domingo, março 02, 2014

EU TE AMO, EU TE AMO (Je T'Aime, Je T'Aime)



E hoje acordamos com a notícia de que um dos mais importantes cineastas até então vivos havia morrido. Alain Resnais já tinha 91 anos de idade, mas continuava bastante ativo e tem um filme inédito em nosso circuito comercial, AIMER, BOIRE ET CHANTER (2014), e outro inédito em Fortaleza, VOCÊS AINDA NÃO VIRAM NADA! (2012). Quer dizer, estava fazendo filmes como um jovem cineasta, ainda apostando em inovações.

No entanto, hei de confessar que minha relação com o cinema de Resnais não é das mais amorosas, embora conheça menos de 10 filmes do diretor. Costumo dormir em seus filmes, embora reconheça que tratam de questões que me são caras, como a memória e o sonho. Curiosamente, o seu filme que mais aprecio é um documentário em curta-metragem, NOITE E NEBLINA (1955), que retrata os horrores dos campos de concentração nazista. Uma obra que retrata a realidade, mas uma realidade tão absurda que nem parece ser verdade.

Com o objetivo de homenageá-lo, resolvi escolher um filme que fosse me agradar mais. Soube deste EU TE AMO, EU TE AMO (1968), que trata de viagem no tempo, um tema que costuma me agradar quase sempre. Creio que sempre será objeto de meu fascínio. Porém, o filme de viagem no tempo de Resnais é diferente de todo os demais, estabelecendo uma relação bem próxima de outro célebre trabalho seu, O ANO PASSADO EM MARIENBAD (1961), inclusive com o uso fragmentado das imagens e cenas.

Na trama, homem depressivo (Claude Rich) que se recupera de uma tentativa de suicídio é convidado a fazer parte de um experimento inédito envolvendo uma viagem no tempo, no caso, a seu passado. Como conhecemos pouco ou quase nada da história desse homem, ficamos tentando juntar o quebra-cabeças de imagens aleatórias que nos são apresentadas, que vão desde o momento em que ele é enviado, saindo do mar, e falando com a namorada, até o momento em que chega ao laboratório para ingressar na máquina do tempo.

O resultado é mais incômodo do que fascinante ou empolgante, embora alguns momentos apareçam mais como sonhos do que como memórias, como a cena em que uma garota bonita pede para que ele a ensaboe em uma banheira, elemento surrealista destacado dentro de uma narrativa já bem pouco comum.

Como as memórias costumam ser embaralhadas mesmo e muitas vezes são reconstruídas na mente para que ganhem mais concretude, elas não são tão diferentes assim dos sonhos. O interessante de EU TE AMO, EU TE AMO é que Resnais prefere deixar essas memórias de maneira esparsa, seja com repetição ou com falhas. Em alguns momentos, porém, conseguimos preencher algumas lacunas, como o fato de o protagonista ter se tornado depressivo e, posteriormente, tentado o suicídio.

Além do mais, como a grande maioria dos filmes franceses que falam de amor, EU TE AMO, EU TE AMO trata o sentimento de maneira racional, ficando até difícil dizer que se trata de uma história de amor. Senti falta de mais cenas com a bela Olga Georges-Picot. Alguns momentos seus são bem poéticos, como quando ela diz que Deus criou o gato à sua imagem e semelhança. E depois criou o homem para ser escravo do gato. Não é uma ideia tão original (já ouvi isso antes), mas é gostoso de ouvir na voz dela. Um alento numa obra que se caracteriza por deixar o espectador cada vez mais desconfortável e angustiado.

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