quarta-feira, julho 07, 2004

ANTES DO AMANHECER (Before Sunrise)



Acho sempre difícil falar sobre um filme que me desperta grande paixão e entusiasmo. Não dá pra descrever em palavras a emoção que senti durante e depois do filme. É nessas horas que eu gostaria de ser um poeta ou, ao menos, uma pessoa com uma grande habilidade com as palavras para homenagear o filme com belas palavras.

Ontem foi dia de eu rever o maravilhoso ANTES DO AMANHECER (1995), de Richard Linklater. A vontade de rever o filme se deu por conta de uma crítica de Jonathan Rosebaum, que li ontem, sobre a continuação - ANTES DO PÔR-DO-SOL, que estará chegando nos cinemas brasileiros em setembro próximo. O filme é um prato cheio para espíritos românticos. O que eu vou tentar fazer aqui é colocar algumas observações sobre o filme. Quem não assistiu o filme (pobre mortal!) recomendo não ler o texto abaixo, por enquanto, e que vá urgente à locadora mais próxima alugá-lo.

A viagem - Pra começo de conversa, viajar, por si só, já é algo que traz um certo mistério. Quando viajamos, estamos mais abertos ao desconhecido, especialmente às surpresas boas que podem surgir. È por isso que um filme que começa com um trem seguindo certo destino já nos dá uma sensação agradável de excitação.

O encontro - Ethan Hawke está lendo um livro de Klaus Klinski - "All I Need Is Love". Não lembro que livro Julie Delpy está lendo. As primeiras palavras trocadas entre eles são sempre um prazer de ver e ouvir. Mesmo porque a observação que ele faz sobre o casal alemão que estava brigando no trem, a fim de puxar conversa, não tem grande importância. O que os dois querem mesmo é se conhecer.

O convite - Esse é um dos momentos mais excitantes do filme. Quase senti como se fosse eu chamando a Delpy para descer comigo e continuar a conversa nas ruas de Viena. Aliás, essa sensação de me colocar no lugar de Hawke, vem desde SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS, quando ele fez o papel de um rapaz tímido, mas com potencial de poeta. Pra mim, o personagem de Jesse vai estar sempre conectado com o personagem de Todd Anderson, mesmo que eu saiba que são duas criações distintas. Inclusive, na cena do poeta que pede a doação de uma palavra em ANTES DO AMANHECER, vemos uma palavra que dá origem a algo belo, quase como se surgisse do nada. Parecido com o que acontece no filme de Peter Weir.

O beijo - Compartilhar um pouco os gostos musicais é bom, mas a cena na loja de discos marca o momento do beijo que não acontece. Fica um crescendo de tensão. Há a vontade desesperada de beijar a pessoa. Quase sinto os batimentos cardíacos acelerados dos dois nessa cena. The first kiss takes so long - como diz o título de um texto sobre o filme, contido no livro "American Independent Cinema", de Jim Hillier, - mas quando ele surge, é como se fogos de artifícios surgissem no céu.

O papo-cabeça - Não é à toa que Linklater é conhecido como o Eric Rohmer texano. O diretor tem a habilidade extraordinária de trazer para seus filmes assuntos profundos sem tornar os diálogos chatos. Longe disso. Em ANTES DO AMANHECER vemos assuntos como a transitoriedade das pessoas em relação ao espaço, a imortalidade da alma, as projeções românticas, diferenças entre homem e mulher, entre outros tópicos comentados.

Inspiração - Interessante como quando estamos com o espírito regozijando, fica tão mais fácil soltarmos palavras e idéias inspiradas. A cena dos dois simulando uma ligação para os amigos contando a boa-nova do encontro é encantadora.

O adeus - Em certa hora, Delpy diz, olhando para a cidade de Viena, "parece que estamos num mundo de sonho." E como sonho tem que acabar, pela manhã os dois terão de se despedir. De fazer chorar quando toca o violino na cena dos dois no restaurante dizendo adeus antecipadamente. E há a cena dos dois deitados na grama, bebendo vinho e pensando no quanto as suas vidas mudariam se eles continuassem juntos. O encanto morreria e daria lugar ao tédio?

O tempo - "A vida escoa vagamente e a todos o tempo há de consumir", como diz a poesia de W. H. Auden, citada por Hawke, próximo do final do filme. Paira no ar certa melancolia. Lembrei de uma canção dos Cranberries ("Will You Remember?"), que faz uma reflexão sobre os momentos mágicos da vida, mas que serão apagados com o tempo e com a morte. Mas, penso eu, será que eles serão mesmo esquecidos? Vai ver eu me pergunto por acreditar na imortalidade da alma. Mas não é triste imaginar que momentos de "céu na terra" na vida de tantas pessoas vão para o túmulo, para o esquecimento?

Sinceramente, eu ainda não consigo acreditar que a continuação desse filme consiga ser melhor ainda, mas é o que grande parte da crítica internacional anda dizendo de ANTES DO POR-DO-SOL, o filme sobre o reencontro de Jesse e Celine depois de nove anos do primeiro encontro. Já estou sentindo um frio na barriga....

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