segunda-feira, março 23, 2009
GRAN TORINO
Muitos andam comparando GRAN TORINO (2008) com os filmes da cinessérie "Dirty Harry". Walt Kowalski seria uma versão mais velha e mais ranzinza do Detetive Harry Callahan. Só que Clint Eastwood, o diretor, possui algo que o distingue de sua persona como ator. E é dessa dicotomia que surge um dos mais interessantes personagens da carreira de Clint Eastwood. Temos um misto daquela autoconfiança que todo homem quer ter e que é típico dos personagens protagonizados pelo ator ao longo dos anos – desde a sua parceria com Sergio Leone – com a fragilidade que seus personagens também possuem. Inclusive, a figura do homem doente e que serve como mestre para um jovem já havia sido mostrada em HONKYTONK MAN (1982), enquanto que a questão da dificuldade de se relacionar com um ente da família já havia sido vista em MENINA DE OURO (2004), que também trata da relação mestre/discípulo.
O sacrifício é outro elemento presente na obra do diretor. E nada mais representativo do sacrifício do que o cristianismo - mais especificamente o catolicismo, no caso da obra de Clint. Assim como o treinador Frankie Dunn encontrava-se regularmente com um padre, mas não conseguia ter uma relação de maior proximidade com a religião por conta de traumas do passado, assim também o velho Walt Kowalski, veterano da Guerra da Coréia e que mantém uma bandeira dos Estados Unidos na varanda de sua casa, vive uma vida amarga, fruto de ações que ele realizou no passado e que o atormentam até os últimos dias de sua vida. Mas comparando os dois personagens, eu ainda diria que ao menos Kowalski atingiu uma redenção no final, enquanto Frankie Dunn, depois de ter realizado o difícil e doloroso ato final, só pode ter encontrado ainda mais amargura em sua vida.
E amargura é outra palavra constante na obra de Eastwood. No recente A TROCA (2008) pudemos ver a figura da mãe que espera a vida toda pelo filho desaparecido. Imagina só a dor que deve ser isso. Mas nem só de dor vive o cinema de Clint Eastwood. Há muito humor em GRAN TORINO. A primeira metade do filme é cheia de momentos engraçados, frutos da rabugice de Kowalski e de sua relação com a família de asiáticos que ele, xenófobo e preconceituoso, tem de aturar. Aos poucos, ele nota, principalmente a partir do primeiro contato que tem com a jovem e simpática Sue, que ele tem mais identificação com aquele povo vindo do outro lado mundo do que com sua própria família.
Quem percebe as reações de descaso e desrespeito que os mais jovens têm com relação aos mais velhos hoje em dia pode facilmente entender a desaprovação explícita de Kowalski. Não é difícil antipatizar com os meninos que não respeitam nem mesmo o dia do velório da esposa de Kowalski, que acontece logo no início do filme. E por mais que se perceba inúmeras falhas na personalidade do velho ranzinza, não há como não amar o personagem. Principalmente quem cresceu aprendendo a admirar o heroísmo e até mesmo o cinismo dos personagens de Clint Eastwood. Por isso, nenhum outro ator, por melhor que fosse, conseguiria atingir a audiência da mesma forma e com tanta classe. E ao nos colocarmos no lugar do jovem Thao, sentimos uma espécie de orgulho de estarmos aprendendo algo de valor e numa relação próxima da de pai e filho. Como havia se formado também em UM MUNDO PERFEITO (1993) e nos já citados HONKYTONK MAN e MENINA DE OURO. E a generosidade e a vontade de proteger à sua maneira aqueles que precisam são aspectos da personalidade de Kowalski que ficam evidentes e que fazem com que sintamos por ele um forte sentimento de amor e respeito.
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