A revista SET foi a principal formadora de minha cinefilia. A minha decisão de me dedicar mais aos filmes aconteceu quase no mesmo momento que comprei a primeira edição da revista, a que vinha com Clint Eastwood na capa, destacando o lançamento de DIRTY HARRY NA LISTA NEGRA. De vez em quando os editores da SET publicavam edições especiais contendo resenhas de seus críticos para edições em papel jornal com textos sobre os 500 melhores filmes presentes nas locadoras. O número de filmes variava de acordo com cada nova edição especial.
PICNIC NA MONTANHA MISTERIOSA (1975), de Peter Weir, era um desses filmes que estava sempre presente nessas antologias de críticas. E é curioso eu só ter visto o filme agora, no dia 1º de janeiro deste ano, passados mais de 30 anos das leituras dessas críticas. Acredito que isso se deu porque eu não encontrava o filme em VHS na época. Mas tudo bem: essas coisas acontecem e acabam por formar lacunas curiosas.
Não sei o que teria achado do filme se o tivesse visto no passado, lá na minha adolescência. Talvez tivesse estranhado o andamento que hoje me remete tanto a Michelangelo Antonioni quanto a certos filmes de horror mais sutis da década de 1970. Recentemente, por exemplo, eu vi SINTOMAS, de José Ramon Larraz, que também tinha tanto o estilo mais contemplativo quanto uma fotografia que acentuava os tons de amarelo e marrom.
Nunca tinha me perguntado sobre a questão da autoralidade nos filmes de Peter Weir, cineasta de importância gigante em minha cinefilia, graças a SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS (1989), mas, ao que parece, um denominador comum em seus filmes são esses personagens que têm um sentimento de não-pertencimento a um determinado espaço ou tempo.
No caso de PICNIC NA MONTANHA MISTERIOSA, temos um grupo de garotas de um internato em um passeio aos pés da Hanging Rock, uma formação rochosa no estado de Victoria, na Austrália. O passeio acaba em tragédia, já que três garotas e uma professora são dadas como desaparecidas no local, sendo que uma das meninas consegue fugir desesperada, mas sem saber dizer exatamente o que a fez ter medo daquele lugar.
O filme começa com uns letreiros que indicam que os eventos são reais, mas ao que parece é pura ficção. Ainda assim, o final em aberto sobre o destino das garotas e da professora fica no ar, querendo respostas. Respostas que, aliás, foram dadas pela própria autora do romance, Joan Lindsay. A solução para o enigma estava no último capítulo da versão inicial, que não foi aprovada pelos editores.
Uma das coisas que chama bastante atenção no filme está na sutileza da sexualidade das personagens. Há uma sensualidade latente na forma como são mostradas as garotas. Em determinado momento, elas passam pela floresta e são visualizadas por dois rapazes. Um deles diz o que pensa sobre a muito provável beleza de suas pernas nuas. O outro diz que aquilo não é algo que se diga, que é grosseiro. O rapaz afirma então que ele diz, enquanto o outro pensa. Isso diz muito da sexualidade apresentada no filme, uma sexualidade reprimida.
PICNIC NA MONTANHA MISTERIOSA tem sido visto como uma influência direta para AS VIRGENS SUICIDAS, de Sofia Coppola, tanto pelo comportamento das meninas, quanto pela atmosfera conferida e também pelos tons adotados na fotografia e na direção de arte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário