Há filmes que se constituem em tão boas surpresas que simplesmente lamentamos o fato de que serão obras pouco vistas ou descobertas por uma audiência maior, mesmo uma audiência acostumada a ver bons filmes no cinema ou em casa. É o caso da comédia MADAME (2017), segundo longa-metragem da cineasta francesa Amanda Sthers.
A visibilidade mínima desta obra muito se deve à presença de um belo elenco internacional, que já chama a atenção no próprio cartaz, que traz a australiana Toni Collette, o americano Harvey Keitel e a espanhola Rossy de Palma, cujo rosto expressivo remete a trabalhos de Pedro Almodóvar, embora ela só tenha aparecido em cinco de seus filmes. Como se já não bastasse um trio como esses, há um ótimo elenco de apoio também em MADAME.
A história se passa em Paris, na casa de um casal de americanos que vive em uma pomposa mansão. A matriarca, Anne Fredericks (Toni Collette), prepara um jantar especial para convidados e tem um quadro de Caravaggio para negociar com um dos presentes. Ela não esperava que o filho fosse aparecer e, supersticiosa que é, não quer que na mesa tenham treze pessoas. Assim, ela tem como solução colocar a governanta da casa, uma senhora de modos simples e pouco requintados, Maria (Rossy de Palma), entre os convidados. Para não dar na vista, Maria deve permanecer calada e comer pouco durante o jantar.
Se o filme já começa com uma cena bela de Anne com o marido Bob (Keitel) pedalando pelas ruas de Paris, ele vai se mostrando melhor ainda com os preparativos e com a cena do jantar em si, que é narrada sem pressa e destacando cada pessoa presente na mesa, revelando tanto casos amorosos extraconjugais como o rápido interesse de um homem de negócios pela enigmática Maria. Boas piadas não faltam e é impressionante como o filme não se esforça para que o humor funcione de maneira bem natural.
Por mais que MADAME denuncie as diferenças de classes e o modo como a empregada deve se portar, de acordo com as regras rígidas da patroa, não há uma intenção em tornar a rica dona da casa em uma vilã, mas também uma mulher insegura. Afinal, ela não faz sexo com o marido (bem mais velho que ela) há algum tempo e agora vê a empregada feliz e tendo uma aventura amorosa. Anne dá suas escapadas, mas isso não é o suficiente para que ela se sinta especial dentro daquela situação inesperada. Mesmo a narrativa transitando pelas histórias pessoais dos três personagens principais, é graças a Maria que a trama ganha força e maior interesse.
Para completar, há uma sensibilidade muito especial que a diretora imprime, trazendo dignidade e afetividade para Maria, que, depois de tanto tempo, tem a possibilidade de viver um grande amor, e não apenas ficar trabalhar de doméstica para poder pagar os estudos da filha, que mora na Espanha. Além do mais, o modo como o filme se encerra é também de uma beleza admirável. MADAME certamente não traz inovações no campo formal, mas acerta em tudo que tenciona.
+ TRÊS FILMES
ASSASSINATO NO EXPRESSO DO ORIENTE (Murder on the Orient Express)
Filme bonito de ver, mas maçante pra caramba de asssistir. Eu já não sou muito fã dessa coisa de whodunit, e do jeito que o Branagh fez não me entusiasmou nenhum pouco. Queria saber dos fãs da Agatha Christie. O Branagh, ele curte texto e também curte imagem, mas infelizmente está fora de forma faz muito tempo. Ao menos, ele rendeu um bom Poirot. Direção: Kenneth Branagh. Ano: 2017.
PATTI CAKE$
Filme que quer enganar posando de indie, mas é pior do que muito filme sobre superação e luta produzido com muito dinheiro. Achei fracos os momentos dramáticos, as músicas, o modo como o diretor quer que a gente sinta empatia pelos personagens, e até o senso de humor. Esperava mais. Direção: Geremy Jasper. Ano: 2017.
BONECO DE NEVE (The Snowman)
Não esperava que o filme fosse tão chato e tão desarticulado. Nem a montadora do Scorsese salvou esse aqui. Chega um momento em que eu não quero mais saber quem é o assassino. Só quero que acabe logo. Não sei se foi falha na hora de adaptar ou se o livro já era vagabundo mesmo. Tem cara de ser, não sei. Mas grandes diretores tiram grandes filmes de livros vagabundos, que o diga Hitchcock. Direção: Tomas Alfredson. Ano: 2017.
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