quinta-feira, janeiro 30, 2020

ADORÁVEIS MULHERES (Little Women)

Saudade de quando eu escrevia sobre quase todos os filmes que eu via, não importando se o texto ia ficar bom ou ruim. Hoje em dia, o intervalo entre cada postagem está tão grande que eu chego a achar que desaprendi aquilo que eu julgava ter aprendido. Perde-se o ritmo, a coragem, o tempo e a energia. Mesmo os filmes do Oscar, eu dava um jeitinho de arranjar tempo para falar sobre cada um. É uma temporada que eu costumo apreciar, pois é um momento em que até os cinemas de shopping exibem filmes mais adultos. Na opção de escolher entre alguns dos títulos de que mais gostei nesta temporada de premiações, não posso deixar de dar uma atenção maior para a nossa querida Greta Gerwig, que muito me alegrou recentemente com LADY BIRD – A HORA DE VOAR (2017).

Diferente de seu primeiro filme solo, temos em ADORÁVEIS MULHERES (2019) uma escolha de Greta Gerwig por um estilo mais clássico-narrativo, talvez para se adequar melhor a um romance do século XIX, embora uma coisa não tenha exatamente a ver com a outra. Mas é importante dizer que há, dentro desse registro mais clássico, umas pequenas transgressões, brincadeiras com uso de metalinguagem, com a inteligente fusão da personagem Jo (Saoirse Ronan, como sempre ótima) com a escritora do romance, Louisa May Alcott.

ADORÁVEIS MULHERES não é o filme perfeito que gostaríamos, mas há tanta delicadeza e a personagem de Saoirse é tão querida, que se torna fácil amar a obra de Greta, por mais que a personagem de Emma Watson, Meg, não esteja tão bem. Quem também se destaca dentre as quatro irmãs é Florence Pugh, como Amy, a mais impulsiva da família e a principal rival de Jo, inclusive nas questões amorosas – ela ama o garoto que é apaixonado por Jo, Laurie (Timothée Chalamet). Para completar o quarteto de irmãs, temos a mais jovem Beth (Eliza Scanlen), que é responsável por uma das cenas mais emocionantes do filme. Refiro-me ao momento em que ela agradece a um senhor rico pelo piano que ganha de presente (ela tem uma inclinação musical).

As quatro, aliás, tem inclinações artísticas: Jo é escritora, apesar da dificuldade do mercado literário em aceitar escritos de mulheres; Meg pensa em ser atriz; Amy é pintora e Beth é apaixonada por música. Jo é a mais rebelde, mais feminista. Não aceita o fato de que a mulher daquela época (Estados Unidos da época da Guerra Civil), para não ficar pobre teria apenas duas opções: ou casar com alguém com dinheiro ou montar um bordel. Isso quem afirma é a tia March, vivida por Meryl Streep, que é solteira, mas diz que ela é uma exceção por ser rica.

A rebeldia de Jo e a rejeição dela ao garoto rico Laurie, que ela tem apenas como um bom amigo, são os elementos que mais fervilham nas emoções do filme. Há também a presença de outro rapaz, vivido por Louis Garrel, mas seu personagem é pequeno e parece feito apenas para cumprir um papel. Quanto a Meg, ela, por ser o extremo oposto de Jo, aceita casar com um professor pobre e deixa de lado as pretensões de ser atriz para abraçar uma vida de família e filhos.

Uma das características da narrativa de ADORÁVEIS MULHERES de Greta Gerwig, diferente das versões anteriores, de George Cukor (1933), Mervyn LeRoy (1949) e Gillian Armstrong (1994), está na utilização de duas linhas temporais paralelas, numa montagem que apresenta dois momentos das vidas das personagens. Às vezes, inclusive, é possível se confundir se o que estamos vendo faz parte da linha mais do passado ou mais do presente. É uma novidade em relação às outras versões do livro de Alcott.

Gerwig fecha seu filme com brilhantismo, ao brincar com os clichês de comédias românticas e do que se espera do destino das personagens femininas – morrer ou casar, como diz o editor vivido por Tracy Letts – e a rebeldia de Jo e sua vontade de se entregar à carreira de escritora acima de tudo.

ADORÁVEIS MULHERES foi indicado aos Oscar de filme, atriz (Saoirse Ronan), atriz coadjuvante (Florence Pugh), roteiro adaptado, figurino e trilha sonora original.

+ TRÊS FILMES

JOJO RABBIT

O tipo de humor do diretor Taika Waititi parece estranho a princípio, mas é mais pelo fato de se estar tratando de uma história, inicialmente cômica, lidando com o nazismo, tendo Hitler como um ídolo e amigo imaginário de um menino de 10 anos. Pra mim, o filme se torna mais interessante (e até mais palatável) a partir do encontro com a jovem judia que está escondida em sua casa, e que o deixa balanceado na questão de ser um fanático pelo nazismo e de entender a desumanidade da situação. Indicado aos Oscar de filme, atriz coadjuvante (Scarlett Johansson), roteiro adaptado, figurino, desenho de produção e edição. Ano: 2019.

FORD VS. FERRARI (Ford v Ferrari)

James Mangold é aquele diretor que costuma entregar uns trabalhos bons, mas não costuma passar disso. Eu, pelo menos, não costumo me entusiasmar de verdade com nenhum filme dele. Esse é um dos mais caprichados em termos de produção. Há também o interesse que o tema provoca, ligando a entrada da Ford no ramo de corridas de automóvel na época das 24 Horas de Les Man, uma corrida maluca que dura 24 horas (eu nunca me dei conta deste detalhe até então). Boas performances de Matt Damon e Christian Bale e uma presença luxuosa de um cara como Tracy Letts. Esperava mais cenas de desastre de automóveis, mais caos. Indicados aos Oscar de filme, edição, mixagem de som e edição de som. Ano: 2019.

HISTÓRIA DE UM CASAMENTO (Marriage Story)

Bonito e um tanto doloroso filme de Noah Baumbach sobre separação conjugal. Vemos o incômodo processo de fim de uma relação, sem que os dois realmente estivessem com raiva um do outro. Pelo menos, a princípio, é essa a impressão que fica, embora depois vejamos que há um misto de mágoa com amor, carinho e respeito, mas também de necessidade de ser a si mesmo, especialmente na personagem da Scarlett Johansson. As cenas com os advogados se digladiando e tornando tudo ainda pior para os dois são bem incômodas. E falando em advogado, destaque para uma fala da Laura Dern sobre Deus e a mulher. Sensacional. No mais, Adam Driver tem mostrado cada vez mais sua excelência como ator. Indicados aos Oscar de filme, atriz (Scarlett Johansson), ator (Adam Driver), atriz coadjuvante (Laura Dern), roteiro original, trilha sonora original. Ano: 2019.

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