sexta-feira, maio 20, 2011

YOU MUST REMEMBER THIS – A HISTÓRIA DA WARNER BROS. (You Must Remember This – The Warner Bros. Story)



Richard Schickel é crítico veterano da revista Time e autor de três livros que me pareceram bem interessantes: um sobre Clint Eastwood, intitulado "Clint: A Retrospective", outro chamado "Conversations with Martin Scorsese" e um que saiu naquela famosa lista dos cinco favoritos de Woody Allen, "Elia Kazan: A Biography". Na falta, pelo menos por enquanto, destes livros, resolvi finalmente assistir a este documentário que celebra os 85 anos de um dos estúdios mais importantes de Hollywood.

YOU MUST REMEMBER THIS – A HISTÓRIA DA WARNER BROS. (2008) tem esse caráter promocional, afinal, não deixa de ser uma propaganda do estúdio. Mas, por outro lado, se hoje em dia, a Warner já não tem algo que a distinga das demais companhias, quando começou, tinha uma característica forte e foi muito importante para a liberdade de expressão no cinema americano, tendo forte influência como apoio nas vozes daquelas pessoas marginalizadas pela sociedade, como os mais pobres e que sofriam com a Grande Depressão e até mesmo os gângsters.

É por isso que quando se fala em Warner, lembra-se rapidamente de filmes como ALMA NO LODO, INIMIGO PÚBLICO e FÚRIA SANGUINÁRIA, que elevaram o status de atores como Edward G. Robinson e James Cagney à categoria de lenda. O documentário, dividido em cinco segmentos destacados cronologicamente, apresenta um pouco da história por trás dos filmes, desde o começo, com os irmãos Warner, passando pelo período em que o estúdio passou para outras mãos.

A primeira estrela do estúdio foi um cachorro: Rin Tim Tim, que fazia muito sucesso na década de 1920, em filmes seriados para o público juvenil. O estúdio foi ficando importante com a contratação de John Barrymore, ganhou prestígio ao trazer Ernst Lubistch e ao fazer a primeira experiência com som com O CANTOR DE JAZZ, que podia não ser lá essas coisas, mas a novidade do som gerou uma bilheteria gigante, ainda que nem todas as salas dos Estados Unidos estivessem equipadas com o novo aparelho. O estúdio também teve a coragem de produzir uma superprodução que naufragou nas bilheterias, A ARCA DE NOÉ.

Uma forte característica da Warner nos anos 1930 eram os diálogos crus, anteriores ao Código Hayes, que depois veio para acabar com a festa e proibir uma série de coisas. Enquanto isso, temas como mulheres que se vendiam, drogas sendo usadas e até um filme em que o pai é cafetão da filha eram usados. A Warner também foi o primeiro estúdio a reconhecer que os Estados Unidos estavam à beira de uma revolução, ao mostrar a onda de protestos que varriam o país naquela época.

Até mesmo os musicais da Warner tinham o seu diferencial em relação aos da concorrente MGM. Havia uma beleza de orquestrações e do visual, das tomadas, dos efeitos de câmera. Exemplo maior desse tipo de musical é RUA 42. Havia também a rainha da época, Bette Davis, bela e selvagem, mas que com o tempo foi se tornando menos bela. A CARTA tem uma cena forte de Bette atirando, que até hoje é marcante.

A Warner também foi pioneira a lidar com temas como o antisemitismo, questões sociais, como a luta interna e a Ku Klux-klan. Fez o primeiro filme antinazista, CONFISSÕES DE UM ESPIÃO NAZISTA, com Edward G. Robinson. E com esse filme eles sabiam que podiam estar perdendo boa parte dos ganhos no mercado europeu, já dominado pelo avanço do nazismo. E quando a guerra chegou, filmes como ÁGUIAS AMERICANAS e SARGENTO YORK, de Howard Hawks, foram importantes não só pela qualidade, mas por levar a guerra para o público. ÁGUIAS AMERICANAS, em especial, eu considero um marco. Aquelas cenas de batalhas aéreas são simplesmente fantásticas.

