terça-feira, fevereiro 26, 2008

A VIDA DOS OUTROS (Das Leben der Anderen)



Há pelo menos duas semelhanças entre este A VIDA DOS OUTROS (2006), de Florian Henckel von Donnersmarck, e a obra-prima 4 MESES, 3 SEMANAS E 2 DIAS: ambos ganharam prêmios cobiçados. Enquanto o filme romeno ganhou a Palma de Ouro em Cannes esse ano, o alemão A VIDA DOS OUTROS foi o vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro do ano passado. Demorou um ano pra eu ver esse filme no cinema. Espero que não aconteça o mesmo com o vencedor desse ano, o austríaco OS FALSÁRIOS, que pelo menos já tem título em português. Se bem que já faz tempo que eu não tenho ligado muito pra esses concorrentes ao Oscar de filme estrangeiro, mas houve uma época, nos anos 90, em que as distribuidoras tinham mais interesse em colocar no mercado de cinema todos os indicados a essa categoria e as indicações eram chamarizes para o público. Agora Oscar não é mais algo que atraia a atenção de pessoas que já não sejam interessadas em cinema. Está perdendo o valor para o público em geral. E o fato de esse ano não ter nenhum filme realmente popular contribui muito para isso. A outra (e principal) semelhança entre A VIDA DOS OUTROS e 4 MESES... é que ambos os filmes mostram um cenário tenebroso nos anos 80, quando os respectivos países faziam parte do bloco comunista.

A VIDA DOS OUTROS mostra a então chamada República Democrática da Alemanha em sua caça às bruxas, aos rebeldes, àqueles que se voltavam contra o sistema. Para isso, o Governo se equipava até mesmo de escultas nos lares de quem era suspeito, em especial os artistas, que eram constantemente policiados e sem permissão de criticar o regime. E é na vida de um casal formado por um dramaturgo (Sebastian Koch, protagonista de A ESPIÃ, de Paul Verhoeven) e uma atriz de teatro (a bela Martina Gedeck) que o filme se desenvolve. O casal é vigiado por um membro ativo do regime, defensor de métodos de tortura objetivando arrancar respostas dos suspeitos para colocá-los numa lista negra, impedindo-os de desempenhar suas profissões. Algo parecido com o que os Estados Unidos faziam na época do macarthismo. Acontece que esse homem, como um espectador de um programa Big Brother, que não respeita nem mesmo os momentos de intimidade do casal, passa a torcer por eles, a sentir um certo carinho por eles e por seus amigos "revolucionários". E assim ele acaba entrando num grande dilema.

Mesmo longe de ser tão bom quanto o premiado filme romeno, A VIDA DOS OUTROS tem o seu valor como retrato de uma época de privação da liberdade, coisa que o Brasil também conheceu muito bem, durante os duros anos de ditadura militar. Além do mais, o filme oferece-nos também o ponto de vista dos vigias, talvez mais até do que dos vigiados. O ator que faz o "vigia" (Ulrich Mühe), inclusive, é um dos destaques do filme, oferecendo riqueza de interpretação ao personagem, que passa de cruel torturador e entusiasta da causa comunista a uma espécie de sub-Schindler, em seu esforço de tentar ocultar as provas do casal. Também gostei muito do desempenho de Martina Gedeck, que brilhou durante o filme inteiro, mas teve que fazer aquela seqüência ingrata no final, que quase deixa A VIDA DOS OUTROS numa espécie de vala comum de tragédias medíocres. Ainda assim, apesar do final "meia-boca", o belo epílogo, mostrado anos depois, quando a Alemanha já está unificada, ajuda a salvar o filme.

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