sexta-feira, novembro 18, 2005
A VIDA MARINHA COM STEVE ZISSOU (The Life Aquatic with Steve Zissou)
Existem filmes que são tão pessoais que fica até difícil de se fazer uma análise a respeito sem precisar de fazer algumas pesquisas antes. E chega a ser quase um milagre esses filmes personalíssimos conseguirem quem os banque dentro de Hollywood. Por mais que não se goste dos filmes de Wes Anderson, há que se elogiar a sua capacidade de fazer o que bem entende no cinema americano. E com o apoio de uma turma de amigos famosos que estão sempre por perto. Alguns deles estão de volta nesse A VIDA MARINHA COM STEVE ZISSOU (2004): Bill Murray, Owen Wilson e Angelica Huston são autênticos atores "andersonianos", sentindo-se em casa para construir aqueles personagens meio caricatos, meio bobalhões, que a gente já está acostumado a ver. Aliás, acostumado em termos, já que a estranheza vai estar sempre no ar nos filmes de Anderson. Mas quem já viu os outros três filmes dele - PURA ADRENALINA (1998), TRÊS É DEMAIS (1999) e OS EXCÊNTRICOS TENEBAUMS (2001) - já pode ficar um pouco mais à vontade vendo esse novo trabalho.
Ainda assim, pelo fato de ser um trabalho muito pessoal e cheio de piadas internas, ainda assim, é um pouco difícil de se absorver o filme, suas intenções, seu humor, suas idéias. O que não nos impede de nos deliciarmos com os belíssimos quadros que Anderson constrói e nos oferece para o prazer de nossos olhos. Ele transforma a tela numa espécie de pintura em cinemascope. As pessoas e os objetos estão no quadro com um senso de simetria tão bem formulado que os atores ficam parecendo bonecos à disposição de uma criança que leva jeito de artista.
E "criança" talvez seja uma das palavras chave do filme, já que uma de suas últimas cenas, com Steve Zissou (Bill Murray) colocando um menino nos ombros e sendo seguido pelos amigos como se dissesse "sigam-me os bons!" é uma das mais belas do filme. Também parece brincadeira de criança as cenas de tiroteio com balas de festim. Seus personagens, principalmente os homens, também agem como crianças em corpo de adulto. As mulheres, "pra variar", são mais maduras. No filme, há duas mulheres bem fortes: Cate Blanchett, como a jornalista grávida que balança o coração de Steve e de Ned (Owen Wilson), e Angelica Huston, como a matriarca Zissou e verdadeira mente por trás do sucesso do aventureiro-cineasta.
Um dos destaques do filme é, sem dúvida, a participação de Seu Jorge cantando versões em português de canções de David Bowie. Acho que eu gosto mais dessas versões em violão cantadas pelo Seu Jorge do que as versões originais. Tanto que, depois do filme, eu fui resgatar o meu disco do Bowie pra ouvir e acabei não curtindo tanto assim. É como se as canções dele fossem ótimas pra ouvir, mas nem sempre boas pra se cantar junto. E eu também não curto muito aquela voz meio glitter dele. Mas reconheço a beleza de suas composições. Inclusive, no filme, tem uma cena que eu acho fantástica, que é quando Bill Murray pede licença de uma conversa que está tendo com Blanchett para respirar um pouco de ar puro lá no ponto alto da proa do navio e ouvimos um trecho de uma canção do Bowie. È como se ele estivesse prestes a desmoronar e por isso pede licença para "suspender o tempo" e recarregar as baterias para enfrentar de novo a dura batalha da vida.
Pena que eu tive de ver esse filme em DVD, já que ele não passou nos cinemas daqui, lugar onde o filme deveria ser visto, preferencialmente. Ao menos, o DVD está muito bom e vem com comentários em áudio do diretor.
Para o próximo ano, Anderson estará de volta com THE FANTASTIC MR. FOX, baseado num livro de Roald Dahl, mesmo autor de "A Fantástica Fábrica de Chocolate". Ainda não foi divulgado o elenco.