CARANDIRU
"Caiam mil ao teu lado, e dez mil à tua direita; tu não serás atingido."
Salmo 91.7
Acabei de vir de uma sessão de cinema que vai entrar pra história. Isto é, entre os melhores momentos que eu tive dentro de uma sessão de cinema. Não sei ainda porque há tanta gente falando mal do filme. Teve gente que disse que Babenco fez isso pelo dinheiro; outros disseram que a fotografia de Walter Carvalho deixava o filme meio...pasteurizado; outros chamaram até de novela mexicana de má qualidade. O que é isso, meu povo? CARANDIRU é foda, muito foda. Nem sei por onde começar pra falar sobre o filme. Posso começar falando que 2003 está sendo um ano bem sangrento, é verdade. Depois de um sensacional filme que cospe sangue de Mr. Scorsese (GANGS DE NOVA YORK), de uma guerra imoral que está se desenrolando no Golfo, que já é motivo pra mais onzes de setembro acontecerem, chega o filme do Babenco dando porrada na concorrência.
Interessante que foi nesse filme que eu mais senti a distância entre o filme que eu assisti e o filme que as outras pessoas que estavam na sala assistiram. Vi gente rindo pra caramba dos personagens gays, principalmente do casal formado por Lady Di (Rodrigo Santoro) e Sem Chance (Gero Camilo). E até vi gente dançando com a música final que tocou (acho que era "Aquarela do Brasil"). Eu não. Eu chorei pra caramba. Senti todo o carinho que Babenco (e acredito que Dráuzio Varela também) sentiram por todos aqueles personagens, cheios de tragédias pessoais. Até mesmo os evangélicos, sempre mostrados de forma preconceituosa em filmes e novelas, são tratados com respeito no filme. Há duas passagens realmente emocionantes envolvendo o tema: a conversão do pistoleiro "Peixeira" e aquele trecho da Bíblia lá de cima. Aquele Salmo eu sabia decorado há um tempo atrás. Hoje em dia esqueço trechos, troco os versículos. As palavras são poderosas.
Os atores do filme não poderiam estar melhor. Como o filme tem muitos personagens, costumam sempre comparar com SHORT CUTS, do Altman. Bom, ainda bem que a comparação é com um filme ótimo. Mas tirando essa semelhança, não há muita coisa em comum entre os dois filmes. O universo é outro, sem dúvida. Há personagens mais fáceis de a gente se identificar, como o garoto Deusdete (Caio Blat), que mesmo não sendo um bandido, foi parar lá no presídio. Mas há personagens fortes como o pirado Zico (Wagner Moura ), o xará Ailton Graça fazendo o papel do malandro Majestade (o cara parece com o Denzel Washington, vejam vocês!); o Barba (André Cecatto); Antonio (Floriano Peixoto); Ezequiel (Lázaro Ramos, que já tinha mostrado o seu talento em MADAME SATÃ); o médico vivido por Luiz Carlos Vasconcelos; Dalva (Maria Luiz de Mendonça); Peixeira (Milhem Cortaz); Seu Chico (o grande Milton Gonçalves); Claudiomiro (Ricardo Blat, que já tinha feito um papel brilhante em O PRÍNCIPE). Entre outros.
Mas se o elenco está de parabéns, o que de dizer de Hector Babenco? Ele é o cara que driblou a morte, sobrevivendo a um transplante de medula, prestou contas com ela no belo e enigmático CORAÇÃO ILUMINADO, e está aí pra trazer de volta os excluídos pra esse Brasil que não tem mais vergonha de mostrar que a prioridade é combater a fome.
E sabe de uma coisa? CARANDIRU é o melhor filme de 2003 até agora. Quero saber qual vai ser o outro filme que vai peitar.
Grande abraço!
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