E quem nunca ouviu falar em CASABLANCA, hein? O título do documentário é retirado da canção-tema do filme. Que infelizmente eu ainda não aprendi a gostar. Mas prometo que vou dar mais uma chance ao filme, de preferência pegando alguma cópia em alta resolução para melhor apreciá-lo. Mas é interessante ver o amargo das interpretações de Humphrey Bogart, que marcou presença na Warner também em obras fortes como SEU ÚLTIMO REFÚGIO, de Raoul Walsh, em pelo menos dois filmes de Howard Hawks, UMA AVENTURA NA MARTINICA e À BEIRA DO ABISMO, e em mais uma série de outros trabalhos, como o brilhante O TESOURO DE SIERRA MADRE.

No ciclo noir a rainha da Warner passou a ser Joan Crawford, com filmes como ALMAS EM SUPLÍCIO, OS DESGRAÇADOS NÃO CHORAM e ACORDES DO CORAÇÃO. Eram anos sombrios os da década de 1940. Mesmo com o filme da guerra, veio o macarthismo, pronto para despachar para a Rússia os cineastas e roteiristas simpatizantes do comunismo. A Warner não teve outra alternativa a não ser aderir ao macarthismo.

Engraçado que vendo o documentário foi que eu soube de onde veio o "Stelaaa", que a Elaine da série SEINFELD grita num episódio engraçadíssimo. Deve ter sido uma homenagem a Marlon Brando e Vivien Leigh em UM BONDE CHAMADO DESEJO, filme que teve forte repercussão por causa da sensualidade, poucas vezes vista no cinema, até então.

Os anos 1950 trouxeram os musicais coloridos com Doris Day, a chegada da tv que veio junto com o fechamento de várias salas de cinema, a busca por uma alternativa com o 3D, a chegada da ficção científica nuclear, os desenhos do Pernalonga, o advento do cinemascope, com o estúdio se antecipando com O CÁLICE SAGRADO e trazendo, segundo Scorsese, o filme com a melhor utilização do scope, VIDAS AMARGAS, de Elia Kazan, além de James Dean em obras inesquecíveis como JUVENTUDE TRANSVIADA, de Nicholas Ray, e ASSIM CAMINHA A HUMANIDADE, de George Stevens. Foi também a era dos autores: John Ford (RASTROS DE ÓDIO), Howard Hawks (ONDE COMEÇA O INFERNO), Alfred Hitchcock (PACTO SINISTRO, O HOMEM ERRADO), entre outros.

A violência, marca da companhia na década de 1930, voltaria com força com a nova Hollywood: BONNIE & CLYDE (nunca deixo de me impressionar com a violenta saraivada de balas no final do filme), MEU ÓDIO SERÁ TUA HERANÇA, PERSEGUIDOR IMPLACÁVEL, QUANDO OS HOMENS SÃO HOMENS, LARANJA MECÂNICA, AMARGO PESADELO, CAMINHOS PERIGOSOS, passando pelo território do horror com o incrível sucesso de bilheteria de O EXORCISTA, no começo da década de 1970.

A Warner começou a perder um pouco de sua aura e de seu diferencial ao aderir ao gênero mais pop, como em SUPERMAN – O FILME e, mais recentemente, a série "Harry Potter". Depois de STAR WARS, o cinema não teve muitas alternativas a não ser a aderir à fórmula mais juvenil, com filmes baseados em quadrinhos, como os da série "Batman", que até hoje rende bastante. Ainda que se destaque obras importantes como OS IMPERDOÁVEIS, OS BONS COMPANHEIROS, DE OLHOS BEM FECHADOS, SOBRE MENINOS E LOBOS, entre outros das últimas duas décadas, o estúdio, nesses anos que coincidiram com o início de minha cinefilia, não se diferenciou tanto, por exemplo, da Fox, da Universal, da Columbia ou da Paramount. Mas não deixa de ser curioso ver um documentário assim extenso e que valoriza a história marcante do estúdio.

O documentário é narrado por Clint Eastwood e conta com comentários muito bem-vindos de Martin Scorsese.

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