terça-feira, novembro 02, 2010

A SUPREMA FELICIDADE



Acho que até entendo a rejeição que A SUPREMA FELICIDADE (2010) está tendo por parte do público e de boa parte da crítica. Arnaldo Jabor, principalmente depois que deixou de ser cineasta para ser comentarista político e colunista de jornal, ganhou a antipatia de muitos. Mas não é por causa disso que eu acredito que venha a falta de empatia do filme com o público mais jovem. O público mais idoso, imagino eu, talvez até tenha apreciado essa obra irregular, mas feita com o coração, pois trata-se de um filme cheio de saudosismo e no fim vemos que é uma bela homenagem a seu avô, aqui vivido por Marco Nanini. O problema é que o cinema que se faz hoje é mais naturalista, não dando muito espaço para esses arroubos poéticos e o tipo de dramaturgia que se fazia até os anos 80, que para muitos parece mal feita ou teatral.

O protagonista é Paulo, vivido por diversos atores durante várias fases da vida: da infância, vendo o seu pai (Dan Stubach) chegando da guerra; passando pela adolescência (Michel Joelsas), quando questiona a doutrina cristã do livre arbítrio e da onisciência divina; até chegar aos 19 anos (Jayme Matarazzo), quando se vê apaixonado por uma bela garota que faz striptease num inferninho. E por mais que eu saiba que o filme não é exatamente uma biografia da vida do cineasta, só de saber que é baseada em fatos de sua vida e de sua família já me senti mais próximo.

Seria o AMARCORD de Jabor. Até a fumacinha que aparece no filme de Fellini, representativa dos sonhos e das memórias, comparece também em A SUPREMA FELICIDADE. E assim como a aclamada obra de Fellini, o filme de Jabor não se preocupa muito com coesão. As idas e vindas no tempo e os vários episódios são mostrados com carinho. Alguns personagens devem ter mesmo saído da infância do cineasta, como o homem que compra livros e revistas usadas (Emiliano Queiroz) e o pipoqueiro da esquina (João Miguel). Aliás, são de João Miguel alguns dos momentos mais divertidos do filme, com as brincadeiras de duplo sentido, que fazem a alegria da turma.

Claro que há sequências que poderiam ter sido cortadas da edição final, mas eu nem saberia dizer quais. O fato é que alguns momentos foram capazes de fazer os meus olhos brilharem, como a cena dos pais de Paulo comentando sobre O MORRO DOS VENTOS UIVANTES, de William Wyler, que estava em cartaz na época. A cena é carregada de força, tanto pelo poder ultra-romântico do filme quanto pelo fato de os dois estarem totalmente encantados um pelo outro.

A relação de Paulo com o pai, mesmo quando este está decadente e alcoólatra, é bonita. Vê-lo perguntando ao pai como ele conheceu a sua mãe é algo belo de ver, assim como sua relação de carinho com o avô, que é o exemplo perfeito de pessoa que sabe viver a vida. E é engraçado quando ele, ao falar de amor para o jovem Paulo, diz apenas, em vez da normalmente esperada verborragia dos filmes de Jabor, "o amor é foda".

P.S.: Deixo aqui para quem ainda não conhece um link para a crônica que eu mais gosto de Jabor, "Amor, sexo e um outro sentimento", publicada no Estadão e contida no livro "Pornopolítica".

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