desses livros acabam por chamar atenção para os títulos escolhidos, como se fossem indicações dentro das indicações, já que considero o trabalho de curadoria dos boxes excelente. Nem preciso dizer que recomendo a todos que não estão acompanhando esses lançamentos que comecem a prestar atenção.
CEGA OBSESSÃO (1969), de Yasuzô Masumura, foi visto com certa “antecedência” por mim justamente por integrar a lista dos filmes essenciais entre os títulos lançados em spin-offs da coleção Obras-Primas do Terror (dedicados a horror japonês, francês, espanhol e italiano). Cada filme recebe uma crítica caprichada de um convidado, geralmente um especialista no assunto. Eu tive a honra de ser convidado para um dos livros vindouros, o de faroeste, previsto para outubro. Mal posso esperar para ter meu exemplar em mãos. Ah, e sobre a palavra “antecedência” em parênteses, isso se justifica pelo fato de eu já ter visto o DVD da Magnus Opus diversas vezes nas locadoras e acabava sempre deixando para ver num outro dia.
CEGA OBSESSÃO é incrível. E o curioso é que, em sua primeira parte, mais ou menos em seu terço inicial, eu não estava gostando. Tanto estranhava o tom excessivamente teatral dos diálogos, quanto pouco me empolgava com a história do sequestro da modelo (Mako Midori) pelo escultor cego psicopata (Eiji Funakoshi). Eis que o filme vai nos surpreendendo – e por isso que recomendo que o espectador que ainda não o viu veja sem saber nada a respeito – e encerrando de maneira violenta e poética.
Gosto muito da voice-over da personagem feminina, que traz o filme para a literatura, um claro traço do romance Moju, de Edogawa Rampo, escritor especialista em mistério e suspense cujo pseudônimo é uma homenagem ao mestre Edgar Allan Poe. Essa ênfase na força da palavra traz algo de lírico para o filme, que também destaca bastante a força das imagens, e elas ressaltam as esculturas de pedaços de mulheres feitas em tamanho gigante no armazém habitado pelo escultor, claramente fascinado pelo corpo feminino.
Essa imagens contribuem para uma sensação de psicodelia muito característica da segunda metade da década de 1960. O aspecto exploitation e também sexploitation traz uma carga de transgressão que me encantou. Além do mais, ao contrário do que possa parecer, a jovem personagem feminina é mais dona da situação do que se imagina, mesmo estando numa situação de prisão e terror. É possível dizer que o filme antecipou o tom erótico e trágico de IMPÉRIO DOS SENTIDOS, o clássico moderno de Nagisa Oshima.
A questão da mulher-objeto, que hoje é trazida à reflexão com mais frequência na sociedade do novo milênio para que tenhamos um pouco mais de consciência do sofrimento alheio, pode vir à tona com frequência, especialmente quando o próprio filme já apresenta a personagem da modelo nua e acorrentada em várias fotos de um fotógrafo de vanguarda, para exposição, no prólogo. A liberdade da moça dura muito pouco tempo na metragem do filme, já que logo ela é raptada pelo escultor cego e por sua mãe, que tem com ele uma espécie de relação edipiana, explorada com ênfase em diálogos com o trio de personagens. Inclusive, se pensarmos bem, para um homem que não teve relação com nenhuma outra mulher a não ser com sua mãe, a geografia dos corpos femininos deve ter vindo principalmente da mãe.
Essa questão também é de forma inteligente percebida pela modelo, que diz que o fato de ele fazer esculturas enormes de partes do corpo de mulheres deixa claro que a figura da mulher para ele se prende bastante à figura materna. Essa teoria fica ainda mais aceitável (ou evidente, melhor dizendo) quando sabemos que o escultor ainda é virgem e o fato de a mãe ser morta em determinado momento, em uma discussão entre os três, explicita a substituição da primeira figura feminina para a posterior, a da amante.
Não sei se CEGA OBSESSÃO se aprofunda tanto nessas questões, mas até prefiro que aquilo que nasceu como principal motivo da realização do filme, que é a vontade de chocar, passe à frente dessas questões, embora os instantes finais também sejam um convite ao pensar a relação dos dois, a condição da mulher, a questão ambígua da dominação feminina frente à ingenuidade masculina etc. Mas o principal, ao final, acaba sendo a expansão dos prazeres provenientes do tato, para uma exploração também da dor e das fantasias cada vez mais doentias do casal. No fim, o filme se torna também uma reflexão sobre a arte e o ato de fazer amor, com a escultura criada pelo homem cego sendo um espelho do real e lembrando de imediato a Vênus de Milo.
Filme presente no box Obras-Primas do Terror - Horror Japonês 2.
+ DOIS FILMES
CAPRICÓRNIO UM (Capricorn One)
Na esteira dos filmes de paranoia, cinismo e descrédito do governo americano da década de 1970, chegou este ótimo exemplar, que usa uma teoria de conspiração já muito pensada e que até hoje é considerada: o fato de a ida à lua em 1969 ter sido uma farsa. Em CAPRICÓRNIO UM (1977), o governo americano prepara sua primeira viagem a Marte, mas no momento da partida do foguete, os astronautas são tirados de cena e convidados a entrar numa conspiração em que técnicas de cinema seriam usadas para fazer a simulação da decida ao planeta vermelho. Fiquei admirado com o elenco de estrelas do filme e do quanto tem cara de filme "A" (acredito que seja, embora não tanto). Peter Hyams e os produtores enfrentaram obstáculos quando do lançamento nos cinemas, por causa do tom supostamente antinacionalista e talvez por dar ainda mais espaço para a teoria que desacredita a ida à lua. De todo modo, o que conta aqui é o quanto o filme nos empolga do começo ao fim, inclusive quando se torna um thriller de ação, em sua segunda metade, com direito a atos heroicos de seus atores principais (Elliot Gould e James Brolin). Filme visto no box Clássicos Sci-Fi Vol. 9.
CHAMAS DA MORTE (The Burning)
Slasher que hoje parece pouco inventivo, mas que foi lançado em um ano que pipocavam produções do tipo. Só o chefe dos efeitos especiais, Tom Savini, já vinha de duas produções do subgênero, o primeiro SEXTA-FEIRA 13 e QUEM MATOU ROSEMARY?. Eu ainda prefiro QUEM MATOU ROSEMARY?, pela qualidade dos efeitos e também por ser mais charmoso. Mas CHAMAS DA MORTE (1981), de Tony Maylam, tem a vantagem de ser relativamente direto, já começando com a pegadinha que deu errado e que ocasionou queimaduras no corpo de um homem, que depois se tornaria o maníaco do acampamento, com sua tesoura de jardim. Divertido ver a participação de Jason Alexander no elenco e é muito difícil deixar de associá-lo ao George de SEINFELD. Das personagens femininas, gostei particularmente de uma moça loirinha, que infelizmente é vítima do assassino, na segunda leva. Há um momento de suspense que gosto bastante, que é a chegada de um grupo a uma das canoas perdidas. Enfim, não é desses filmes que vão me marcar, mas acredito que tem sua importância na popularização e na manutenção do subgênero por mais alguns anos. Filme visto no box Slashers (o primeiro).
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