terça-feira, junho 30, 2009
LOUCA PAIXÃO (Turks Fruit)
O que aconteceria se Paul Verhoeven, o "o holandês maluco", filmasse uma história de amor? O resultado pode ser conferido em LOUCA PAIXÃO (1973), um dos melhores trabalhos da fase holandesa do cineasta. Quem está acostumado com o cinema de Verhoeven, repleto de sexo, sangue e violência, pode prever o que seria um romance com a sua marca. Em seu filme, os momentos de ternura tangenciam a escatologia. O casal vivido por Rutger Hauer e a bela ruivinha Monique van de Van desde o momento em que se conhecem passam por situações que o diretor não tem o menor pudor em tornar explícitas. Ela dá carona a ele, os dois batem o carro. Antes disso, ele passa por uma situação embaraçosa, quando prende o pênis no zíper e sai em busca de um alicate numa casa próxima. No dia do casamento dos dois, uma mulher grávida, que também está no grupo dos vários que vão se casar, sente dores e, pelo sangue no vestido branco, parece estar perdendo uma criança. Em outra sequência, a ruiva chora no banheiro, achando que suas fezes vermelhas são sinal de que está com uma doença grave. Ele examina as fezes com as mãos, as cheira e vê que é resultado da alimentação com beterraba. Tudo isso, que pode parecer nojento, é mostrado até com certa ternura. Mas uma ternura à maneira de Verhoeven, não havendo espaço para lágrimas ou algo do tipo. O que não significa que a paixão que ele nutre por ela não seja verdadeira. Na verdade, sentimos um pouco de sua dor no momento em que ela o trai, numa cena com os familiares dela reunidos numa mesa, rindo de forma escarnecedora. A cena mais parece um pesadelo.
Monique van de Ven se destaca como uma das mais belas musas dos filmes de Verhoeven. E isso não é pouco, levando em consideração as inúmeras beldades que abrilhantaram os trabalhos do diretor. É que ela tem uma aura de doçura que a destaca. Consta que a moça se casou com o diretor de fotografia do filme, Jan de Bont, em 1973. Não sei se eles se conheceram antes ou durante as filmagens. O fato é que era sua estreia no cinema e seu nome já se destacava mais do que o nome de Rutger Hauer. Os dois repetiriam a parceria no trabalho seguinte de Verhoeven, O AMANTE DE KATHY TIPPEL (1975). A maneira como ela é apresentada no filme é um verdadeiro sonho para aqueles que gostam de fantasiar. Sem muita cerimônia, o sujeito faz um elogio ao seu cabelo e pergunta se embaixo é vermelho também. Isso normalmente seria visto como uma ofensa, um ultraje, em algum filme americano. Mas na Holanda as coisas devem ser bem diferentes, a julgar pelos filmes de Verhoeven. A moralidade é outra e o cineasta faz questão de colocar os personagens nus ou fazendo sexo em lugares públicos ou de modo a ofender a instituição familiar, praticamente negada ou desrespeitada em toda a obra de Verhoeven.
Um ponto bem positivo em LOUCA PAIXÃO é a forma como o filme nos surpreende, através da técnica de criar falsas expectativas, dado o prólogo violento e que parece prenunciar uma história de ódio e vingança, ao mostrar o personagem de Hauer de maneira pouco simpática e até de natureza aparentemente sociopata. Rutger Hauer interpreta um artista plástico sem nenhum problema de autoestima. Para ele, é fácil levar qualquer mulher para a cama. Seu personagem vai ganhando a simpatia do público aos poucos. No início, há um certo distanciamento. A empatia com o público chega com a dor de cotovelo e chega próximo da compaixão no ato final, tão lírico quanto Verhoeven é capaz de ser. Vai ver, no fundo, o cineasta, nascido sob o signo de câncer, é um grande romântico que se recusa a demonstrar. Prefere levar a fama de cínico e rude.
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