domingo, maio 17, 2015
SEIS CURTAS BRASILEIROS
Aproveitando a Mostra Outros Cinemas, que rolou em Fortaleza esta semana, para escrever um pouco sobre os curtas que pude ver ou rever.
O CLUBE
Este é bem o caso de filme cuja boa aceitação crítica eu não consigo entender. Já tinha visto O CLUBE (2014), de Allan Ribeiro, em uma mostra especial no Dragão do Mar e agora pude rever na Mostra Outros Cinemas. Não melhorou minha impressão, embora tenha o seu grau de interesse no que se refere ao modo como o diretor misturou um roteiro com acontecimentos e falas espontâneos a cargo dos próprios personagens, que interpretam a si mesmos. A história se passa em um clube de transformistas que comemora mais de 50 anos de existência e também mostra a rivalidade existente entre eles/elas. O cineasta, presente ao evento, comentou que até a quantidade de brilho na roupa é levada em conta quando a questão é se sair melhor, fazer a melhor apresentação da noite etc. Embora eu não tenha gostado do filme, percebi muita gente entusiasmada e até dançando na cadeira com a canção final que toca, uma versão em espanhol e dançante de "My way", o que é um indicador que O CLUBE encontrou o seu público, como também encontrou o longa de Ribeiro, ESSE AMOR QUE NOS CONSOME (2012).
SEM CORAÇÃO
Outra revisão, SEM CORAÇÃO (2014), de Nara Normande e Tião, é só mais uma prova de quanto anda bem o cinema pernambucano. Aqui temos uma história que se passa em uma pequena cidade litorânea de Pernambuco que serve de palco para o encontro entre um garoto da cidade grande e uma menina, chamada de “Sem Coração”, por ter uma cicatriz no peito de uma cirurgia do coração que fez. A menina, ao mesmo tempo que convive entre os meninos, é ridicularizada por eles, e vista como alguém que não pode ser encarada como uma namorada séria, já que ela é generosa o bastante para “dar” para todos eles numa espécie de ritual. Ela encontra o amor no menino da cidade. O estilo de direção não é exatamente rigoroso, com uma câmera inquieta e alguns diálogos difíceis de entender, como geralmente acontece quando se trabalha com crianças, mas é um filme bem bonito e tocante.
ESTUDO DE PERSISTÊNCIA
Nada contra selfies pornôs. Ao contrário. O problema é que ESTUDO DE PERSISTÊNCIA (2014), de Krefer, nada mais é do que uma sucessão de imagens rápidas e com flashes dessas fotos. Se um flash já incomoda, imagina centenas deles, ainda que num intervalo de tempo de apenas dois minutos. Assim, procurar uma justificativa para esse trabalho, algo como uma reflexão, por exemplo, chega a soar até forçado.
ENSAIO SOBRE MINHA MÃE
Como deu pra notar no debate, ENSAIO SOBRE MINHA MÃE (2014), de Jocimar Dias Jr., encontrou sim o seu público, com depoimento de alguém que se identificou com a narrativa e com o fato de a protagonista ser também uma idealização de sua mãe. Ou seja, o filme, com várias sequências musicais, e a maior parte das músicas ser de fonte evangélica, acaba agradando a quem embarca nas intenções do jovem cineasta, que utilizou a própria mãe para recriar alguns momentos particularmente dolorosos de sua vida, incluindo a saída do filho de casa e as crises no casamento, passando pelos conflitos religiosos. É uma obra interessante, mas que não chegou a me tocar.
FILME SELVAGEM
Pedro Diógenes, um dos membros mais importantes do grupo Alumbramento, faz aqui uma espécie de manifesto sobre como o cinema deveria ser. FILME SELVAGEM (2014) traz uma sucessão de imagens desfocadas, que servem como pano de fundo para o discurso do próprio cineasta sobre o estado das coisas no que se refere à falta de interesse do grande público por um cinema mais desafiador e uma preguiça lamentável que faz com que esse público procure sempre mais do mesmo. Por outro lado, há também a culpa do sistema, que não oferece espaço para que um outro cinema, mais corajoso, circule. É o caso de filme cujo discurso verbal é mais interessante do que as imagens.
NUA POR DENTRO DO COURO
Estou gostando de ver essa nova geração fazendo cinema fantástico e criando coisas lindas como este NUA POR DENTRO DO COURO (2014, foto), um trabalho bem fácil de deixar os fãs do gênero e de cinema em geral maravilhado. Engraçado que o primeiro filme que eu vi de Lucas Sá foi uma espécie de documentário em que ele viaja até uma cidadezinha do interior para criar uma história adorável de sua família, um filme chamado NO INTERIOR DA MINHA MÃE (2013), curiosamente também exibido na Mostra Outros Cinemas do ano passado. NUA POR DENTRO DO COURO é algo completamente diferente, pelo menos à primeira vista, já que há uma mudança de registro. Temos aqui duas personagens principais: uma garota que usa um olho pintado colado no lugar do que seria seu olho (presume-se que ela seja cega de um olho), vivida pela bela Miriã Possani (de A ÚLTIMA ESTRADA DA PRAIA), e uma mulher com jeitão de bruxa que faz bolinhos e compra também veneno em um supermercado (Gilda Nomacce, de QUANDO EU ERA VIVO). Se o andamento da narrativa é por si só de dar gosto, o desenrolar e o desfecho tornam este curta ainda mais especial, com algo de lovecraftiano misturado com contos de fadas. Aguardemos com atenção o primeiro longa de Lucas Sá, que disse no debate que será protagonizado por Gilda Nomacce.
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