quinta-feira, junho 23, 2016
OS COWBOYS (Les Cowboys)
Uma das grandes surpresas do Festival Varilux de Cinema Francês deste ano foi o pouco badalado OS COWBOYS (2015), estreia de Thomas Bidegain na direção e exibido na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes. O ideal é ver o filme sem saber nada do enredo, mas pra quem se aventura a ler a respeito sem ter visto, eu diria que é uma muito bem dosada mistura de RASTROS DE ÓDIO, o clássico de John Ford, com HOMELAND, a série sobre ataques terroristas do canal americano Showtime.
O filme nos apresenta a uma comunidade que tem um especial carinho pela cultura americana e no início já somos apresentados a uma das festas mais importantes, com várias bandeiras americanas, muita gente cantando e dançando música country e vestidos como se estivessem no velho oeste selvagem. Há quem se vista de xerife, há quem se vista de índio. O filme não demora a mostrar o que será o seu principal eixo dramático: o desaparecimento da filha mais velha de um casal, uma adolescente que teria fugido com um rapaz de origens árabes.
A família está esfacelada, mas o pai (François Damiens) tenta a todo o custo trazer a filha de volta, enfrentando vários obstáculos pelo caminho, já que o rapaz que a teria levado estaria envolvido com grupos extremistas. E trafegar pelos lugares onde ele possa estar é sempre um perigo, tanto para ele quanto para quem tente ajudá-lo.
O passar do tempo na narrativa é muito interessante, com o filme oferecendo sinais da passagem dos anos de maneira muito sutil, a partir de eventos que requerem um pouco mais de observação por parte do espectador, mas nada que seja muito difícil de acompanhar. É apenas uma maneira menos didática de contar uma história, respeitando a inteligência de quem vê o filme.
A semelhança dessa busca do pai pela filha que já pode ter mudado bastante depois de conviver com os islamitas lembra bastante a trajetória de Ethan Edwards no já citado western de Ford. Saem os índios, entram inimigos ainda mais difíceis de serem pegos, já que se sacrificam e se tornam invisíveis.
Um acontecimento inesperado faz com que o filme se divida em duas partes, como um disco que contém um lado A e um lado B. A boa notícia é que, com a saída de cena de um ótimo personagem, a narrativa continua forte, já que muda um pouco mais de aspecto, passando a se confundir com um thriller moderno de espionagem, mas sem perder o foco dramático. Ao contrário, a busca pela garota se torna ainda mais desesperadora, levando em consideração que entra um sentimento maior de desesperança.
Como o personagem de John C. Reilly diz a Georges "Kid" Balland, o rapaz precisa preocupar-se mais consigo mesmo, com conseguir voltar vivo daquela viagem perigosa, do que com a irmã perdida. A natureza amarga daquela situação contamina e pesa sobre o jovem protagonista e sobre todos ao redor. E um reencontro perto do final é de uma sensibilidade tão bonita quanto dolorosa. Sempre muito bom quando nos vemos diante de uma obra assim tão cheia de força, mesmo quando essa força vem da dor da perda.
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