quarta-feira, outubro 01, 2008
OS DESAFINADOS
Uma pena que um cineasta tão importante quanto Walter Lima Jr., com um passado glorioso e uma filmografia por vezes brilhante, tenha retornado com um filme tão cheio de falhas como OS DESAFINADOS (2008). Depois de ter feito dois belos e estranhos trabalhos nos anos 90 – O MONGE E A FILHA DO CARRASCO (1994) e A OSTRA E O VENTO (1997) – o cineasta ficou um pouco perdido na virada do século, tendo se aventurado com uma não muito bem sucedida co-produção com a Itália no drama UM CRIME NOBRE (2001). Esse longo hiato talvez não tenha feito muito bem para Lima Jr., que parece ter perdido a mão nesse novo trabalho. Não me refiro ao estilo de dramaturgia pré-retomada, coisa que até me agrada, passa um ar de agradável anacronismo, mas a diversos pontos e escolhas tomadas pelo diretor.
Tento não me incomodar com dublagens, mas às vezes isso chega a incomodar a apreciação de um filme. Ouvir, por exemplo, a voz de Selton Mello dublando seu personagem maduro não deixa de ser muito estranho. E não gostei da opção de substituição da voz original de Cláudia Abreu pela voz da filha do diretor nas cenas cantadas. Tudo bem que Claudiinha não é uma cantora profissional e talvez não tenha mesmo técnica suficiente para ser a cantora no filme, mas eu achei tão bonito vê-la cantando "Como é grande o meu amor por você", de Roberto e Erasmo Carlos, em O CAMINHO DAS NUVENS que lamentei o fato de não poder ouví-la cantar novamente. Mesmo assim, é graças à personagem dela e ao personagem de Rodrigo Santoro que o filme se sustenta em alguns momentos. Não é difícil entender o coração de Joaquim (Santoro), dividido entre sua esposa vivendo no Brasil (Alessandra Negrini) e a jovem cantora aventureira com passagem nos Estados Unidos (Cláudia Abreu). Não apenas porque as duas atrizes são de uma beleza fantástica, mas porque Santoro desempenha essa divisão e essa paixão por Glória (Cláudia Abreu) de forma tão convincente quanto tocante. Quem já teve o coração dividido sabe o quanto é duro lidar com esse sentimento cruel e que é sintetizada na frase em que Joaquim diz, com olhos marejados, ao seu colega Davi (Ângelo Paes Leme): "Eu amo a Luiza (Negrini), mas estou apaixonado por Glória".
Outra fraqueza do filme está nas seqüências que mostram os personagens no presente. Já citei aqui o problema da dublagem na voz do personagem mais velho de Selton Mello, mas todas essas cenas passadas no presente bem que poderiam ser totalmente excluídas do filme. Não só não fariam falta como tornariam o trabalho mais redondo e bonito. Só bastaria arranjar um final, mas aí qualquer bom roteirista encontraria um meio para solucionar esse problema. Mas como não sou eu o dono do filme, e se Walter Lima Jr. preferiu optar pela nostalgia, apesar dos sérios problemas políticos da época, é responsabilidade dele tornar esse sentimento próximo do palpável para o público. Agora aquele final ridículo, nem toda a versatilidade e técnica de Santoro conseguiram dar uma melhorada nessa seqüência, que foi motivo de riso na sessão em que estive. Para o bem do filme, é melhor deletar essas cenas e as demais do presente da memória e nos lembrarmos apenas da estória de amor de Joaquim e Glória, que em alguns momentos, principalmente na seqüência em que eles se encontram pela primeira vez num lugar arborizado e agradável, chega a lembrar alguns filmes franceses da Nouvelle Vague. Curiosamente, o filme não deixa espaço para Selton Mello roubar a cena, como normalmente acontece. Por mais que o personagem dele fosse o mais próximo do que seria um elo de identificação com os cinéfilos, pelo fato de ele ser um aspirante a cineasta, citando Antonioni e Rossellini de vez em quando, o modo como ele é mostrado no filme é caricato demais para convencer.
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