sábado, dezembro 03, 2016

A ECONOMIA DO AMOR (L'Économie du Couple)























O título americano de A ECONOMIA DO AMOR (2016) é "After Love" (depois do amor). Não se refere ao amor significando sexo como em algumas românticas canções de Roberto Carlos, mas ao fim do amor, especialmente quando, a mulher, no caso, depois de algum tempo, passa a não gostar mais do marido, a ficar irritada com qualquer coisa que ele faça. Algo se perdeu, por algum motivo aparentemente desconhecido, nesse relacionamento de 15 anos. O filme, porém, não mostra os motivos e eles não são tão importantes.

O cineasta Joachim Lafosse tem um especial interesse na temática de famílias partidas em sua obra. Foi assim em PROPRIEDADE PRIVADA (2006) e também em PERDER A RAZÃO (2012), dois trabalhos inéditos na cidade. A ECONOMIA DO AMOR, curiosamente, é um filme que conta com uma atriz que já protagonizara um importante filme sobre a questão do divórcio, O PASSADO, do cineasta iraniano Arghar Fahadi. A difícil situação aqui é de outra natureza: tem muito mais a ver com problemas financeiros, embora se perceba que a resistência do marido de sair de vez da relação esteja também no fato de ainda amar a esposa e de não querer se apartar das duas filhas ainda crianças, as gêmeas Jade e Margaux.

A ECONOMIA DO AMOR se passa quase que inteiramente e claustrofobicamente dentro da casa de apenas um piso e poderia muito bem ser confundido com uma adaptação teatral, mas não é. Há um cuidadoso e dinâmico trabalho de câmera e de encenação no interior daquele espaço. Desde o começo, em uma cena na cozinha, esse uso criativo da câmera, torna-nos cúmplices daqueles momentos dolorosos, tensos e de ressentimento por que passa o casal vivido por Bejo e Cédric Kahn, respectivamente Marie e Boris. Alquebrados física, financeira e emocionalmente, eles vivem na mesma casa por não terem dinheiro para morar em casas diferentes.

Boris afirma que não sairá do espaço a não ser que receba o que acredita ser seu de direito: os 50% do valor casa, já que, segundo ele, foi graças à reforma feita por ele, agora um arquiteto desempregado, que a casa se valorizou. Ele também afirma que ele trouxe amor para a casa. E de fato presenciamos momentos extremamente amorosos dele com as crianças. No começo do filme, elas preferem estar com ele que com a mãe, enquanto em outros momentos é o contrário.

O rosto insatisfeito de Marie e a presença pouco bem-vinda de Boris e o atrito que constantemente surge, principalmente quando ele tenta, em vão, uma reaproximação, são tão incômodos que provocam também uma forte tensão do lado de cá da tela. Uma das cenas mais memoráveis dessa situação acontece quando Marie está jantando com um grupo de amigos e Boris chega, gerando uma situação um bocado constrangedora. Este é um dos poucos momentos em que podemos ouvir da própria Marie um desabafo sobre sua perda do amor por Boris.

Mas a melhor e mais tocante cena ainda estaria por vir: Boris havia passado um tempo com as crianças e, quando ele chega, Marie está particularmente mais afável. É quando podemos nos dar ao luxo de ver o lindo sorriso de Bérénice Bejo, que ainda a torna mais bela. A cena em questão, e certamente uma das mais arrebatadoras cenas do ano, é a da dança da família ao som de "Bella", de Maître Gims. É um momento de catarse, que mistura amor, tristeza e até um pouco de alegria, e que ajuda a quebrar um pouco a tensão, mas que também potencializa a amargura.

Lafosse, porém, não cai na armadilha de oferecer uma conclusão convencional, seja feliz ou extremamente trágica, embora situações não faltem para que isso aconteça. O corte seco ao final se assemelha à vida, aos momentos em que é preciso desapegar, antes que mais alguém saia machucado. Mas, mesmo depois de tantos sufocantes momentos por que passamos ao longo da metragem, o sentimento que permanece é de lamento. E, claro, também de gratidão pela obra-prima que acabamos de presenciar.

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