terça-feira, novembro 16, 2004

MÁ EDUCAÇÃO (La Mala Educación)



O fim de semana prolongado foi bem legal. Muita diversão em Canoa Quebrada com uma turma de dar gosto. Mas, assim como aconteceu quando eu voltei de Brasília, bastou eu chegar em casa pro meu corpo adoecer. Até o cinema, que eu estava programando ir, não aconteceu. Preferi ficar em casa dormindo ou vendo o dvd de DRÁCULA, de Tod Browning, que a Érika me emprestou. (Ela também me emprestou o maravilhoso livro UM FILME É UM FILME, com textos antológicos de José Lino Grünewald, sobre o cinema dos anos 60.) Canoa Quebrada está bem diferente de quando eu passei por lá há mais de cinco anos. Entre as casas de forró (que eu passo longe) e as boates que tocam música vulgar (não sei porque me vem à cabeça esse adjetivo), encontramos um bar bem legal que toca rock e que tem boa movimentação de gente bonita. Encerrávamos as noites de farra na barraca Freedom, onde acontecia o Luau (sem lua, dessa vez), ao som de reggae. Até eu, que não morro de amores pelo ritmo jamaicano, me senti contagiado com o balançar da barraca (literalmente), causado pela dança de quem estava presente. Mas legal mesmo era o ambiente na casa onde estávamos. Não dá pra esquecer do agradável papo com o Rafael, a Èrika, o Murilo (também conhecido como "muro pequeno" ou "grunhido de rato"), Igor e Valéria - afinal, "Tente Outra Vez", de Raul Seixas e Paulo Coelho, é ou não uma canção dotada de ironia?-; ou da tentativa de se jogar Perfil com álcool na cabeça; ou da primeira refeição: pão com ovo e cachaça. Pena que não deu pra ir mais gente, mas, de qualquer maneira, foi mais um evento bem sucedido organizado pela promoter Valéria Pinheiro. Mas vamos ao filme do Almodóvar.

MÁ EDUCAÇÃO (2004), de Pedro Almodóvar, é filme para se analisar os prós e contras. Apesar de não ter ficado totalmente satisfeito com o filme como um todo, cada vez que lembro das cenas geniais, percebo que até quando Almodóvar erra, ele acerta. Mesmo os filmes mais fracos desse brilhante autor não deixam de ser imperdíveis.

Assim que o filme começou, já fiquei entusiasmado com os créditos de abertura, que lembram PSICOSE, do Hitchcock, especialmente pela música de Alberto Iglesias, homenageando Bernard Herrmann. As primeiras imagens do filme são igualmente interessantes, quando vemos pela primeira vez a bela fotografia de José Luis Alcaine, colaborador de Almodóvar em ATÁ-ME (1990) e MULHERES À BEIRA DE UM ATAQUE DE NERVOS (1988), que, ao gosto do autor, sempre tem que destacar as cores quentes, especialmente o vermelho. Interessante também o uso do leve estreitamento da tela nas cenas de flashback.

Pena que o ritmo do filme vai ficando irregular a partir do momento em que a história vai se revelando um suspense, gênero que Almodóvar já tinha experimentado antes com MATADOR (1986). Mas o filme que MÁ EDUCAÇÃO mais faz lembrar é mesmo A LEI DO DESEJO (1987), por causa do homossexualismo mais forte. Claro que gay tem em quase todo filme do diretor, mas nesses dois filmes, esse tema está presente até na câmera, como, por exemplo, na cena em que Fele Martínez está na piscina e olha para certas partes do corpo de Gael García Bernal. Não se trata apenas dos travestis engraçados da maioria de seus filmes, ainda que tanto Gael quanto Javier Cámara apareçam travestidos numa cena até engraçada, mas que não dá o tom geral do filme, mais sério.

Almodóvar, a partir de A FLOR DO MEU SEGREDO (1995), tem preferido adotar mais seriedade, assumindo o melodrama definitivamente. Ele também tem evitado chocar as audiências, como fazia nos tempos de A LEI DO DESEJO. Assim como ele preferiu (sabiamente) não mostrar o enfermeiro interpretado por Javier Cámara fazendo sexo com uma garota em estado de coma na obra-prima FALE COM ELA (2002), nesse novo filme, ele evita mostrar os abusos que o garotinho sofre de um padre na escola, ainda que isso fique mais do que evidente. Não sei dizer se essa escolha, no caso de MÁ EDUCAÇÃO, foi acertada, já que a impressão que se tem é que o diretor se acovardou; que o que parecia ser um filme-denúncia sobre a podridão da Igreja Católica, acaba virando um filme de suspense, uma história de assassinato e trocas de identidade, deixando em segundo plano "o crime do padre Manolo".

Almodóvar também suaviza as cenas de sexo homossexuais, em comparação com A LEI DO DESEJO, ainda que possa até chocar alguns desavisados com uma cena de felação bastante ousada, levando em consideração que quem está "botando a boca no trombone" aqui é o superstar Gael García Bernal.

Apesar dos contras, é um autêntico Almodóvar. Logo, é uma obra imperdível. Pena que dessa vez não vai estar no meu top 10 no fim do ano.

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